A primeira possibilidade de um pensamento africano...

Por Edgar Joao Francisco | 21/06/2017 | Filosofia

O objectivo deste artigo e trazer de uma forma resumida a ideia da existencia de um pensamento entologico africano.

A primeira possibilidade de um pensamento africano filosófico colectivo: etnofilosofia em Templs, Kagame e Mbiti.

Os pensadores africanos problematizam a questão do estatuto da oralidade tradicional africana. E questão fundamental é: os provérbios, os contos tradicionais, os dizeres dos sábios, os mitos, os costumes, expressam conteúdo filosóficos ou em si são filosóficos?

Qual é a função ou qual é o papel dos filósofos educados profissionalmente perante os dizeres tradicionais?

A Filosofia seria uma forma de pensamento exclusiva de alguns povos? Ou será que cada povo elabora uma visão filosófica de mundo? Os questionamentos filosóficos sobre a verdade, o justo, a beleza, a finitude da vida, a existência dos deuses são de fato universais, isto é, válidos para todos independentemente da cultura de cada povo ou país? E as respostas a essas indagações seriam válidas para todos ou variariam de acordo com a cultura e o local? Existe uma filosofia africana? Se não existe, quais seriam as causas dessa ausência? Se existe, por que não conhecemos suas reflexões e autores? Haveria uma filosofia africana única ou diversas tendências filosóficas dentro do continente africano? Mas, se se pode falar de filosofia africana por que tal filosofia e seus filósofos não estão presentes nos livros didáticos de filosofia? As respostas a perguntas colocadas acima, serão dadas baseando-se em três (3) autores principais, que deram as suas contribuições, atendendo as perguntas acima.

Estes autores são: Placide Templs (1945), na sua obra intitulada “Filosofia bantu”, Alexis Kagame (1956), na sua obra intitulada “La Philosophie Rwandaise de L’entre”, John Mbiti (1969), na sua obra intitulada “African Religions and philosophy”.

Conceptualização

O termo etnofilosofia é usado para designar as crenças encontradas nas culturas africanas. Tal abordagem trata a filosofia africana como consistindo em um conjunto de crenças, valores e pressupostos que estão implícitos na língua, práticas e crenças da cultura africana e como tal, visto como um item da propriedade comum. Um dos defensores desta proposta  é Placide Templs, que argumenta em filosofia bantu que a metafisica do povo Bantu  é refletida em suas linguagens.

E.J. Algoa da universidade nigeriana de Port Harcourt, defende a existência de uma filosofia da historia decorrente dos provérbios tradicionais do Delta do Niger, no seu artigo, “uma filosofia da historia africana na tradição oral”, argumente que na filosofia africana, a idade e vista como um factor importante na obtenção de sabedoria e de interpretação do passado. E ele faz citações dos seguintes provérbios:” mais dias mais sabedoria”, “ o que um velho vê sentado, um jovem não vê me pé”, “a verdade e vista como interna e imutável (a verdade nunca apodrece), mas as pessoas estão sujeitas ao erro (mesmo um cavalo de quatro patas tropeça e cai).

A sagacidade filosófica é uma espécie de visão individualista da etnofilosofia, que o registo das crenças de certos membros de uma comunidade especial. A premissa é de que embora a maioria das sociedades exigem algum grau de conformidade de crenças e de comportamentos dos seus membros, alguns desses membros chegam a níveis superiores de conhecimento e de entendimento das suas culturas e visão do mundo. Em alguns casos, o sábio vai além do mero conhecimento e compreensão para reflexão e questionamento, tornando-se alvo da sagacidade filosófica.

Placide Templs (1945), Filosofia Bantu.

Templs foi um missionário franciscano de origem belga, que foi trabalhar numa missão do Congo belga, em Dilolo, Katanga. Ora, a questão que se levanta é a seguinte: porquê falar do Templs na filosofia africana? Ou seja, que contribuição teria dado um missionário ocidental, iluminado por ideias hegelianas, para a filosofia africana?

A resposta é um pouco complexa: Templs, apesar de ser ocidental, constitui uma oportunidade e uma força para os estudos da filosofia africana contemporânea. É considerado uma oportunidade porque foi o primeiro autor, que produziu uma obra, intitulada filosofia bantu, em 1945, que abriu um espaço de debate de existência ou não da filosofia africana. E uma forca, dado que mesmo sendo hegeliano o contexto teórico que se vivia, reconheceu a existência de um pensamento ontológico africano, como atesta a citação seguinte:

            “De facto, Templs foi o primeiro a afirmar que a reliosidade dos bantus exprime

             Um pensamento metafisico e não magico, afirmando que a sua cultura representa                             

             Um sistema filosófico autentico, (Bono, 2014, P.259).”

Por seu turno, Castiano (2010, P.253) considera Templs, como sendo o autor do texto fundador da etnofilosofia.

Segundo Templs, citado por Bono (2014, P.259), os bantu possuem um pensamento metafisico coerente, ainda que não tenha plena consciência ou não consiga expô-la. O autor supracitado salienta, assumindo o papel de ajuda-los a sistematizar a sua ontologia.

Por seu turno Mogobe Ramose[1], faz a seguinte observação: 

“Os conquistadores da África durante as injustas guerras de colonização se arrogaram a autoridade de definir filosofia. Eles fizeram isto cometendo epistemicídio, ou seja, o assassinato das maneiras de conhecer e agir dos povos africanos conquistados. O epistemicídio não nivelou e nem eliminou totalmente as maneiras de conhecer e agir dos povos africanos conquistados, mas introduziu, entretanto, - numa dimensão muito sustentada através de meios ilícitos e 'justos' - a tensão subsequente na relação entre as filosofias africana e ocidental na África”.

Para o estudo da filosofia bantu, Templs usou, infelizmente a língua ocidental e para fundar a objetividade a exposição da filosofia bantu, Templs fez confronto entre linguagens, comportamentos, instituição e usos bantu, para analisa-los isolar as ideias fundamentais e construir um sistema do pensamento bantu, (Bono, 2014, P.259).

A tese central do Templs é de que a concepção da vida dos bantu e alicerçada num único valor: a vida, o rigor da vida, que é o valor supremo, se não vejamos:



[1]  Mogobe Bernard RAMOSE (1945). Filósofo sul-africano. Professor de filosofia na Universidade da África do Sul (Pretória). Desenvolve suas pesquisas nos campos da filosofia africana e da filosofia política, do direito e das relações internacionais. Autor, dentre outros, de Filosofia africana através do Ubuntu [African philosophy through Ubuntu]; dos artigos “Sobre a legitimidade da filosofia africana” (revista Ensaios Filosóficos, vol. IV, 2011) e “Globalização e Ubuntu” (no livro organizado por B. S. Santos e M. P. Meneses. Epistemologias do Sul).  Consultado em: https://observatoriodaevangelizacao.files.wordpress.com/2015/11/caderno-2_filosofias-africana-e-latino-americana-2.pdf, em15 de Abril de 2017.

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