A recuperação de empresas e a função social

Por FATIMA SERRALHEIRO KELLNER | 07/02/2025 | Direito

FATIMA SERRALHEIRO KELLNER


 


 


 


 


 


 


 


 


 


 


 


 


 


 


 


 


 


 

A RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS E A FUNÇÃO SOCIAL


 


 


 


 


 


 


 


 


 


 


 


 


 


 


 


 

ESCOLA PAULISTA DE DIREITO

Especialização em Direito Empresarial


 


 


 


 


 


 


 


 

São Paulo

2014

FÁTIMA SERRALHEIRO KELLNER


 


 


 


 


 


 


 


 


 


 


 


 


 


 


 

A RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS E A FUNÇÃO SOCIAL


 


 


 


 


 


 


 

Monografia Apresentada ao Curso de Pós-Graduação Lato Sensu, Especialização em Direito Empresarial, como parte dos requisitos para obtenção do Título de Especialista em Direito Empresarial pela Escola Paulista de Direito (EPD).


 


 


 


 


 


 


 

Orientador: Prof.


 


 


 


 


 


 


 


 


 

São Paulo

2014

FÁTIMA SERRALHEIRO KELLNER


 


 


 


 


 


 


 


 


 


 


 

A RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS E A FUNÇÃO SOCIAL


 


 


 


 


 

Monografia apresentada à Escola Paulista de Direito (EPD), como parte dos requisitos para obtenção do Título de Especialista em Direito Empresarial.


 


 


 


 

Aprovada com média: ______________________________________________ .


 


 


 

São Paulo, 14 de junho de 2014.


 


 

Banca Examinadora:


 


 

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Nome do professor examinador


 


 

________________________________________ _

Nome do professor examinador


 


 

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Nome do professor examinador

RESUMO


 


 


 

O presente trabalho visa analisar a origem e evolução histórica do instituto da “Recuperação de Empresas” até os dias atuais, período em que o valor dado ao princípio da chamada função social ganhou força, vindo a surtir reflexos também neste instituto, já que a própria recuperação empresarial, quando declarada, ou uma eventual quebra futura, em decorrência do não cumprimento integral do plano de recuperação, devido aos reflexos sociais da empresa, tem o condão de gerar consequências em diversas áreas, tais como civil, trabalhista, tributária, entre outras, a depender das atividades exercidas pela respectiva empresa. Sendo um pedido de recuperação judicial rechaçado pelo juiz ou, mesmo quando acolhido por ele, caso a empresa não consiga cumprir o plano de recuperação na forma como proposto, a quebra é inevitável, sendo capaz de prejudicar, consequentemente, todos os indivíduos direta ou indiretamente ligados a esta empresa, na medida em que o desemprego gerado, a redução da concorrência em sua área de atuação, assim como o próprio inadimplemento de suas obrigações empresariais poderiam acarretar uma reação em cadeia, evidenciando uma crise ainda maior. Tais reflexos seriam suportados por toda uma sociedade que, até então, se via beneficiada com a existência daquela pessoa jurídica. Tal visão social adotada juridicamente na atualidade acaba por afastar, por assim dizer, com algumas garantias ou benefícios antes atribuídos unicamente às próprias empresas em dificuldade financeira e aos seus credores, já que, da forma como tratada pela atual lei, tais personalidades passam a ter uma importância secundária, apesar do papel mais ativo adotado pela atual legislação em favor desses credores. Durante a análise dos reflexos da função social na recuperação de empresas, o presente trabalho visa, ainda, avaliar eventual limitação dos poderes do magistrado quanto à sua decisão voltada à aprovação ou não do plano de recuperação judicial. Questiona-se: Poderia ele, juiz, ir contra um plano regularmente aprovado em assembleia geral de credores? Como nossa jurisprudência vem enfrentando a matéria? Todas essas análises serão viabilizadas mediante a utilização de diversos métodos, dentre os quais estão os métodos histórico, comparativo, dedutivo e indutivo.


 


 

PALAVRAS-CHAVE: Recuperação de Empresas. Função Social. Objetivos. Limites. Preservação da Empresa.

ABSTRACT


 


 

This study aims to analyze the origin and historical evolution of the institution of the "Business Recovery" until present days, epoch during which the value given to the principle of the social function gained strength and also reflected on this institute, since the recovery business itself, when declared, or any future break, due to the failure to comply with the recovery plan, due to the social function that company represents, has the ability to generate consequences in several areas, such as civil, labor, tax, among others, depending on the activities performed by the respective company. Being a bankruptcy filing rejected by the judge or even when accepted by him, if the company fails to comply with the recovery plan the way as it was proposed, the bankruptcy is inevitable and may prejudice all individuals directly or indirectly attached to this company, it can occur because the unemployment generated, the reduction of competition in the same business area, as well as breach of its own corporate bonds could cause a chain reaction, showing an even greater crisis. Such reflections would be supported by a whole society that until then was receiving benefits because of the existence of that entity. This social vision legally adopted nowadays ends up to dispel some guarantees or benefits previously attributed solely to these companies in financial difficulty and its own creditors, since the way they are treated by current law, such persons stay in a second place, despite the more active role adopted by the current legislation in favor of the creditors. During the analysis of the effects of the social function in corporate recovery, this study also aims to assess possible limitations on magistrate powers as to its decision to approve or not the judicial recovery plan. We can ask: Could he, the judge, decide against a plan duly adopted at a general meeting of creditors? How our jurisprudence has been facing the issue? All these analyzes are made possible through the use of various methods, among which are the historical, comparative, inductive and deductive methods.


 


 

KEY WORDS: Corporate Recovery. Social function. Goals. Limits. Company´s Preservation.

SUMÁRIO


 


 

INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 7 

CAPÍTULO 1

1. EVOLUÇÃO HISTÓRICA …...........................................................…...............

1.1. A insolvência na Antiguidade ..........................................................................

1.2. A insolvência na Idade Média .........................................................................

1.3. A falência na Idade Moderna ..........................................................................

1.4. A falência no direito brasileiro .........................................................................

CAPÍTULO 2

2. A RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS NOS DIAS ATUAIS …............................

2.1. Recuperação Extrajudicial ….........................................................................

2.2. Recuperação Judicial ....................................................................................

2.2.1. Recuperação Judicial Comum ...................................................................

2.2.2. Recuperação Judicial Especial ..................................................................

CAPÍTULO 3

3 FUNÇÃO SOCIAL ...........................................................................................

3.1 Função Social da Propriedade ......................................................................

3.2 Função Social da Empresa ...........................................................................

CAPÍTULO 4

4 Concessão da Recuperação de Empresas: considerações sobre seus limites, objetivos e a função social ...................................................................................

CONCLUSÃO .........................................................................................................


 

INTRODUÇÃO


 


 

O presente trabalho visa analisar a origem e evolução histórica do instituto da “Recuperação de Empresas” até os dias atuais, período em que o valor dado ao princípio da chamada função social ganhou força, vindo a refletir também neste instituto, já que a própria recuperação empresarial, quando declarada, ou uma eventual quebra futura, em decorrência do não cumprimento integral daquela, devido aos reflexos sociais da empresa, tem o condão de gerar consequências em diversas áreas, tais como civil, trabalhista, tributária, entre outras, a depender das atividades exercidas pela respectiva empresa.

Sendo um pedido de recuperação judicial rechaçado pelo juiz ou, mesmo quando acolhido por ele, caso a empresa não consiga cumprir o plano de recuperação na forma como foi proposto, a quebra é inevitável, sendo capaz de prejudicar, consequentemente, todos os indivíduos direta ou indiretamente ligados a esta empresa, na medida em que o desemprego gerado, a redução da concorrência em sua área de atuação, assim como o próprio inadimplemento de suas obrigações empresariais, poderiam acarretar uma reação em cadeia, evidenciando uma crise ainda maior. Tais reflexos seriam suportados por toda uma sociedade que, até então, se via beneficiada com a existência daquela pessoa jurídica.

Tal visão social adotada juridicamente na atualidade acaba por afastar, por assim dizer, algumas garantias ou benefícios antes atribuídos unicamente às próprias empresas em dificuldade financeira, como, por exemplo, o então denominado “favor legal”, atributo da concessão da concordata ao empresário em dificuldades, e aos seus credores, já que, da forma como tratada pela atual lei, tais personalidades passam a ter uma importância secundária, apesar do papel mais ativo adotado pela atual legislação em favor dos credores. Nesse último caso, podemos exemplificar a possibilidade de participação dos credores no acolhimento ou não do pedido de recuperação, já que, apresentado o plano de recuperação, eles poderiam, ainda que individualmente, apresentar impugnação à proposta, discordando deste plano, ou, ainda, em conjunto, durante assembleia geral convocada pelo juiz, rejeitar ou acolher esse mesmo plano.

Cabe aqui lembrar, no entanto, que essa decisão coletiva de credores pode ou não vincular o juiz, dependendo do preenchimento de determinados requisitos exigidos pela lei.

Na análise dos reflexos da função social na recuperação de empresas, o presente trabalho visa, ainda, avaliar a limitação dos poderes do magistrado quanto à sua decisão voltada à aprovação ou não do plano de recuperação judicial, ainda que o plano de recuperação tenha sido aprovado em Assembleia de credores.

Questiona-se: Poderia ele, juiz, ir contra um plano regularmente aprovado em assembleia geral de credores? Como nossa jurisprudência vem enfrentando a matéria? Todas essas análises serão viabilizadas mediante a utilização de diversos métodos, dentre os quais estão os métodos histórico, comparativo, dedutivo e indutivo.

Com o fim de abordar os assuntos acima mencionados, o presente trabalho é formado por 4 capítulos e referem-se aos seguintes temas, os quais serão melhor delineados em momento oportuno: 

  1. Capítulo I – Evolução Histórica da Recuperação de empresas – nesse capítulo, abordaremos a evolução histórica do instituto, iniciando-se pela insolvência, passando pela falência, até chegarmos na recuperação de empresas, já que a partir da criação do instituto da falência a sociedade percebeu a necessidade de mecanismos voltados à preservação da empresa;

  2. Capítulo II – Recuperação de Empresas nos Dias Atuais – nesse capítulo serão abordadas as principais características da recuperação de empresas, tal como é encarada na atualidade, assim como serão feitos breves comentários acerca da recuperação judicial e da extrajudicial, com suas peculiaridades;

  3. Capítulo III – Função Social – antes de adentrarmos na função social da própria recuperação de empresas, imprescindível tecermos comentários acerca da função social em si, assim como sobre a função social da propriedade e a função social da empresa, sendo abordados alguns pontos que acabam por fazer com que os dois princípios venham a ser utilizados na interpretação de regras relacionadas à própria empresa;

  4. Capítulo IV - Concessão da Recuperação de Empresas: Considerações sobre seus limites, objetivos e a função social – Aqui, neste capítulo, buscaremos relacionar todos os temas abordados individualmente nos capítulos anteriores, tratando da aplicação da função social e função social da propriedade e da empresa na própria interpretação do instituto da recuperação de empresas. Trataremos dos requisitos necessários para que a recuperação seja concedida ao devedor em dificuldades, assim como da eventual autonomia do juiz para indeferir tal concessão, ainda que diante do preenchimento dos requisitos legais. Trataremos, ainda, dos limites dos poderes do juiz para decidir sobre a concessão ou não da recuperação, ainda que o plano tenha sido aprovado em assembleia de credores;

Desta forma, ao final da exposição de todas as ideias acima indicadas, teceremos nossa conclusão ao presente trabalho.


 

 


 

1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS


 


 

A chamada “Recuperação de Empresas” no Brasil, a primeira vista, parece ser um instituto novo, tendo origem recente através da Lei 11.101/2005, a denominada Lei de Falências e Recuperação de Empresas; porém, ao realizarmos um estudo histórico, é possível verificar uma situação muito diferente. Apenas a denominação utilizada pela lei é nova, tendo sido adotada recentemente em nosso país, mas o instituto em si já existia, apesar de sua evolução no tempo, chegando em seus moldes atuais, tal como o conhecemos nos dias de hoje.

Para entendermos melhor o instituto da recuperação, necessária sua análise em diversos momentos históricos, em países e culturas diversas, ficando aqui anotado que, sua antecessora, a chamada concordata teria provável origem em dois institutos do direito romano, tal como menciona Luiz Tzirulnik1: “A doutrina encontrou a provável origem da concordata em dois institutos formulados no Direito Romano: o pactum ut minus solvatur e a indutia quinquinallis.”

O termo “Recuperação de Empresas”, muito antes de adotado por nossa legislação, da forma como ele se apresenta na atualidade, já era utilizado em alguns países, como restará demonstrado no transcorrer do presente trabalho, sendo que, para bem compreendermos esse instituto em sua plenitude, imprescindível o conhecimento de sua evolução histórica, passando por suas diversas fases anteriores, tais como a insolvência civil e a própria falência, momentos estes em que não era dada a devida atenção às empresas em dificuldade, dando-se ênfase na própria liquidação dessas empresas, objetivando a conversão de seu patrimônio em valores que deveriam ser revertidos em favor dos credores.


 


 

1.1 A Insolvência na Antiguidade


 


 


 

Longo foi o caminho até que a execução de uma dívida pelo credor deixasse de recair sobre a própria pessoa do devedor para atingir unicamente a seus bens. Em muitas das civilizações antigas, tais como na Índia, Egito, Grécia e Roma, o devedor poderia ser aprisionado, escravizado e até morto por seus credores, sendo estas as formas de coerção física para que sua dívida fosse saldada. O Estado, na maioria das vezes, ficava a margem desses atos, deixando de intervir, já que o credor poderia fazer valer seus direitos com suas próprias mãos e o devedor inadimplente estava sujeito a essa sua vontade.

Importante mencionar que esse tipo de coação física do devedor foi paulatinamente sendo abolido e isso se deve, em grande parte, à influência que o direito helênico, oriundo da Grécia, surtiu na Lei das XII Tábuas, que passou a vigorar em Roma. Antes da reforma realizada por Sólon na Grécia, subsistia a servidão pessoal do devedor ao credor, devido a dívidas não pagas. Talvez influenciado pelo direto Egípcio, que passava por transformações humanitárias, Sólon realizou diversas reformas e teria ordenado a liberação de todos os presos por dívidas, além de proibir que os corpos dos devedores fossem responsabilizados por estas.

Apesar da influência das reformas de Sólon, a Lei das XII Tábuas, compilada pelos decênviros, primitivamente ainda exprimia grande crueldade. A execução em face do devedor era realizada através da legis actio per manus injectionem, sendo assim o devedor que deixasse de saldar seu débito era encaminhado pelo credor a juízo. Segundo ensinamentos de Alfredo Buzaid, mencionado na obra de Rubens Requião2, nessa ocasião, caso o devedor não pagasse ou se ninguém se apresentasse para afiançá-lo, ele era adjudicado ao credor que poderia inclusive amarrá-lo com uma corda ou algemar seus pés, podendo ser mantido em cárcere privado por até sessenta dias. Durante esse período o devedor poderia ser levado a até três feiras sucessivas para que seu crédito fosse apregoado. Caso ninguém solvesse sua dívida, esse devedor poderia ser morto ou vendido trans Tiberim (além do Tibre), sendo que, havendo mais de um credor, esse devedor poderia, inclusive, ser retalhado em tantas partes quantos fossem os credores.

Esse esquartejamento permitido expressamente pela lei, no entanto, felizmente, parece não haver sido efetivamente aplicado, ao menos com certa contumácia, já que não são encontrados na História, nas crônicas latinas, nenhum relato de eventual aplicação de tal regra. 

Apesar de a Lei das XII Tábuas haver traçado os contornos da execução singular e da execução coletiva, o que serviu de ponto de partida para o direito moderno, felizmente o tratamento desumano que era admitido pelas normas primitivas em relação ao devedor não perdurou, sendo a então citada manus injectio abolida com o advento da Lex Poetelia Papiria. Com o surgimento dessa norma, a figura do magistrado também restou fortalecida, sendo colocada de lado a então permitida execução extrajudicial, assim como “Os bens do devedor e não o seu corpo, passam a constituir a garantia dos credores.” 3

A forma da execução coletiva traçada por essa lei é a que nos interessa no presente trabalho, já que esta acabou por delinear a falência. Mediante uma petição direcionada ao pretor, o credor poderia imitir-se na posse dos bens de seu devedor (missio in bona). Esse credor não teria disposição jurídica sobre tais bens mas sim mera detenção, devendo zelar e administrar esses bens até que a venda fosse realizada (bonorum venditio). Já naquela época, os credores deviam providenciar a divulgação pública de um edital (libeli), que era afixado na porta do local de trabalho ou residência do devedor, anunciando a arrecadação de bens. Um magister (cargo equiparado ao nosso atual administrador judicial, antigo síndico) era nomeado para que viesse a estabelecer as regras para a venda daqueles bens arrecadados, sendo que essas regras eram submetidas a uma assembleia de credores, que deveriam aprová-la, devendo, a seguir, ser publicada para conhecimento de terceiros. Era o magister que estabelecia as regras da venda, através da lex venditiones e, havendo oferta que viesse a representar a porcentagem mais alta em favor dos credores, providenciava a adjudicação dos bens àquele que ofereceu o melhor preço.

Mesmo sendo desapossado de seus bens, ao final de todo o processo, o devedor ainda ficava marcado com a nota de “infâmia”, sendo tratado como se morto fosse, perdendo, portanto, todos os seus direitos civis.

Em contraposição a esse procedimento citado acima, surgiu outra modalidade de execução coletiva, conhecida como bonorum cessio, que deveria ser aplicada ao devedor sem culpa que deixasse de pagar suas dívidas. Segundo ensinamentos de Rubens Requião4, esse procedimento teria surgido nos princípios do império, sendo regulado pela Lex Julia, vindo a ser considerado por alguns como originária da então chamada concordata preventiva. Vindo a entregar seus bens aos credores, judicial ou extrajudicialmente, o devedor sinalizava que não teve intenção em prejudicá-los, evitando, assim, a execução e a imposição da “infâmia”. A administração desses bens ficava sob a pessoa do magister ou do curador, sendo que a partir da entrega feita pelo devedor os bens seriam vendidos e o produto dessa venda seria entregue proporcionalmente aos seus credores, conforme a natureza de seus créditos e privilégios.

Apesar de essa última modalidade de execução coletiva não atribuir ao devedor inadimplente a marca da infâmia, de qualquer forma, em qualquer uma das duas modalidades mencionadas, tanto a missio in possessionem (aplicada ao devedor inadimplente ausente, confesso ou em fuga), quanto a bonorum cessio (aplicada ao devedor inadimplente sem culpa), resultavam na abertura do concursum creditorum (concurso de credores). Segundo ensinamentos de Fábio Ulhoa Coelho5, “isso é o que se entende por par condictio creditorum”, princípio básico do direito falimentar” em que é dado aos credores as mesmas chances de receber seus créditos, já que estes não poderão executar individualmente aquele devedor.

Como iremos abordar de forma mais clara adiante, verificamos que diversos comportamentos até aqui descritos ainda são adotados nos dias atuais, apesar de as consequências impostas ao devedor inadimplente serem menos severas do que nos tempos primitivos. Nesse meio tempo, eventuais consequências penais da quebra foram passadas para outro campo de discussão que não o cível, como será visto mais adiante.


 


 

1.2 A Insolvência na Idade Média


 


 

Nessa época ainda não importava se o devedor inadimplente era comerciante ou não, o procedimento adotado perante qualquer um deles era o mesmo, apresentando características extremamente repressivas. Foi nesse período que houve a formação de um direito comum, vindo a surgir o direito comercial, ainda que num sentido informal; este começou a ser delineado, pautado nos usos e costumes que vinham sendo adotados pelos juízes consulares.

Em diversos países, tais como Itália, França e Inglaterra, as normas falimentares tratavam tanto o falido quanto os delinquentes comuns da mesma forma e os comissários da falência tinham poderes muito amplos sobre o devedor inadimplente, podendo, inclusive, determinar a ablação de uma de suas orelhas, caso este houvesse subtraído bens superiores a determinado valor, como era previsto de forma expressa numa lei inglesa de 1676, tal como foi citado por Rubens Requião ao mencionar obra de Del Marmol6. A aplicação de penas com tais características degradantes eram comuns para a época.

No direito ibérico perdurou por algum tempo a ideia de que o credor mais diligente, ou aquele que agiu primeiro, tinha um privilégio sobre os demais credores, desta forma, a partir da penhora realizada, ele tinha a preferência no pagamento de seu crédito. Esse entendimento é oriundo do antigo direito germânico, influenciado pelo direito visigótico, mas a partir do Code de 1673, originário da França, o princípio do direito romano da par condictio creditorum prevaleceu, dominando o processo falimentar. 


 


 

1.3 A falência na Idade moderna

 


 

Devido à intervenção de Napoleão Bonaparte, que entendia que o falido deveria ser tratado de maneira mais rigorosa, o Code de Commerce de 1807 ainda trazia traços dessa intolerância. Ainda se entendia que raras eram as vezes em que o falido não era culpado ou que não tinha agido com a intenção de fraudar, portanto ele deveria ser reprimido e penalizado por sua conduta.

O avanço trazido por essa lei, no entanto, diz respeito à separação no tratamento do devedor insolvente comerciante ou não comerciante. Ao comerciante, aplicavam-se as regras do direito falimentar, enquanto que ao não comerciante passou-se a aplicar as regras do regime jurídico geral, ou seja, do direito civil, conforme ensinamento de André Luiz Santa Cruz Ramos7.

Essas ideias de intolerância, impostas pelo imperador, no entanto, não demoraram para seguir outra orientação, a partir da legislação de 1832, que baseou-se em ideias humanísticas e liberais.

Durante essa evolução histórica, o interesse dos credores foi colocado num patamar mais elevado, buscando-se, neste sentido, a correção de determinadas falhas normativas, principalmente em relação à repressão na prática de fraudes, que não estava atendendo as expectativas. Neste sentido, foi criado um direito penal falimentar. Foi verificado que a falência é o instituto que mais sofre mudanças cotidianas, desta forma a norma deixa de ser eficaz muito rapidamente, devendo passar por alterações constantes, o que ocorreu sucessivamente em diversos países. A demora judicial na solução da falência também era outro obstáculo, já que o patrimônio do devedor muitas vezes era diluído no tempo, acabando por expor uma crise do instituto.

Ao Estado, o instituto da falência também não vinha atendendo bem aos seus interesses, desta forma entendeu-se por bem afastar do mesmo várias espécies empresariais do seu interesse, as quais passaram a adotar outros sistemas, tais como a liquidação ou a intervenção administrativa.

Foi em meio a essas discussões e alterações legislativas em diversos países que surgiu na Bélgica a concordata preventiva; sendo aperfeiçoada a concordata suspensiva já existente.

Outros países, tais como Estados Unidos e França possuem previsão legislativa diversa, cada qual com suas peculiaridades, mas sempre visando a conservação da empresa, já que o desaparecimento de uma grande empresa poderia ser catastrófico para determinada região de seu país, a depender do tamanho dessa empresa e do seu campo de atuação dentro do território nacional.

Nos Estados Unidos temos a chamada corporate reorganization, que não substitui a concordata, mas não sendo suficiente esta, aplica-se aquela, visando-se verdadeira reorganização administrativa, sendo os respectivos diretores privados da administração da empresa, que é passada ao trustee, equivalente ao síndico. Essa previsão de reestruturação visa assegurar interesses públicos e não meramente dos credores quirografários, tal como ocorre na concordata preventiva.

Na França, havendo uma proposta séria de concordata, é concedido o regulamento judiciário, sendo que os administradores da empresa não são afastados, no entanto, são assistidos pelo comissário. Assemelhando-se ao sistema americano da corporate reorganization, a legislação francesa também prevê a suspensão provisória de ações e execuções e a apuração coletiva do passivo.

Tal como exposto pelo Professor André Luiz Santa Cruz Ramos8, a partir do desenvolvimento econômico experimentado a partir da revolução industrial, houve uma necessária reformulação de todo o pensamento ligado ao direito falimentar. A própria noção de insolvência deixa de ter um caráter negativo, deixando de lado a visão de fraude e desonestidade, passando a ser encarada de forma mais natural, já que passou a ser uma situação comum, inerente ao risco empresarial.


 


 

1.4 A falência no direito brasileiro


 


 

Devido à colonização de nosso país pelos portugueses, logo após a época do descobrimento, evidente a influência do direito português em nosso ordenamento, inclusive em relação ao nosso direito falimentar.

Durante o período do Brasil colônia, as Ordenações do Reino foram amplamente aplicadas e Portugal, assim como ainda faziam alguns países, continuava a reconhecer privilégio ao primeiro credor exequente, que tinha prioridade no recebimento de seu crédito.

As Ordenações Afonsinas, promulgadas em 1446, foram revistas posteriormente por ordem do Rei D. Manuel quando, desta forma, em 1521 passam a serem chamadas de Ordenações Manuelinas. Segundo o professor Rubens Requião9, tais ordenações, também aplicadas ao Brasil, ainda imputavam ao devedor inadimplente sua submissão ao credor, ou seja, caso este não viesse a saldar sua dívida nem fizesse a cessão de seus bens, quando esta era permitida, poderia vir a ser preso. Mas, segundo esse mesmo autor, foi nas Ordenações Filipinas, que o direito falimentar restou delineado, já que nessa época Portugal estava submetido ao então reino de Castela e as atividades mercantis do Brasil, enquanto colônia, começavam a despertar. Tais Ordenações Filipinas, promulgadas em 1603, quando de sua criação, sofreram influência da Lei de 8 de março de 1595, que teria sido o primeiro diploma que viria a tratar da falência, segundo Manuel Justino de Bezerra Filho10.

Nesse período do Brasil colonial, diversos foram os alvarás expedidos, sobressaindo-se em relação à falência o Alvará de 13 de dezembro de 1756, editado pelo Marquês de Pombal. Nesse alvará o processo de falência restou regulado, prevendo tanto a punição penal por eventual crime falimentar, como também a falência culposa ou a inocente.

Caso o comerciante fosse honesto, deveria confessar sua quebra, apresentando-se a uma Junta e entregando todos seus livros, papeis e chaves de seu estabelecimento, além de uma declaração de bens. Para que seu juramento e confissão fossem aceitos, esse devedor deveria apresentar ao menos um diário, para que sua “quebra” não fosse tida como fraudulenta. Sendo considerada fraudulenta ou não, todos os bens desse devedor falido eram convertidos em dinheiro, para pagamento de seus credores, sendo que apenas 10% do valor total obtido lhe era direcionado, para seu sustento e de sua família.

Algumas determinações existentes em ditos alvarás dessa época nos é curiosa na atualidade, tal como a determinação de que o falido era tido como civilmente falecido, para que todas as suas obrigações anteriores fossem tidas como extintas, assim como, a seguir, era prevista a sua ressuscitação civil, para que esse devedor voltasse a exercer suas atividades comerciais no futuro, como se fosse uma nova pessoa que acabara de nascer. Dessa forma protegia-se o devedor falido de seus antigos credores.

No período imperial, por sua vez, devido à previsão trazida pela Lei de 30 de outubro de 1823, as leis portuguesas foram adotadas no território brasileiro. Essa lei também determinou a observância do Alvará número 18 de agosto de 1769, conhecido como “Lei da Boa Razão”, o qual determinava que fossem aplicadas no território nacional, subsidiariamente, a lei das nações civilizadas. Devido a essa previsão de 1769, verificamos aqui a influência do direito francês no ordenamento brasileiro, já que passou-se a aplicar o Code de Commerce de 1807 no território nacional.

Quando a família real chegou ao Brasil, uma medida tomada por D. João acabou por expor ainda mais a necessidade de criação de uma lei nacional para regular as peculiaridades das relações comerciais brasileiras, ou seja, foi determinada a abertura dos portos nacionais às nações amigas, fazendo com que fossem intensificadas as relações comerciais brasileiras.

Desta forma, para regular tais relações praticadas no Brasil, foi editado nosso primeiro Código Comercial, a Lei 556, de 25 de junho de 1850, que previu o instituto da falência a partir de sua “PARTE TERCEIRA”, que tratou das “quebras”; seu conteúdo, no entanto, foi muito criticado, pois não trazia previsões suficientes para as necessidades comerciais, já que deixou de prever determinadas peculiaridades das práticas comerciais nacionais pertinentes à época.

Nessa lei, o instituto da concordata preventiva não foi previsto, restringindo-se o texto legal apenas à previsão da concordata suspensiva que, por sua vez, dependia de concessão por parte dos credores do devedor, na forma dos artigos 842 e seguintes da referida lei. O processo da falência, no entanto, foi regulado por um regulamento posterior, o 738, de 25 de novembro de 1850.

Uma das peculiaridades dessa lei comercial era a previsão da moratória, concedida diretamente pelo Tribunal do Comércio, com o fim de sustar todas as execuções pendentes e futuras até final decisão da moratória, nos casos em que o devedor comprovasse a impossibilidade de satisfazer de pronto suas obrigações devido a acidentes extraordinários imprevistos ou de força maior, cumulado com a demonstração por balanco e documentos de que possuia meios de pagar integralmente seus credores, apesar de algum atraso, na forma dos artigos 898 e 899 de mencionado código.

Um fato relevante ocorrido nessa época e que evidenciou certa falha nesta norma, merecendo ser citado neste momento é aquele relacionado à Visconde de Mauá, que teve sua quebra determinada por não haver conseguido reunir a maioria de seus credores, que se encontravam espalhados pelo mundo, não preenchendo, desta forma, os requisitos do artigo 847 do Código Comercial para a concessão da concordata. Devido a tal fato, disseminou-se a ideia concretizada pela superveniência do Decreto 3.065, de 6 de maio de 1882, que alterou a Terceira Parte do código e passou a exigir votos apenas da maioria dos credores que estivessem presentes à reunião de credores, facilitando assim a obtenção de tal concordata. Foi também nessa nova norma que a concordata preventiva passou a ser prevista em nosso ordenamento.

A partir da proclamação da república, o que ocorreu em 15 de novembro de 1889, o governo que acabara de assumir o poder passou a preocupar-se com a edição de uma legislação que viesse a refletir essa nova fase brasileira, fazendo frente aos acontecimentos da época. Com esse pensamento, nova legislação falimentar surgiu, ou seja, foi editada em 24 de outubro de 1890 o Decreto 917, que reformou a Parte Terceira do Código Comercial (Lei 556, de 25 de junho de 1850). Esse decreto veio a introduzir em nosso ordenamento a concordata preventiva, mas continuou a prever a moratória. Sobre essa previsão acerca da concordata preventiva, dispôs Nelson Abrão11:


 

(…) Poderia ela ser por acordo extrajudicial, mas homologado pelo juiz, e judicial. Conforme a primeira modalidade, “o devedor, com firma inscrita no registro do comércio, que, antes do protesto por falta de pagamento de obrigação comercial, líquida e certa., tiver feito extrajudicialmente algum acordo ou concordata com os credores, representando pelo menos três quartos da totalidade do passivo, deverá requerer, sem demora, a homologação pelo juiz comercial com jurisdição na sede de seu principal estabelecimento, e, obtida ela, não poderá ser declarado falido. (...)


 

Tinha-se grandes esperanças que esse decreto fosse capaz de conter as fraudes existentes, no entanto essa expectativa restou frustrada.

Em 16 de agosto de 1902, nova legislação viria a alterar a lei de falências; a Lei 859, que foi editada e passou a regular toda a matéria falimentar, preocupava-se em evitar conluios entre devedores e credores, desta forma, os síndicos passaram a serem escolhidos dentre aqueles indicados em uma lista proveniente das Juntas Comerciais e não mais dentre os próprios credores do devedor inadimplente; quarenta eram os nomes indicados em referida lista no Distrito Federal, no entanto tais indicações não eram vistas com confiança.

Curto foi o trajeto de referida norma, que logo foi substituída pela Lei 2.024 de 17 de dezembro de 1908. Essa nova lei persistiu no tempo, vindo a ser revista apenas muitos anos depois, em 1949. O Professor Otávio Mendes, citado em obra de Rubens Requião12, atribui culpa aos magistrados pela não produção de bons resultados por referida norma, que exigia que a “execução fosse fiscalizada e garantida por um juiz enérgico, inteligente e ilustrado”. Conforme já mencionado, tal norma foi alterada apenas em 1929, com o advento do Decreto 5.746, de 9 de dezembro, que surtiu efeitos até o início do regime político do Estado Novo, fundado por Getúlio Vargas em 10 de novembro de 1937.

Com o advento desse novo regime, houve uma preocupação crescente em ajustar as leis àquele novo pensamento político, havendo necessidade de fortalecer o poder do Estado. Com esse objetivo, foi editado o Decreto-lei 7661, de 21 de junho de 1945. A nova norma vinha a dar mais forças ao magistrado, assim como a concordada suspensiva e a preventiva passaram a ser encaradas como um benefício que o Estado proporcionava ao devedor inadimplente que não houvesse agido fraudulentamente, sendo, portanto, apenas vítima das intempéries comerciais.

Mencionada norma, assim como qualquer outra anterior a ela, acabou por sofrer certo desgaste no tempo, ou seja, com a mudança das práticas comerciais suas previsões passaram a ser consideradas insuficientes para refletir a necessária segurança jurídica tão importante para o desenvolvimento das relações comerciais. Diante de tal necessidade de reforma, editou-se a Lei 7.274, de 10 de dezembro de 1984, a qual apenas veio a alterar determinados dispositivos daquela norma, porém quando editada seu texto recebeu críticas, já que trouxe determinada impropriedade, ou seja, fez menção ao credores não sujeitos à concordata, enquanto que o ideal seria tê-los deixado de fora de sua previsão.

Quanto ao tema, chegando à falência no direito empresarial contemporâneo, oportuno mencionar as palavras de Bráulio Lisboa Lopes13 quando menciona os termos utilizados para designar a falência, assim como qual seria seu conteúdo, conforme segue:


 

O estudo da evolução histórica do Direito Concursal permite uma análise da consolidação das formas de resolução das crises empresariais ao longo do tempo, até a formação do complexo normativo em vigor. A palavra falência é oriunda do termo fallare, que em latim significa faltar ou enganar. Já a expressão quebra, é originária do Direito Português, designando o estado de insolvência do empresário. Utiliza-se, também, a expressão bancarrota, empregada no Código Criminal português de 1830 para designar a falência fraudulenta. Apesar do instituto regulador da insolvência ter recebido nomenclaturas diversas ao longo dos anos, nosso ordenamento pátrio em vigor adota o termo falência, instituto jurídico composto por um complexo de normas que definem e regulam uma situação especial, representada pelo desequilíbrio econômico, financeiro e patrimonial do devedor.


 

Por fim, tal como era nosso objetivo dentro deste capítulo, chegamos até os dias atuais, época em que foi editada nossa atual legislação falimentar, a Lei 11.101, de 09 de fevereiro de 2005, a qual enfrentou longa jornada até sua publicação, havendo tramitado longos anos em nosso Congresso Nacional até sua entrada em vigor, conforme veremos de forma mais detalhada no capítulo seguinte.


 


 

2 A RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS NOS DIAS ATUAIS


 


 

Nossa atual lei falimentar, Lei 11.101/05, originou-se do Projeto de Lei 4.376/93, o qual enfrentou um longo período de debates em nosso Congresso Nacional até que ela fosse finalmente promulgada em 9 de fevereiro de 2005.

A nova norma revogou a antiga Lei 7.661/45 e trouxe diversas novidades ao nosso procedimento falimentar, como, por exemplo, a mudança de paradigma, ou seja, sua antecessora, a concordata, era vista como um “favor legal” concedido à concordatária que se enquadrasse nos requisitos previstos em lei, sem que qualquer consulta a seus credores fosse realizada.

Sendo um favor legal, portanto, e encaixando-se nas situações previstas na norma, ao juiz cabia apenas deferir o pedido. Isto no entanto, acabava por favorecer comportamentos fraudulentos por parte de empresas que buscavam beneficiar-se da lei com o único objetivo de reduzir o valor de suas dívidas ou o de dilatar o prazo de para a realização de pagamentos à seus credores, em verdadeiro abuso de direito.

A recuperação de empresas, por sua vez, nos moldes como se apresenta, deixou para trás essa característica de favor legal e acabou por reconhecer a importância na continuidade empresarial, preservação da empresa, como forma de manter o valor econômico da mesma e de seus bens, assim como para que a ela consiga sair da crise então enfrentada, continuando a atender à sua função social.

Importante mencionar, no entanto, nesse momento a grande influência que esse instituto, ainda em sua fase de projeto, sofreu de um estudo publicado em 1999 sobre a insolvência na América Latina, o qual foi patrocinado pelo Banco Mundial, conforme foi mencionado na obra de André Luiz Santa Cruz Ramos14

Nesse estudo, apontado por referido autor, vários pontos foram observados, frente à nossa antiga lei brasileira, dentre eles a insegurança do crédito em nosso país, assim como a necessidade em se fazer uma distinção entre empresa e empresário.

Mesmo após a edição da Lei 11.101/05, vários foram os desafios para a sua aplicação, já que ela foi, de imediato, objeto de duas ações diretas de inconstitucionalidade, as quais atacavam vários de seus dispositivos, porém, tais ações foram julgadas improcedentes pelo Supremo Tribunal Federal.

A recuperação de empresas, por sua vez, apesar de todos dos problemas enfrentados, representou um avanço em relação à antiga lei falimentar, vindo a apresentar a possibilidade de uma verdadeira reestruturação em relação à empresa em crise, tal como disposto em obra conjunta escrita por Maria Gabriela Venturoti Perrotta Rios Gonçalves e Victor Rios Gonçalves15, conforme segue:


 

O instituto da concordata previsto no antigo Decreto-Lei n. 7661/45 foi extinto e substituído pela recuperação judicial, mecanismo mais moderno e eficaz no combate à crise da empresa. Com efeito, enquanto a concordata restringia-se à remissão de dívidas e dilação de prazos para pagamento dos credores, a recuperação judicial prevê um verdadeiro plano de reestruturação, com diversas medidas de ordem financeira, jurídica, econômica e comercial, as quais conferem efetivas chances para a superação da crise. Ademais, na recuperação judicial há intensa participação dos credores, responsáveis pela aprovação ou rejeição do plano de recuperação escolhido pelo devedor, bem como pela fiscalização do seu cumprimento. Na concordata, os credores eram meros expectadores que deveriam contentar-se com a remissão e/ou moratória impostas.


 

O Brasil, com a nova lei, acabou por adotar uma tendência mundial, passando a reconhecer a importância da preservação da empresa, que acaba por trazer mais benefícios a toda a sociedade, os quais vão muito além dos interesses econômicos de seus credores. Nesse sentido, foram adotados mecanismos novos e mais eficientes do que aqueles trazidos pela antiga concordata, que atualmente restou extinta, com exceção daquelas ações ainda em andamento sob a égide da antiga norma.

Um dos mecanismos adotados pela nova lei, por exemplo, acabou por reconhecer aos credores do falido, na recuperação de empresas comum, um papel mais ativo no curso de eventual ação buscando a recuperação da empresa em dificuldade financeira, já que eles são intimados para que venham a se reunir, decidindo sobre o acolhimento ou não do plano de recuperação apresentado por aquela empresa em crise.

Neste sentido, com a previsão dessa reunião de credores visando o acolhimento ou não do plano, a lei buscou conceder um incentivo para que o credor viesse a se envolver com a situação da empresa em crise, buscando a melhor solução para todos, para que não agisse individualmente, por conta própria, como ocorria com a antiga concordata. Comportamento individualista este que muitas vezes acabava por dificultar ainda mais a recuperação de uma empresa em dificuldades ou que acabava por comprometer ainda mais o valor do patrimônio do devedor, diminuindo o valor que cada um dos credores eventualmente viessem a receber com o término da liquidação daquela empresa.

Apenas para ilustrar, conforme mencionado por Maria Celeste Morais Guimarães16, ambos os institutos acima mencionados, concordata e recuperação de empresas, são vigentes na norma norte-americana, sendo que sua correspondente recuperação de empresas (corporate reorganization) não vem a substituir sua respectiva concordata (arrangement proceeding), sendo aquela aplicável apenas no caso de esta segunda não ser suficiente, já que menos abrangente do que a primeira.

Essa dupla modalidade de procedimentos, não existe em nosso país. Aqui, preferiu-se adotar apenas um desses institutos, ou seja, a recuperação de empresas, restando a concordata, tanto a preventiva quanto a suspensiva, revogadas. Ainda segundo palavras da autora supra mencionada:

 

Desde o Chandler Act de 1938, que alterou a lei falimentar de 1898, como nos mostra Fábio Konder Comparato10, “a grande sociedade anônima insolvente pode ser submetida, nos Estados Unidos, ao processo da corporate reorganization, cujo objetivo é salvaguardar a empresa, operando na companhia que a explora a reorganização econômica e administrativa necessária ao superamento da crise”.

O instituto, como o nome indica, só se aplica às sociedades anônimas, não se trata de procedimento substitutivo da concordata, ao arbítrio do devedor, mas de uma solução aplicável apenas nas hipóteses em que a simples concordata (arrangement proceeding) se revela uma medida insuficiente para conjurar a crise empresarial. Por isso mesmo, em sua petição inicial de corporate reorganization, a companhia deve demonstrar porque a concordata não se aplica ao seu caso.


 

No Brasil, apesar de a recuperação de empresas haver sido prevista na nova norma, dando suporte ao princípio da preservação da empresa, reconhecendo-se a função social daquela unidade produtora, e aparentando ser uma solução mais favorável ao devedor, sua aplicação em si mesma considerada nem sempre é viável, ou seja, nem sempre sua concessão pode vir a representar a melhor solução para a situação de crise em que a empresa se encontra. Em determinado contexto fático, na verdade, sua concessão pode representar até mesmo o agravamento da situação, já que a continuidade do crédito colocado a disposição de uma empresa que não possui capacidade de soerguimento, pode acarretar prejuízos de ordem ainda maior do que sua imediata retirada do mercado, através da decretação de sua falência. 

Desta forma, buscando auferir a pertinência acerca de eventual pedido de concessão desta medida, o devedor deve verificar, estudando toda a situação em conjunto com seus advogados, administradores e demais profissionais especializados na área, a viabilidade da utilização desse instituto, já que ela demanda certos desafios, assim como a aplicação dessa medida pode vir a exigir determinados esforços do próprio devedor e também de seus credores que nem sempre poderão ser considerados compensadores a ambos, já que a aplicação da recuperação representa uma incerteza na assunção dos resultados almejados por ambos, os quais seriam: o pagamento tempestivo das obrigações assumidas no plano de recuperação dentro ou fora do prazo do exercício do controle judicial de dois anos a contar da concessão da medida, e a consequente continuidade das atividades empresariais até então exercidas por esta empresa.

Observe-se que descumprido o plano de recuperação na forma como foi ajustado, dentro do prazo de 2 anos a contar do deferimento da medida, será decretada a falência da então recuperanda, no entanto, caso dito descumprimento ocorra após o decurso de mencionado prazo, o credor, neste caso, poderá optar por ingressar com a respectiva ação de execução, buscando o recebimento do seu crédito. Nesse caso, o credor poderá, ainda, com base no artigo 94 e seguintes da lei falimentar, ingressar com pedido de falência, já que a então ação de recuperação é encerrada após o decurso do prazo do exercício do controle judicial. 

Desta forma, como podemos observar, a concessão da recuperação de empresas, objetivando unicamente a aplicação do princípio da preservação da empresa, não pode ser considerada um fim em si mesma, devendo ser analisada, tanto pelo juiz, quanto pelo devedor, a viabilidade desta concessão e também se estaria cumprindo a função social tão almejada pela norma caso essa medida seja deferida para determinada empresa em dificuldades. 

Alguns autores entendem que o princípio da preservação da empresa, adotado por essa lei, originou-se no artigo 170 da Constituição Federal, que consagrou a valorização do trabalho humano e a livre iniciativa, porém outros autores pensam de forma diversa, como veremos mais adiante. 

O próprio termo “Recuperação de Empresas”, objeto deste capítulo, nunca havia sido utilizado antes em nosso ordenamento, no entanto ele reflete pensamento já existente, ou seja, a recuperação de uma empresa em dificuldades já era visada, apesar de representar mais um objetivo econômico do que jurídico, tal como mencionado por Jorge Lobo, citado na obra de Manoel Justino Bezerra Filho17, quando afirmou que diversas instituições financiadoras de empresas em dificuldades já haviam sido criadas anteriormente pelo poder público de diversos países, inclusive do Brasil, visando sua recuperação e superação de dificuldades econômicas em tempos de crise financeira. Tais instituições existiam independentemente de qualquer lei falimentar e evidenciavam um socorro extraprocessual às empresas em dificuldade, já que disponibilizavam capital para estas, que poderiam continuar a exercer suas atividades.

Evidente, no entanto, a influência e a pressão que o setor bancário infligiu à criação da nova lei falimentar, tanto é que, durante a fase de projeto, o nome da lei passou a ser conhecido no meio jurídico, de maneira irônica, como sendo a “Lei de Recuperação de Crédito Bancário”, tal como mencionado por Manuel Justino Bezerra18.

Nesse sentido, é possível verificarmos pela singela leitura de determinados artigos contidos no respectivo texto legal, tal como o artigo 49, parágrafo 3º, que o setor bancário restou favorecido em diversos pontos da lei, inclusive quando foi estabelecida a ordem de classificação dos créditos; vindo a norma, por exemplo, prever a colocação dos créditos tributários numa ordem posterior aos créditos com garantia real.

Apesar desta posição, logo atrás do setor bancário, o setor fazendário, por sua vez, também restou favorecido pela atual norma falimentar, já que, além de ser credor de um crédito privilegiado em caso de eventual decretação de quebra, também não se sujeita ao plano de recuperação apresentado pela devedora, assim como pode ingressar com eventuais execuções fiscais pertinentes, com o fim de receber valores em atraso e isso sem que tais ações venham a sofrer qualquer interferência do juízo das recuperações, já que, não sujeitando-se a esta, o processo segue sem curso sem qualquer suspensão.

Cabe mencionar, no entanto, que, para que um pedido de recuperação seja admitido pelo juiz, o artigo 57 da Lei 11.101/05 exige a apresentação de certidão tributária negativa, podendo o juiz conceder a medida apenas após a apresentação destas.

Foi nesse ponto, exemplificativamente, que a nova lei acabou por afastar-se um pouco de sua função social, já que deixou de lado seu objetivo maior, que seria o de propiciar a recuperação econômica de uma empresa em dificuldades em pé de igualdade em face de seus credores. Quando fez essa exigência, no entanto, a norma acabou por salvaguardar interesses de determinados credores, instituições financeiras e fisco, em detrimento de outros.

Em relação a esse privilégio concedido pela norma ao fisco, ele seria capaz de inviabilizar a recuperação de diversas empresas em dificuldade devido a existência de débitos em aberto com esses entes, em verdadeiro confronto com a tentativa de recuperação de uma determinada empresa em dificuldade; no entanto, conforme assinalado na obra de Stuart Slatter e David Lovett19, apesar da previsão acerca dessa exigência legal, ela vem sendo deixada de lado em diversos julgamentos:


 

Vale notar, relativamente ao já acenado problema da não sujeição dos créditos tributários à recuperação, que apesar da não apresentação das certidões negativas de débitos tributários, os juízes têm em muitos casos por bem decidido não convolar a recuperação em falência unicamente por este motivo.


 

Neste sentido, portanto, verificamos que mencionada exigência legal vem sendo relativizada por nossos tribunais, já que, a despeito dessa previsão, há outra, que diz que, em caso de concessão da recuperação em face de uma empresa em crise, haverá um parcelamento concedido pelo fisco, buscando-se, com isso, a regularização de sua situação fiscal, com o fim de viabilizar a tão almejada recuperação. Esse parcelamento, por sua vez, está previsto no artigo 68 da Lei de Falências e Recuperação de Empresas, porém ainda não foi regulado por nenhuma outra norma até o momento.

Ocorre que, como essa lei específica ainda não veio, a matéria relacionada ao parcelamento ainda não existe, o que inviabilizaria a utilização desse mecanismo pelas empresas em crise. Diante disso, os tribunais passaram a entender que, até que a norma específica venha, possibilitando o parcelamento de eventuais tributos por parte das empresas em crise que são devedoras de tributos, a exigência quanto à apresentação da certidão negativa fiscal pode ser afastada.

Esse raciocínio decorre também do entendimento de que a previsão acerca do parcelamento é um poder-dever do fisco, não representando, portanto, uma faculdade e já que a norma ainda não foi editada, aquelas empresas em dificuldade econômicas não podem ser prejudicadas pela omissão atribuída à falta de legislação que venha a dispor sobre a matéria.

O STJ, por sua vez, acabou por adotar essa mesma corrente originária do tribunal paulista, que já vinha ganhando força e passou a desconsiderar a necessida de de apresentação de tais certidões.

Outro fato que merece ser mencionado, colocando-se em posição de destaque na atualidade por diferenciar-se sobremaneira da forma como era interpretado nos tempos primitivos, é aquele que expressa a forma como uma empresa em dificuldades é encarada nos dias atuais, ou seja, diferentemente do que ocorria historicamente durante uma situação de insolvência, hoje é possível, em princípio, encarar o devedor insolvente como sendo aquele que realmente foi atingido por dificuldades financeiras decorrentes dos riscos inerentes à sua atividade econômica e não mais, sumariamente, como uma pessoa desonesta que, agindo com intenção de prejudicar credores, veio a agir fraudulentamente na gestão de seus negócios, sendo então atingido pela falência.

Tais pensamentos de desconfiança então existentes em relação aos devedores insolventes, que acabavam falindo, tiveram o condão de influenciar nossas leis anteriores e seu caráter negativo pode ser observado, inclusive, pela simples leitura do significado etimológico da palavra falência, nas palavras de José Xavier Carvalho de Mendonça20:


 

2. FALIR, do latim fallere, exprime a mesma coisa que faltar com o prometido, com a palavra, enganar (1); daí falimento, falência, seus derivados, significando falha, falta, omissão (2).


 

A nova lei, acompanhando um pensamento mais moderno e favorável ao devedor e voltando-se a preocupação quanto à a função social da empresa, pautou-se em um novo princípio, o da preservação da empresa.

Isso ocorreu devido à constatação de que uma empresa não representa importância unicamente para seus sócios/quotistas e empregados, na medida em que aqueles auferem os lucros e estes mantêm-se empregados, mas também existem outros reflexos, muito além desses, tais como a redução na aferição de tributos por parte do poder público, assim como a redução na circulação de bens e riquezas, no caso de decretação da falência daquela determinada empresa em particular.

Enfim, os reflexos da quebra iriam muito além do campo econômico, passando também para o campo social, e verifica-se que quanto maior o tamanho ou influência da companhia naquele mercado determinado, maior os reflexos gerados, inclusive no campo social, no caso de encerramento de suas atividades.

Pertinente, outrossim, mencionar, neste momento, a mudança de paradigma trazida pela nova lei, que veio a revogar a antiga lei falimentar, ou seja, o então existente instituto da concordata era encarado por aquela norma como um favor legal e ainda que os credores discordassem do pedido de concordata, o juiz poderia acolhê-lo, depois de verificado o preenchimento das exigências legais para tanto. A atual recuperação de empresas, no entanto, possui uma natureza contratual, na medida em que a vontade dos credores é levada em consideração, através, inclusive, da assembleia de credores.

Ainda que o plano de recuperação apresentado pelo devedor seja rechaçado em assembleia geral de credores, caso o juiz acabe por decretar o cram down, derrubando essa decisão de assembleia, o acordo é tido como firmado entre o devedor e seus credores, podendo ser imposto a todos, representando verdadeira novação quanto às obrigações existentes até então, quando do deferimento do pedido de recuperação.

Essa natureza contratual da recuperação, entretanto, não se confunde com a sentença concessiva desta, conforme anotado por Amador Paes de Almeida21, conforme segue:


 

Conquanto contenha elementos próprios, não perde, entretanto, a sua feição contratual, envolvendo com os credores compromissos de pagamentos a serem satisfeitos na forma estabelecida no respectivo plano.

A natureza jurídica da recuperação judicial não se confunde com a sentença concessiva da recuperação. Essa última é, inquestionavelmente, constitutiva, por isso que, criando uma situação nova, implicando novação dos créditos (art. 59), altera sensivelmente as relações do devedor com seus credores.


 

Antes de aprofundarmos nessas considerações, no entanto, importante adentrarmos brevemente nos tipos de recuperação previstos pela nova lei de recuperação de empresas, os quais serão tratados a seguir.


 


 

2.1 Recuperação Extrajudicial


 


 

A recuperação extrajudicial está regulada a partir do artigo 161 da Lei de Falências e Recuperação de Empresas, sendo que a proposta de recuperação acaba por representar uma esperança para os credores de que todos os débitos do devedor serão pagos, apesar de algum esforço ou sacrifício por parte de alguns ou de todos eles, já que o vencimento de suas dívidas podem vir a ser prorrogados, por exemplo.

A proposta de recuperação extrajudicial, no entanto, não engloba todos os credores da empresa-devedora, não tendo como se impor o cumprimento do plano a esses credores que não participam da recuperação, já que estes ficariam a margem dessa recuperação, na forma do artigo 161, parágrafo 1º e do 163, parágrafo 1º, ambos da Lei de Recuperação de Empresas.

Ainda que a proposta feita extrajudicialmente não seja aceita pelos credores em sua totalidade, desde que preenchidos os requisitos previstos na Lei 11.101/05, o devedor pode impor as condições firmadas nesse plano de recuperação aos demais credores, ainda que não tenham concordado com ele, mas, para isso, o plano deve ter sido assinado por pelo menos 3/5 dos credores de todos os créditos de cada espécie por ele abrangido, devendo, logo após, ser submetido, obrigatoriamente, à homologação judicial, adquirindo status de título executivo judicial.

Dito isto, resta esclarecido o fato de que não é obrigatória, para a validade entre as partes signatárias de uma recuperação proposta extrajudicialmente, a sua submissão à decisão homologatória de um magistrado, porém essa submissão muitas vezes é conveniente, já que acaba por conferir uma maior transparência a esse pacto, devido à publicidade inerente aos atos judiciais em geral, conferindo ao ato uma maior transparência; em outros casos, no entanto, essa submissão à apreciação judicial homologatória será obrigatória, como meio de impelir os demais credores, não signatários do acordo entabulado, o seu cumprimento, garantindo-se com isso a legalidade deste acordo que será imposto a todos, conforme já mencionado no parágrafo anterior.

Apesar de a Lei de Recuperação de Empresas prever o preenchimento de determinados requisitos para a recuperação extrajudicial, tais requisitos, segundo ensinamentos do professor Fábio Ulhoa Coelho22, seriam aplicados unicamente em caso de necessidade de homologação judicial do acordo firmado.

Desta forma, ainda que ausente algum desses requisitos legais no momento da assinatura do plano de recuperação extrajudicial, não sendo o caso de obrigatoriedade legal de homologação judicial para que determinada obrigação ali prevista possa ser cumprida ou imposta, tal acordo é válido entre as partes, não podendo, no entanto, vincular os credores não signatários de tal proposta extrajudicial.

Apenas enfatizando aquilo que já foi dito, caso se pretenda, todavia, vincular os credores não signatários ao cumprimento do plano apresentado, o devedor, deve, obrigatoriamente, submeter o plano à homologação judicial, nos termos do artigo 163 caput, da Lei 11.101/05, ou seja, neste caso ele deverá observar todos os requisitos exigidos pela lei, de outra forma não conseguirá mencionada homologação e nem a vinculação daqueles credores.

Apesar de ainda não estar sendo utilizado com tanta frequência como ocorre com a recuperação judicial, o instituto da recuperação extrajudicial representa um avanço, sendo merecedor de elogios, na medida em que incentiva a procura dos credores, por parte do devedor em dificuldades, buscando uma solução mais benéfica para ambos durante uma determinada situação de crise. Isso dá mais transparência às relações, já que o credor pode tomar conhecimento de antemão das dificuldades financeiras enfrentadas pelo devedor. 

Quanto ao tema, no entanto, oportuno mencionar que, segundo a antiga legislação falimentar, Decreto-Lei 7.661 de 21 de junho de 1945, conforme previsão então existente em seu artigo 2º, inciso III, o ato de convocar credores com o fim de propor dilação, remissão de crédito ou cessão de bens, era considerado ato de falência, ou seja, aquela norma acabava por inviabilizar qualquer tentativa de soerguimento da empresa mediante acordo extrajudicial entre devedor e seus credores, ao contrário do que a atual recuperação de empresas na modalidade extrajudicial o faz.

Nesse sentido, temos que a atual norma representa um avanço, já que pautou-se em nova premissa, mais moderna e compatível com nossa atual realidade brasileira, acabando por reconhecer a importância de se manter o funcionamento das empresas em dificuldades e, com essa finalidade, acabou prevendo em seu texto diversos mecanismos, em rol exemplificativo, no sentido de auxiliar na recuperação daquelas empresas em que ainda se vislumbra uma eventual possibilidade de recuperação.

Quanto ao plano de recuperação extrajudicial, ele guarda determinadas semelhanças com aquele atribuído à recuperação judicial, vindo a diferenciar-se, no entanto, em relação a outros pontos. 

Importante lembrar, no entanto, que este plano deve respeitar o princípio da par condicio creditorum, assim como sua homologação judicial vinculará apenas aqueles créditos já constituídos até a data do respectivo pedido.

Independentemente do fundamento trazido para esse pedido de homologação judicial, o procedimento previsto é o mesmo, ou seja, o juiz, em qualquer caso, determinará a publicação de edital, convocando os credores interessados em impugnar o plano apresentado, nos termos daquilo que estabelece o artigo 164 da Lei 11.101/05.

Conforme já mencionado, devido às restrições trazidas pela lei, nem todos os credores poderão participar da recuperação extrajudicial, sendo que as ações e execuções dos créditos desses devedores, por não se sujeitarem a essa recuperação, continuarão seu curso, sem qualquer suspensão referente à homologação do plano pelo juiz. Inclusive tais credores poderão, ainda, a qualquer momento, requerer a decretação da falência do devedor por tais dívidas, na forma da lei falimentar.

Em arremate, importante mencionar os efeitos que a homologação do plano de recuperação extrajudicial acarreta, ou seja, a homologação, em regra, gera efeitos posteriores a ela, com exceção de eventual modificação do valor ou da forma de pagamento de determinadas dívidas. Nesses casos, a lei abre uma exceção, aceitando efeitos anteriores à homologação e, caso o juiz deixe de homologar o acordo então entabulado, os credores voltarão a ter o direito de exigir seus créditos da forma como eram originariamente, abatendo-se no entanto, eventuais valores recebidos antes do desacolhimento do pedido de homologação pelo juiz.


 


 

2.2 Recuperação Judicial


 


 

A recuperação judicial, como o próprio nome já diz, é uma modalidade de recuperação empresarial submetida à apreciação do poder judiciário e, na forma do artigo 47 da Lei Falimentar, ela tem por objetivo viabilizar a superação de uma situação de crise econômico-financeira enfrentada pelo devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica.

A lei prevê, ainda, a existência de dois tipos de recuperação judicial: a recuperação judicial comum, que é a mais utilizada, e a especial, voltada aos empresário de médio e pequeno porte, sendo a menos utilizada dessas modalidades.

O procedimento de ambas é diverso entre si, já que a recuperação judicial especial possui um procedimento mais simplificado e envolve apenas uma classe de credores, ou seja, os credores quirografários, sendo, ainda, direcionada unicamente às microempresas e às empresas de pequeno porte, tal como disposto nos artigos 70 e seguintes da Lei 11.101/05, porém seus princípios balizadores são os mesmos da recuperação judicial, que é aplicável também às demais modalidades empresariais, apesar de algumas peculiaridades atribuíveis unicamente a esta.

Importante mencionar que o pedido de recuperação judicial pode ocorrer tanto antes da existência de qualquer pedido de falência por parte de algum credor, como após a distribuição desse tipo de pedido judicial. Nesse último caso, o devedor deve requerer sua recuperação judicial quando da apresentação de sua contestação, como matéria de defesa.

Quanto a essa última possibilidade, frise-se, no entanto, que no momento desse pedido o juiz ainda não decretou a falência, pois, caso o houvesse feito, esse pedido de recuperação seria inviável, já que, a despeito do que ocorria com a antiga concordata suspensiva que poderia ser requerida mesmo após a decretação da falência, a atual recuperação não permite recuperação após eventual decretação da falência. 

De qualquer forma, em qualquer uma das duas modalidades de recuperação judicial, caso não sejam cumpridas as metas e propostas idealizadas no plano de recuperação dentro do prazo de dois anos previstos pelo artigo 61 da lei falimentar, a decretação da falência será inevitável, apesar de não ser a única hipótese de convolação em falência no curso da recuperação, já que a lei dispõe expressamente acerca de outras hipóteses.

Após o decurso de tal prazo de controle judicial, no entanto, ainda que o plano venha a prever prestações posteriores àquele período, o juiz encerrará a recuperação. Diante disso, temos duas situações possíveis: em relação a eventual descumprimento do plano de recuperação: caso ocorra descumprimento de qualquer obrigação assumida, antes do decurso de tal prazo, o juiz decretará a falência; no entanto, caso o descumprimento ocorra após esse período, o credor poderá socorrer-se da execução específica ou ingressar com pedido de falência seguindo-se as determinações do artigo 94 e seguintes da Lei 11.101/05. 


 


 

3 FUNÇÃO SOCIAL


 


 

O termo função social é de grande importância no mundo jurídico, porém nem sempre foi assim. Na atualidade, a função social passou a ter maior aplicação em nosso ordenamento em relação a diversos institutos, tais como a propriedade, o contrato e a empresa. Isso se deu devido à necessidade de se limitar o liberalismo que vinha ocorrendo em tempos passados e que deixou de atender as necessidades da vida em sociedade cujos problemas sociais aumentaram de tal maneira, gerando uma crescente falência do estado liberal.

A função social representa uma limitação, controle, a determinado direito que deixa de ser visto como absoluto, devendo cumprir a finalidade para a qual foi criado sem que seja exercido de forma abusiva; ou seja, o comportamento do indivíduo, ao exercer determinado direito próprio previsto em lei, deve levar em consideração também os interesses da sociedade como um todo e isso é realizado mediante o respeito às leis e princípios constitucionais e morais de determinada sociedade.

Segundo esse pensamento, deixa-se de lado a interpretação voltada à proteção de um único individuo, levando-se em consideração as necessidades sociais, através da verificação de quais seriam os reflexos do exercício daquele direito individual sobre os interesses coletivos. Desta forma, quando um indivíduo exerce determinado direito extrapolando os fins para os quais ele foi criado, ainda que sua conduta esteja inicialmente prevista de maneira expressa na norma, sendo, portanto, legal, seu comportamento pode ser considerado ilegal, por ser considerado contrário à sua função social. Assim, compete ao judiciário exercer controle acerca de eventual abuso de direito praticado, já que representaria uma afronta à função social de determinada norma, e, para isso, o magistrado pode socorrer-se nesse princípio social, conforme podemos verificar em recente decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferida em 12 de maio de 2014 (Relator: Correia Lima), nos autos da apelação nº 0043505-13.2009.8.26.0071, originária da Comarca de Bauru, conforme segue:


 

EMENTA: INEXIGIBILIDADE DE DÉBITO E RESPONSABILIDADE CIVIL Tarifas e encargos de manutenção de conta Dever de informação não cumprido pelo banco Conta para recebimento de salário sem movimentação após fim do vínculo empregatício Incidência dos princípios da boa-fé e função social do contrato Inscrição em cadastro de proteção ao crédito indevida Prejuízo moral evidenciado Damnum in re ipsa Indenização devida Arbitramento segundo os critérios da prudência e razoabilidade Recurso improvido.


 

Ainda em relação à aplicação da função social, podemos citar a previsão trazida pelo artigo 1.228, em especial seus parágrafos 1º e 2º, de nosso Código Civil de 2002, como segue:


 

Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha.

§1º O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas.

§2º São defesos os atos que não trazem ao proprietário qualquer comodidade, ou utilidade, e sejam animados pela intenção de prejudicar outrem. [...]


 

A seguir, traçaremos alguns aspectos da função social da empresa, no entanto, para tal, imprescindível passarmos previamente pela função social da propriedade, já que ambos acabam intimamente ligados, como veremos melhor adiante.


 


 

3.1 Função Social da Propriedade


 


 

O direito de propriedade, assim como qualquer outro direito brasileiro, apresenta certas limitações de ordem social, decorrentes dos interesses da coletividade como um todo, ou seja, ele não pode ser exercido de forma absoluta, abusiva, sem respeito aos demais princípios da nossa ordem constitucional ou legal. As limitações, por sua vez, dependerão de cada caso concreto, uma vez que a previsão legal é esparsa em nosso ordenamento pátrio, podendo variar devido a diferentes fatores.

Nas palavras de Francisco Eduardo Loureiro23, temos que:


 

A função social é um poder-dever do proprietário de dar ao objeto da propriedade determinado destino, de vinculá-lo a certo objetivo de interesse coletivo. Não pode ser encarada como algo exterior à propriedade, mas como elemento integrante de sua própria estrutura. Os limites legais são intrínsecos à propriedade. Fala-se não mais em atividade limitativa, mas conformativa do legislador. Como resume Pietro Perlingiere, a função social não deve ser entendida em oposição, ou ódio, à propriedade, mas “a própria razão pela qual o direito de propriedade foi atribuído a determinado sujeito” (Introdução ao direito civil constitucional, 2.ed. Rio de Janeiro, Renovar, 1999, p.22).


 

Nossa Carta Magna faz previsão expressa acerca da função social em diversos dispositivos, entre eles no artigo 5º, inciso XXIII e 170, inciso III. Tais dispositivos mencionados dizem respeito à propriedade e determinam que esta deve atender a sua função social. Nesse mesmo sentido, os artigos 182, parágrafo 2º e 186 caput, quando descrevem a situação em que a propriedade imóvel estará cumprindo sua função social. Desta forma, dependendo do tipo de imóvel a que estamos nos referindo (urbano ou rural), a destinação dada a ele (comercial ou residencial) e a previsão em plano diretor municipal, poderemos dizer se ele está ou não cumprindo sua função social.

A partir de sua previsão constitucional, o princípio ganhou força, vindo a ser, posteriormente, previsto expressamente também em nosso atual Código Civil (Lei 10.406/02), conforme podemos verificar pela singela leitura de alguns mandamentos legais, tais como o artigo 2.035, parágrafo único e o 1.228; este último, quando determina que o direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas finalidades econômicas e sociais. Importante frisar neste momento, no entanto, que outros artigos, inclusive de outras leis que não a civil, também acabam por espelhar a função social do direito nele tratado, ainda quando não o tenham feito de maneira expressa.

Quanto ao conceito de “propriedade”, o Código Civil não traz de maneira expressa seu significado, no entanto ele é alcançado através de um dispositivo desta mesma norma, que trata dos poderes, atributos, inerentes ao proprietário, ou seja, o artigo 1.228. Desta forma, segundo o professor Luiz Antonio Scavone Júnior24, “a propriedade nada mais é do que o direito real de usar, fruir, dispor e reivindicar a coisa sobre a qual recai, respeitando sua função social”. Sendo um direito real, oportuno mencionar que dela decorrem todos os outros direitos reais, os quais são previstos de forma taxativa em nosso ordenamento civil, refletindo, assim, a função social também em relação a eles.

Acerca do conceito em apreço, conforme ensinamento de Maria Helena Diniz, citada na Obra de Hércules Aghiarian25, foi dito que:


 

propriedade consiste no direito real mais amplo, por incidir sobre bem (móvel ou imóvel) próprio (jus in re propria), podendo seu titular dele usar, fruir e dispor (CC, artigo 1.228), sem intervenção de quem quer que seja, ressalvadas as limitações naturais, legais e voluntárias


 

Aghiarian diz, ainda, que todos os demais direitos reais se materializam jus in re aliena, ou seja, representam direito sobre coisa alheia e não própria, como ocorre com a propriedade.

Cabe nesse momento, no entanto, mencionar entendimento exposto por Caio Mario Pereira da Silva26. Segundo ele “Não existe um conceito inflexível do direito de propriedade.”. O sentido do significado de propriedade vem sendo modificado desde a sua criação e isso se deve aos reflexos políticos, sociais, religiosos e à conjuntura política de cada local e época. Desta forma seria um equívoco pensar-se em um conceito estático.

Da mesma forma como ocorre com o conceito de propriedade tratado acima, o conceito de função social da propriedade também não foi previsto de forma expressa em nosso ordenamento pátrio, porém podemos verificar seu alcance a depender do instituto em apreço, o qual deve ser interpretado levando-se em consideração os interesses da coletividade e não apenas salvaguardando os interesses pessoais do titular desse direito. Neste sentido, segundo entendimento de Uadi Lammêgo Bulos27:


 

Considerando-se uma interpretação sistemática nesta hipótese, os diversos perceptivos colacionados são peças de uma mesma engrenagem, e, por isso, podem ser compreendidos como realidades conexas, indissociáveis, complementares. Numa palavra, a função social da propriedade, conforme constituição de 1988 traduz-se pela investigação do sentido, significado e alcance do conjunto de todos os dispositivos que tratam da matéria. Tais preceitos constitucionais mantêm estreito vínculo de reciprocidade. Esse conjunto de normas sobre a propriedade comprova que ela não mais consigna simples direito individual.


 

Em arremate, ao contrário do que ocorria nos primórdios dos tempos, em Roma, quando o senhor era dono desde o subsolo até o espaço aéreo, podendo fazer o que desejasse em suas terras sem que ninguém pudesse se impor a seus desejos, atualmente existem limitações àquele direito, então absoluto. Essas limitações, porém, não são arbitrárias, elas visam os interesses da sociedade, objetivando, ainda, inibir atuações que venham a prejudicar terceiros por mero capricho, mais do venham a beneficiar o proprietário.


 


 

3.2 Função Social da Empresa


 


 

Como lembrado pelo professor Rubens Requião28 em sua obra, citando entendimento do professor Ferri, o termo “empresa” comporta diversos sentidos, podendo ser diferenciado de acordo com o ponto de vista empregado. Desta forma, a empresa pode ser tida como: a expressão da atividade do empresário; ideia criadora; complexo de bens; ou, ainda, em relação a seus dependentes, neste último caso, relacionada à relação empregador e empregado. De qualquer forma, à empresa é atribuída uma função social que é reconhecida tanto pela lei, quanto pela doutrina e jurisprudência atual.

Quanto à função social da empresa, esta pode, por vezes, ser confundida com a própria função social da propriedade, já que o instituto empresa acaba por estar inserido em um conceito mais moderno de propriedade, na medida em que reúne fatores como trabalho e capital, “este considerado como os bens materiais e imateriais necessários à elaboração dos produtos ou serviços(80)”, conforme palavras de Marcelo Mauad29. Ainda segundo este autor:


 

À primeira vista, evidencia-se a preocupação com os chamados bens de produção(81), mas uma exegese mais aprofundada do Art. 170, da Lei Magna, leva a considerar que tanto faz falar em função social da propriedade dos meios de produção, como de função social da empresa, como de função social do poder econômico(82).


 

Ainda que a respectiva norma não mencione de maneira expressa no que consiste essa função social, a importância da empresa em relação à sociedade pode ser observada mediante a simples verificação dos negócios jurídicos que ela envolve, já que os interesses decorrentes desses negócios são difusos, como é melhor esclarecido por Calixto Salomão Filho30 quando trata da empresa, ao citar obra de H. Hansmann, The ownership of interprise, cit., pág. 18:


 

Em uma linguagem mais jurídica, a firma é vista como um único agente subscritor de um grupo de contratos, que começa pelos contratos com os sócios e vai desde contratos com fornecedores e clientes até contratos com trabalhadores e contratos de empréstimo necessários para suprir as necessidades de fundo de empresa

 

Em contribuição a esse pensamento, podemos acrescentar também a importância da empresa nas relações existentes entre a respectiva empresa e seus consumidores e também os tributos pagos por ela em relação às fazendas federal, estadual e municipal, que acabam por fomentar a implantação de diversos programas e obras, enfim, gastos governamentais que acabam por beneficiar toda a sociedade.

Desta forma, seguindo essa linha de raciocínio, quanto maior a empresa, maior será a circulação de riquezas que ela promoverá, na medida em que ela acaba por fomentar um circulo vicioso saudável, já que uma pessoa que está empregada, por exemplo, acaba por gastar mais com roupas, sapatos, alimentação, recreção, etc e consequentemente estes comércios restarão aquecidos, buscando a contração de novos funcionários, os quais, também empregados, passam a fazer parte daquela mesma cadeia de consumidores, o que acaba por aquecer todo o mercado, já que a necessidade de cada indivíduo tende a ir para uma determinada área em especial.

Continuando com esse raciocínio, o mercado, por sua vez, estando aquecido, acaba preocupando-se em aprimorar suas técnicas e a qualidade de seus produtos, passando a vender mais e a contratar mais funcionários, e assim por diante.

Esse movimento poderia ser visto não apenas em relação aos empregados e consumidores, mas também em outras áreas, tal como a tributária, já que uma empresa próspera acaba por pagar mais tributos, fomentando a atividade estatal voltada à educação, saúde, etc, propiciando qualidade de vida a seus cidadãos.

Enfim, quanto maior a atuação da empresa em determinada região, maior será o impacto social em caso de eventual crise, já que ela proporciona grande circulação econômica de bens e riquezas, conforme mencionado acima.

A Lei de Recuperação de Empresas (Lei 11.101/05), por sua vez, em seu artigo 47, faz previsão expressa acerca do termo função social, determinando que o objetivo de uma recuperação é viabilizar a superação de uma situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade produtora.

Desta forma, como já dito, evidente a importância que a empresa representa a toda a sociedade quando a própria lei falimentar pretende preservar a continuidade de sua atividade, reconhecendo sua função social.

Neste sentido, importante salientar que o STJ já expôs entendimento no sentido de sempre ser levada em conta a função social quando o assunto for referente a empresa, como é possível verificar pelo enunciado 53, aprovado na I Jornada de Direito Civil, que assim dispôs: “Art. 966: Deve-se levar em consideração o princípio da função social na interpretação das normas relativas à empresa, a despeito da falta de referência expressa.”

Corroborando esse entendimento, anotamos o pensamento de Clayton Reis31, quando ele diz que o próprio artigo 966 do Código Civil já traz consigo a previsão acerca da função social da empresa, sendo que “Não mais se admite que a geração de bens e ou de serviços, não tenha função social no contexto da realidade atual.”

Antes do Código Civil, no entanto, a própria Constituição Federal já trouxe previsão acerca da função social da empresa quando em seu artigo 170 fez previsões sobre as finalidades da ordem econômica. Desta forma, ainda citando Clayton Reis32, temos que: 


 

Essa realidade social encontra ressonância no campo da empresa posto que, a par da ocorrência dessa função no trabalho remunerado, na produção de bens e recolhimento de tributos, ocorre ainda nas relações laborais, disciplinadas pelas normas trabalhistas […] Nesse contexto vislumbra-se o relevante papel social da empresa na ordem jurídica e social do Estado, ressaltando-se no comando constitucional (CF/88, art. 174, inc. II) a necessidade da sua sujeição aos direitos e obrigações civis, comerciais, trabalhistas e tributários, como meio de disciplinar a sua atuação, bem como, destacar seu papel na sociedade.


 

Desta forma, como observado, a empresa dissemina reflexos em diversas áreas e ramos do direito (civil, trabalhista, tributário entre outros), sendo importante para a ordem social já que representa não apenas a possibilidade de trabalho para os cidadãos, em consonância com o princípio da dignidade da pessoa humana, mas também em relação ao próprio Estado, quando, conforme já mencionado, mediante o pagamento de impostos, possibilita uma maior atuação estatal no campo social, já que este receberia mais recursos econômicos para a implantação de políticas sociais.

Outro ponto relevante é a circulação de recursos econômicos propiciada pela empresa, imprescindível para a política capitalista adotada não apenas em nosso pais na atualidade, mas também por outras nações, em escala mundial.

Outrossim, ainda sobre o artigo 170, inciso III, de nossa Carta Magna, refletindo pensamento já transmitido acima, ele acaba por tratar da função social da propriedade num sentido mais específico, conforme entendimento exposto por José Afonso da Silva33, que acabou por citar pensamento de Eros Grau, conforme segue:


 

Disso decorre que tanto vale falar de função social da propriedade dos bens de produção, como de função social da empresa, como de função social do poder econômico.25 Eros Grau é do mesmo sentir, quando escreve: “O princípio da função social da propriedade, para logo se vê, ganha substancialidade precisamente quando aplicado à propriedade dos bens de produção, ou seja, na disciplina jurídica da propriedade de tais bens, implementada sob compromisso com a sua destinação. A propriedade sobre a qual em maior intensidade refletem os efeitos do princípio é justamente a propriedade dinâmica, dos bens de produção. Na verdade, ao nos referirmos à função social dos bens de produção em dinamismo, estamos à aludir a função social da empresa”.26


 

Desta forma, segundo entendimento acima exposto, a função social da propriedade dos bens de produção, da empresa e do poder econômico acabam por representar a mesma realidade. 

Segundo Filemon Galvão Lopes34:


 

O artigo 170 da Constituição Federal ao abordar a ordem econômica, o faz em harmonia com os demais princípios já mencionados. Equivale dizer que, apesar da livre iniciativa estar no bojo do seu “caput”, há limites à exploração do mercado (uma “ficção econômica” e também “realidade concreta” que pertence à sociedade, e em função dela é que se permite a exploração), sendo asseguradas a livre concorrência e a defesa do consumidor.


 

O princípio da função social da empresa é constitucional, geral e explícito, conforme entendimento de Fábio Ulhoa Coelho35, que também sustenta que:


 

Cumpre sua função social a empresa que gera empregos, tributos e riquezas, contribui para o desenvolvimento econômico, social e cultural da comunidade em que atua, de sua região ou do país, adota práticas empresariais sustentáveis visando a proteção do meio ambiente e ao respeito aos direitos dos consumidores. Se a sua atuação é consentânea com esses objetivos, e se desenvolve com estrita obediência às leis a que se encontra sujeita, a empresa está cumprindo sua função social; isto é, os bens de produção reunidos pelo empresário na organização do estabelecimento empresaria estão tendo o emprego determinado pela Constituição Federal.


 

Importante mencionar neste momento, no entanto, que ao contrário do que nos parece, o princípio da função social da empresa vai além do que uma simples limitação quanto ao exercício do direito em apreço, ou seja, condutas ativas também podem ser exigidas do empresário (sócio controlador) de uma empresa, para que esta venha a atingir sua finalidade social.

Neste sentido, destacamos a opinião do ex-ministro Eros Grau, citado em obra de Marcelo Mauad36:


 

O princípio da função social da propriedade, é ainda Grau quem o sublinha, “impõe ao proprietário – ou a quem detém o poder de controle, na empresa – o dever de exercê-lo em benefício de outrem e não, apenas, de não o exercer em prejuízo de outrem. Isso significa que a função social da propriedade atua como fonte de imposição de comportamentos positivos – prestação de fazer, portanto, e não, meramente, de não fazer – ao detentor do poder que deflui da propriedade”(108).


 

Como podemos verificar durante a leitura deste trabalho, a função social acaba por representar não apenas uma limitação em si mesma considerada, trazida pela lei ou por princípios gerais, mas sim tanto uma limitação quanto uma imposição de atuação com objetivo próprio, específico, ou seja, o de promover o bem comum a todos, sem que sejam perpetradas condutas abusivas, tanto ativas quanto omissivas, que vão contra a própria natureza de cada instituto em apreço, conforme houver sido delineado por nossa Constituição e/ou pelas legislações esparsas aplicáveis para cada situação específica.

Nesse sentido, o princípio da função social da empresa acaba por exigir tanto comportamentos ativos quanto omissivos por parte do proprietário ou sócio controlador de determinada empresa e acaba por orientar as decisões dos juízes, assim como dos tribunais.


 


 

 

4 CONCESSÃO DA RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS: CONSIDERAÇÕES SOBRE SEUS LIMITES, OBJETIVOS E A FUNÇÃO SOCIAL


 


 

Conforme disposto no artigo 58 da Lei de Falências e Recuperação de Empresas (Lei 11.101/05), a recuperação será concedida ao devedor cujo plano de recuperação não tenha sido impugnado mediante objeção apresentada por algum credor descontente ou quando, ainda que objeto de eventual objeção, seu plano venha a ser aprovado em Assembleia Geral de Credores.

Neste sentido, conforme esclarecido por Maximilianus Cláudio Américo Fuhrer37, ao citar o artigo 69 da respectiva lei em debate, concedida a recuperação “O nome da empresa, nos seus documentos, passará então a ser seguido da expressão em Recuperação Judicial (69)”.

Quanto à previsão legal originária do artigo 58 da mencionada lei, conforme abaixo transcrito, no entanto, importante observar que a regra trazida em seu caput comporta exceção, ou seja, ainda que o plano não tenha sido aprovado pela integralidade dos credores em assembleia, o magistrado pode conceder a recuperação; mas, para isso, algumas exigências legais precisam ser previamente preenchidas, não sujeitando-se essa decisão concessiva ao mero arbítrio do juiz.


 

Art. 58. Cumpridas as exigências desta Lei, o juiz concederá a recuperação judicial do devedor cujo plano não tenha sofrido objeção de credor nos termos do art. 55 desta Lei ou tenha sido aprovado pela assembléia-geral de credores na forma do art. 45 desta Lei.

(...)


 

Os parágrafos do artigo 58 trazem os requisitos legais para que o juiz venha a conceder a medida de recuperação judicial ainda que o plano de recuperação tenha sido rejeitado em assembleia de credores, a essa prática chamamos de Cram Down, termo originário da legislação norte-americana, mas também nos perguntamos se haveria a possibilidade dessa concessão ainda que o plano deixasse de cumprir tais preceitos legalmente exigidos do devedor.

A resposta a essa questão seria não, certamente, conforme podemos verificar por simples pesquisa realizada em banco de dados de nossos tribunais, tal como a decisão a indicada a seguir, proferida pela 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, em sede do Agravo de Instrumento nº 0289223-97.2011.8.26.0000, conforme segue:


 

Agravo. Recuperação judicial. Recurso contra decisão que, em face da aprovação do plano pela Assembleia-Geral de Credores pelo quórum legal, concede a recuperação. A Assembleia-Geral de Credores só é reputada soberana para a aprovação do plano se este não violar os princípios gerais de direito, os princípios e regras da Constituição Federal e as regras de ordem pública da Lei nº 11.101/2005. Proposta que viola princípios gerais de direito, normas constitucionais, regras de ordem pública e o postulado da "pars conditio creditorum", ensejando a manipulação do quórum assemblear, é nula. Cláusula que outorgue liberdade para a alienação de quaisquer bens, móveis e imóveis, inclusive os que são objeto de arrendamento mercantil e de alienação fiduciária, independente de autorização do Juiz, da Assembleia-Geral, e dos titulares da propriedade é nula. Supressão das garantias reais e fidejussórias sem a expressa aprovação dos credores titulares das respectivas garantias implica nulidade da cláusula. Proibição de ajuizamento de ações e execuções contra as recuperandas e seus garantidores e a extinção de tais ações viola a Constituição Federal. Cláusulas que consubstanciam abuso de direito, violação dos princípios gerais de direito, da Carta da República e das leis de ordem pública são nulas. Agravo provido para decretar a nulidade da deliberação da AGC, com determinação de apresentação de outro plano, no prazo de 30 (trinta) dias, a ser elaborado em consonância com os princípios gerais do direito, a Constituição Federal e a Lei nº 11.101/2005, a ser submetido à Assembleia-Geral de Credores no prazo de 60 (sessenta) dias, sob pena de decreto de falência.

"A assembleia de credores é soberana em suas decisões quanto aos planos de recuperação judicial. Contudo, as deliberações desse plano estão sujeitas aos requisitos de validade dos atos jurídicos em geral, requisitos esses que estão sujeitos ao controle judicial" (REsp. 1.314.209-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi).


 

Tal como já mencionado de forma exaustiva no presente trabalho, o instituto da Recuperação de Empresas visa a preservação da Empresa e para isso diversos mecanismos foram criados neste sentido e acabariam por explicar a exceção legal do cram down que acaba por fazer prevalecer a decisão concessiva do magistrado sobre uma decisão negativa tomada em assembleia de credores, que seria considerada, num primeiro momento, como soberana. 

Esse entendimento, a nosso ver, está em consonância, inclusive com o princípio da preservação da empresa, já que, realizando um juízo de legalidade, apenas, o juiz pode verificar a adequação do pedido de recuperação às exigências previstas em lei e, apesar de os credores não aprovarem o plano em assembleia, esta atingiu o quórum mínimo para que o juiz pudesse decidir pelo cram down, logo após verificar a viabilidade da empresa, em verdadeira observância ao princípio da preseção da empresa, em consonância com o princípio da função social, o qual deve ser levado em consideração sempre que o tema envolver o direito de empresa, conforme já mencionado anteriormente no presente trabalho.

Desta forma, vale lembrar neste momento, no entanto, que a decisão proferida pelo juiz não está pautada em um juízo de mera discricionariedade, ou seja, o magistrado não pode decidir apenas com base em sua convicção, mas sim acabará por fazer apenas um controle de legalidade, verificando se estão presentes no caso concreto os requisitos exigidos pela norma, para a concessão desta medida excepcional. Presentes os requisitos, ao magistrado caberá conceder a recuperação, assim como, caso os respectivos requisitos não estejam presentes, a medida não poderá ser concedida, na forma dos parágrafos 1º e 2º do artigo 58 da Lei 11.101/05.

Este entendimento é passível de ser verificado, inclusive, pela leitura do Agravo de Instrumento nº 0162002-63.2013.8.26.0000, impetrado perante a 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, cuja decisão foi proferida em 5 de maio de 2014, relator: Tasso Duarte de Melo, conforme segue:

 

RECUPERAÇÃO JUDICIAL. PLANO DE RECUPERAÇÃO. CONTROLE DE LEGALIDADE. APROVAÇÃO DO PLANO DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL PELO SISTEMA DENOMINADO DE CRAM DOWN. Credora trabalhista. Habilitação retardatária. Intempestividade que não acarreta a perda do direito a voz e voto na AGC. Validade do voto proferido em 2ª AGC. Inteligência do art. 10, § 1º, e 39, da Lei 11.101/05. Concessão da recuperação judicial com fundamento no cram down. Admissibilidade. Requisitos do art. 58, § 1º, incs. I a III, da Lei nº 11.101/05 preenchidos. Recurso não provido neste ponto.

CONDIÇÕES DE PAGAMENTO. Ausência de tratamento diferenciado entre os credores (princípio pars conditio creditorum), nem ilegalidade ou afronta ao nosso sistema de validade dos negócios jurídicos. Efetivação dos princípios da preservação da empresa e de sua função social (artigo 47 da Lei nº 11.101/05). Recurso não provido neste ponto.

ALIENAÇÃO OU ONERAÇÃO DE BENS OU DIREITOS. Cláusula genérica que permite a alienação ou oneração de quaisquer bens ou direitos do ativo permanente, submetidas apenas à aprovação dos credores. Violação do art. 66 da Lei nº 11.101/05. Cláusula anulada. Decisão agravada reformada neste ponto.

Recurso parcialmente provido.


 

Quanto à função social, a atual lei falimentar, reguladora também da Recuperação de Empresas, acabou por dar mais importância e atenção à função social da empresa, seus reflexos sociais, pretendendo a sua preservação, do que à própria insolvência em si por parte do devedor, conforme defendido por Carlos Henrique Abrão38, em obra coletiva da qual foi um dos colaboradores. Segundo ele:


 

Esta realidade fica muito evidenciada na medida em que observamos na Lei nº. 11.101/05 as diversas técnicas vinculadas ao sistema que permitem a recuperação da empresa em crise, deixando, em segundo plano, o aspecto da insolvência, de natureza falimentar.


 

A despeito de ser a intenção da lei a preservação da empresa em dificuldades, o deferimento dessa medida judicial não é automático, ou seja, alguns pressupostos legais prévios devem ser observados, conforme requisitos expressos do artigo 51 da lei em referência. 

Oportuno mencionar, no entanto, que, caso a empresa não preencha os requisitos previstos na norma, ainda assim, ela poderia socorrer-se na recuperação, ou seja, ela poderia promover perante seus credores uma recuperação extrajudicial, desde que a lei não venha a exigir a homologação judicial desse acordo perante um tribunal. Nesse último caso, exigindo a lei que seja providenciada a homologação judicial deste acordo firmado extrajudicialmente, ao juiz competirá fazer uma análise de legalidade, não podendo adentrar ao mérito, devendo apenas verificar se os requisitos do artigo 51 estão presentes, para só então proceder à homologação do acordo.

O próprio nome do instituto da recuperação de empresas, tal como trazido pela norma, evidencia uma tendência que acompanha pensamento também de outras nações, tal como já foi mencionado anteriormente, sendo que a nova lei trouxe diversos mecanismos facilitadores da recuperação, os quais não existiam na antiga lei falimentar quando tratava da concordata. Nesse sentido, defende Ricardo Negrão39:


 

A nova terminologia e o alcance das novas regras vêm ao encontro da tendência do atual direito internacional, que, com algumas variantes, busca a preservação da empresa e, por consequência, dos meios econômicos e dos empregos26 e unifica o tratamento obrigacional, não mais existindo distinção entre empresários e não empresários quando a atividade econômica encontra-se em situação deficitária.


 

A nova lei trouxe determinadas previsões que, ao contrário do que ocorria com a antiga concordata, que apenas acabava por protelar futura decretação da falência, apresenta mecanismos para um efetivo reerguimento da empresa em dificuldades. Neste sentido, o artigo 50 da lei traz um rol exemplificativo desses mecanismos de recuperação, os quais podem ser utilizados pela empresa em dificuldades, nos termos da legislação pertencente a cada caso.

Conforme ensinamentos de Carlos Roberto Claro40, nossa lei de recuperação e falência não é genuinamente brasileira, representando uma compilação de procedimentos adotados em outros países, tais como França e Estados Unidos. Segundo esse autor, historicamente, nosso direito nunca se preocupou verdadeiramente primeiro com a recuperação de uma empresa em dificuldades, para só então, num segundo plano, preocupar-se com a retirada dessa empresa do mercado (falência). Ao contrário disto, a preocupação com a reorganização e recuperação de uma empresa deficitária é algo novo, representando interpretação nova que passou a ser adotada ainda sob a égide da lei anterior, ainda que nos últimos anos de sua existência, devido a ideias de conteúdo econômico e ao reconhecimento da importância da empresa como geradora de bens e riquezas.

Stuart Slatter e David Lovett41, por sua vez, sustentam que a nova lei acabou por seguir diretrizes de instituições como o Banco Mundial e a Uncitral, vindo a prever mecanismos de recuperação mais eficientes, os quais foram inspirados, sobretudo no direito norte-americano:


 

Essa lei saiu de cena em 2005 e, em seu lugar, a Lei 11.101/2005 entrou em vigor, e alterando substancialmente as regras da falência e seguindo as diretrizes de instituições como o Banco Mundial e a Uncitral. A Lei 11.101/2005 traz mecanismos muito mais eficientes para a recuperação de empresas em crise e que foram inspirados sobretudo pelo “structured bargaining” do Chapter 11 do Bankruptcy Code norte-americano. Um dos pilares da lei de 2005 é o princípio da separação entre o devedor e a atividade empresarial e a convicção de que a recuperação da empresa não equivale à concessão de favores aos empresários que à levaram à ruína. Além disso, a lei tentou restringir a recuperação às empresas que fossem efetivamente viáveis; as inviáveis deveriam ser exterminadas, para que o mercado funcionasse de forma eficiente.

 

Desta forma, a despeito de a preservação da empresa ser a intenção da lei, a recuperação, no entanto, pode não representar o melhor caminho no caso concreto, ainda que se leve em conta a importância da função social da empresa e a sua preservação. Quanto a isso, Fran Martins42 faz breve menção:


 

O procedimento da recuperação abarca a demonstração da viabilidade do negócio, podendo haver o afastamento do controlador ou sócio administrador em casos excepcionais, donde é fundamental assinalar as causas da crise e os remédios em torno da execução do plano.


 

Isso pode ocorrer a depender do tamanho da crise enfrentada pela empresa. Neste sentido, oportuno mencionar que a falência, tal como prevista pela atual lei, apresenta-se mais benéfica do que aquela existente sob a égide da legislação anterior, trazendo previsões que favorecem a liquidação, no sentido de torná-la mais rápida e eficaz, evitando-se a dilapidação de patrimônio antes do pagamento dos credores.

Quanto ao regime da Recuperação de Empresas e Falência, dispôs Marcos de Barros Lisboa43:


 

Esse princípio geral de equilíbrio entre os objetivos do devedor e do credor na busca da preservação da função social da empresa permeou a construção dos dois institutos que compõe o novo arcabouço falimentar. Para os casos em que a empresa tiver condições de se reerguer, foi desenvolvido o regime da Recuperação, decomposto nas suas opções judicial ou extrajudicial. Mas caso a continuidade do negócio seja inviável economicamente, sob a gestão original ou seu encerramento inevitável, o novo regime de Falências prevê regras e instrumentos para a liquidação da empresa e alienação de seus ativos de maneira eficiente e rápida, evitando a sua deteriorização.

 

Portanto, caso a medida tenha sido tomada tardiamente ou tenha surgido de maneira sorrateira e gravíssima, nem sempre a recuperação será possível, devendo o juiz, verificando essa situação através de perícia técnica contábil realizada com o fim de verificação da viabilidade da medida, decretar a falência. Isso deve ser providenciado pelo magistrado para que os prejuízos decorrentes da concessão da recuperação não venham a superar os benefícios trazidos por ela, em verdadeiro confronto à função social tão almejada pela norma, devendo este princípio, portanto, também ser observado na via contrária ao deferimento da medida.

Tal como preceitua Paulo Sérgio Restiffe44, os princípios orientadores do ordenamento jurídico devem ser levados em consideração durante todo o trajeto da norma, desde sua criação, até sua aplicação a cada caso em concreto, com o fim de atingir o objetivo da norma:


 

Assim, os princípios, entendidos como ponto de partida, começo da existência, fundamento do processo de conhecimento, são hauridos tanto da ordem política positiva, ou seja, da Constituição da República e das normas infraconstitucionais, como do próprio sistema jurídico, sendo função dessas duas fontes principiológicas – positiva e sistêmica ou sistemática – orientar o intérprete para alcançar a finalidade do instituto sub examinen.


 

Os princípios acabam por orientar a conduta da lei, assim como a do magistrado, que também exerce uma função de controle da legalidade dos atos judiciais pautando-se nesses princípios. O conflito, no entanto, pode ocorrer quando a lei, a primeira vista, acaba por afastar a aplicação de um princípio.

Nesse sentido, encontramos algumas decisões judiciais que, seguindo orientação expressa da norma, que vai de encontro à concessão da recuperação, acabaram por afastar-se do princípio da preservação da empresa, no entanto, muitas vezes isso ocorre para que sejam evitados abusos devido a prazos e condições muito flexíveis, devendo a lei fixar um horizonte para a aplicação da norma. Acrescente-se a isso o fato, já mencionado no presente trabalho, de que a recuperação não pode ser concedida apenas com fundamento no princípio da preservação, mas também deve-se vislumbrar ao menos a possibilidade de aquela empresa ter condições de recuperar-se. 

Traçando esse norte ao comportamento do magistrado, para a homologação do plano de recuperação de empresas, o acordo firmado entre os credores e o devedor deve respeitar também as limitações trazidas no artigo 54 da respectiva lei, que prevê o prazo máximo de um ano para o pagamento de créditos derivados da legislação do trabalho ou de natureza acidentária vencidos até a data do pedido de recuperação de empresas; assim como esse mesmo artigo ainda traz previsão acerca do prazo máximo de trinta dias para o pagamento de débitos de natureza estritamente salarial, limitados a 5 salários mínimos por trabalhador, vencidos nos últimos 3 meses anteriores ao pedido. 

Outrossim, além dessas exigências trazidas expressamente pela própria lei regulatória da recuperação de empresas e que devem ser respeitadas, o plano também deve estar de acordo com as demais normas constitucionais e infraconstitucionais, além dos princípios do nosso ordenamento brasileiro.

Em contradição a isso, no entanto, nossos tribunais vêem encontrando planos que acabam por deixar de lado tais limitações, em verdadeiro abuso de direito, por vezes incluindo no plano aqueles credores que, por lei, estão fora da recuperação ou quando, no caso de trabalhadores, prevê prazo superior ao fixado em lei, para o pagamento dos salários vencidos.

Nesse sentido, Agravo de Instrumento nº 0168318-63.2011.8.26.0000, julgado em 17 de abril de 2012 pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, em Câmara Reservada à Falência e Recuperação, relator: Pereira Calças:


 

Agravo. Recuperação judicial. Recurso contra decisão que concede a recuperação judicial. A Assembleia-Geral de Credores só é considerada soberana para a aprovação do plano se forem obedecidos os princípios gerais de direito, as normas da Constituição Federal, as regras de ordem pública e a Lei nº 11.101/2005. Proposta que viola princípios de direito, normas constitucionais, regras de ordem pública e a isonomia dos credores, ensejando a manipulação do resultado das deliberações assembleares é nula. Inclusão de credores garantidos por alienação fiduciária, titulares de arrendamento mercantil e por adiantamento de contrato de câmbio (ACC) nos efeitos da recuperação judicial viola o art. 49, §§ 3º e 4º da LRF. Previsão de carência para início do pagamento dos credores de 60 meses (5 anos), ou seja, após o decurso do prazo bienal de supervisão judicial do art. 61, "caput", da LRF, impede que o Judiciário convole a recuperação em falência, no caso de descumprimento das obrigações assumidas pela recuperanda. Liberdade para alienação de bens ou direitos integrantes do ativo permanente, independentemente de autorização judicial, afronta o art. 66 da LRF. Proibição de ajuizamento de ações contra sócios, cônjuges, avalistas e garantidores em geral por débitos da recuperanda, configura violação da Constituição Federal. Proibição de protesto cambial ou comunicação à Serasa e SPC, coíbe os credores do exercício de direito subjetivo. Invalidade (nulidade) da deliberação assemblear acoimada de ilegalidades, com determinações de apresentação de outro plano, no prazo de 30 dias, a ser elaborado em consonância com a Constituição Federal e com a Lei nº 11.101/2005, e submetido à assembleia-geral de credores em 60 dias, sob pena de decreto de falência. Agravo provido.


 

Também nessa mesma linha, decisão proferida em 28 de fevereiro de 2012 nos autos do Agravo de Instrumento nº 0136362-29.2011.8.26.0000, proveniente da Comarca de Suzano, proferida por Câmara Reservada à Falência e Recuperação do Egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo, Relator: Pereira Calças, conforme segue:


 

Agravo. Recuperação Judicial. Plano aprovado pela assembleia-geral de credores. Plano que prevê o pagamento do passivo em 18 anos, calculando-se os pagamentos em percentuais (2,3%, 2,5% e 3%) incidentes sobre a receita líquida da empresa, iniciando-se os pagamentos a partir do 3º ano contado da aprovação. Previsão de pagamento por cabeça até o 6º ano, acarretando pagamento antecipado dos menores credores, instituindo conflitos de interesses entre os credores da mesma classe. Pagamentos sem incidência de juros. Previsão de remissão ou anistia dos saldos devedores caso, após os pagamentos do 18º ano, não haja recebimento integral. Proposta que viola os princípios gerais do direito, os princípios constitucionais da isonomia, da legalidade, da propriedade, da proporcionalidade e da razoabilidade, em especial o princípio da "pars conditio creditorum" e normas de ordem pública. Previsão que permite a manipulação do resultado das deliberações assembleares. Falta de discriminação dos valores de cada parcela a ser paga que impede a aferição do cumprimento do plano e sua execução específica, haja vista a falta de liquidez e certeza do "quantum" a ser pago. Ilegalidade da cláusula que estabelece o pagamento dos credores quirografários e com garantia real após o decurso do prazo bienal da supervisão judicial (art. 61, 'caput', da Lei nº 11.101/2005). Invalidade (nulidade) da deliberação da assembleia-geral de credores declarada de ofício, com determinação de apresentação de outro plano, no prazo de 30 dias, a ser elaborado em consonância com a Constituição Federal e Lei nº 11.101/2005, a ser submetido à assembleia-geral de credores em 60 dias, sob pena de decreto de falência.


 

Desta forma, ainda que o plano tenha sido aprovado em assembleia geral de credores, caso não sejam cumpridos os demais preceitos legais existentes em nosso ordenamento jurídico, tal acordo pode ser considerado nulo. Neste sentido, também a seguinte decisão de 22 de maio de 2012, nos autos do RECURSO ESPECIAL Nº 1.314.209 - SP (2012/0053130-7), proferida pelo Superior Tribunal de Justiça, relatora: Ministra Nancy Andrighi:


 

RECURSO ESPECIAL. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. APROVAÇÃO DE PLANO PELA ASSEMBLEIA DE CREDORES. INGERÊNCIA JUDICIAL. IMPOSSIBILIDADE. CONTROLE DE LEGALIDADE DAS DISPOSIÇÕES DO PLANO. POSSIBILIDADE. RECURSO IMPROVIDO. 1. A assembleia de credores é soberana em suas decisões quanto aos planos de recuperação judicial. Contudo, as deliberações desse plano estão sujeitas aos requisitos de validade dos atos jurídicos em geral, requisitos esses que estão sujeitos a controle judicial. 2. Recurso especial conhecido e não provido.


 

Ocorre que, nos parece, na atualidade, que a maior flexibilidade da nova norma, no sentido de viabilizar a recuperação de empresas em dificuldade, não vem sendo utilizadas da melhor forma, como pretendia a lei.

Em alguns casos, é possível verificar muitos abusos praticados dentro de um plano de recuperação, tais como prazo para início do pagamento dos credores além do prazo de dois anos, reservado para o exercício do controle judicial, ou cláusulas puramente potestativas, as quais teriam o potencial de prejudicar em demasia os credores da recuperanda.

Muitas vezes o plano, mesmo que abusivo, acaba sendo aprovado em assembleia-geral de credores unicamente devido à pressão exercida perante os mais fracos da cadeia, o que acaba por desvirtuar o objetivo da norma.

Sobre esse assunto, foram tecidos comentários em artigo redigido por Fernando Pompeu Luccas45, conforme segue:


 

A discussão sobre essas questões ganhou contornos ainda mais relevantes após recentes decisões do Tribunal de Justiça de São Paulo, no sentido de relativizar a soberania das assembleias de credores, determinando a apresentação de novos planos de recuperação, posto que os anteriormente apresentados feriam princípios constitucionais e legais. Tais decisões foram alvo de duras críticas. No entanto, o que se verifica é que elas podem ter ocorrido exatamente porque o tribunal percebeu o desequilíbrio da balança. Ou seja: pode-se entender que as próprias recuperandas deram causa às discussões sobre a soberania da assembleia de credores, sobre a atuação efetiva dos juízes etc. O fato é que essas questões forçaram todos que atuam nesse meio a repensar, rediscutir pontos e redefinir posicionamentos, levando alguns a já cogitarem alterações legais de cunho limitador.


 

Como observado, o tribunal já vem apresentando uma atitude mais atenta perante esse tipo de comportamento desleal, vindo, desta forma, a anular planos de recuperação que não se encontrem de acordo com nosso ordenamento, representando verdadeiro abuso de direito.

CONCLUSÃO


 


 

Através do presente trabalho foi possível verificarmos o desenvolvimento histórico da Recuperação de Empresas desde os primórdios dos tempos até chegarmos nos dias atuais, momento histórico em que a recuperação de empresas adotou uma visão voltada ao social, isto é, a lei passou a preocupar-se com a preservação da empresa como forma de garantir a continuidade do exercício da função social da empresa, verificando nessa conduta a melhor forma de enfrentamento de uma crise, evitando-se, assim, reflexos negativos na sociedade quando da decretação de eventual quebra da empresa.

A seguir, foram traçados os contornos da função social, como sendo um objetivo intrínseco, almejados por cada instituto, que deixa de estar voltado apenas para si, abrindo seu campo de visão para o lado social. Ainda dentro deste assunto, foram tecidos comentários acerca da função social da propriedade, assim como da empresa, sendo que, em determinados casos tais princípios acabam por confundir-se, na medida em que a propriedade também engloba os bens de produção de uma empresa.

Num terceiro momento, passamos a tratar da recuperação de empresas, seus objetivos, forma de concessão, natureza jurídica e plano de recuperação. Quanto a esse ponto, foi possível observar as peculiaridades da recuperação de empresas, tanto judicial como extrajudicial. 

Por fim, acabamos por unir o objeto de cada um desses capítulos, passando a analisar como eles se relacionam entre si e como eles vem sendo tratados por nossos doutrinadores, assim como a forma como nossa jurisprudência vem interpretando a lei sobre a matéria.

Diante de tais paralelos traçados no curso do presente trabalho, foi possível a abordagem de temas bem atuais, em pauta em nossos nos tribunais, vindo a esclarecer, inclusive, quais os limites impostos às decisões do juiz diante de eventual aprovação ou não do plano de recuperação em Assembleia de Credores. 

No presente trabalho, restou clara a intenção da lei na preservação da empresa em dificuldades, desde que a própria falência não seja a mais indicada para o caso em concreto, já que, em princípio, esta empresa valeria mais em funcionamento do que extinta, apesar de esse pensamento não pode ser levado a extremos, conforme já mencionado.

Esse pensamento fundamenta-se no fato de que uma empresa em grande crise, além de não conseguir recuperar-se, pode, ainda, ver-se prejudicada com sua própria manutenção, já que sua dívida poderia atingir dimensões estratosféricas, deixando um grande rombo financeiro ao final, muito maior do que antes, indo, absolutamente, contra aquilo que se defende com a aplicação do princípio da preservação da empresa.


 


 


 


 


 


 


 


 


 

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1 Tzirulnik, Luiz. Direito Falimentar. 6ª edição revista. Editora Revista dos Tribunais. Pág. 233.

2Requião, Rubens – Curso de Direito Falimentar – 1º volume – Editora Saraiva – 16ª edição – 1995 – fl. 07.

3Requião, Rubens. Curso de Direito Falimentar. 1º volume. Editora Saraiva. 16ª edição. 1995. fl. 07.

4Idem ao anterior.

5Coelho, Fábio Ulhoa – Manual de Direito Comercial – Direito de Empresa – 23ª edição – Editora Saraiva – 2011 – pág.348.

6Requião, Rubens – Curso de Direito Falimentar – 1º volume – Editora Saraiva – 16ª edição - 1995, citando às fls. 09 a obra de Del Marmol, La faillite em droit anglo-saxon, pág.15.

7Ramos, André Luiz Santa Cruz – Direito Empresarial Esquematizado, 3ª edição – Editora Método - 2013, pág. 615.

8Ramos, André Luiz Santa Cruz – Direito Empresarial Esquematizado, 3ª edição – Editora Método, pág. 615.

9Requião, Rubens – Curso de Direito Falimentar – 1º volume – Editora Saraiva – 16ª edição – 1995 – fl. 14.

10Bezerra Filho, Manoel Justino – Lei de Recuperação de Empresas e Falência – Editora RT - 7ª edição, pág. 43.

11Abrão, Nelson. Curso de Direito Falimentar. 5ª edição. Livraria e Editora Universitária de Direito Ltda. São Paulo. 1997. p.305.

12Requião, Rubens – Curso de Direito Falimentar – 1º volume – Editora Saraiva – 16ª edição – 1995 – citando às fls. 21 obra de Otávio Mendes – Falências e Concordatas, pág. 10.

13Lopes, Bráulio Lisboa – Aspectos Tributários da Falência e Recuperação de Empresas – Editora Quartier Latin do Brasil – 2008 – pág. 38.

14Ramos, André Luiz Santa Cruz – Direito Empresarial Esquematizado – 3ª edição – Editora Método – 2013 – pág.618. 

15Gonçalves, Maria Gabriela Venturoti Perrotta Rios; Gonçalves, Victor Rios - Sinopses Jurídicas – Direito Falimentar – vol.23 – pág. 57.

16Guimarães, Maria Celeste Moraes – Recuperação Judicial de Empresas – Direito concursal contemporâneo – Editora Del Rey - pág. 136. Citação de rodapé na respectiva obra: 10 COMPARATO, Fábio Konder, Op. cit., p.108.

17Bezerra Filho, Manoel Justino – Lei de Recuperação de Empresas e Falência – Editora RT - 7ª edição, pág. 49. 

18Bezerra Filho, Manoel Justino – Lei de Recuperação de Empresas e Falência – Editora RT - 7ª edição, pág. 53.

19Slatter, Stuart; Lovett, David – Como recuperar uma empresa: A gestão da recuperação do valor e da performance – Editora Atlas – 2009 - pág.296.

20Mendonça, José Xavier Carvalho de - Tratado de Direito Comercial Brasileiro – 7ª edição – Livro V – Da falência e da concordata preventiva – pág. 7. O autor traz as seguintes notas de rodapé quanto ao trecho citado: (1) FREI DOMINGOS VIEIRA, Grande dicionário português; AULETE, Dicionário contemporâneo; CÂNDIDO DE FIGUEIREDO, Nôvo dicionário da língua portuguesa, ed. de 1913. O latim fallere procede da raiz sânscrita sphall, vacilar, mover, desviar, donde também o grego sphallen, faltar; o alemão, fallen, fehlen, cair, decair, faltar, cair em falta; o inglês, fall, fail, cair, faltar; o francês, faillir, faillite, enganar, pecar, faltar; o italiano, fallire, fallimento com o mesmo significado. (2) A palavra falência é empregada, na Ord. Afonsina, Livro 4º, Tít. 72, § 2º, como exceção da lei; falimento encontra-se na mesma Ord., Liv. 1º, Tít. 67, § 2º, significando, falta, êrro, culpa; e na do Liv. 4º, Tít. 45, § 10, diminuição (PEREIRA E SOUSA, Dicionário jurídico, verb. falência e falimento).

21Almeida, Amador Paes. Curso de Falência e Recuperação de Empresa. 27ª edição. Editora Saraiva. 2013. pág. 321.

22Coelho, Fábio Ulhoa – Manual de Direito Comercial – Direito de Empresa – 23ª edição – Editora Saraiva – 2011 – pág. 433.

23Loureiro, Francisco Leonardo, Comentários ao parágrafo 1º, do artigo 1228 CC. In: Código Civil Comentado. Coord. Ministro Cesar Peluzo. 6ª ed. Editora Manole. pág. 1205.

24Scavone Júnior, Luiz Antonio – Direito Imobiliário, teoria e prática – 5ª edição – Editora Forense – 2012, pág. 07.

25Aghiarian, Hércules. Curso de Direito Imobiliário. 11ª edição. Editora Atlas. 2012. pág. 30.

26Pereira, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. Volume 4. direitos reais. 19ª edição. Editora Forense. 2007. pág. 81.

27Bulos, Uadi Lammêgo. Constituição Federal Anotada. 7ª Edição - Editora Saraiva – 2ª triagem – 2007 – pág. 194.

28Requião, Rubens - Curso de Direito Comercial - 1º volume - 32ª edição – 2013, pág. 77.

29Mauad, Marcelo – Os direitos dos trabalhadores na Lei de Recuperação e de Falência de Empresas – Editora LTR – págs. 96 e 97. Esse autor traz as seguintes notas de rodapé em seu texto: 80 – Sobre o conceito de empresa, mais voltado ao Direito do Trabalho, assinala CARRION, lastreado nas lições de José Martins CATHARINO (Temas do direito do trabalho, 1971, Ed. Trabalhistas, Rio de Janeiro, sem menção da página). “Empresa é o conjunto de bens materiais, imateriais e pessoais, para a obtenção de certo fim. Juridicamente, a empresa é uma universalidade, compreendendo duas universalidades parciais, a de pessoas (personarum) e a de bens (bonorum), funcionando em direção a um fim. Importante é que a lei quis salientar a integração do trabalhador nesse conjunto, independentemente da pessoa que seja o proprietário da empresa ou venha a responder pelas obrigações em determinado momento (Arts. 10 e 448, CLT). O vocábulo “empresa” é usado como pessoa física ou jurídica que contrata, dirige e assalaria o trabalho subordinado” (CARRION Valentin. Comentários à consolidação das leis do trabalho, 1996, 21 ed., São Paulo: Saraiva, p.26). MANUS, de seu turno, leciona que “a expressão empresa tem um sentido bastante amplo, pois há de ser entendida como o conjunto de todos os meios necessários à consecução dos objetivos a que se propõe”. Sob essa ótica, acrescenta, “compõe a empresa todos os bens que a ela pertencem, seus estabelecimentos, que são as unidades de produção, seus nomes, suas relações com terceiros e toda a estrutura burocrática necessária para a sua vida, onde aí encontramos sua diretoria, composta pelos seus titulares ou sócios” (MANUS, Pedro Paulo Teixeira, Direito do Trabalho, 1995, São Paulo: Atlas, p.66); 81 – Bem a propósito, as palavras do mestre Orlando GOMES: RT-411, p.10. ;82 – José Afonso, op.cit., p.788. 

30Salomão Filho, Calixto. O novo direito Societário. 4ª edição. Editora Malheiros Editores. pág. 42.

31Reis, Clayton e outros colaboradores – Direito Empresarial & Cidadania – Questões contemporâneas - págs. 55 e 56.

32Reis, Clayton e outros colaboradores – Direito Empresarial & Cidadania – Questões contemporâneas - págs. 57.

33Silva, José Afonso da – Comentário Contextual à Constituição – 7ª edição – Atualizada até Emenda Constitucional 66, de 13/07/2010 – Editora Malheiros - Pág. 727. Fazendo constar as seguintes notas de rodapé: 25 Cf. Fábio Konder Comparato, O Poder de Controle na Sociedade Anônima, p.419: “O poder econômico é uma função social, de serviço à coletividade”. É esta a inteligência que dá ao princípio constante do artigo 160, III da Constituição revogada, igual ao disposto no 170, III da CF de 1988; e, 26 Cf. A Ordem Econômica na Constituição de 1988, p.231. 

34Lopes, Filemon Galvão - A antecipação de tutela no processo falimentar – São Paulo - ed. do autor - 2006 - pág.96.

35Coelho, Fábio Ulhôa – Curso de Direito Comercial – direito de empresa – Volume 1 – 16ª edição – Editora Saraiva - 2012 – pág. 76.

36Mauad, Marcelo – Os direitos dos trabalhadores na Lei de Recuperação e de Falência de Empresas – Editora LTR - Pág. 106 – citando em sua nota de rodapé nº 108 entendimento de Eros Roberto Grau, exposto à fl. 275 de sua obra: A ordem econômica na Constituição de 1988.

37Fuhrer, Maximilianus Cláudio Américo – Roteiro das Recuperações e Falências – Lei 11.101/2005, Dec.-lei 7.661/1945 – 21ª edição – Editora RT – pág. 28.

38Abrão, Carlos Henrique e outros colaboradores em obra coletiva – Direito das Empresas em Crise: Problemas e Soluções – Editora Quartier Latin do Brasil – 2012 – pág.: 35. 

39Negrão, Ricardo – Manual de Direito Comercial & de Empresa – Recuperação de Empresas e Falência – 7ª edição – 2012 – Editora Saraiva – pág.: 53. Este autor anota como nota de rodapé (26): Robson Zanetti, Especialista pela Università Statale di Milano, mestrado e doutorado pela Universitè de Paris (Pantheon Sorbonne), anota: “A falência das empresas deve ser sempre evitada para não causar grandes prejuízos aos empregados, aos credores e às coletividades locais. A utilização de processos de prevenção (o regulamento amigável francês, a administração controlada italiana e a concordata preventiva brasileira) são os meios judiciais para evitar o crescimento das dificuldades das empresas, dando a estas um fôlego para sua recuperação” (Direito Falimentar – a Prevenção de Dificuldades e a Recuperação de Empresas, Curitiba, Juruá, 2000, p.18).

40Claro, Carlos Roberto – Revocatória Falimentar – De acordo com a nova Lei de Falências – 3ª edição (ano 2005) – 2ª tiragem (ano 2006) – Revista, atualizada e ampliada, com base na Lei 11.101, de 09.02.2005, que regula a recuperação judicial, extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária – Curitiba – Juruá Editora – 2006 – pág. 213.

41Slatter, Stuart; Lovett, David – Como recuperar uma empresa: A gestão da recuperação do valor e da performance – Editora Atlas – 2009 – pág. 292.

42Martins, Fran. Curso de Direito Comercial. 33ª edição. Ed. Forense. Rio de Janeiro. 2010. pág. 467.

43Lisboa, Marcos de Barros – In: Direito Falimentar e a Nova Lei de Falências e Recuperação de Empresas – Obra coletiva com coordenação de Luiz Fernando Valente de Paiva – São Paulo – Editora Quartier Latin do Brasil - 2005 – pág. 43.

44Restiffe, Paulo Sérgio – Recuperação de Empresas: de acordo com a Lei 11.101, de 09.02.2005 – Editora Manole – pág.02.

45Luccas, Fernando Pompeu – Artigo: Equilíbrio nas recuperações judiciais, publicado em 28 de janeiro de 2013 no Valor Econômico, pelo site http://www.valor.com.br/imprimir/noticia_impresso/2985246.

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