A MULTIMODALIDADE NOS QUADRINHOS E SUA CONTRIBUIÇÃO PARA O PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM

Por Talita Santos Menezes | 30/08/2013 | Educação

A MULTIMODALIDADE NOS QUADRINHOS E SUA CONTRIBUIÇÃO PARA O PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM 

Talita Santos Menezes[1] 

RESUMO

É sabido que a multimodalidade tem sido marcante nas produções textuais da atualidade, inclusive no contexto escolar, e isso pode ser visto como reflexo da preferência textual dos sujeitos desta época. Nesse contexto, para um processo de ensino-aprendizagem realmente significativo, o uso de gêneros multimodais em sala de aula torna-se primordial e, nesse sentido, as Histórias em Quadrinhos ainda são um dos principais gêneros representantes da multimodalidade. Seu uso pode certamente contribuir para uma prática docente relevante e uma aprendizagem que desperte interesse entre os alunos. O presente trabalho tem, portanto, como objetivo principal compreender como um texto multimodal – nesse caso, os quadrinhos – pode contribuir no processo de ensino-aprendizagem de língua portuguesa. Através da revisão de obras que discorram acerca da temática em questão, pretendemos evidenciar o quanto a multimodalidade permeia as produções textuais na atualidade e, pelo fato de tais produções estarem presentes também no ambiente escolar, como essas produções tornam-se importantes auxiliares no processo de ensino-aprendizagem de língua portuguesa.

PALAVRAS-CHAVE: Multimodalidade. História em quadrinhos. Ensino-aprendizagem.

RESUMEM

Es sabido que la multimodalidad  ha sido sobresaliente en las producciones textuales de la actualidad, incluso en el contexto escolar, y eso puede ser visto como reflejo de la preferencia textual de los sujetos de esta época. En ese contexto, para un proceso de enseñanza-aprendizaje realmente significativo, el uso de géneros multimodales en aula de clase se vuelve primordial y, en ese sentido, las Historietas aún son uno de los  principales géneros representantes de la multimodalidad. Su uso puede, por supuesto, contribuir para una práctica docente relevante y un aprendizaje que despierte interés entre los alumnos. El presente trabajo, tiene, por lo tanto, como objetivo principal comprender como un texto multimodal – en ese caso, las historietas – puede contribuir en el proceso de enseñanza-aprendizaje de lengua portuguesa. A  través de la revisión de obras que discurran acerca de la temática en cuestión, pretendemos evidenciar lo cuanto la multimodalidad permea las producciones textuales en la actualidad y, por el hecho de que tales producciones estén presentes también en el ambiente escolar, como esas producciones se vuelven importantes auxiliares en el proceso de enseñanza-aprendizaje de lengua portuguesa.

PALABRAS CLAVE: Multimodalidad. Historietas. Enseñanza-aprendizaje.

1 INTRODUÇÃO

Toda e qualquer modificação ocorrida na sociedade, inevitavelmente, será refletida na produção textual dos indivíduos. O aumento da preferência por textos multimodais tem sido notório na sociedade atual e isso afeta e/ou influencia, entre outras instâncias, o ambiente escolar. Se os alunos têm preferência por textos/gêneros multimodais, nada melhor que o professor fazer uso de tais textos/gêneros com o intuito de tornar o processo de ensino-aprendizagem mais produtivo e significativo.

Nesse contexto, entre tantos outros gêneros, as Histórias em Quadrinhos estão entre os principais representantes da multimodalidade no contexto escolar, contribuindo, assim, significativamente ao estudo e ensino de língua portuguesa, já que tal disciplina é vista pelos alunos, em muitos momentos, como sendo de difícil compreensão e estudada (por muitos alunos) apenas por obrigação.

O objetivo deste trabalho é compreender como um texto multimodal – nesse caso, os quadrinhos – pode contribuir para o processo de ensino-aprendizagem de língua portuguesa, bem como identificar os aspectos multimodais das Histórias em Quadrinhos e listar possíveis sugestões de trabalho com os quadrinhos em sala de aula, justificando a relevância da temática por seu efetivo auxílio na prática docente.

Através da revisão de obras que discorram acerca da temática em questão, pretendemos evidenciar o quanto a multimodalidade permeia as produções textuais na atualidade e, pelo fato de tais produções estarem presentes também no ambiente escolar, como essas produções tornam-se importantes auxiliares no processo de ensino-aprendizagem de língua portuguesa.

2 TEXTO E ENSINO

Sabe-se que, de forma geral, o texto tem sido tomado como a unidade básica de ensino de língua portuguesa e, embora ainda seja amplamente utilizado apenas como pretexto para o tratamento de questões gramaticais, seu uso tem também contribuído para o aprimoramento – por parte dos alunos – das práticas de leitura e produção textual, bem como para a reflexão sobre o funcionamento da língua nas diversas situações comunicativas, para aprendizagem dos recursos que a língua lhes oferece para a construção do sentido, na compreensão da adequação dos textos em cada situação cotidiana, além do conhecimento da diversidade dos gêneros e tipos textuais.

Tendo a sua disposição uma multiplicidade de códigos e inúmeras possibilidades de uso destes códigos, o aluno fará escolhas significativas pelo uso da forma mais adequada à produção do sentido, visando a um objetivo final. Nesse processo, o aluno fará uso de conhecimentos linguísticos, enciclopédicos, interacionais, enfim, um conjunto de artifícios que contribuam para o alcance de seu objetivo.

Koch (2003), ao falar sobre a Linguística Textual – ciência que tem o texto como principal objeto de estudo, considerando também todos os processos linguísticos, cognitivos e sociais envolvidos em sua organização, produção, compreensão e funcionamento – mostra como essa ciência pode contribuir para o trabalho do professor de língua portuguesa. Para a autora, a principal contribuição dessa ciência é

dotar o professor de um instrumental teórico e prático adequado para o desenvolvimento da competência textual dos alunos, o que significa torná-los aptos a interagir socialmente por meio de textos dos mais variados gêneros, nas mais diversas situações de interação social. (KOCH, 2003, p. 2)

Nesse sentido, o trabalho do professor de língua portuguesa, na busca pelo desenvolvimento dessa “competência textual” do aluno, será voltado para o uso social da língua, ou seja, na forma em que ela é usada no dia a dia desse aluno – mostrando o uso da norma culta, sem contudo, desprezar a variedade que tal aluno possa utilizar – e isso evidenciará a necessidade do estudo de aspectos comunicativos e também gramaticais.

Ou seja, o texto é que vai conduzindo nossa análise e em função dele é que vamos recorrendo às determinações gramaticais, aos sentidos das palavras, ao conhecimento que temos da experiência, enfim. [...] Assim, é nas questões de produção e compreensão de textos, e de suas funções sociais, que se deve centrar o estudo relevante e produtivo da língua. (ANTUNES, 2003, pp, 110,111)

Diante dessa concepção de ensino de língua que leva em consideração o texto em suas funções sociais é óbvio que, se a sociedade sofre constantes mudanças, tais mudanças, consequentemente, serão refletidas nas produções textuais que circulam por essa sociedade. Tendo em vista esse pressuposto, o professor precisa considerar que o avanço tecnológico e as mudanças sociais, culturais e ideológicas serão, inevitavelmente, refletidas nos textos de seus alunos e ele precisará estar apto a não só receber e analisar tais textos sem fazer julgamentos preconceituosos, mas também passar a trabalhar a constituição e características desses textos em sala de aula. Tal trabalho certamente fará com que o processo de ensino-aprendizagem seja relevante e produtivo, pois se trata de algo que faz parte do dia a dia do aluno. Com isso, o professor ganha a atenção de seus alunos e desperta o interesse dos tais pelo conteúdo ministrado, além de fazê-los refletir e posicionar-se criticamente acerca da criação e preferência por determinados gêneros textuais que mais se enquadram e/ou refletem a realidade em que vivem.

Nesse contexto, voltando o olhar para a sociedade atual e para os textos que circulam em seus espaços, pode-se perceber que a multimodalidade tem crescido cada dia mais como principal aspecto constituinte das produções textuais dos indivíduos.

3 MULTIMODALIDADE COMO PREFERÊNCIA TEXTUAL COMTEMPORÂNEA

Num mundo cada dia mais globalizado, onde as fronteiras nacionais têm sido diminuídas no campo econômico, político e cultural, e diante dos diversos avanços e recursos tecnológicos que estão à disposição dos indivíduos – com inúmeras ferramentas de edição textual e ambientes multidimensionais – pode-se perceber que, nas produções textuais realizadas e compartilhadas, os textos multimodais aparecem como preferência em grande parte dos espaços onde circulam as informações na sociedade. Seja nas redes sociais, na TV, em Outdoor, na internet ou em outros meios, a multimodalidade é marca essencial dos gêneros que circulam nesses espaços.

Nesse contexto, o desenvolvimento de novas tecnologias de informação e comunicação (TIC), o aumento da velocidade das informações que circulam pela internet e a preferência pelas redes sociais como principal meio de interação entre os sujeitos podem ser vistos como alguns dos fatores que favoreceram a criação de novos gêneros textuais baseados no uso dos diversos “modos” da linguagem.

Se o mundo conectado em permanência traz uma sobrecarga de discursos/textos e informações nunca dantes vista, muitas naturalizadas, monofônicas, hipnóticas, ele, por isso mesmo, cria também novos modos de produção/recepção/circulação dos textos/discursos que precisam ser pensados em teoria e em educação. (ROJO, 2008, p.23)

É sabido que as teorias interacionais da linguagem veem o texto como lugar de interação dos sujeitos sociais, de forma que os sujeitos nele se constroem e, dialogicamente, são construídos. “A essa concepção subjaz, necessariamente, a ideia de que há, em todo e qualquer texto, uma gama de implícitos, dos mais variados tipos, somente detectáveis pela mobilização do contexto sociocognitivo no interior do qual se movem os atores sociais.” (KOCH e ELIAS, 2007, p.7).

Sendo o aluno um desses “atores sociais”, suas produções, consequentemente, irão refletir o contexto sociocognitivo em que está inserido. Dessa forma, se o aluno tem como preferência produções textuais baseadas na multimodalidade, isso significa que o uso dos diversos “modos” da linguagem compondo um todo significativo não se trata de uma “fuga” dos padrões normativos, mas constitui o que se passa – ou já se passou – a vigorar em sua realidade de vida.

É possível que ainda haja resistência por parte de alguns profissionais de educação, os quais talvez ainda insistam no uso e exploração de textos puramente verbais em suas aulas. Entretanto, é inegável a contribuição do uso das linguagens não verbais em sala de aula e como elas auxiliam no processo de ensino-aprendizagem. Com essa percepção, vários professores têm feito uso de técnicas e tecnologia em suas atividades pedagógicas. O uso de slides, datashow, celular, notebook, tablet, entre outros aparelhos que possibilitam o trabalho com recursos visuais e sonoros, apenas ratifica que a multimodalidade está tornando-se como que um tipo de “regra” nas instituições de ensino. O texto, então, passa a ser visto como algo dinâmico, multifacetado e (agora) multimodal, ou seja, “um conjunto de múltiplas formas de representação ou códigos semióticos que, através de meios próprios e independentes, realizam sistemas de significados” (SELVATICI, 2007, p. 1).

Nessa perspectiva, um ensino relevante na atual realidade escolar se baseará, entre outras formas, na multimodalidade, pois a preferência por esse aspecto textual pode ser observada – como dito acima – até mesmo no próprio ambiente escolar. Se, antes, o uso de imagens, sons, animações, entre outros recursos, fazia parte de exposições direcionadas em sua maior parte ao público infantil, atualmente é quase que obrigatoriedade, em todos os níveis do ensino, o uso das várias formas de linguagem na ministração dos conteúdos em sala de aula. Ainda que as instituições não estabeleçam direta ou normativamente tal metodologia, no mínimo é o que esperam de um “bom” professor. Essa realidade mostra que a multimodalidade precisa estar inserida no processo de ensino-aprendizagem, pois tanto contribui no sentido de tornar o ensino mais prazeroso, como serve também de artifício para estimular o aluno e, assim, se obter uma efetiva aprendizagem.

Mayer (2001 apud Barros 2009) assinala que há dois canais no sistema humano de processamento: um destinado ao material verbal e outro ao visual. Esse autor “considera, portanto, que uma aprendizagem realmente significativa envolve uma conexão de ambos os canais de processamento cognitivo.” (p. 166). Assim, a integração desses materiais, – verbal e visual – num texto, exige, tanto na produção quanto na interpretação, novas habilidades por parte dos alunos, e o professor precisa estar preparado para contribuir com esse processo. Sobre isso, Barros (2009) ainda ressalta que

As especificidades dos textos que aliam a materialidade verbal à pictográfica exigem que o leitor recorra não somente às estratégias de compreensão e apreciação, mas também a estratégias particulares de observação multimodal que o levam a selecionar e verificar as informações verbais e organizar as informações da sintaxe visual. (p. 167)

Sob essa perspectiva, que traz à tona as exigências de um leitor – que nesse caso é o aluno – capaz de interpretar corretamente um texto multimodal, é que Rojo (2008) discorre acerca da importância dos letramentos multissemióticos, pois, segundo a autora,

traz impactos importantes para o tratamento do texto na leitura e no ensino, pois já não basta mais, como na era do livro, a leitura do texto escrito para o qual desenvolvemos as teorias de leitura com as quais operamos e ensinamos. Agora, é imprescindível colocar em relação o texto escrito com signos de outras modalidades de linguagens (imagens estáticas e em movimento, fala, música, infografias). (p.25)

Dessa forma, o uso de textos que contenham essas variadas modalidades da linguagem no ensino de língua portuguesa, certamente contribui para um melhor rendimento escolar do aluno e maior relevância aos conteúdos ministrados pelo professor.

4 HISTÓRIA EM QUADRINHOS: UM DOS MUITOS MODELOS MULTIMODAIS

O apelo visual imposto pela modernidade acabou por interferir em grande parte nos textos que circulam na atualidade e, embora isso favoreça novas formas de textualidade, é inegável que as Histórias em Quadrinhos (HQs) ainda estejam entre os principais gêneros que representam a multimodalidade.

Pinheiro (2012) assinala que “se os aspectos não verbais também concorrem, entre os vários outros fatores, para a construção do sentido do texto, o seu caráter multimodal deve delinear, teórica e metodologicamente, o seu estudo” (p. 3). Sendo assim, entende-se que a multimodalidade expressa nas Histórias em Quadrinhos, através das linguagens verbal e não verbal – características de sua composição – contribuem significativamente com o processo de ensino-aprendizagem na escolas.

4.1 CARACTERÍSTICAS DAS HQs

As Histórias em Quadrinhos podem ser facilmente identificadas visualmente devido às formas textuais utilizadas que lhe são peculiares. Entretanto, uma caracterização teórica torna-se mais complexa devido à multiplicidade de enfoques possíveis.

Mendonça (2005) traz uma caracterização dos quadrinhos baseada em alguns critérios, dos quais pode-se citar:

  • Quanto ao Tipo textual, as HQs enquadram-se no tipo narrativo “dada a predominância dessa espécie de sequencia na maioria dos casos” (p.195). Todavia, a autora assinala que também há certa heterogeneidade tipológica, a qual evidencia a presença de sequências características de outros tipos textuais;
  • Quanto aos mecanismos e recursos tecnológicos usados para narrar, os quadrinhos têm relação com os desenhos animados e com o cinema. A autora afirma que enquanto nestes os quadros são representados em movimento, nas Histórias em Quadrinhos há certa seleção dos quadros apresentados, o que exige um maior trabalho cognitivo por parte do leitor. “As lacunas e omissões exigem um leitor eficiente capaz de preencher os vazios, o não-dito” (NEPOMUCENO, 2008, p. 404);
  • Na relação fala e escrita, as Histórias em Quadrinhos, embora se realizem no meio escrito, procuram reproduzir a fala nos balões, geralmente uma conversa informal;
  • Com relação às semioses envolvidas (verbal e não verbal), os quadrinhos, segundo a autora, são material riquíssimo, pois ambas as linguagens desempenham papel central na co-construção do sentido.

Esse último critério explicitado pela autora é o que mais evidencia o caráter multimodal das HQs, de forma que a linguagem pictórica sobrepõe-se à linguagem verbal (NEPOMUCENO, 2008:402).

Ao tratar do uso das imagens em ambientes escolares, Calado (1994) afirma que

Alguns professores recorrem ainda à imagem para suscitar nos alunos o desenvolvimento do espírito crítico (função dialética), o que nos parece de realçar, sobretudo se tivermos em conta a problemática da escola paralela a da educação para os media. [...] As imagens que possuem um valor estético e as que estimulam o sentido crítico (ambas com forte potencial conotativo) permitem gerar, em situações de ensino-aprendizagem, mensagens ricas e diversificadas. Nesse sentido – cremo-lo – mostram-se aptas a favorecer a dimensão da criatividade nas nossas escolas, quando correctamente utilizadas. (p. 110)

Observa-se que toda essa potencialidade da imagem integrada ao texto é que faz com que as Histórias em Quadrinhos se tornem um dos mais atrativos recursos para melhoria e efetivação não só do ensino de língua portuguesa, mas de outras disciplinas também.

4.2 AS HQs NAS ESCOLAS

Dada sua composição de quadros, desenhos, balões, cores, expressões faciais, entre outros aspectos, é fato que as Histórias em Quadrinhos estão entre a preferência de leitura do público infanto-juvenil. Esse “gosto” pela leitura dos quadrinhos expressa por crianças e adolescentes não pode ser desprezado, mas tornar-se um incentivo para o maior uso das HQs no contexto escolar.

Talvez ainda haja certa resistência e/ou preconceito por parte de alguns profissionais da educação acerca do uso dos quadrinhos em sala de aula. Tal reprovação, possivelmente, pode ser advinda do pensamento de que as Histórias em Quadrinhos oferecem relativa facilidade de leitura, sendo consideradas de “baixa qualidade”. Felizmente “com o avanço das pesquisas linguísticas e educacionais, os preconceitos contra essa espécie de texto foram diminuindo” (MENDONÇA, 2005, p. 202) e a presença das HQs nas escolas tem mostrado o quanto sua contribuição no processo de ensino-aprendizagem tem sido válida e eficiente, tanto que, conforme Vergueiro e Ramos (2009), as Histórias em Quadrinhos se tornaram política educacional do país e foram consideradas como “manifestação artística a ser trabalhada em sala de aula” (p. 11).

Com a diversificação de seus gêneros – charge, Cartuns e Tiras – as Histórias em Quadrinhos presentes no ambiente escolar geram novos desafios ao trabalho docente, no sentido de que os professores precisam enxergar as HQs como recurso pedagógico e conseguir extrair delas contribuições ao ensino de Língua Portuguesa.

É sabido que estudar português nem sempre se constitui uma tarefa prazerosa, pois, geralmente, tal disciplina é ofertada, em grande parte, no trabalho com conteúdos gramaticais – embora a realidade esteja sendo modificada e outras questões também estejam sendo trabalhadas. Mas para minimizar tal descontentamento dos alunos nas aulas de Língua Portuguesa, o professor precisa buscar meios de incentivar seus alunos à aprendizagem dos conteúdos. “É preciso também que os estudantes consigam interagir com os assuntos apresentados em sala de aula. Sem essa interatividade, os conteúdos estão desprovidos de sentido para os alunos e as aulas não passarão de mera formalidade” (Vergueiro e Ramos, 2009, p. 78).

Além de auxiliares no ensino de regras gramaticais, no desenvolvimento de capacidades linguísticas, comunicativas, cognitivas e discursivas e na ativação de conhecimentos de mundo e partilhado, exigidos na compreensão de textos multimodais, as Histórias em Quadrinhos podem ser trabalhadas de diversas maneiras em sala de aula e, assim, contribuir com o desenvolvimento de múltiplas competências dos alunos.

  • O professor pode sugerir a leitura de quadrinhos em sala de aula sob a forma de representação dos personagens. Além de promover a interação entre os alunos, essa atividade pode auxiliar no desenvolvimento da capacidade de leitura e apresentações em público;
  • Os alunos podem criar Histórias em Quadrinhos baseadas em lugares e personagens reais, de sua cultura e/ou cidade. Assim, além de conhecer um pouco mais da história do personagem e/ou de sua cidade e cultura, conteúdos de História e Geografia podem auxiliar na realização da tarefa, tornando-a interdisciplinar;
  • O professor pode levar uma História em Quadrinhos sem texto – apenas com as imagens – e os alunos (em grupo) deverão analisar as imagens, escolher os balões e frases adequadas ao contexto dos personagens e, assim, “narrar” a história. Tal atividade exigirá um conhecimento prévio dos formatos e funções dos balões, ativará o conhecimento das funções da linguagem, além de suscitar a integração e cooperação entre os alunos;
  • Os alunos podem escolher personagens de HQs já conhecidas e analisá-los, identificando as características e situações em que os personagens estão envolvidos, a fim de fazer um comparativo com atitudes semelhantes ocorridas na sociedade e/ou estereótipos da atualidade, além de estabelecer um debate acerca da temática tratada nos quadrinhos;
  • O professor pode trabalhar com a caracterização dos diversos gêneros em quadrinhos, após essa explanação dividir a turma em grupos e cada grupo ficaria responsável por apresentar um gênero; falar de suas características, personagens, variações linguísticas, cenários, etc.

Enfim, são inúmeras as possibilidades de trabalho com as Histórias em Quadrinhos e “reconhecer e utilizar o recurso da quadrinização como ferramenta pedagógica parece impor-se como necessidade, numa época em que a imagem e a palavra, cada vez mais, associam-se para a produção de sentido nos diversos contextos comunicativos” (MENDONÇA, 2005, p. 207).

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Considerando que o texto tem sido tomado como base de ensino de Língua Portuguesa é inevitável o uso dos diversos gêneros e tipos textuais numa prática docente metodologicamente relevante.

Sabe-se que a modernidade impôs e continua a impor diversas modificações nas formas de vida dos indivíduos e as transformações ocorridas na sociedade são, consequentemente, refletidas nas produções textuais desses indivíduos. Se a multimodalidade tem sido a principal característica dos textos que circulam pelos espaços da sociedade atual, fazendo parte do dia a dia dos indivíduos, a escola não pode se eximir de tal realidade, pois um ensino produtivo e significativo sempre estará atrelado à mostra do efeito e função do conhecimento no dia a dia dos alunos.

Nesse contexto, entre tantos outros gêneros que trazem a multimodalidade em sua composição, estão as Histórias em Quadrinhos - excelente ferramenta pedagógica. Sua presença em livros, gramáticas, jornais, revistas e até mesmo como sugestão feita por programas governamentais para o trabalho escolar, apenas ratifica a potencialidade das HQs num processo de ensino-aprendizagem produtivo, relevante e significativo.

REFERÊNCIAS

ANTUNES, I. Aula de Português: encontro e interação. São Paulo: Parábola Editorial, 2003.

BARROS, C.G.P. Capacidades de leitura de textos multimodais. Polifonia. N. 19, p. 161-186, Cuiabá: EDUFMT, 2009. Disponível em: < cpd1.ufmt.br/meel/arquivos/artigos/341.pdf‎>. Acesso em: 26 Ago. 2013.

CALADO, I. A utilização educativa das imagens. Portugal: Porto Editora, 1994.

KOCH, I.G.V. Linguística Textual: uma entrevista com Ingedore Villaça Koch. Revista Virtual de Estudos da Linguagem – ReVEL. vol. 1, n. 1, agosto de 2003. Disponível em: <http://pt.scribd.com/doc/71969806/Revel-1-Entrevista-Ingedore-Koch>. Acesso em: 07 jul. 2013.

______. ELIAS, V.M. Ler e compreender: os sentidos do texto. 2. ed. São Paulo: Contexto, 2007.

MENDONÇA, M.R.S. Um gênero quadro a quadro: a história em quadrinhos. In: DIONISIO, A.P.; MACHADO, A.R.; BEZERRA, M.A. (Orgs). Gêneros textuais & ensino. 4. ed. Rio de Janeiro: Lucerna, 2005. (Parte II) Cap. 6, p. 194-207.

NEPOMUCENO, T. Sob a ótica dos quadrinhos: Uma proposta textual-discursiva para o gênero tira. In: TRAVAGLIA, L.C.; FINOTTI, L.H.B.; MESQUITA, E.M.C. (Orgs). Gêneros de texto: Caracterização e ensino. Uberlândia: EDUFU, 2008. Cap. 13, p. 395-434.

PINHEIRO, C.L. Processos referenciais em textos multimodais: aplicação ao ensino. Anais do SIELP. vol. 2, n. 1, Uberlândia: EDUFU, 2012. Disponível em: <www.ileel.ufu.br/anaisdosielp/pt/arquivos/sielp2012 2.pdf >. Acesso em: 07 jul. 2013.

SELVATICI, V.L.C.G. A análise textual de um texto multimodal. Pesquisas em Discurso Pedagógico [online]. Departamento de Letras, PUC-Rio, 2007.1. Disponível em: < http://www.maxwell.lambda.ele.puc-rio.br/rev_discurso.php?strSecao=input0>. Acesso em: 07 jul. 2013.

ROJO, R. O texto no ensino-aprendizagem de línguas hoje: desafios da contemporaneidade. In: TRAVAGLIA, L.C.; FINOTTI, L.H.B.; MESQUITA, E.M.C. (Orgs). Gêneros de texto: Caracterização e ensino. Uberlândia: EDUFU, 2008. Cap. 1, p. 9-43.

VERGUEIRO, W.; RAMOS, P. (Orgs). Quadrinhos na educação: da rejeição à prática. São Paulo: Contexto, 2009.



[1]  UFS – Universidade Federal de Sergipe. Pós-Graduação em Letras. E-mail: tat.happy@hotmail.com

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