A produção científica moderna

Por Rafael Martinez Slomp | 24/06/2012 | Tecnologia

Rafael Martinez Slomp[Graduando em Sistemas de Informação] e Laíze Márcia Porto Alegre[Orientadora]

 

Departamento Acadêmico de Sistemas de Informação

Campus Curitiba

Universidade Tecnológica Federal do Paraná - UTFPR

Avenida Sete de Setembro, 3165 - Curitiba/PR, Brasil - CEP 80230-901

 

rafagusment@yahoo.com.br

 

 

Resumo - Este trabalho acadêmico expõe de forma breve as influências que caracterizam o fetichismo da ciência e a unidimensionalidade da formação dos seus fazedores: engenheiros, pesquisadores e professores e, em seguida, indagar sobre a recente crise do paradigma científico. Para isso foi feita uma reflexão baseada no livro Um Debate sobre a Tecnociência: neutralidade da ciência e determinismo tecnológico, de Dagnino, em conjunto com uma série de artigos e seleções de outros autores de renome. Finalmente, questiona-se se o método científico moderno está chegando ao fim é realmente eficiente para o progresso da sociedade.

 

Palavras-chave: Ciência Moderna, Cientificismo, Fetichismo Tecnológico, Filosofia da Ciência.

 

Abstract - This academic article will briefly explain the influences that characterize the fetishism of science and the formation of one-dimensionality of those who make it: engineers, researchers and teachers and then inquire about the recent crisis of the scientific paradigm. For this was made a reflection based on the book Um Debate sobre a Tecnociência: neutralidade da ciência e determinismo tecnológico, by Dagnino, together with a series of articles and selections from other authors of repute. Finally, we wonder if the modern scientific method is nearing the end and if it is really efficient for the advancement of society.

 

Key-words: Modern Science, Scientism, Technological Fetishism, Philosophy of Science.

 

 

INTRODUÇÃO

 

            Uma vez que a ciência não é neutra, é de extrema importância para a sociedade entender o próprio conhecimento científico que produz. Este artigo se reserva a apresentar as ideias do cientificismo com a finalidade de refletir em que moldes é produzida a tecnologia na atualidade e até que ponto a ciência moderna corresponde a uma sociedade mais evoluída.       Inicialmente, analisa-se a relação da ciência moderna enquanto forma de esclarecimento com seu surgimento em meio ao paradigma religioso. Em seguida é discutida sua não-neutralidade e sua instrumentalização pela lógica do capital, para que, por fim, coloque-se em questionamento uma crise no paradigma científico.

 

METODOLOGIA

 

            O tema aqui abordado foi selecionado por sua relevância na contemporaneidade, quando a produção tecnocientífica se encontra cada vez mais irracional. A elaboração deste artigo se deu a partir da análise bibliográfica dos autores Renato Dagnino, Hilton Japiassu, Arilson P. Do Vale e Fritjof Capra. Os autores citados foram identificados por suas publicações convergentes à mesma percepção crítica com relação à construção do conhecimento na área de C&T (Ciência e Tecnologia), o que permite um desenvolver linear das ideias e uma conclusão focada no tema em questão.

A SOCIEDADE CIENTIFICISTA

 

            A ciência moderna nasce no decorrer do século XVI com o notável objetivo de esclarecer a sociedade, de iluminar as trevas do desconhecido, de libertar a sociedade dos dogmas religiosos por meio da crítica e do pensamento racional. Segundo Japiassu, a ciência moderna acontece inicialmente como um movimento de confronto e independência, movimento o qual logo se transformou em objeto de controle.

            Desde o século XVII, as Academias de Ciências geravam conhecimento para resolver os problemas políticos do Estado, que por sua vez patrocinavam os sábios para desenvolver seus trabalhos. Instauraram-se então os primeiros vínculos entre política e ciência, os quais só se fortaleceram com a revolução industrial. Filósofos positivistas enxergavam com bons olhos esta revolução, Comte acreditava que a mesma proclamava o fim do pensamento teológico e consequentemente o fim da sociedade militar [1].

            Japiassu salienta que, nesta época, a ciência ainda exercia um papel crítico na sociedade e “assumia várias formas de oposição”. Porém não demorou muito para que a ciência basta-se de si só, isolando seu discurso no próprio ambiente de pesquisa e cessando aquele questionamento anti-dogmático [1]. A ciência se tornou o mito que combatia.

            O cientificismo pode ser entendido como a ciência baseada em três artigos de fé: a ciência é a única forma de conhecimento autêntica; a ciência é capaz de responder e resolver todos os problemas e perguntas; é legítimo confiar à sociedade científica toda a sintetização da verdade [1].

            O estado mitificador da ciência que encontramos abundantemente na sociedade hoje caracteriza por fim o cientificismo. Esse conceito de alienação é muito novo, só recentemente foi posta em discussão a verdade tecnocientífica, o que pode ser um baque para os já formatados “fazedores de ciência”.

            Às controvérsias positivistas que posicionam a ciência moderna como elemento vital do desenvolvimento da sociedade, fica a questão: como a ciência construída num contexto de desigualdade sócio-econômica pode vir a reduzir essa mesma desigualdade [3]?

 

O FORMATO DO CIENTISTA MODERNO

 

            Dentro do âmbito do cientificismo repousam as ideias de neutralidade científica e determinismo tecnológico. Brevemente, a primeira posiciona a ciência acima dos valores humanos, como se seguisse o próprio caminho, independente do contexto em que está inserida. A segunda trata a construção da tecnologia de forma linear e principalmente como fator determinante da expressão cultural, política e econômica de uma sociedade [3].
            Constantemente discutindo sobre a construção da C&T no contexto capitalista, Dagnino tem uma visão crítica sobre as influências que ocorrem no sentido economia-tecnologia:

 

Os engenheiros internalizam os valores da sociedade de classes, em geral da pequena burguesia, que estão subjacentes ao seu processo de formação e à sua profissão: controle, individualismo, dominação dos trabalhadores, produção voltada (à) reprodução do capital. Além dos valores da classe dominante, os engenheiros recebem nas universidades e posteriormente na fábrica os conhecimentos “técnicos”, e as capacidades e habilidades gerenciais necessários para a reprodução do capital. [4]

 

            O que acontece com o profissional da área de C&T (assim como tantas outras áreas) atualmente é que este sofreu um processo de qualificação unidimensional, ou seja, recebeu orientação técnica para um fim pré-determinado, com o objetivo de manter a linha das castas superiores. Isso implica em um profissional instrumentalizado: altamente capaz em uma pequena especialidade com pouca capacidade crítica do impacto social de seu trabalho. Da instrumentalização do conhecimento parte a noção do especialista, na qual a perspectiva cartesiana da verdade analisa o todo como mera justaposição das partes [2].

            Já não bastasse uma alienação em massa que coloca a ciência como neutra, como verdade auto-sustentadora e livre de influências, encontramos outras dificuldades em reverter o processo de qualificação instrumental do profissional da área de C&T. Afinal, como educar uma nova geração de cientistas desmitificados se todos os educadores foram criados em “um ambiente excludente e impregnado por preconceitos, valores morais e interesses econômicos”? [4].

            Isso tudo já nos remete a pensar sobre a necessidade de um completamente novo método de ensino que seja capaz de ensinar o cidadão fora dos padrões especialistas cartesianos, orientando-o para a autocrítica de modo a conquistar a visão da todo, e não só da parte.

 

FIM DA CIÊNCIA COMO CONHECEMOS?

           

            As sessões anteriores nos permitem construir uma reflexão sobre os aspectos sociais e epistemológicos de uma possível crise no paradigma científico.

            No sentido social, percebemos que, no final das contas, houve uma frustração nos postulados científicos, os quais previam avanço racional da sociedade. Capra simplifica o resultado que vemos de fato na modernidade:

 

“Podemos controlar os pousos suaves de espaçonaves em planetas distantes, mas somos incapazes de controlar a fumaça poluente expelida por nossos automóveis e nossas fábricas. Propomos a instalação de comunidades utópicas em gigantescas colônias espaciais, mas não podemos administrar nossas cidades. O mundo dos negócios faz-nos acreditar que o fato de gigantescas indústrias produzirem alimentos especiais para cachorros e cosméticos é um sinal de nosso elevado padrão de vida, enquanto os economistas tentam dizer-nos que não dispomos de recursos para enfrentar os custos de uma adequada assistência à saúde, os gastos com educação ou transportes públicos. A ciência médica e a farmacologia estão pondo em perigo nossa saúde, e o Departamento de Defesa tornou-se a maior ameaça à segurança nacional.” [5]

 

            Em sentido epistemológico, coloca-se em questão o menosprezo criado pelo método científico sobre as outras formas de conhecimento. O senso comum é tomado como conhecimento ingênuo por limitar-se à observação crua dos fenômenos e por seu caráter subjetivo de avaliação do real. Da mesma forma, a filosofia é também descartada por fundamentar sua busca pela verdade em reflexões metafísicas [2]. A própria arte é vista de maneira preconceituosa por “não fazer sentido”.

            Ao julgar o contexto produzido pela ciência moderna na sociedade é sensato conjecturar sobre a crise do paradigma científico que vivemos.

 

 

CONCLUSÃO

 

            Com base nas reflexões apresentadas, podemos concluir que a tecnologia, principalmente a produzida desde a revolução industrial, sofre uma pesada influência político-econômica que acaba por determinar o conhecimento científico da atualidade. Juntamente com o “avanço” tecnológico, tal influência modela também os profissionais que futuramente constituirão uma outra geração nos mesmos padrões mecanizados.

            Portanto, enfatiza-se aqui a importância de uma reflexão por parte de toda a sociedade sobre a atual situação da tecnociência e sobre a possível crise paradigmática, para que, finalmente, seja discutida a elaboração de novos métodos os quais a sociedade deve seguir para atingir de fato o progresso.

 

REFERÊNCIAS

 

[1]JAPIASSU, H. A Revolução Científica Moderna. Rio: Imago, 1997, p. 182, 183, 190, 191.

 

[2]MIRANDA, A. L.; VALE, A. P.; QUELUZ, G. F. (artigo) Epistemologia e a Crise do Paradigma Científico. p. 10, 8, 4.

 

[4]DAGNINO, R.; NOVAES, H. T. O Papel do Engenheiro na Sociedade. Revista Tecnologia e Sociedade, Curitiba, 2008,  n. 6. p. 98, 102 .

 

[3]DAGNINO, R. Um Debate sobre a Tecnociência: neutralidade da ciência e determinismo tecnológico. Campinas: Unicamp, 2008, p. 15, 21-32.

 

[5]CAPRA, F. O Ponto de Mutação. São Paulo: Cultrix, 1986, p. 19.