A PRESTAÇÃO DA TUTELA JURISDICIONAL MEDIANTE AS NOVAS MODALIDADES...

Por Catarina Santos Bogéa e Jailson Martins Filho | 28/02/2017 | Direito

A PRESTAÇÃO DA TUTELA JURISDICIONAL MEDIANTE AS NOVAS MODALIDADES DE SENTENÇA QUE FLEXIBILIZAM OS PODERES DO JUIZ[1]

 

Catarina Santos Bogéa[2]

Jailson Martins Filho [3]

 

Sumário: 1 Introdução; 2 Modalidades de tutela jurisdicional, 2.1 Classificações doutrinárias de tutelas jurisprudenciais, 2.1.1 Tutela Jurisdicional Declaratória, 2.1.1 Tutela jurisdicional constitutiva, 2.1.3 Tutela jurisdicional condenatória, 2.1.4 Tutela jurisdicional mandamental, 2.1.5 Tutela jurisdicional executiva; 3 A mitigação do princípio da congruência; 4 Conclusão; Referências bibliográficas

 

1 INTRODUÇÃO

O Direito atual carece em sua doutrina de classificações que se adéquam a função real que adquiriram as sentenças para que a prestação jurisdicional se desse de forma eficaz. A sentença condenatória hoje não mais preenche todas as lacunas do direito em sua prática, o que não significa dizer também que o surgimento de novas distinções para as classificações de sentença admitem arbitrariedade por parte do julgador.

O estudo do instituto da sentença condenatória deve ser esgotado, em seu caráter histórico e prático, para que se faça compreensível o surgimento das novas formas de prestação jurisdicional, isto é, as sentenças executivas e mandamentais. O que deve estar claro é a necessidade social do surgimento dessas novas formas de tutela jurisdicional, que concedem sim ao juiz maiores poderes, e desvinculam através do principio da tipicidade a congruência entre o pedido e sentença.

A afirmação da existência das novas formas para a prestação jurisdicional do Estado-juiz não incidem dizer que o controle sobre o arbítrio do julgador foi esquecido. O que se quer, na realidade, explanar através deste trabalho, é a distinção entre as classificações do instrumento que tutela o direito – a sentença.

Ao longo desta pesquisa, será indicado que o controle sobre o juiz continua em vigor, mas, para adequar às necessidades da sociedade, a forma de controle sofreu mudança. Se antes o controle era realizado através de lei, hoje o mesmo controle é realizado por regra hermenêutica que atribui ao juiz o poder de julgar mediante o caso concreto, isto é, a proporcionalidade a luz das reformas contidas no CPC vigente.

 

2 MODALIDADES DE TUTELA JURISDICIONAL

A tutela jurisdicional se fundamenta na proteção que o Judiciário concede ao autor ou réu, ao final da prestação jurisdicional, em favor deste ou àquele. Candido Rangel Dinamarco afirma, por sua vez, que o instituto se caracteriza pelo “amparo que, por obra dos juízes, o Estado ministra a quem tem razão num litígio deduzido em processo”. (DINAMARCO, 2004, p.104).

Com o objetivo precípuo de pacificação social, constitucionalmente a tutela jurisdicional vem regulada no artigo 5º, inciso XXXV: “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”. Outras garantias constitucionais diretamente relacionadas ao devido processo legal, como o principio do contraditório, a ampla defesa, as fundamentações das decisões judiciárias, e o juiz natural, complementam o conceito de inafastabilidade da tutela jurisdicional. Os princípios citados se não outra coisa, possuem o condão de garantir que ao final de um processo, advenha decisão justa e efetiva a quem demandou ao Estado certo Direito.

Toda forma de organização social demanda limites; com a tutela jurisdicional não poderia ser diferente. Tais limitações são impostas pela própria Constituição Federal, assim como Código de Processo de Civil, especialmente em seus artigos 2º e 262, nos quais se estabelece que em regra, se faz necessário a instauração de um processo onde a iniciativa seja da parte em demandar o Estado-juiz. A observância de correlação entre sentença e o pedido do autor se faz também como regra essencial, de modo que o juiz não poderá proferir decisão que conceda direito divergente ao que foi pedido. Competência, parte legítima e condições das ações também são aspectos fundamentais para a legitimidade da tutela a ser prestada pelo Estado, e esses preceitos, assim como outros processuais que não serão aprofundados neste trabalho, devem ser respeitados para que se obtenha a tutela jurisdicional eficaz.

Para que se adentre nas classificações das modalidades de tutelas jurisdicionais, algumas considerações são cabíveis. Antes da Lei 11.232/2005, o conceito de sentença estava fundamentado no artigo 162, § 1º, CPC, e dizia que sentença era o ato que tinha a finalidade de encerrar o processo. A doutrina muito discutiu acerca deste conceito, uma vez que o processo, em verdade, não poderá ser encerrado por meio de sentença, isso porque ainda existe a possibilidade da parte vencida interpor em recurso, onde então, o processo seguirá rumo em segundo grau de jurisdição, e assim sucessivamente. Scarpinella é certeiro quando diz que melhor seria se o legislador tivesse colocado a menção “procedimento de primeiro grau de jurisdição”, ao invés do termo processo, e então, restaria confirmado o conceito correto do instituto. (BUENO, 2006, p.14). Por fim, com a promulgação da lei supracitada, o conceito de sentença passou a ser basicamente o ato que tem como conteúdo uma das hipóteses dos artigos 267 e 269, CPC, onde então se encerra a fase procedimental.

Mais uma vez, sábios são os ensinamentos de Candido Rangel, quando disserta: “a sentença de mérito é o momento culminante do processo de conhecimento, dito também processo de sentença justamente porque tem a finalidade especifica de produzir a tutela jurisdicional mediante o julgamento de pretensões”. (DINAMARCO, 2002, p. 194).

 Finalmente, adentrando a seara a que se destina este trabalho, e para que se faça a devida classificação dos tipos de tutela, necessário se faz a análise do tipo de provimento jurisdicional solicitado pelo autor. Feito esta consideração, a petição inicial compulsoriamente deve conter um pedido, e, com base neste, será possível aferir classificações de tutela.

 

2.1 Classificações doutrinárias de tutelas jurisdicionais

A doutrina atual defende a existência de três modalidades de tutela jurisdicional, as quais sejam: (a) de conhecimento; (b) executiva; e (c) cautelar). No âmbito da tutela de conhecimento, que será o rito objeto de estudo ao longo deste trabalho, ainda há subdivisões, que classificam a tutela jurisdicional neste momento do processo ainda em três outras classificações, as quais sejam: (a) declaratória; (b) constitutiva; e (c) condenatória. A doutrina nomeou esta classificação como trinaria, ou tríplice. Todavia, doutrinadores mais modernos ainda entendem que dentro da tutela de conhecimento, duas outras modalidades ainda fazem parte de sua classificação, as quais sejam: (d) mandamental; e (e) executiva em sentido lato. Com a adição de mais dois tipos de tutela o conceito trinário antes adotado passou a considerar a classificação quinária para a fase de conhecimento em prestação jurisdicional.

Apesar de muitos permaneceram com a ideia de que a classificação trinaria para a prestação jurisdicional é a correta mediante um pensamento conservador enraizado por prestigiados doutrinadores, é válido a análise de que ao seu tempo, a classificação trinaria foi suficiente para tutelar de forma eficaz as necessidades da sociedade, no entanto, nas palavras de Luiz Guilherme Marinoni,

 

Não é porque uma classificação há várias décadas atrás, constituía forma adequada para explicar as varias sentenças, que, hoje, diante de novas realidades, ela poderá explicar as novas sentenças e os valores nela impregnados. Isso não significa qualquer contestação à antiga classificação das sentenças, ate porque ela estava perfeita quando formulada – e apenas nessa perspectiva deve ser analisada –, mas somente a constatação de que o surgimento de novas realidades gera, naturalmente, outros conceitos, e esses, por consequência absolutamente lógica, devem dar origem a uma nova classificação. (MARINONI, 20-?, p.3).

 

No momento atual que o Direito vive, a classificação quinaria atende as expectativas das demandas, isso porque, alguns direitos, nomeados de direitos de terceira geração (como por exemplo, o meio ambiente), exigem proteção imediata, sob o risco de perecer rapidamente, assim, as “novas sentenças”, adicionadas ao modelo trinário, permitem uma tutela efetiva e tempestiva. Logo, as sentenças mandamentais e executivas a lato sensu, exigem imposição do juiz sob pena de medidas coercitivas, como por exemplo, multas. Araken de Assis explica:

O reconhecimento muito recente das duas últimas forças – mandamental e executiva –, desembaralhadas das funções jurisdicionais, e a aparente simplicidade do seu cumprimento (execução “forçada”), induziram o legislador, nas reformas parciais do processo civil brasileiro, a eliminar a necessidade de um novo processo – o processo de execução previsto no Livro II do CPC – para efeito de executa-las. Até adotou, a título de prestidigitação legislativa, um novo título para a atividade: ‘efetivação (v.g., art 273 § 3º). Alude-se, a este propósito, em execução “sincrética” ou imediata. (ASSIS, 2006, p.11).

 

Dessa forma, esses dois tipos de sentenças que prestam enquanto instrumento à tutela jurisdicional, permitem que a sua aplicação se dê independentemente da autorização do réu, e também sem a necessidade de instaurar um novo processo, que viria a demandar ação de execução, para que então fosse satisfeito o direito do autor.

Feitos os comentários necessários, neste momento, acerca das modalidades que integram a nova classificação quinária, vale destacar ainda, de uma forma geral as características de todos os tipos de modalidade de sentença. As que atuam apenas no “mundo do direito”, ou seja, as tutelas declaratórias e também as constitutivas, onde a proteção jurisdicional que o Estado concede dispensa a alteração dos fatos, isto é, a realidade, o mundo do ser, não sofre mudanças.

As tutelas que atuam no mundo do “direito e dos fatos” são aquelas que trazem consigo consequências e mudança da realidade sensível. O judiciário, aqui, se vê obrigado a alterar, de alguma forma, o campo do mundo real, e as sentenças que possuem o condão de realizar tal feito são as condenatórias, mandamentais e executivas.  

2.1.1 Tutela jurisdicional declaratória

A sentença declaratória tem por finalidade declarar se existe ou não a relação jurídica discutida em juízo. Araken de Assis afirma que “através da eficácia declarativa o autor tem por fito extirpar a incerteza, tornando indiscutível, no presente e no futuro, graças à autoridade da coisa julgada, a existência, ou não, de relação jurídica, ou a falsidade, ou não, de documento” (ASSIS, 2006, p.7). Característica atribuída a sentença declaratória é também o efeito “ex tunc”, isto é, a sentença possui efeitos retroativos. Os motivos para tanto decorrem de ordem lógica, já que o juiz declara que a relação jurídica já existia ou que ela não existia, e assim, irá declarar sempre o pretérito já ocorrido.

 

2.1.2 Tutela jurisdicional constitutiva

A sentença constitutiva tem como finalidade a criação, modificação e extinção de direitos e obrigações. Neste momento, o que se tem, é uma crise na situação jurídica. Wambier explica que “nas sentenças constitutivas contém condenação, mas declaração acompanhada da constituição, modificação ou desconstituição de uma situação jurídica” (WAMBIER, 2007, p.148). Quanto ao efeito, a sentença constitutiva implica a condição “ex nunc”, isto é, a partir deste momento, assim, os efeitos desta modalidade de tutela se iniciam a partir do trânsito em julgado da sentença.

 

2.1.3 Tutela jurisdicional condenatória

As tutelas condenatórias são aquelas que o autor instaura o processo de conhecimento com dois objetivos, além da declaração, o de condenação do réu, e ao cumprimento de uma obrigação ativa ou omissiva. De forma simplória, Araken de Assis ensina que “através da eficácia condenatória o autor visa obter a reprovação do réu, ordenando que sofra a execução” (ASSIS, 2006, p.7). Na sentença condenatória, a crise de inadimplemento discutida em juízo será sempre o descumprimento de um dever ou uma obrigação. Assim, a tutela condenatória vai modificar uma situação (onde esta é contrária a pretensão do autor) para conseguir a reparação de um dever ou uma obrigação. O efeito da sentença condenatório é “ex tunc”, isto é, retroage. No entanto, a lei irá determinar o alcance dessa retroatividade. Exemplo disso são os casos em que a sentença é julgada em favor do autor, e o juiz estabelece que o réu pague a condenação, incluindo os juros e correção monetária desde o momento da citação.

2.1.4 Tutela jurisdicional mandamental

A sentença mandamental já faz parte da nova classificação quinaria adotada quando das espécies de sentença em processo de conhecimento. Como dito anteriormente, o Direito acompanha a sociedade, e a nova realidade exigiu do Estado meios de imposição de condutas de não-fazer, um desses meios se faz através da sentença mandamental. Luiz Rodrigues Wambier afirma que:

 

Tem por objetivo a obtenção de sentença em que o juiz emite uma ordem, cujo descumprimento, por quem a receba, caracteriza desobediência à autoridade estatal passível de sanções, inclusive de caráter penal (artigo 330 do CP). Exemplo disso são as sentenças proferidas no mandado de segurança e na ação de nunciação de obra nova (artigo 938 do CPC). (WAMBIER, 2007, p.149).

 

Aqui, assim como na sentença condenatória, a crise de inadimplemento discutido em juízo sempre será o descumprimento de um dever ou de uma obrigação. As tutelas mandamentais, compartilhando mais uma vez características das condenatórias, também possuem um momento declaratório, onde o juiz declara o reconhecimento do direito do autor, e um segundo momento, chamado sancionador, que abre o caminho da execução forçada, caso o devedor não cumpra a obrigação espontaneamente.

O que diferencia a sentença mandamental da condenatória é o conteúdo. Na sentença mandamental concedida pelo juiz, o meio de cumprir a obrigação será sempre especifico, não estando o obrigado livre para cumprir a obrigação conforme lhe convier. Se por exemplo o juiz impõe a uma empresa que pare atividades em violação ao meio ambiente, este está obrigado a cessar a sua conduta violadora, e não simplesmente a ressarcir pecuniariamente os danos causados pela empresa.

O núcleo da sentença mandamental se constrói com a ordem de fazer mais a ação coercitiva (pressão). Essa é a diferença chave entre este tipo de sentença, e a condenatória, já que na primeira, o juiz não apenas condena, mas ordena, sob pena de uma imposição de medida coercitiva, como por exemplo, multa diária.

No direito brasileiro, a coerção, em regra, é pecuniária. A medida coercitiva pessoal (prisão civil) é excepcionalíssima, e somente permitida nas hipóteses previstas expressamente na lei, como depositário infiel e devedor de alimentos, com fundamento no artigo 5º da Constituição Federal e artigo 733 do Código de Processo Civil. Àquele que não cumprir a ordem do juiz, em âmbito de procedimento mandamental, poderá também responder por crime de desobediência.

A novidade que veio por meio do artigo 461 do CPC, é a dispensa da abertura de novo processo (de execução), no âmbito de sentença mandamental. Tudo é resolvido na mesma relação processual, e emissão e o cumprimento da ordem são feitos no mesmo processo. A sentença mandamental, portanto, possui eficácia própria. O fato de não mais ser necessário ingressar nova ação para que se execute uma ordem, saindo então da esfera do processo de conhecimento, transmite um valor muito forte na concentração da execução por meio deste rito (MARINONI, 20-?, p.7). Marinoni explica que “trata-se da superação do princípio da tipicidade das formas executivas, outrora visto como garantia da liberdade dos cidadãos contra a possibilidade arbítrio judicial, e agora pensado como obstáculo à efetiva tutela do direito” (MARINONI, 20-?, p,7).

A flexibilização dos poderes do juiz mediante a sentença mandamental, com caráter executivo levantou dúvidas, insegurança e críticas. Nas palavras de Marinoni, estão traduzidos alguns anseios experimentos por doutrinadores:

 

Lembre-se que, na concepção do direito liberal clássico, não seria correto dar o poder de executar ao julgador, pois aí “o juiz seria mais do que juiz”, podendo se constituir em um “opressor” e, assim, colocar em risco as liberdades. Dar ao juiz, que apenas deveria proclamar as palavras da lei, o poder de execução, seria tão ou mais grave do que lhe conferir poder para criar a lei . Chegou-se a sustentar, até mesmo, que a execução consistiria em uma função menos nobre do que a de “dizer o direito”. (MARINONI, 20-?, p.7).

 

Com o objetivo de acalmar os nervos dos que apostam na arbitrariedade legalizada dos juízes com a flexibilização de seus poderes, é válido lembrar que o julgador ainda está limitado à iniciativa da parte em acionar o Judiciário, e, ademais, os meios executivos só poderão ser admitidos em casos expressamente tipificados na lei.                Contudo, a partir do entendimento de que a tarefa jurisdicional do Estado não termina no momento em que a sentença é proferida, nos casos em que o direito depende de atuação na realidade, os artigos 461 e 461-A do CPC e 84 do CDC concederam ao juiz o poder de atuar de ofício, mesmo depois de transitado em julgado a sentença, com objetivo de estabelecer multa, alterar o seu valor, ou ainda modificar a medida executiva já instituída, “libertando o juiz das amarras do legislador, mas não o deixando, como é óbvio, sem controle algum, uma vez que esse passou a ser feito pela regra da proporcionalidade”. (MARINONI, 20-?, p.8). Em resumo, a dispensa da ação de execução confere ao juiz que proferiu a sentença, determinar em caso concreto, à medida que lhe convier ou que lhe seja adequada, ainda que não expressamente tipificada em lei.

A seguir será visto a tutela jurisdicional executiva, que muito se assemelha a mandamental, com exceção apenas das medidas utilizadas pelo Judiciário para satisfazer a pretensão da parte que tem razão.

 

2.1.5 Tutela jurisdicional executiva

A princípio, a tutela jurisdicional é aquela concedida aquele que tem a razão, ou seja, a parte que está amparada pelo direito material. Por este conceito, aparentemente, somente pó exequente detém direito resguardado para si. No entanto,  princípios demonstram que o executado também é merecedor de tutela, como por exemplo quando o exequente possui crédito a ser executada, esta ação deve se dar de modo menos gravoso para o executado.

Tutela executiva então consiste no conjunto de medidas para satisfazer o direito de uma pessoa à custa do patrimônio de outrem, independente da concordância ou não do devedor. Greco entende por execução “o conjunto de atividades atribuídas aos órgãos judiciários para a realização pratica de uma vontade concreta da lei previamente consagrada num título”. (GRECO, 2006, p.8).

Aqui, assim como na tutela mandamental, primeiramente se dará a ação declaratória, e em seguida o momento sancionador, neste, o juiz para satisfazer o direito do vencedor se utilizará de medidas sub-rogatórias, como por exemplo, a expropriação. Em resumo, a característica fundamental da sentença executiva é a expropriação de um bem, inicialmente do patrimônio disponível no devedor. O CPC ainda divide as sentenças executórias em executórios de coerção e executórios de sub-rogação.

Quanto à medida coercitiva, Candido Rangel ensina:

 

As medidas de coerção consistem em pressões sobre a vontade do obrigado, para que cumpra. Mediante elas o Estado – juiz procura persuadir o inadimplente, impondo-lhe situações tão onerosas e inconvenientes que em algum momento seja para ele mais vantajoso cumprir do que permanecer no inadimplemento. (DINAMARCO, 2004, p.147).

 

Os meios sub-rogatórios, por sua vez, consistem em mudança da realidade pelo próprio poder Judiciário, e não pelo obrigado, como no meio coercitivo, ou seja, é sub-rogatório porque o Judiciário substitui o próprio devedor. Tais meios podem ser exercidos por mais de uma forma, as quais sejam: desapossamento, transformação, expropriação, e dentro da expropriação, abjudicação, alienação e usufruto.

 

3 A MITIGAÇÃO DO PRINCÍPIO DA CONGRUÊNCIA

Com a concessão de maiores poderes aos juízes para que a tutela jurisdicional se desse de forma mais eficaz (o juiz ordena; o juiz executa, em um só processo), houve nítida quebra ao princípio da tipicidade das formas, assim como a execução restou concentrada no processo de conhecimento. Com o novo formato de sentenças e prestação jurisdicional, quebrou-se a ideia absoluta de congruência entre o pedido a e a sentença. Marinoni explica de forma didática:

 

Note-se que a superação dessa idéia é uma conseqüência lógica da quebra do princípio da tipicidade dos meios executivos e da concentração da execução no proce sso de conhecimento, uma vez que todas elas se destinam a dar maior mobilidade ao juiz – e assim maior poder de execução. A ligação entre tudo isso, ademais, deriva do fato de que a regra da congruência, assim como o princípio da tipicidade e a separação e ntre conhecimento e execução, foi estabelecida a partir da premissa de que era preciso conter o poder do juiz para evitar o risco de violação da liberdade do litigante. Tanto é verdade que, quando se pensa congruência, afirma-se que sua finalidade é a de evitar que a jurisdição atue de ofício, o que poderia comprometer sua imparcialidade. (MARINONI, 20-?, p.17)

 

De modo a garantir a segurança jurídica perante a nova realidade que praticamente ilimita os poderes do juiz, o CPC em seu artigo 128 afirma que “o juiz decidirá a lide nos limites em que foi proposta, sendo-lhe defeso conhecer de questões, não suscitadas, a cujo respeito a lei exige iniciativa da parte”. Ainda, o artigo 460 assevera que “é defeso ao juiz proferir sentença, a favor do autor, de natureza diversa da pedida, bem como condenar o réu em quantidade superior ou em objeto diverso do que lhe foi demandado”.

As limitações, ou proibições aludidas pelos artigos supracitadas teriam que ser superadas para encontrar com a realidade das novas sentenças executivas. Marinoni defende que “essa regra não poderia mais prevalecer, de modo absoluto, diante das novas situações de direito substancial e da constatação de que o juiz não pode mais ser visto como um inimigo, mas como representante de um Estado”. (MARINONI, 20-?, p.18).

Então, de modo a solucionar o que ainda restringia a atuação arbitrária do juiz, os artigos 461 do CPC e 84 CDC – relativos a obrigações de fazer e de não fazer –, autorizaram o juiz a impor multa ao réu, independentemente do pedido do autor. Autorizou também que, de oficio, o juiz pudesse determinar as medidas necessárias, conforme lhe convenha ao caso concreto.

É nítido que o amplo poder conferido ao juiz pelas novas reformas processuais tem o condão precípuo de flexibilizar a concessão da providencia e do meio executivo que seja a um só tempo capaz de tutelar o direito de forma eficaz, e restringir da menor maneira possível à esfera jurídica do réu. Marinoni atesta:

 

Não é porque a aplicação da regra da congruência pode impedir a efetividade da tutela do direito, e que o juiz não pode mais ser v isto como “inimigo”, que o poder de execução que lhe foi deferido pode restar sem controle. A diferença está na forma de controle. Se antigamente ele era feito pela lei – daí se pensar no princípio da tipicidade dos meios executivos, na separação entre conhecimento e execução e na congruência entre o pedido e a sentença -, atualmente esse controle deve ser realizado pela regra da proporcionalidade. (MARINONI, 20-?, p.20)

 

Apesar de a proporcionalidade ser regra hermenêutica muito debatida entre os doutrinadores, pelo alto nível de subjetividade, não há como resguardar a tutela efetiva do direito sem que haja algum tipo de concessão no que concerne a objetividade e neutralidade. O que se espera, no entanto, é que, apesar de o juiz deter em suas mãos mais poder que a lei é capaz de controlar, cabe a sua inerente responsabilidade de julgador, respeitar as linhas do devido processo legal assim como todos os princípios constitucionais e processuais que regem o ordenamento jurídico quando da tomada de decisões.

A constatação que se fez acima é extremamente importante em um país onde o número de demandas é crescente junto ao Poder Judiciário, ainda mais onde a conciliação e arbitragem são métodos ainda discretos para a solução dos litígios, e pouco utilizados pelos operadores do direito.

O acautelamento da tutela mandamental e executiva, com a implementação de medidas de coerção e até sub-rogação, revela-se meio eficiente e necessário para o alcance do direito material, sendo que a conversão em perdas e danos deve se dar em última hipótese, quando impossível o cumprimento da obrigação específica ou a requerimento do próprio credor.

Em conclusão, a criatividade dos doutrinadores pátrios não encontra obstáculos, havendo posições variadas, todas, porém, com o objetivo comum de manter incólume o sistema processual em vigor.

 

4 CONCLUSÃO

As recentes alterações processuais, especialmente aquelas relativas às obrigações de fazer e não fazer fortaleceram a teoria das sentenças mandamental e executiva. Mesmo com marcantes diferenças em relação à sua origem, as tutelas mandamental e executiva exercem, hoje, relevante papel para a obtenção da tutela jurisdicional específica.

As tutelas mandamental e executiva são mecanismos que tendem a ter seu campo de atuação ampliado, já que algumas de suas características – como a falta de obrigatoriedade de processo de execução – fazem com que, a tutela jurisdicional seja obtida com celeridade.

Relevante notar que essa tendência de "mandamentalizar" as sentenças não é exclusividade brasileira. No direito italiano, vozes autorizadas têm sustentado a necessidade de considerar a sentença condenatória civil como uma ordem dirigida ao devedor, de modo que sua desobediência seja passível de punição criminal.

Os meios de coerção utilizados em ações dessa natureza são, no mais das vezes, efetivos, e o direito de acesso à justiça e a garantia da prestação da tutela jurisdicional efetiva são ideais a serem buscados pelos operadores do direito. E, para isso, aprofundar o estudo sobre as sentenças mandamentais e respectivos instrumentos de coerção parece ser imprescindível. Sempre, porém, dentro dos parâmetros constitucionais.

 

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

ASSIS, Araken de. Cumprimento da Sentença. Rio de Janeiro: Forense, 2006. 1. ed.

 

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado, 1988.

 

BUENO, Cássio Scarpinella. A nova Etapa da Reforma do Código de Processo Civil. 2ª. Edição. São Paulo: Editora Saraiva, 2006.

DINAMARCO, Candido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil. 2ª. Edição. Volume III. São Paulo: Editora Malheiros, 2004.

 

DINAMARCO, Candido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil. 2ª. Edição. Volume III. São Paulo: Editora Malheiros, 2002.

 

MARINONI, Luiz Guilherme. As novas sentenças e os novos poderes do juiz para a prestação da tutela jurisdicional efetiva. Disponível em:

<http://www.abdpc.org.br/abdpc/artigos/luiz%20g.%20marinoni(3)%20-%20formatado.pdf>. Acesso em: Novembro, 2014.

 

VADE MECUM. Colaborado por Antonio Luiz de Toledo Pinto, Márcia Cristina Vaz dos Santos e Lívia Céspedes. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2014

 

WAMBIER, Luiz Rodrigues. Curso Avançado de Processo Civil. V. 1. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007.

 

 

[1] Paper apresentado à disciplina de Processo de Conhecimento II, da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco – UNDB.

[2] Aluna do 5º período, do Curso de Direito, da UNDB.

[3] Aluno do 5º período, do Curso de Direito, da UNDB.