A OMISSÃO DO LEGISLADOR EM FACE DA PEDOFILIA VIRTUAL: Esquecimento ou descaso

Por Lorena Carvalho Moraes | 09/09/2013 | Direito

A OMISSÃO DO LEGISLADOR EM FACE DA PEDOFILIA VIRTUAL: esquecimento ou descaso[1].

 

Anna Marcelle Cunha Sousa[2]

Lorena Carvalho Moraes[3]

Maria do Socorro Almeida de Carvalho[4]

 

RESUMO

O presente trabalho tratará sobre a omissão do legislador quando da produção de normas que criminalizem os crimes praticados virtualmente, no caso será restringido ao de pedofilia, ora analisando da perspectiva de ser uma doença ora como crime, que é quando parte para a exteriorização das vontades. Tem-se então que é da manifestação da vontade, da ação de atrair pessoas - as quais não alcançaram a maioridade e, juridicamente falando, o discernimento – virtualmente para satisfação da libido que ocorre o “crime” o qual não encontra-se tipificado em nosso ordenamento.

 

Palavras – chaves: Direito Informático. Direito Penal. Pedofilia Virtual.

 

1 INTRODUÇÃO

 

Os crimes praticados virtualmente são novidades, surgiram juntamente com o crescimento e proliferação da tecnologia ao passo que esta ficou mais acessível  a sociedade. Não se pode deixar de observar que a informática trouxe muitas coisas boas e ruins, como é o caso da velocidade que as informações se disseminam e isso dependendo do conteúdo poderá ser maléfica ou não.

O direito por sua vez deve evoluir lado a lado com a sociedade para que consiga suprir os anseios desta e com o direito informático não seria diferente, é nesse sentido que se fará uma análise desse direto correlacionando-o com o direito penal, falando sobre suas implicações e se há essa relação, tendo em vista se há ausência do legislado em proferir enunciados normativos os quais façam referência a ações incompatíveis com as normas de moral e conduta da sociedade. Em um segundo momento será tratado da pratica da pedofilia virtual, analisando de quando que isso deixa de ser uma doença e passar a ser crime, como ele é tratado pela doutrina e pelo Estado, mais especificamente o legislador.

 

 

2 ANÁLISE GERAL DO DIREITO INFORMÁTICO E SUA INFLUÊNCIA NO DIREITO PENAL

Antes de adentrarmos na omissão do legislador em crimes informáticos, é necessário ressaltar a influência do Direito de Informática e suas implicações na sociedade brasileira como forma de proteção para as situações dela derivadas, tais como direito à privacidade que é um mandamento constitucional, proteção nas relações civis como é o caso de contrato de compra e venda virtual, e precipuamente os desafios de tipificação de crimes da nova era da informação.

Assim, diante de tais argumentos, vivemos em uma “sociedade da informação”, isto é, “era digital” que proporcionam a velocidade de informações, a celeridade das decisões judiciais, dentre outros. Essa sociedade tem sua função precípua de “possibilitar a circulação de informações pelo planeta em tempo real, bem como a tomada de decisões com agilidade e confiabilidade. Esta velocidade impulsiona transformações, que ocorrem mais rapidamente do que nossa habilidade em assimilá-las” (BENUCCI, 2005, p.44).

Deste modo, observamos que o direito informático age de forma interligada com os outros ramos do direito. A doutrina o conceitua “como um conjunto legislativo e doutrinário que visa estudar, em conjunto com os demais ramos do Direito, as relações havidas através dos canais de informação obtidos por meio digital” (ALMEIDA FILHO, 2005, p.82). Assim, é perceptível que o direito penal também faça parte, no sentido de que a sociedade é dinâmica e que o mesmo deve acompanhar as mudanças sociais.

Conforme sabemos, o crime é um fato típico, antijurídico e culpável. Em analogia aos crimes informáticos tem como definição a “ação típica, antijurídica e culpável cometida contra ou pela utilização de processamento automático de dados ou sua transmissão” (TRUZZI; DAOUN, 2007, p.116).  

Essa classificação do crime tem estreita correlação aos princípios da legalidade e taxatividade. O primeiro assenta-se que o “seu fundamento político radica principalmente na função da liberdade do cidadão ante a intervenção estatal arbitrária, por meio da realização da certeza do direito” (PRADO, 2010, p.141). Já o segundo “significa que as condutas típicas, merecedoras de punição, devem ser suficientemente claras e bem elaboradas, de modo a não deixar dúvida, em relação ao cumprimento, por parte do destinatário da norma” (NUCCI, 2010, p.48).

Deste modo o legislativo federal que tem competência para editar leis de aplicação nacional, não pode se omitir quanto às mudanças sociais e com estas vem surgindo novas modalidades de condutas criminosas que necessitam de legislação, posto que “além de ampliar o campo delitivo nos injustos penais clássicos, cria novos modos delitivos, como a utilização abusiva da informação armazenada, violação de segurança da informação, que seriam os crimes praticados contra os computadores e sistemas” (COURI, 2009, p.06).

De acordo com tais princípios, só existe crime quando estiver tipificado pela lei penal ou em leis extravagantes de matéria penal. Desta forma, a tipificação também serve de freio contra o Estado-Juiz na aplicação do jus puniendi, como garantia constitucional. Assim, a crítica se faz no sentido de que a ausência de legislação para crimes informáticos torna vulnerável a proteção da vítima e do bem jurídico ainda não tutelado. Em relação ao bem jurídico sabemos que “cada tipo penal tem o condão de proteger determinado bem jurídico. O legislador ao elaborar o tipo penal o constrói a partir de modelos reais de comportamento para os quais atribui um valor” (PINHEIRO, 2006, p.25).

É nesse paralelo que a ausência dos tipos penais não só dificulta a persecução penal, como também a aplicação de penas para os autores do cometimento do delito na seara virtual. É necessário ressaltar que a falta de legislação também dificulta a produção probatória eficiente, materializada no inquérito policial, conforme do art. 5° do CPP “tem por fim a apuração das infrações penais e de sua autoria”. A dificuldade de se coletar provas de onde partiu a conduta delituosa do computador ainda tem-se o receio de “que muitos hesitam em aceitar juridicamente, alegando que são altamente adulteráveis” (COURI, 2009, p.20) dando o ensejo ao aumento da criminalidade e ao mesmo tempo um sentimento de impunidade.

Portanto, o legislador não pode ser omisso às mudanças sociais e com estas vêm surgimento de novas facetas do crime, tendo-se também a necessidade de proteção de novos bens jurídicos. Assim, diante da correlação dada entre o direito informático e penal, passaremos ao do enfoque do problema, a omissão do legislador em face da pedofilia virtual.

3 O ESQUECIMENTO OU DESCASO DO LEGISLADOR EM FACE DA PEDOFILIA VIRTUAL 

 

Como já outrora falado, a tecnologia possibilitou a velocidade das informações e redes de acesso e com essa facilidade deu azo a novas formas de cometimento de crimes. Neste momento, partiremos para a discussão a omissão do legislador em face da pedofilia virtual. Antes de mais nada, devemos esclarecer que pedofilia não é crime, uma vez que não está tipificada como crime, mas “um grave desvio e, portanto, algo que leva o indivíduo a atitudes fora dos padrões de normalidades, podendo, inclusive, chegar a estados de semi ou inimputabilidade.” (SYDOW, 2009, p. 47), mas a sua conduta exteriorizada. “A legislação brasileira em si não possui nenhum dispositivo que traga como típica a conduta de desejo forte e repetido, nem de fantasias sexuais com crianças, mas tão somente outras figuras que guardam relação com tais desejos” (SYDOW, 2009, p. 48).

Deste modo, os crimes, cometidos por pedófilos contra crianças e adolescentes, cresceram vertiginosamente, em sites de relacionamento, aproveitando-se da inocência com o fim de corrompê-los, enganá-los de diversos modos. Assim, não há uma legislação eficiente na punição do cometimento desses crimes, o Estado-Juiz deve buscar, por analogia, leis comuns que fazem correlação aos crimes. O autor SYDOW critica a lei 11.829/08 que alterou os artigos do ECA de forma não eficaz deixando lacunas de forma a dificultar a punição dos responsáveis pelo vasto serviços de internet que são oferecidos. Eis o que diz:

Sabe-se que os serviços em questão são amplíssimos; dessarte, a forma como a legislação se estabeleceu – e incluamos o tipo de assegurar o acesso à rede no mesmo sentido– leva a uma situação de difícil punição, tendo-se em vista que fica praticamente impossível a demonstração fática de que um serviço de hospedagem ou um web café tiveram o dolo, ainda que eventual, de desviarem-se de seus propósitos comerciais regulares para prestarem serviço à perversão sexual. (SYDOW, 2009, p. 51)

Outro ponto a ser destacado é o do anonimato que facilita a ação dos criminosos que se utilizam a inocência de crianças ou de adolescentes para cometer delitos. A crítica se faz no intuito de que mesmo havendo uma legislação rigorosa, não há aparato efetivo de pessoas preparadas no combate a esse tipo de crime, como é o caso de que “policiais admitem a existência de grandes obstáculos para capturar os criminosos e, principalmente, para detectá-los, pois praticantes de tais atos são acobertados pelo anonimato e os criminosos podem agir 24 horas por dia” (ANGELUCI, 2007, p.4).

É nesse sentido que a ausência ou ineficácia de legislação em crimes informáticos facilita a pedofilia que age em diversas facetas, para satisfazer os desejos sexuais através de imagens, desenhos como forma de armadilha a atrair crianças ou adolescentes que estão em fase de desenvolvimento psíquico que pode causar danos imensuráveis. Devemos mencionar neste trabalho o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Este diferencia criança e adolescente em seu artigo 2°: “Considera-se criança, para efeitos desta Lei, a pessoa até os doze anos de idade incompletos, e adolescente aquela entre os doze e dezoito anos de idade”.

Para o ECA, “a proteção à criança e ao adolescente decorre de um reconhecimento, por parte do Estado, de vulnerabilidade daqueles que ainda não atingiram a maioridade. Por ainda estarem em fase de crescimento e formação, devem receber proteção especial” (RODRIGUES, 2009, p.16). Assim, a ausência de leis informáticas torna vulnerável a proteção por parte do Estado e aqui também devemos pontuar o papel da família que deve está atenta, quando os filhos menores estão na frente de um computador e ajudar em forma de denúncia, caso venha a ocorrer tal pratica.

Deste modo, como poderemos provar que determinado pedófilo (autoria) cometeu o delito? As entraves são enormes, uma vez que, protegido pelo anonimato, o autor produz novos modos de não ser punido por conta do progresso tecnológico. Isto se torna um perigo, na medida em que “o mesmo desenvolvimento poderá oportunizar ao autor do delito estudado outras formas de ocultar a autoria ou mesmo mascará-la, bem como dificultar a comprovação da materialidade” (GODOY, 2008, p.65).

Entendemos que o direito penal proíbe pelos princípios da legalidade e da taxatividade como outrora citado que o Estado só pode punir como crime condutas tipificadas em nome da segurança jurídica. Assim, “não resta dúvida de que a internet é um veículo de comunicação apto a tornar público o conteúdo pedófilo das fotos encontradas, o que já é suficiente para demonstrar a tipicidade da conduta” (GODOY, 2008, p.30). Conforme esse raciocínio, não podemos aceitar, uma vez que tais princípios vedam a atuação estatal quando vão de encontro ao regime democrático.

Assim, diante da dificuldade de provar o crime informático, o governo deve estudar de que modo atuará de modo eficiente na proteção de novos bens jurídicos e não se omitir para os problemas trazidos por conta do avanço tecnológico.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

De acordo com o que fora exposto é possível se dizer que o direito penal deve ter uma relação bastante próxima com o direito de informática e com as ações praticadas nele, proximidade esta que não corresponde somente à punição, mas a prevenção também. É nesse sentido que se almeja por iniciativas mais firmes e menos lacônicas por parte do Poder legislativo.

Diante disso tem-se com relação à pedofilia virtual deve ser combatida, com já foi supracitado havendo uma campanha de prevenção mais incisiva, porém não deixando de constar punição prevista e taxativa, vez que é preciso que se respeite o princípio da taxatividade e in dubio pro réu ao cogitar a possibilidade do uso de analogia. 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

REFERÊNCIAS

ALMEIDA FILHO, José Carlos de Araújo. Direito da Informática. In:___. ALMEIDA FILHO, José Carlos de Araújo; CASTRO, Aldemario Araújo. Manual de informática jurídica e direito da informática.1.ed.Rio de Janeiro, 2005.

ANGELUCI, Regiane Alonso et al. Sociedade da informação: o mundo virtual second life e os crimes cibernéticos. Disponível em: <http://www.icofcs.org/2007/ICoFCS2007-pp07.pdf>. Acesso em: 25 out. 2011.

BENUCCI, Renato Luís. A tecnologia da informação a serviço da agilidade na prestação jurisdicional. Caderno de doutrina e jurisprudência da Escola da Magistratura da 15ª Região, Campinas, v. 1, n. 2, p.44, mar./abr. 2005. Disponível em: <http://bdjur.stj.jus.br/xmlui/bitstream/handle/2011/22618/tecnologia_informacao.pdf?sequence=1>. Acesso em: 25 out. 2011.

COURI, Gustavo Fuscaldo. Crimes pela internet. Disponível em: <http://www.emerj.tjrj.jus.br/paginas/trabalhos_conclusao/2semestre2009/trabalhos_22009/GustavoFuscaldoCouri.pdf>. Acesso em: 25 out. 2011.

GODOY, Evandro da Silva. Aspectos destacados da pedofilia em redes sociais na internet. Disponível em: <http://portal2.unisul.br/content/navitacontent_/userFiles/File/cursos/cursos_graduacao/Direito_Tubarao/monografias/Evandro_da_Silva_Gogoy.pdf>. Acesso em: 25 out. 2011.

NUCCI, Guilherme de Souza. Da aplicação da lei penal. In:___. Código penal comentado. 10.ed.rev.atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010.

PINHEIRO, Emeline Piva. Crimes virtuais: uma análise da criminalidade informática e da resposta estatal. Disponível em: <http://www3.pucrs.br/pucrs/files/uni/poa/direito/graduacao/tcc/tcc2/trabalhos2006_1/emeline.pdf>. Acesso em: 25 out. 2011.

PRADO, Luiz Regis. Princípios fundamentais do direito penal. In:___. Curso de direito penal brasileiro: parte geral. 9. ed. rev. Atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010.

RODRIGEUS, Débora Alcântara. A lei 12015/09 e a proteção ao vulnerável. Disponível em: <http://www.bdjur.tjce.jus.br>. Acesso em: 25 out. 2011.

SYDOW, Spencer Toth. “Pedofilia virtual” e considerações críticas sobre a lei 11.829/08, Revista Liberdades, n° 1, mai./ago, 2009. Disponível em: <http://www.direitocriminal.com.br/site/revistaLiberdades/_pdf/01/integra.pdf#page=46>. Acesso em: 25 out. 2011.

TRUZZI, Gisele; DAOUN, Alexandre. Crimes informáticos: o direito penal na era da informação. Disponível em: <http://www.icofcs.org/2007/ICoFCS2007-pp17.pdf>. Acesso em: 25 out.2011.



[1] Paper apresentado à disciplina de Direito Penal Especial III da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco – UNDB.

[2] Aluna de direito° da UNDB

[3] Aluna de direito° da UNDB

[4] Professora, orientadora.

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