A PRÁTICA GESTORA NO ACOMPANHAMENTO DOS PROFESSORES INICIANTES
Por Sonia Aparecida da Silva de Lara Pires | 18/05/2017 | Educação
A PRÁTICA GESTORA NO ACOMPANHAMENTO DOS PROFESSORES INICIANTES[1]
PIRES, Sonia Aparecida da Silva de Lara Pires[2]
CARVALHO, Auricélia Pires[3]
Resumo
Este artigo tem a intenção de fomentar a discussão sobre a liderança da equipe gestora no auxilio do desenvolvimento profissional docente, com o foco no papel da equipe gestora das escolas na atuação de professores iniciantes do primeiro ciclo do ensino fundamental, pois entendemos que a equipe gestora possui um papel de extrema importância na inserção dos docentes iniciantes e no acompanhamento e auxílio dos professores iniciantes não só nas práticas educativas de aprendizagem como na vivência no espaço educativo. Os dados terão como aportes básicos de investigação as contribuições de Garcia (1992, 1999, 2009); Day (2001, 2004, 2005); Clandinin&Connely (2004, 2006) e Nóvoa (1992,2007,2010).A metodologia desenvolvida fará uma aproximação a Pesquisa Narrativa apesentada por com Clandinin&Connely, (2011).
Palavras-chave: Formação de Professores. Equipe Gestora. Professores Iniciantes
Introdução
Partindo do pressuposto que desde a década de 90 a política educacional do Estado de Mato Grosso, firma-se sobre o pilar da Gestão Democrática, tendo como um de seus princípios fundamentais a gestão participativa centrada nas atividades tanto administrativa quanto das práticas educativas, faz-se necessário a seguinte questão problematizadoras: “Como a equipe gestora pode auxiliar no desenvolvimento profissional docente dos professores iniciantes do 1º ciclo do Ensino Fundamental?”
A contextualização do problema em questão
Fui “professora feita a machado”, utilizo essa expressão para mostrar como foi o início de minha experiência formativa, quando me reporto a meu passado inicial , por hora um pouco distante tendo em vista estar na educação de Mato Grosso desde final da década de 80, recordo-me de ingressar como professora sem nunca ter obtido ensinamentos do como? Quando? Onde? Por quê? Lecionar para crianças.
Na verdade em meus cinco primeiros anos nem sabia ao certo o que estava fazendo. Apesar desta situação em minha trajetória como educadora, docente, pesquisadora, formadora e membro de equipe gestora sempre busquei compreender e dar significado a todas as minhas práticas e vivências, acreditando no poder que a educação exerce nas relações sociais.
Desenvolvimento
É necessário que tenhamos um olhar ao aparentemente menos visível nas instituições: as pessoas. É possível perceber que nas instituições desfilam-se portarias, obrigações e deveres. Raramente direitos! E as relações pelas quais tudo é gerado e a intersubjetividade e os sentidos que nos fazem, não raro, estão interditados de fazerem presentes no espaço do trabalho.
Lutas, alegrias, conflitos, vitórias, doenças, fracassos, ansiedade, medos e desejos, que expressam os sentidos para o corpo, são esmagados pelo “sortilégio” de um poder onipresente, constituído, que nos destrói como pessoas e nos coisifica como objetos e/ou partes do sistema sem alma.
A Formação docente e práticas pedagógicas existentes hoje propiciam um confronto de ideias, concepções, além do aprofundamento teórico necessário para expandir nossa compreensão em relação às questões pertinentes ao percurso didático-epistemológico que envolve a atuação da equipe gestora exercidos pelos docentes em cargos de gestão.
O foco parte agora para investigar como a equipe gestora auxilia no desenvolvimento profissional docente dos professores iniciantes do 1º ciclo do ensino fundamental, e como a liderança desta equipe influencia nas práticas educativas dos professores iniciantes?
Sabemos que a natureza da função docente e a forma como usualmente os cursos estão organizados, a preparação do futuro professor para enfrentar a complexidade do campo de atuação e as diversas situações que encontrarão nas escolas em que vão se inserir como profissionais têm se apresentado insuficiente.
Não se espera que tal formação se complete nessa época, dada à dinamicidade do contexto educacional e social e também da própria evolução dos conhecimentos e conteúdos que precisam ser contemplados no ato de ensinar.
Entretanto, a natureza da formação traz desafios maiores para as escolas e sistemas educativos vistos haver necessidade de investir na continuidade da formação em serviço, favorecendo o desenvolvimento profissional dos professores e sua aprendizagem ao longo da vida.
Marcelo Garcia (1999) ainda destaca que é preciso atender aos professores iniciantes não só como uma demanda social, mas também como uma exigência de justiça social visando assegurar o melhor ensino possível. E complementa, dizendo que se quisermos avançar na qualidade do ensino-aprendizagem e nos resultados escolares dos alunos, há de se repensar os princípios de desenvolvimento profissional, bem como os apoios e a promoção de bem-estar docente aos iniciantes.
Durante a atuação, por sua vez, nem sempre são oferecidos aos professores os auxílios de que necessitam para melhorarem sua atuação. Exemplo disso são os cursos organizados sem levar em consideração o tempo no magistério, às necessidades individuais dos professores e as demandas específicas do contexto de atuação.
Talvez um pouco por isso muitos docentes iniciem suas carreiras e já nos primeiros anos fazem uso de jargões pedagógicos, como estes presenciados em reuniões pedagógicas : “... quando iniciamos nosso trabalho na escola percebemos que a realidade é outra e que a teoria é uma e a prática é outra...”; “... o que aprendemos na universidade é bem diferente da realidade da sala de aula...”; “... a universidade deveria ter nos ensinado mais a prática do que a teoria...”.
Percebe-se nesses discursos a angústia e apreensão dos docentes iniciantes do primeiro ciclo do ensino fundamental quando se deparam com os sentidos e significados da prática docente.
Atualmente e desconheço se no passado houve algum acompanhamento específico e/ou políticas de acompanhamento aos docentes que ingressam a sala de aula pela primeira vez e, por conseguinte aqueles ingressantes do primeiro ciclo.
Na verdade não se percebe enquanto política pública uma preocupação em oferecer a equipe gestora condições deste acompanhamento, em face dessa situação adversa que enfrentam que coloca em xeque a própria formação, alguns professores chegam a desistir da docência e se voltam para atuações profissionais mais afastadas dos problemas cotidianos da sala de aula.
Outros, ainda que com conflitos e dificuldades, permanecem nas escolas, procurando sobreviver às situações que se apresentam, ou adotando modelos de ensinar e ser professor que tomam dos pares ou de seus antigos professores, esse comportamento é reconhecido pelos docentes como troca de experiências, baseando-se em trocar atividades (modelos) e métodos de ensinar que tiveram efeitos positivos.
Diante dessas situações, o período de iniciação deveria receber cuidados especiais dos proponentes das políticas públicas educacionais, pois é o momento no qual os professores procuram se apropriar das normas escolares (TARDIF e RAYMOND, 2000).
Nesse momento os docentes iniciantes precisam adaptar os conhecimentos adquiridos no curso de formação inicial, dentro da escola e construírem um ponto de partida para a formação de atitudes e posicionamentos frente à prática profissional e à aprendizagem dos alunos (GARCIA, 1999). As escolas neste momento através dos docentes mais experientes e principalmente a equipe gestora precisa ajudá-los a superar as dificuldades iniciais e construírem sua competência educativa.
No entanto, usualmente em sua maioria não sabem dessas necessidades nem estão preparadas para investir nos professores iniciantes. O processo de inserção dos que iniciam o exercício da docência deve se estar voltado para: abordagem da gestão da classe, o ensino, o estresse e a carga do trabalho, a gestão do tempo, as relações com os alunos, pais, colegas e principalmente a equipe gestora, pois o apoio efetivo da equipe é fundamental para o desenvolvimento profissional docente.
A questão aqui é mais do que pedagógica e vai além desta dimensão, o fato é que os docentes iniciantes nos seus primeiros momentos de atuação podem ser identificados como docentes artesãos, pois:
Dito claramente, esses professores trabalham sozinhos, aprendem sozinhos e desenvolvem a maior parte de sua satisfação profissional sozinho ou por suas interações com os alunos em vez de com os companheiros (HUBERMAN, 1993, pp. 22-23 apud GARCIA, 2010, p.26).
Envolta na ideia de participação, envolvimento, interação e compartilhamento no desenvolvimento profissional docente e das práticas educativas, a equipe gestora precisa se fazer presente e atuante nesse universo “das artes” e participar das tessituras que envolvem a matéria prima (contexto escolar), a mão-de-obra (docentes iniciantes) e o produto final (resultado das práticas iniciantes)
Fundamentação Teórica
Em uma breve consulta ao Banco de Teses da Capes sem especificar data (consulta realizada em 11 de outubro de 2015), foram encontrados 528 trabalhos com a temática Desenvolvimento Profissional Docente, quando incluída a expressão professores iniciantes somente uma tese apresentou em seu título essas expressões e ao incluir a expressão equipe gestora e/ou liderança nenhum trabalho foi encontrado.
A pesar da superficialidade da pesquisa realizada, tendo em vista o pouco tempo disponibilizado a ela, percebe-se que há necessidade de pesquisas que se dediquem mais ao tema Professores Iniciantes e, sobretudo da relação existente com a equipe gestora quando se trata de desenvolvimento profissional docente.
O estudo se mostra pouco explorado na realidade brasileira. Os estudos sobre Professores Iniciantes são relevantes tendo em vista as possibilidades que podem desencadear, pois é conhecida a importância que o período inicial de exercício da profissão tem para a efetivação do professor, bem como para o seu desenvolvimento profissional.
Day (2001) reconhece que a necessidade de melhorar os níveis de aprendizagem dos alunos levou as políticas nacionais a investirem em um perfil mais qualitativo tanto dos professores quanto das aulas que ministram, contudo esse movimento parece ter desencadeado um momento mais voltado “apenas para falar sobre o ensino e não para examinar as próprias práticas” (DAY, 2001, p.85)
O perigo em enveredar pelo caminho somente do ensino e não refletir sobre as práticas ocorridas em sala de aula é citado por Barth (1996) apud Day (2001), como o “lugar perigoso”
[...] os aprendentes vorazes são aqueles que se encontram no início da carreira, professores no seu primeiro ano de ensino, que se preocupam desesperadamente em aprender o seu novo ofício. A curva de aprendizagem mantém-se elevada durante três ou quatro anos [...] (BARTH, 1996, pp.28-29 apud DAY, 2001, p.85).
Nas observações de Day (2001) infelizmente parece ser essa a máxima que os diretores conseguem em seus esforços para promover culturas participativas em meio ao relacionamento pedagógico entre professores iniciantes.
O autor continua narrando que é visível a alegria, a vontade de ensinar e o entusiasmo que os professores iniciantes demonstram quando iniciam sua carreira, contudo quando os mesmo se deparam com as particularidades que envolvem o ambiente escolar, com as culturas vigentes na escola, esse entusiasmo sofre uma brusca ruptura e dá lugar ao que Barth (1996) nomeia como “a curva da aprendizagem já não existe...Parece que a vida na escola é tóxica[...]”
Sobre esse quadro de declínio da curva de aprendizagem Lacey (1977) apud Day (2001) “identificou três fases pelas quais o professor ‘principiante’ (no caso desta pesquisa usamos o termo iniciante) passa - a fase de ‘lua-de-mel’, de ‘crise’, de ‘fracasso’ ou de ‘ir andando’ (o que implica viver com a situação ou lutar pela sobrevivência)”.
Sobre essa última fase: O sentimento de sobrevivência‖ resulta do choque de realidade ou da confrontação inicial do professor com a complexidade da prática profissional (VEENMAN, 1984). Esse sentimento é decorrente do distanciamento entre a teoria socializada nos cursos de licenciatura e o dia-a-dia escolar marcado por dificuldades de relacionamento com alunos, com a direção, com pais e com colegas mais experientes; dificuldades na gestão de classe e no ensino de conhecimentos.
Em outro ponto de vista ao sentimento de sobrevivência, surge quase que ao mesmo tempo, os de descoberta e de entusiasmo inicial pela carreira. Esses sentimentos são resultantes do fato de se perceberem em situação de responsabilidade (ter a sua sala de aula, os seus alunos, o seu programa) e de sentir-se integrante de uma comunidade profissional (HUBERMAN, 1997).
Pacheco e Flores (1999, p.110) também afirmam que o início da carreira proporciona uma intensa fase de aprender a ensinar, a qual redefine e consolida a sua atuação na procura de um equilíbrio pessoal e profissional.
Desta forma, temos uma situação dotada de sentimentos fortes e significativos que influenciam a identificação com a profissão docente, as práticas pedagógicas e o próprio desenvolvimento profissional docente. Essas características iniciais da carreira apontam para a necessidade de apoios específicos ao professor iniciante e de realização de pesquisas sistematizadas sobre essa fase da carreira (PACHECO e FLORES, 1999).
Nessa direção, Marcelo Garcia (1999) afirma que os professores adquirem conhecimentos, habilidades e atitudes nesse período, mas pouco se sabe sobre suas ações educativas e sobre sua adaptação à profissão.
Marcelo Garcia (1999) ainda destaca que é preciso atender aos iniciantes não só como uma demanda social, mas também como uma exigência de justiça social visando assegurar o melhor ensino possível. E complementa, dizendo que se quisermos avançar na qualidade do ensino-aprendizagem e nos resultados escolares dos alunos, há de se repensar os princípios de desenvolvimento profissional, bem como os apoios e a promoção de bem-estar docente aos iniciantes.
Ainda sobre essa necessidade, Clandinim& Connely (2004) comentam que muitos docentes iniciantes mantêm um pensamento de que para ensinar deve-se ter como ponto de partida o seu conhecimento prático e pessoal.
O pressuposto metodológico
A escolha da pesquisa narrativa como método de pesquisa não seu por acaso, por sugestões de terceiros, por conhecimento da mesma e etc... Confesso que em primeiro momento achava que já conhecia essa metodologia, eu mesma dizia pelos corredores: “ pesquisa narrativa? É a mesma coisa que história oral. Isso é só ecletismo pedagógico”
Minha surpresa ao começar as leituras sobre a dinâmica deste tipo de pesquisa é que eu estava muito enganada e conforme fui lendo sobre como ela se constitui enquanto método, foi paixão a primeira vista!
Embora enquanto pesquisadora narrativa ainda esteja no prólogo do caminho, “encontrei na pesquisa narrativa uma possibilidade de construir saber com sabor, como sugere Rubens Alves.”( 1995). Sei o quanto me falta para compreender as inúmeras possibilidades que a pesquisa me proporciona, contudo percebo que com ela poderei percorrer caminhos nunca vivenciados e jamais imaginados, ouvir histórias e construir minha história a partir destas.
Após o término do mestrado e da leitura dos autores Clandinin & Connely (2011),tive a percepção de que ver o mundo de forma narrativa, perceber a escola, as relações que ocorrem no ambiente educativo e o cotidiano escolar como um “fenômeno narrativo”(IBID, idem), faz todo sentido e por conseguinte deve-se estudar essas categorias de forma narrativa.
[...] a vida - como ela é para nós e para os outros - é preenchida de fragmentos narrativos, decretados em momentos históricos de tempo e espaço, e refletidos e entendidos em termos de unidades narrativas [...].(IBID, idem)
Esse é o pensamento chave para nossas reflexões do objeto que se pretende pesquisar, porque à medida que pensamos sobre a “ concepção e gestação” que passa o professor iniciante em seu primeiro ano da escola, ou sobre como a liderança da equipe gestora é constituída nas relações com os professores iniciantes em particular, a sempre uma história, que está sempre mudando tendo em vista as diversas culturas da escola.
Em meio a tantos empecilhos, como: burocracia, frustrações, descréditos, angústias e etc... Apresentados tanto pelos docentes iniciantes quanto pela equipe gestora, pretendemos desenvolver este projeto de pesquisa sob a ótica metodológica da pesquisa narrativa tendo como conexão narrativa e vida.
Objetivando desta maneira a tentativa em compreender a experiência dos professores iniciantes e a liderança da equipe gestora nesse lugar ou série de lugares que se imbricam as narrativas, ou seja, nesse “meio do viver e do contar, do reviver e recontar, as histórias das experiências que compuseram as vidas das pessoas, em ambas as perspectivas: individual e social.”(CLANDININ E CONNELY, 2011)
Considerações preliminares
É uma pesquisa ainda em curso, mas a partir de algumas análises realizadas já conseguimos perceber o quão é deficitário o acompanhamento dos professores iniciantes em seus primeiros três anos de docência.
As causas elencadas são as mais diversas como: excesso de trabalho por parte da equipe gestora, ausência dos docentes nas reuniões pedagógicas devido a assistência em mais de uma unidade escolar, excesso de cobrança com os relatórios e diários eletrônicos, acúmulo de atividades de planejamento e etc..
É imprescindível que haja uma política de acompanhamento pedagógico junto a esses docentes tendo em vista que em sua maioria os mesmos acabem por aprendendo sozinhos com seus erros em sala de aula.
8- Referências Bibliográficas
CLANDININ, D. Jean & CONNELY, F. Michael. Pesquisa Narrativa: Experiência e História em Pesquisa Narrativa. Tradução: Grupo de Pesquisa Narrativa e Educação de Professores ILEEL/UFU. Uberlândia: EDUFU.2011
DAY, C. (2001) Desenvolvimento profissional de professores: o desafio da aprendizagem permanente. Porto – Portugal: Porto Editora.
HUBERMAN, M. (1997) O ciclo de vida profissional dos professores. In: NÓVOA, António (Org.). Vidas de Professores. Porto: Porto Editora, número 4. (Coleção Ciências da Educação).
MARCELO GARCÍA, C. (1999) Formação de Professores: para uma mudança educativa. Coleção Ciências da Educação: século XXI. Porto: Ed. Porto.
NÓVOA, A. Profissão Professor. 2ª ed. Porto: Porto Editora, 1999
PACHECO, J. A. e FLORES, M. A. (1999) Formação e avaliação de professores. Portugal: Porto, Porto Editora LDA, Coleção Escola e Saberes, n°16.
TARDIF, Maurice. (2002) Saberes docentes e formação profissional. Trad. Francisco Pereira. Petrópolis: Vozes.
VEENMAN, S. (1988) El proceso de llegar a ser profesor: un análisis de la formación inicial. In: VILLA, A. (coord.). Perspectivas y problemas de la función docente. Madrid. p. 39-68.
[1] Pesquisa em curso/texto preliminar de algumas análises realizadas
[2] Mestre em Educação pela Universidade Federal de Mato Grosso
[3] Pós-graduanda das Faculdades Integradas de Diamantino/MT