A privatização dos presídios nacionais
Por Geraldo Freire de Carvalho Júnior | 10/11/2011 | DireitoINTRODUÇÃO
Hodiernamente, o sistema penitenciário brasileiro vem passando por uma realidade bastante desagradável. A precariedade física das prisões, a superlotação, as doenças sendo transmitida entre os detentos, rebeliões realizadas constantemente, a falta de higiene, o descrédito do apenado diante da sociedade, a falta de oportunidade e capacidade para um novo emprego, enfim, mostram a realidade vivenciada pelos presidiários.
A Lei de Execução Penal (lei 7.210 / 84), logo em seu artigo 1º diz que a execução penal possui por objetivo proporcionar uma harmônica integração social do condenado e o seu art. 11 demonstra um rol taxativo de assistências, tais como; material, à saúde, jurídica, educacional, social e religiosa.
Porem, a realidade é totalmente distinta da prevista em lei, pois tais assistências asseguradas na Lei de Execução Penal e também na própria Constituição da República Federal vigente, não são minimamente cumpridas pelo Estado, ferindo os direitos fundamentais dos presos.
Essa dura realidade que os encarcerados brasileiros estão vivendo, reflete diretamente na sociedade e faz com que as pessoas, sem distinção de qualquer espécie ou classe social, sofram as conseqüências negativas dessa situação, pois os criminosos não são ressocializados e voltam as ruas tão ou até mais perigosos do que quando praticaram o delito pela primeira vez.
Assim, cresce a cada dia uma dicotomia jurídica e social sobre a privatização dos presídios nacionais como a solução de tais problemas.
Aqueles que são a favor da privatização buscam sua fundamentação no direito comparado, principalmente o Norte Americano e o Francês, pois são países de elevado nível social e econômico e aderiram a esta forma de tentar garantir os direitos dos presos e conseqüentemente, cumprir a função de maior interesse da condenação, que é a ressocialização.
Conseqüentemente, a parte contraria a privatização, afirma que a condenação e o cumprimento do que diz expressamente a Lei de Execução, a Constituição da República e alguns doutrinadores do Direito Administrativo e do Penal, é função pública indelegável do Estado, não podendo ser transferida aos particulares, pois se assim o fosse, o Estado não estaria cumprindo uma de suas atribuições sociais (função jurisdicional) e o mundo do crime poderia virar uma “industria” totalmente legalizada.
Assim, o sistema penitenciário viraria uma grande empresa que busca somente o lucro e não o bem do condenado, pois quanto mais presos nas prisões, mais lucros teriam os seus proprietários e a ressocialização ficaria desprivilegiada nessa situação.
No Brasil, uma possível implantação da privatização dos presídios sofre três obstáculos: Jurídicos, éticos e políticos.
OBJETIVOS
OBJETIVO GERAL
Identificar a aplicabilidade e a eficácia da privatização dos presídios nacionais diante da terrível e degradante situação vivenciada pela população carcerária nacional proporcionada por um sistema ineficaz estatal, usando como parâmetro o direito e leis de outros países onde a privatização já existe.
OBJETIVO ESPECÍFICO
Identificar a aplicabilidade da Lei de Execução Penal diante da privatização;
Realizar uma abordagem histórica das prisões nacionais e de outros países;
Apresentar as teorias aplicadas á pena e a ressocialização no Brasil;
Atuação Estatal diante do sistema prisional nacional atual;
A possibilidade da delegação de poderes estatais para a propriedade privada;
Obstáculos jurídicos que podem impedir a implementação da privatização no Brasil.
JUSTIFICATIVA
A escolha desse tema foi motivada por ser bastante polêmico e atual. Esta pesquisa é de fundamental relevância, pois, o modelo prisional usado atualmente pelo Estado está completamente falido, devendo-se buscar novas alternativas e uma delas, que surge no cenário nacional, é a privatização do sistema prisional.
A privatização surge como uma possibilidade de melhoria do sistema prisional vigente.
O Governo não garante os direitos e deveres estabelecidos na Constituição Federal e nas Leis Infraconstitucionais aos condenados. O Estado vem encontrando muita dificuldade em gerir e administrar os seus presídios.
Pesquisa realizada no ano de 2003 pelo Departamento Penitenciário Nacional mostrou que o índice de reincidência é de 82% nas prisões brasileiras.
Com a atual situação de degradação do sistema vigente, a possível realização de uma mudança deste sistema em que o Estado é o controlador de todas as funções por um sistema baseado na propriedade privada vem sendo bastante discutido. Assim, a privatização vem ganhando muitos adeptos para que seja instalada no Brasil.
Existe atualmente tramitando na Câmara dos Deputados, desde meados de 2003, um projeto de lei nº 2. 825, com a finalidade de alterar alguns dispositivos da Lei de Execução Penal (7.210/84), ao qual permitirá a terceirização dos serviços praticados nas unidades prisionais, permitindo, assim, o particular prestar serviços de gestão, tais como, o serviço de limpeza, saúde e comida.
Destarte, para a maioria da doutrina, a legislação pátria e aspectos políticos e éticos não possibilitam tal mudança, surgindo como principal obstáculo para essa prática, afirmando que o Estado é o único que possui o poder de policia e a atividade jurisdicional. Para tanto, seria fundamental uma mudança legislativa e política.
REFERENCIAL TEÓRICO
O sistema prisional pátrio é regulado pelo Código de Processo Penal, pelo Código Penal e pela Lei de Execução Penal. Conforme tais institutos, o Estado possui com exclusividade o jus puniendi, pois é dotado de soberania, sendo este poder indelegável e intransferível. Para a maioria da doutrina nacional, o direito de punir é poder intimo e in abstrato do Estado.
O Estado realiza o seu poder de punir quando utiliza a persecução e a execução penal como forma de impor a lei contra aquele que cometeu algum crime. A execução penal surge com o propósito de realizar a pretensão punitiva do Estado, ao qual impõe uma sanção penal ao autor de um fato típico, antijurídico e culpável.
Conforme entendimento do art. 1º da LEP, a execução penal possui como objetivo realizar de maneira correta os pronunciamentos existentes na decisão criminal proferida pelo juiz de execução (condenação criminal) e a conseqüente ressocialização do condenado. É através da pena que o estado busca concretizar os mandamentos da execução penal.
A pena é o principal meio de coação praticado pelo Estado, sendo através dela que este tenta organizar uma sociedade sem crimes ou delitos, buscando-se a paz social. Para muitos estudiosos, a pena surgiu junto com o Direito Penal, em detrimento das constantes necessidades de sanções penais em todas as épocas e culturas.
A pena é uma espécie do gênero sanção e possui um conceito bastante subjetivo, pois cada código contém suas próprias generalidades e objetivos. Para Fernando Capez, conhecido doutrinador na área penal e processual penal brasileiro, a pena:
“ é a sanção penal de caráter aflitivo, imposta pelo Estado, ao culpado pela prática de uma infração penal, consistente na restrição ou privação de uma bem jurídico, cujas finalidades são aplicar a retribuição punitiva ao delinqüente, promover a sua readaptação social e prevenir a novas transgressões pela intimidação dirigida à sociedade” (pag. 14).
Assim, possui como finalidade, de acordo com o art. 59 do CPB, (teoria mista, eclética, intermediária ou conciliatória) punir o criminoso que praticou a conduta delitiva e prevenir novas condutas impostas pela intimidação e a reeducação (ressocialização).
“Art.59 CPB, caput: O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e conseqüências do crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime”:
O código penal, em seu art. 32, estabelece as espécies de penas utilizadas no direito brasileiro, a saber, privativas de liberdade, restritivas de direitos e as de multa. A pena privativa de liberdade restringe a liberdade do condenado em um estabelecimento prisional por um determinado período. É por meio deste estabelecimento prisional que o Estado busca garantir a reincorporação do autor do delito ao seio social, readaptando-lhe de forma segura e assegurando-lhe todos os seus direitos e deveres expressos nas leis infraconstitucionais e na constituição federal.
Acontece que a realidade é totalmente contraria ao que preceitua a nossa legislação, pois os direitos e deveres dos presos não são cumpridos pelo Estado, haja vista que este não oferece as mínimas condições necessárias para a realização de uma possível ressocialização.
A ineficácia, as mazelas e o descaso do Estado estão presentes no sistema carcerário brasileiro. Vários foram os fatores que contribuíram pra que o sistema atual se encontre nessa precariedade, tais como, o abandono e a falta de investimentos estatais.
Os cárceres estão superlotados, as rebeliões são rotineiras, não existe infra-estrutura adequada, a ociosidade marca o dia-a-dia do condenado, essa é a realidade vivenciada atualmente.
Várias outras formar de gerir e organizar o sistema carcerário vêem sendo debatidas, sendo que a de maior repercussão é sobre a privatização como meio de solucionar tais tormentos. Contudo, essa possível inovação vem sofrendo demasiadas críticas e aceitações.
Os fatores que ensejam a opinião positiva a respeito da privatização baseiam-se na crise atual vivenciada pelo sistema carcerário e no direito estrangeiro, onde países já utilizam tal modalidade (Estados Unidos e França). Bernardo Del Rossi, citado por Geisa de Assis Rodrigues, conceitua privatização como:
“ a gestão plena por parte de empresas privadas, que desenvolvem seu trabalho a título lucrativo, em centros ou estabelecimentos tutelares ou penitenciários, gestão que pode chegar a incluir a construção do centro ou habilitação do já existente”.
Em entrevista concedida a revista dataveni@, Fernando Capez se mostrou totalmente a favor da privatização:
“É melhor que esse lixo que existe hoje. Nós temos depósitos humanos, escolas de crime, fábrica de rebeliões. O estado não tem recursos para gerir, para construir os presídios. A privatização deve ser enfrentada não do ponto de vista ideológico ou jurídico, se sou a favor ou contra. Tem que ser enfrentada como uma necessidade absolutamente insuperável. Ou privatizamos os presídios; aumentamos o número de presídios; melhoramos as condições de vida e da readaptação social do preso sem necessidade do investimento do Estado, ou vamos continuar assistindo essas cenas que envergonham nossa nação perante o mundo. Portanto, a privatização não é a questão de escolha, mas uma necessidade indiscutível, é um fato”.
Algumas propostas de implantação da privatização do sistema carcerário já foram concretizadas, tais como, uma proposta feita pela União, uma pelo Estado de São Paulo e a outra é a tramitação na Câmara dos Deputados do projeto de lei nº 2.825.
O modelo federal possui por finalidade a criação de um sistema penitenciário federal, ou seja, as prisões de segurança máxima ficariam a responsabilidade da União. Utilizar-se-á um modelo de gestão mista, que envolve a administração pública e a entidade privada. Os servidores continuam estatais e a entidade privada iria construir os presídios de acordo com o estabelecido pela administração publica e em contrapartida poderia explorar o trabalho remunerado dos detentos. Os contratos teriam duração de no Maximo 10 anos.
A respeito do modelo paulista, este é basicamente igual ao da União, a única diferença é que os funcionários seriam da empresa privada.
O projeto de lei nº 2.825 estabelece a terceirização das unidades prisionais, alterando a LEP em alguns pontos. Pretende-se que o particular realize os serviços de gestão, tais como o fornecimento de comidas, a segurança interna e a prestação de assistência médica.
As criticas a tais projetos ocorrem na questão da indelegabilidade do jus puniendi Estatal. A jurisdição e a execução penal, como serviços públicos, não são passíveis de delegação, pois fere o sistema constitucional.
Outro ponto negativo citado pelos contrários a privatização seria a exploração do trabalho do detento pela empresa que iria gerir o presídio.
Maria Juliana Morais de Araujo, colaboradora com João Marcelo de Araujo Junior, professor e coordenador do Curso de Mestrado em Direito da Cidade, da Faculdade de Direito do Rio de Janeiro, Afirma que:
“ Sendo a atividade executiva penal uma função pública, não poderia jamais ser objeto de contrato com particulares através de procedimentos de licitação e muito menos de privatização, pois como entendia De Marico: A jurisdição, em suma, é o poder exclusivo de um órgão público de apurar a violação ou o perigo de violação de um direito público ou privado, para declaração de vontade da lei e aplicação coativa das conseqüências cominadas para a infração ou das medidas destinadas a preveni-las”.
Assim, como se percebe, a dicotomia a respeito do tema é bastante árdua, não de obtendo uma opinião concreta e majoritária.
METODOLOGIA
Este trabalho de pesquisa vai ser baseado no estudo bibliográfico, utilizando-se de livros jurídicos, revistas jurídicas e da internet. Para Antonio Carlos Gil, a pesquisa bibliográfica:
“desenvolve-se ao longo de uma série de etapas. Seu número, assim como seu encadeamento, depende de muitos fatores, tais como a natureza do problema, o nível de conhecimento que o pesquisador dispõe sobre o assunto, o grau de precisão que se pretende conferir à pesquisa etc.”
Quanto ao método de abordagem, será utilizado o dialético, em que se buscará a conclusão a partir de comparações de teses, doutrinas, jurisprudências e no direito comparado.
Para o método de procedimento, utilizar-se-á o exploratório e o descritivo-comparativo, utilizando-se, de fatos já acontecidos no passado para se comparar e adequar ao presente. Esse método de pesquisa possui como característica primordial possibilitar uma maior proximidade com o tema abordado e o seu respectivo problema a ser estudado