A modernização da sociedade e o crime de desacato: a busca pela polícia preventiva
Por Ícaro Carvalho Gonçalves | 10/12/2015 | DireitoA
A modernização da sociedade e o crime de desacato: a busca pela polícia preventiva1
Ícaro Carvalho Gonçalves2
João Carlos da Cunha Moura3
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RESUMO
O presente trabalho possui como foco a busca pela polícia preventiva no atual contexto da sociedade brasileira a partir de uma análise histórica das políticas criminais e o desenvolvimento do crime de desacato como percursor de atuação da polícia repressiva. Deste modo, nasce a configuração do que representa a modernidade para a sociedade e vice-versa, ao passo que a política criminal não acompanha o desenvolvimento natural de toda sociedade, criando uma autonomia exacerbada da polícia quando o bem-comum deveria ser a proteção da sociedade e a prevenção de crimes.
Palavras-chave: Modernidade. Política Criminal. Desacato. Polícia Repressiva. Polícia Preventiva.
2 A MODERNIDADE DA SOCIEDADE E O CRIME DE DESACATO
Neste tópico, far-se-á menção à modernidade da sociedade. A evolução desta contribui para o desenvolvimento da polícia, porquanto seja a busca pelos métodos preventivos de combate ao crime. Como base para melhor entendimento desta modernidade, a obra de Jurgen Habermas (o discurso filosófico na modernidade) traz o conceito de modernidade como “um conjunto de processos cumulativos e de reforço mútuo: à formação de capital e mobilização de recursos” (200, p. 05). Assim, a sociedade deve ser observada tempo ao tempo, utilizando de meios capazes de desenvolver uma sociedade justa.
Neste contexto o crime de desacato surge em descompasso com o progresso e atua como meio para perspicácia da polícia repressiva, atuando com métodos arcaicos e com autonomia exacerbada.
2.1 Crime de Desacato: meio para atuação da polícia repressiva
Far-se-á uma contextualização sobre o crime de desacato e suas consequências na sociedade moderna. O crime de desacato se desenvolve, hoje, como o principal instrumento para as práticas impetuosas da polícia repressiva. Este crime cria uma autonomia fora dos parâmetros estabelecidos à polícia.
A polícia deve ser aquela que consiga prever e combater o crime e consequentemente a proteção da sociedade. Desta forma, o comportamento da sociedade deve ser entendido como manifestação para a busca de uma polícia preventiva, a fim de que sejam findados os métodos repressivos da polícia.
3A BUSCA PELA POLÍCIA PREVENTIVA
Como visto nos capítulos anteriores, a busca vai de uma análise além das fronteiras do direito. Jorge Luiz P. Bengochea e outros (2004) aduz que o modelo tradicional da polícia tem por essência o uso da força como único mecanismo de controle, sendo, de certa forma, usada sem parâmetros estabelecidos e sem preparo algum.
A sociedade carece de uma polícia que atenda pelo aspecto mais social (preventiva) do que criminal ou repressiva. O uso da força como mecanismo de controle, é também o principal meio para atividade do abuso de autoridade, sendo assim, corriqueiramente confundido com o crime de desacato, transferindo equivocadamente a responsabilidade por quem deu causa.
Dito isso, é preciso analisar o modo de utilização da força: por meio da abordagem policial e da busca pessoal. Sobre o conceito da abordagem policial, comenta Valdeonne Dias da Silva (2014, p. [?]): “(...) é costumeira e historicamente utilizada pelas instituições estatais, mais precisamente pelas polícias, como meio intervencionista nas relações sociais, visando o controle da criminalidade e manutenção da ordem pública”.No entanto, este conceito não é seguido ao ‘pé da letra’, haja vista que o controle da criminalidade não é realizado por métodos aceitáveis para a sociedade atual, elevando os índices deste mal que afronta os cidadãos.
Em tese, a abordagem policial é interpretação da polícia preventiva, pois a busca pessoal “possui uma conotação mais restritiva, sendo concernente ao ato do policial ‘vistoriar’, ‘investigar’ e ‘revistar’ o cidadão suspeito, visando localizar possíveis objetos ou armas que possuem relação com uma dada atividade ilícita” (SILVA, 2014, p. [?]), ou seja, é o ato legitimado pelo Poder de Polícia à autoridade policial incumbida de realizar uma busca preventiva. Neste sentido, também deveria ser visto sob a ótica preventiva. Entretanto, as duas formas de atuação da polícia no combate ao crime são atuações que ensejam o modo repressivo.
Consoante a isso, pretende-se a busca pela polícia preventiva como forma de combate ao crime, deixando de lado meios que ensejam o policiamento repressivo, quais sejam o abuso de autoridade e principalmente do crime de desacato, ambos relacionados aos cidadãos. Exposto isso, Valdeonne Dias da Silva versa sobre o policiamento preventivo:
(...) está intimamente relacionado ao aspecto da ostensividade e da fácil percepção que é alcançada por meio dos patrulhamentos e das rondas policiais efetuadas. Por se responsável pela prevenção de delitos e de outras perturbações sociais, a Polícia Militar realiza o policiamento ostensivo e preventivo nas diversas cidades brasileiras, realizando rondas nas ruas e em outros locais públicos, buscando garantir a manutenção da paz e da tranquilidade social, conforme previsão constitucional (2014, [?]).
Em tese, a teoria explana o que deveria acontecer na prática. No entanto, a instrumentalização da polícia é feita de maneira equivocada. A ideia da polícia preventiva deve construída através do tempo, aprimorando o sistema político criminal com o fulcro de aprimorar as técnicas policiais.
Jorge Luiz P. Bengochea e outros (2004) cita o exemplo do estado do Rio Grande do Sul pelo fato de diferenciar os boletins de ocorrência para a polícia Civil e Militar, assim o atendimento ao cidadão é mais ágil e eficaz. Além disso, revela que a polícia não mais interfere nos crimes de menor potencial ofensivo, remetendo o caso imediatamente para o Poder Judiciário para sanar o conflito. Sobre este sistema, Jorge Luiz P. Bengochea e outros versam:
Este procedimento atende de forma eficaz a um dos maiores problemas da atualidade quando o cidadão está diante de um conflito: o acesso à Justiça, de forma célere, imediata e imparcial, sem intermediações burocráticas. Até então, o policial tinha o processo de apenas conduzir e não interagia com o próprio delito, isentava-se de qualquer responsabilidade de interferência, inclusive não conhecia essa relação porque não tinha capacidade nem competência para tanto (2004, p. 128).
Assim, no momento da abertura da denúncia, o policial deve estar preparado para atender aquela demanda, de modo que possua a capacidade de resolver determinado conflito posto naquele momento.
Sob a ótica da polícia repressiva é totalmente diferente, há uma preocupação com o final da conduta do criminoso (BENGOCHEA E OUTROS, 2004), se importando em como autuar a prisão, ficando avulsas os meios de como chegará a essa prisão, deixando o próprio cidadão a mercê da situação por poder se enquadrar em desconformidade com a atuação da policial, envolvendo o crime de desacato nessa relação.
Embora entenda que a polícia deva modernizada e se adaptar com aquela comunidade que está incumbida de proteger, não se pode retirar a parcela de culpa por parte da própria sociedade, haja vista que esta requer uma atividade fim por parte da polícia (BENGOCHEA E OUTROS, 2004).
Importante ressaltar que tal dever da polícia em preservar a ordem pública é garantia constitucional situada no art. 144 e §5º, da Constituição Federal/88 que dispõem:
Art.144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos:
(...)
§ 5º - às polícias militares cabem a polícia ostensiva e a preservação da ordem pública; aos corpos de bombeiros militares, além das atribuições definidas em lei, incumbe a execução de atividades de defesa civil (grifo nosso).
REFERÊNCIAS
ABREU, Roberto de; BENGOCHEA, Jorge Luiz Paz; GOMES, Luiz; MARTIN, Luiz Brenner Guimarães. A transição de uma polícia de controle para uma polícia cidadã. In: São Paulo em Perspectiva, 18(1): 119-131, 2004. Disponível em: <p://www.uece.br/labvida/dmdocuments/a_transicao_de_uma_policia_de_controle.pdf>. Acesso em 07 mar. 2015.
BRASIL. Código Penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014.
BRASIL. Constituição Federal de 1988. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014.
GIL, Antônio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2002.
HABERMAS, Jurgen. O discurso filosófico da modernidade: doze lições. Tradução: Luiz Sérgio Repa, Rodnei Nascimento. São Paulo: Martins Fontes, 2000, p. 03-33.
SILVA, Valdeonne Dias da. Abordagem policial e abuso de autoridade em busca pessoal. In: Jus Navigandi, Teresina, ano 19, n. 3963, 8 maio 2014. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/28050>. Acesso em: 7 mar. 2015.
SOARES, Claudio Leal. O crime de desacato e a honra funcional como bem jurídico. 2005. Disponível em: <http://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/2157/O-crime-de-desacato-e-a-honra-funcional-como-bem-juridico>. Acesso em: 12 mar. 2015.