A PALAVRA PRONUNCIADA E SEUS REFLEXOS...

Por ZILMAR WOLNEY AIRES FILHO | 27/04/2017 | Religião

A PALAVRA PRONUNCIADA E SEUS REFLEXOS: numa perspectiva de que:
“não é aquilo que entra na boca que macula o homem, mas o que sai daquela” 

*Zilmar Wolney Aires Filho 

As palavras ditas e a sensatez do silêncio, em inúmeras circunstâncias, produzirão incontáveis reflexões, pela força do que podem produzir e alterar no meio. Impende ilustrar, neste contexto, que o advogado e líder espiritual indiano, Mahatma Gandhi, por meio apenas da diplomacia do diálogo, com verbo sensato, superou um conflito de mais de 100 (cem) anos entre a Índia e o Reino Unido, sem louvar-se de uma arma. Madre Teresa de Calcutá pondera, de outro lado, que o silêncio do trabalho produzido pelas mãos supera a voz dos lábios que emitem orações. Resta, portanto, compreensível a lição do filósofo americano William James, quando joeirou que: “o exercício do silêncio é tão importante quanto a prática da palavra.
O ato de detectar pessoas mudas ou gagas, num primeiro momento, pode trazer espanto e incompreensão para muitos. Quando se busca respostas sobre tais circunstâncias, recorre-se à principiologia espiritual de causa e efeito, ou nos convencedores ensinamentos das causas atuais e anteriores das aflições terrenas. Pode-se obter como resposta, numa primeira reflexão, que a origem das deficiências na fala situa-se nos erros ou excessos desta encarnação. Cite-se, à guisa de ilustração, que não é raro encontrar pessoas, que num cotidiano excedem nos gritos, consumo de cigarros, e bebidas alcoólicas, amiúde geladas. Essas práticas geram sequelas iniciais de um pigarro, tosses contínuas, desgastes nas cordas vogais, e em inúmeros casos, apresentam um resultado final de linfoma na garganta.

Noutras circunstâncias, as causas de uma mudez ou gagueira podem ser oriundas de vidas pretéritas, conforme nos ensina a doutrina espírita nas causas anteriores das aflições terrenas. Elas poderão residir em causas de resgate ou expiação pelo mau uso da fala, em vidas passadas. Essas limitações fônicas, também, podem se dar em decorrência de uma escolha de prova e expiação feita pelo espírito, durante a engenharia do seu projeto reencarnatório, para evitar reincidência em velhos erros nos excessos da fala, a exemplo do espírito Ricardo em Nosso Lar.

Nesta seara de emissão da voz, cabe refletir que muitas pessoas, antes de se articularem por meio das palavras orais, deveriam ponderar os reflexos gerados por essas, para si e para terceiros, mormente para, após, não se louvarem do álibi injustificável de que o verbo torto se deu num minuto impensado. Nesse sentido, ensina o jargão popular: “Deve-se pensar duas vezes antes de falar e dez vezes antes de escrever.” Os ensinamentos cristãos nos advertem acerca da irreversibilidade dos atos de maledicência. A cultura chinesa, neste particular, continua ofertando lições gratuitas, quando leciona que: “há três coisas que não voltam: a palavra dita; a oportunidade perdida, e a flecha lançada do arco.”
Quando se observa os efeitos produzidos pelas palavras, sobretudo a repercussão sentimental dessas nas pessoas, torna-se fácil compreender aquilo que muitas crianças proclamam durante a educação infantil: “prefiro palmadas a receber um sermão do meu pai ou da minha mãe.” Em que pese a necessária observância à Legislação menorista (art. 18-A, da Lei nº13.010 de 26.06.2014)1 e, de outro lado, a lição irretocável de Pitágoras, que recomendou: “eduque as crianças, para que não seja necessário punir os adultos.” Reconhece-se, não obstante, que as palavras, em diversas circunstâncias, castigam mais que a reprimenda física, na medida em que aquelas se prolongam no tempo com seus efeitos psicológicos. Impende refletir que a repercussão do verbo mal utilizado pode durar por um lapso temporal duradouro. Pessoas, vítimas de calúnias, injúrias, difamações, comumente, não superam, com facilidade, as consequências pessoais dessas ações. Elas carregam ressentimentos por longos anos.

Nas atuais relações sociais, induvidosamente, as principais ferramentas de trabalho do homem cingem-se a fala e a escrita. As plagas populares já nos tem lecionado: “quem tem boca vai a Roma.” O filósofo Voltaire do iluminismo francês nos ensinava acerca da importância de se garantir o direito de expressão pela voz, quando afirmava: “posso não concordar com nenhuma das palavras que disseres, mas assegurarei até a morte, o direito de dizê-las.” Neste sentido, caminha a Constituição Federal de 1988, assegurando a liberdade de manifestação do pensamento, sendo vedado, todavia, o anonimato. (art. 5º, IV, da CF-88).2

Insta salientar, porém, que é necessário aprender a distinguir o joio do trigo, nesta seara das palavras ditas. Sabe-se, pois, que nem toda palavra verbalizada carrega consigo o seu sentido real. Esses vocábulos pronunciados podem ocultar interesses escusos ou intenções pouco ortodoxas, e de modo mais grave, iludir, massificar, e induzir pessoas aos erros. Os falsos profetas, os oradores eloquentes nas antigas sinagogas, e hoje em inúmeros templos religiosos, utilizam a arte de iludir com boas palavras, como ontem faziam os sofistas na Grécia. O Cristo, felizmente, nos ensinou desmistificá-los: “conhecereis os verdadeiros professas pelos seus gestos, palavras, e ações.” (Mateus, VII: 15-20).

Das sagradas escrituras, colhe-se lições importantes acerca do exercício do verbo e suas conseqüências. O decálogo divino nos adverte contra os falsos testemunhos. Das páginas do evangelho, vem a lição de que: “não é o que entra pela boca que macula do homem, mas o que sai daquela.” Observa-se, em decorrência, o sábio clamor, para que: “não julgueis o vosso próximo, para não serdes julgados com a mesma severidade.” Atesta-se, infelizmente, que calúnias, injúrias, difamações, enfim, maledicências, continuam sendo uma constante nas relações sociais com efeitos desastrosos. Reconhece-se, por isso, que a Síndrome da mulher de Potifar, de priscas eras, não castigou apenas José, na medida em que a sua prática constitui uma realidade em nossos dias.

As pessoas comumente buscam alcançar a harmonia em seus lares, como local sagrado para o descanso, recomposição e reencontro com os familiares. Aludidos humanos, não obstante, invariavelmente proferem gritos, berros, xingamentos, que rompem com o sossego e equilíbrio. A física quântica, neste particular, tem demonstrado acerca dos efeitos gerados pela voz e sonoridade em relação às moléculas da água e outros corpos. Cite-se, à guisa de ilustração, a sonoridade produzida pela música clássica de Mozart, que mantém a perfeita harmonia das moléculas nas águas. As mesmas moléculas, de outro lado, agora, expostas ao barulho de um rock ou do grito de Adolf Hitler desarmonizam-se totalmente.

No mundo e vida da pressa e estresse, que muitos vivenciam, o verbo pronunciado, em forma de grito e histeria, tem sido uma constante desarmonizando o convívio e tudo que antes encontrava-se em harmonia. Cabe lembrar, a título de reflexão, que: “o barulho de um beijo, nem de longe se equipara ao de um canhão, mas o eco daquele continua durando muito mais.” (Oliver Wendell Holmes).

Insta salientar que em algumas ocasiões, haverão excludentes para os gritos. Cite-se, pois, a dor insuportável; o bebê que ainda não aprendeu a falar e chora exaustivamente por sua mãe; o grito de clemência da vítima ao verdugo contra o castigo e a violência; dentre outros, enfim, o desabafo pela vitória perseguida: passei!

O grito e o berro, na maioria das circunstâncias, salvo honrosas exceções, representam a voz que perdeu a razão e a eloquência. O grito não convence, antes irrita e revela desespero. Se pudessem ser gravados os momentos de fúria, agressão, xingamentos, de cada pessoa, para que essas, depois pudessem visualizá-los no espelho refletido, certamente não acreditariam que tudo aquilo foi fruto de suas autorias. Na imagem refletiva pelos vídeos estaria o monstro, e do outro lado, o remorso e arrependimento daquilo que restou de um humano em estágio de reerguimento moral, se possível for.

Assimila-se, enfim, que comumente as explosões e gritos são direcionadas às pessoas mais próximas, de maior estima e afeto, porque essas são capazes de suportar esse lado animalesco, brutal, externando mais uma compreensão e tolerância. Exalte-se, todavia, que pode chegar um momento, em que aquelas poderão cansar de emitir um perdão. O Rabino da Galiléia dizia: “até mesmo os criminosos devem ser perdoados, contudo, desde que demonstrem vontade de acerto, e ausência de reiteração nessas condutas.” (Cap. IV, Caridade para com os Criminosos, E.S.)
Teorias materialistas modernas recomendam que as pessoas, no propósito de libertarem do estresse, cansaço, devam gritar, dar socos e chutar, a fim de se libertarem de suas angústias. Ora, é como se víssemos uma comparação retrógrada do homem ao seu tempo de duelo, onde na busca da sua paz interior, tivesse que fazer antes uma guerra consigo mesmo e com as pessoas. Registre-se que até mesmo os animais, a exemplo dos cães, quando se perfilham em estado angustiante, costumam se afugentar para local distante e ermo, na busca da recuperação, ou para o último repouso.

No cotidiano, depara-se com tiranos domésticos, que apesar de ostentarem na sociedade o ar de bom moço, mas apenas ao ultrapassarem o portal de suas residências, esbravejam xingando a tudo e a todos, pela insatisfação da comida, da esposa, da arrumação da casa. Se esquecem, todavia, que no mesmo passo em que podem ser temidos e respeitados, também serão odiados. (Cap. I. A Afabilidade e a Doçura, E.S).

A força do verbo nas atuais relações sociais é motivo de incontáveis discussões. Observa-se, em muitos, a eloqüência nos discursos, recheados de dialética e retórica. Noutros, o dom da oratória vindo de berço. Questiona-se, outrossim, de que modo e com que propósitos essas falas e discursos têm sido utilizados. Vê-se, portanto multidões sendo arrastadas pelo impressionismo de uma lábia, que os convençam, por exemplo, para um consumo desregrado. Atesta-se outras pessoas que são atraídas por falsos profetas a templos suntuosos, para deixarem dízimos que comprometem as suas subsistências.

Lastima-se pela enormidade de falas, verbos, discursos, que sob o manto Divino, foram articulados, para promover seus artífices ou ocultar suas ações criminosas. Jesus já advertia acerca dos falsos profetas, no contexto da verdadeira pureza e mãos não lavadas, citando os Escribas e Fariseus, que traziam o nome do Cristo tão próximo dos lábios, no mesmo passo em que também o distanciavam dos seus corações. (Matheus, XV: 1-20). Asseverava, enfim, o Rabino da Galiléia: “são sepulcros caiados for fora, mas cheios por dentro de podridão.”

A prática da maledicência na sociedade moderna tornou-se lugar comum. Verifica-se de inúmeros sítios, jornais, revistas, grande espaço dedicado aos articuladores de futricas, fuxicos, e fofocas, com a finalidade de trazer notoriedade aos erros, equívocos, e condutas indesejadas das pessoas. Os ensinamentos que se recebe da doutrina espírita, neste particular, antes de denotarem uma postura condescendente, firmam-se nos pilares da indulgência, tolerância, e perdão.

Cabe realçar que as dores e angústias que são plantadas no curso de um projeto encarnatório, estão aí para serem superadas, com resignação, e mansuetude. Aliás, a Lei das boas aventuranças, como insuperável legado cristão, segundo Mahatma Gandhi, exalta que: “bem-aventurados continuam sendo os mansos e pacíficos, pois que eles herdarão a terra.”

Ouve-se, constantemente, nas plagas populares que: “o silêncio, às vezes, fala mais alto que inúmeras palavras.” Nesta perspectiva, vê-se as leis humanas assegurarem ao réu, o direito de silenciar-se no seu interrogatório (art. 5º, inciso LXIII, da Constituição Federal de 1988),3 ou o direito das partes não produzirem provas contra si mesmas. (art. 379, do CPC de 2015).4 Impende esclarecer, todavia, que referido silêncio pode ser interpretado contra o seu articulador. Ressalte-se, enfim, que médicos, advogados, ministros de confissão religiosa, devem guardar sigilo das informações, que receberam em função de suas profissões, salvo nas ações de estado e família, ou quando forem autorizados para tal. (art. 388, II, e parágrafo único,
do CPC de 2015).5

O líder negro americano, Martin Luter King, em seu discurso ontológico chamava a atenção do mundo e pessoas acerca da neutralidade e indiferença às boas ações, quando pontuou: “[...] não é o grito dos maus que me incomoda, mas o silêncio e omissão dos bons. [...]” Espera-se, por isso, seja articulada a caridade moral por meio da palavra amiga, de conforto, de apoio, e de reerguimento moral. A omissão nesta prática exsurge incompreensível diante das irretocáveis lições de que: “a fé sem obras é morta” (Tiago 2:14-16), e “fora da caridade não há salvação” (Alan Kardec).

Os excessos e abusos no uso da fala poderão trazer, ainda nesta encarnação, ou numa próxima, humanos mudos ou gagos, a título de resgate nos desequilíbrios da articulação verbal. Felizmente, muitos adeptos da doutrina espírita já podem compreender essa lição. Outros tantos ainda não assimilaram essa inexorável lei de resgate, e por isso não se acautelaram no uso do verbo, que apesar de ser o aguilhão da liberdade de expressão, ensina a todos que a liberdade de cada um, termina exatamente onde começa a liberdade do seu próximo. (Herbert Spencer).

 


* ZILMAR WOLNEY AIRES FILHO. É advogado e professor universitário pós-graduado em Direito Processual Civil. Mestre em Direito Civil. Membro da União Literária de Anápolis-ULA e da Academia de Letras Brasileira de Anápolis-ALBA. Integra o quadro docente da Faculdade FIBRA em Anápolis-GO.