A miséria do historicismo e a sua desconstrução na Filosofia da história de Popper

Por Rabim Saize Chiria | 13/11/2017 | Filosofia

1.Introdução

O presente trabalho tem como tema ‟a miséria do historicismo e a sua desconstrução na Filosofia da história de Popper.ˮ Contudo, Popper analisa os princípios da mecânica social gradual, em oposição à mecânica social utópica – a mais poderosa das quais é a que denomina historicismo. O estado ainda insatisfatório de certas ciências sociais suscita o problema de seus métodos – seu problema mais fundamental. Um exame cuidadoso dessa questão levou a Popper à convicção de que as profecias históricas de longo prazo estão fora do âmbito do método científico.

Segundo Popper, o futuro depende de nós mesmos, e nós não dependemos de qualquer necessidade histórica. Há, contudo, filosofias sociais influentes que sustentam o oposto. Afirmam que a tarefa da ciência é fazer predições; e que cabe às ciências sociais fornecer-nos profecias históricas de longo prazo, acreditando haver descoberto leis históricas que nos habilitam a profetizar o curso desses acontecimentos. Entretanto, Popper, chama de historicismo às várias filosofias sociais que sustentam afirmações dessa espécie. Popper não procura substituir os velhos sistemas de filosofia por um novo sistema. Busca mostrar que essa sabedoria profética é prejudicial, e que as metafísicas da história impedem a aplicação dos métodos graduais da ciência aos problemas da reforma social.

O trabalho tem como objectivo geral, analisar a visão historicista e sua desconstrução na filosofia da história de Popper. E tem como objectivos específicos: i) analisar duma fora critica a visão historicista e entender o sentido da história em Popper; ii) apresentar uma visão crítica de Popper ao historicismo de Hegel; iii) reflectir criticamente sobre o determinismo de Marx na filosofia de história de Popper.

Quanto a organização pode-se dizer que o  trabalho está organizado em subtemas para melhor situar o leitor. Para a sua realização foi feita uma pesquisa bibliográfica e interpretativa em diversas obras relacionadas ao tema, sobretudo a leitura específica e pesquisa nos principais subtemas referente ‟ a miséria do historicismoˮ de Karl Popper.

 

2. O historicismo e o sentido da história em Popper

O historicismo concebera um método dialéctico que foi aplicado ao estudo da sociedade. O método dialéctico hegeliano, patente no historicismo, segue a ordem triádica de tese antítese e síntese. ‟O historicismo centra-se na fé em leis férreas de desenvolvimento da história humana na sua inteireza, leis essas que não permitem ao homem sonhos utópicos, nem planos racionais de construção socialˮ (POPPER apud GEQUE, 2004: 96). Para Popper, as teses metodológicas do historicismo constituem o suporte teórico mais válido das ideologias totalitárias. Segundo Sousa (2007: 7), Popper tomou o historicismo como sendo qualquer abordagem em Ciências Sociais que pretenda ter a capacidade de predição. Portanto, Popper ataca o historicismo usando duas linhas argumentativas fundamentais:

1) é insustentável, pois “o curso da natureza humana é fortemente influenciado pelo crescer do conhecimento humano”, sendo que o crescimento do conhecimento humano é imprevisível, o curso da história, em decorrência, também o é. Ou seja, a história da humanidade não tem um sentido concreto que antecipadamente pode ser conhecido; o único sentido que possui é aquele que os homens lhe dão. No entanto, o progresso da humanidade é possível e não carece de um critério último de verdade.

2) O historicismo é gerador necessário de todo o tipo de autoritarismos e intolerâncias (como o comunismo e o nazi-fascismo), visto que não autoriza possibilidades alternativas de compreender a realidade. A razão humana é essencialmente falível, pois, o dogmatismo não tem qualquer fundamento. A única atitude justificável para atingir a verdade é através do diálogo, o confronto de ideias por meios não violentos. Na ciência, significa aceitar o risco de formular hipóteses que venham depois a ser refutadas pela experiência. Na política, essa atitude significa que cada um deve aceitar o risco de ver as suas propostas serem recusadas por outros no confronto de ideias ou projecto (Ibidem: 96) Segundo Popper apud Sousa, as leis físicas, ou «leis da natureza” são válidas em toda a parte e sempre; porque o mundo físico rege-se por um sistema de uniformidades físicas invariáveis no espaço e no tempo. As leis sociológicas, porém, ou leis da vida social, diferem em lugares e períodos diferentes.

As leis da sociologia dependem assim da própria história e das diferenças culturais, são um resultado de situações históricas específicas! O método da física é experimental: reprodução em laboratório de condições semelhantes. Ora na sociedade a repetição é sempre um acontecimento novo, em certo sentido, porque aprendemos com as experiências. Assim, está aberto o caminho para que qualquer situação social seja sempre específica e não geral! Paralelamente, a complexidade e a especificidade das situações sociais impedem a previsão de acontecimentos. “Uma previsão é um acontecimento social que pode interagir com outros acontecimentos sociais, entre os quais se inclui aquele que a previsão estipula”.

 

3. O historicismo de Hegel na filosofia da história de Popper

O historicismo de Hegel é optimista. Seu mundo em fluxo é um estado de “evolução criativa”; cada uma de suas etapas contém as precedentes, das quais se origina; e cada etapa supera todas as etapas anteriores, aproximando-se cada vez mais da perfeição. A lei geral do desenvolvimento é, assim, a do progresso. O colectivista Hegel, como Platão, visualiza o Estado como um organismo, dotado de uma “vontade geral” colectiva rousseauniana – sua essência consciente e pensadora, sua “razão”. Esse “Espírito”, cuja “própria essência é a actividade”, é também o colectivo Espírito da Nação que forma o Estado. Conhecemos sua essência e suas “potencialidades” pelo conhecimento de sua “efectiva” história, ou melhor, através da história do seu “Espírito” (POPPER, 2002: 134).

O primeiro pilar da filosofia hegeliana é o método dialéctico. Como Heráclito, Hegel acredita na identidade dos opostos e sua permanente tensão. É da própria natureza da razão que se contradiga; não é uma fraqueza das faculdades humanas, mas a essência de toda racionalidade o fato de que esta opera dialeticamente com contradições e antinomias, já que é desse modo que a razão (e a ciência) se desenvolve: não somente as contradições são admissíveis, como inevitáveis e desejáveis. A própria razão é o produto da herança social e do desenvolvimento histórico dialéctico da Nação. O segundo dos pilares do hegelianismo é a denominada filosofia da identidade, ela própria uma aplicação da dialéctica. O elo entre a dialéctica de Hegel e sua filosofia da identidade é a doutrina de Heráclito sobre a unidade dos opostos. Hegel adota, da doutrina de Platão, a equação Ideal = Real. Da dialéctica de Kant, Hegel aceita serem a Ideias algo mental, algo espiritual ou racional, o que pode expressar-se pela equação Ideia = Razão. Combinadas, essas duas equações, ou equívocos, dão-nos Real = Razão (POPPER apud OLIVEIRA, 1999: 18).

Neste caso, Popper salienta que isso permite a Hegel afirmar que tudo que é razoável deve ser real, e tudo que é real deve ser razoável; o desenvolvimento da realidade é o mesmo da razão. E como não pode existir padrão mais alto do que o último desenvolvimento da Razão e da ideia, tudo o que agora existe, existe por necessidade, e deve ser razoável e bom. Ora, a filosofia da identidade, afora seu positivismo ético, implica como subproduto uma teoria da verdade: tudo que é razoável é real e, portanto, deve ser verdadeiro.

A verdade se desenvolve do mesmo modo que a razão, e tudo quanto apela para a razão na sua última etapa de desenvolvimento deve também ser verdadeiro para essa etapa. A evidência, por si mesma, é o mesmo que a verdade. Desse modo, a oposição entre o que Hegel chama o “Subjectivo”, a crença, e o “Objectivo”, a verdade, transforma-se numa identidade; e essa unidade dos opostos explica também o conhecimento científico.

 

4. Marx e o determinismo sociológico na filosofia da história de Popper

Segundo Popper (2004: 174), o interesse de Marx pela ciência social e pela filosofia social era fundamentalmente prático; ele via no conhecimento um meio de promover o progresso da humanidade. Apesar de seus méritos, Marx foi um falso profeta do curso da história; suas profecias não se materializaram; pior, induziu muitos à crença de que a profecia histórica é o modo científico de abordar os problemas sociais.

Marx é responsável pela devastadora influência do método historicista nas fileiras dos que desejam impulsionar a causa da sociedade democrática. O marxismo é uma teoria puramente histórica, que visa predizer o curso futuro dos eventos económicos e do poder político, e especialmente as revoluções. Marx rejeitou qualquer tipo de mecânica social, que denunciou como utópicas e ilegítimas. Como Lênin admite, dificilmente se encontra na obra de Marx uma palavra sobre a economia socialista, à exceção de lemas inúteis como “de cada um segundo sua capacidade e a cada um segundo suas necessidades (Ibidem: 197). No dizer de Popper, o marxismo deve ser submetido à prova e criticado por padrões metodológicos. Deve-se indagar se, como método, tem ou não capacidade de impulsionar a tarefa da ciência.

Os padrões pelos quais devemos julgar o método marxista devem ser, portanto, de natureza prática. ‟…o argumento de que a ciência só pode predizer o futuro se este for predeterminado levou Marx a aderir à falsa crença de que o método científico deve estar baseado num determinismo rígido (Ibidem: 204). Com enfeito, a crença de que os termos “científico” e “determinista” estão inseparavelmente ligados persiste ainda como uma superstição, reminiscência de um tempo que ainda não passou de todo. Marx opôs-se ao “idealismo” hegeliano em seu famoso epigrama: “Não é a consciência do homem que determina sua existência; é sua existência social que determina sua consciência”. Trata-se da antiquíssima distinção entre leis sociais “naturais” e “convencionais. É ingénuo admitir que todas as leis sociais derivem da psicologia da “natureza humana”. Contra o psicologismo – a doutrina plausível de que todas as leis da vida social podem ser redutíveis às leis psicológicas da “natureza humana” – os defensores de uma sociologia autónoma opõem concepções institucionalistas (Ibidem: 124).

Nenhuma acção humana pode ser explicada só por motivos psicológicos ou behavioristas: se estes forem ser usados na explicação, deverão ser suplementados por uma referência ao ambiente social; nossas acções não podem ser explicadas sem referência às instituições sociais e à sua maneira de funcionamento. As mentes humanas – as necessidades, as esperanças, os temores e as expectativas, os motivos e as aspirações dos indivíduos humanos – são o produto da vida em sociedade.

 

5. A crítica de Popper em comparação com os movimentos políticos e culturais em Moçambique

A crítica que Popper faz ao historicismo pode ser comparada com os movimentos políticos e culturais em Moçambique. Ora, quanto aos movimentos políticos, temos aqueles que proferem discurso libertários, pretendendo manter o sistema político em nome da memória histórica, no entanto, o facto de serem libertadores da pátria, os faz crer que são merecedores do poder até eternidade. Por um lado esta atitude os torna dogmáticos e por outro os torna arrogantes e totalitários, visto que oprimem e não abrem o espaço para o diálogo, isto, em nome do movimento histórico.

Aliás, o próprio Popper afirma que a razão humana é falível, pois, o dogmatismo não tem sua razão de ser. Temos também os que proferem discursos democráticos, ou seja, progenitores do movimento democrático em Moçambique, e, em consequência desta titularidade recusam aceitar o risco de ver suas propostas serem recusadas por outros no confronto de ideias. No dizer de Popper, a única atitude justificável para atingir a verdade é a través do diálogo, confronto de ideias por meio não violentos.

Quanto a visão Cultural eu posso afirmar que Moçambique está dividido em dois grupos! Não são três, apenas são dois. Temos os da zona Sul e temos também os da zona Centro e Norte. Os da zona Sul depositam a sua fé em leis férias, pois eles acreditam que são mais culturistas em relação aos do Centro e Norte. De salientar que esta visão não é de hoje, pois, já vinha sido concebida desde da muito tempo, e por esta razão, os atuais estão resoluto de que estão e sempre estarão no topo em em relação aos demais, sobretudo do Centro Norte. Ora, quando falamos da cultura estmos a fazer referência do comportamento ético duma sociedade no seu todo. A cultura é a ética, ou seja, a inteligência compartilhada ao serviço do aperfeiçoamento da convivência como diria Clovis!

Portanto, se dentro duma sociedade uma parte tem cultura e a outra não tem, podemos inferir que nesta sociedade não há ética, se não há ética é porque não há inteligência compartilhada, e se não há inteligência compartilhada é porque não há cultura nem para os da zona Sul e nem para os zonas Centro e Norte.

Entretanto, posso concluir que a visão de alguns habitantes do Sul de Moçambique é castradora e, portanto Suicidária. É castradora porque excluem uma parte do todo no panorama cultural! É Suicidária porque tenta desumanizar uma parte da sociedade, e, ao fazer isso, eles também se desumanizam!

 

Considerações finais

Em jeito conclusão salientar que Popper está convicto de que, a história da humanidade não tem um sentido concreto que antecipadamente pode ser conhecido; o único sentido que possui é aquele que os homens lhe dão. No entanto, o progresso da humanidade é possível e não carece de um critério último de verdade. , O futuro depende de nós mesmos, e nós não dependemos de qualquer necessidade histórica. Há, contudo, filosofias sociais influentes que sustentam o oposto. Afirmam que a tarefa da ciência é fazer predições; e que cabe às ciências sociais fornecer-nos profecias históricas de longo prazo, acreditando haver descoberto leis históricas que nos habilitam a profetizar o curso desses acontecimentos.

 

Bibliografia

ANDRADE, Sousa. Karl Popper, a pobreza do historicismo: Esfera do Caos. São Paulo, 2007.

GEQUE, Eduardo & MANUEL, Biriate. Introdução a Filosofia. Maputo, 2004.

OLIVEIRA, Santos. Popper, ciência e história antiga. Lisboa, 1999.

POPPER, Karl. Sociedades abertas e seus inimigos. 2.ed., Fiocruz, Rio de Janeiro, 2002. POPPER, Karl. A miséria do historicismo. Lisboa, Martins Fontes, 2004.