A MEDIAÇÃO COMO FERRAMENTA DE RESOLUÇÃO DE CONFLITOS FAMILIARES
Por Francismary de Jesus Costa Froes | 21/07/2024 | DireitoA MEDIAÇÃO COMO FERRAMENTA DE RESOLUÇÃO DE CONFLITOS FAMILIARES
Autora: Francismary de Jesus Costa Froes
11 de junho de 2023
RESUMO
Este artigo analisa a eficácia da mediação como método de resolução de conflitos dentro do contexto familiar, uma prática que tem se destacado como uma abordagem não adversarial e colaborativa em comparação com os métodos judiciais tradicionais. Através de uma revisão bibliográfica, explora-se os princípios fundamentais da mediação, o papel dos mediadores e o impacto dessa prática nas relações familiares. Discute-se como a mediação oferece uma oportunidade para as partes envolvidas expressarem suas preocupações de maneira segura e controlada, promovendo um entendimento mútuo e respeitando a autonomia de todos os envolvidos. A importância de habilidades como escuta ativa, imparcialidade e a habilidade de facilitar a comunicação entre as partes são ressaltadas como essenciais para o sucesso do processo de mediação. Conclui-se que a mediação não só resolve disputas, mas também restaura e fortalece os laços familiares, oferecendo um caminho sustentável para a harmonia familiar e a resiliência emocional.
Palavras-chave: Mediação, Conflitos Familiares, Resolução de Conflitos, Comunicação Interpessoal.
ABSTRACT
This paper examines the effectiveness of mediation as a method for resolving conflicts within the family context, a practice that has emerged as a non-adversarial and collaborative approach compared to traditional judicial methods. Through a literature review, we explore the fundamental principles of mediation, the role of mediators, and the impact of this practice on family relations. We discuss how mediation provides an opportunity for involved parties to safely and controlledly express their concerns, fostering mutual understanding and respecting the autonomy of all involved. The importance of skills such as active listening, impartiality, and the ability to facilitate communication between parties is emphasized as crucial for the success of the mediation process. It concludes that mediation not only resolves disputes but also restores and strengthens family bonds, offering a sustainable path to family harmony and emotional resilience.
Keywords: Mediation, Family Conflicts, Conflict Resolution, Interpersonal Communication.
INTRODUÇÃO
A mediação, enquanto prática alternativa de resolução de conflitos, vem ganhando relevância significativa no panorama jurídico e social contemporâneo, especialmente no âmbito familiar. Em contraste com os métodos tradicionais de litígio, a mediação enfatiza a comunicação eficaz e a busca conjunta por soluções que respeitem os interesses de todas as partes envolvidas.
A mediação é valorizada por sua capacidade de transformar relações através da escuta ativa, da empatia e da facilitação de diálogos construtivos entre as partes, sendo diferente do sistema judiciário convencional, a mediação oferece um espaço mais informal e controlado pelas próprias partes, o que pode resultar em soluções mais personalizadas e menos adversariais. Além disso, o mediador, como facilitador do processo, desempenha um papel crucial na orientação das discussões, mantendo a neutralidade e promovendo um ambiente de respeito mútuo.
Neste contexto, o artigo se propõe a analisar as características que definem a mediação, os perfis e a preparação necessária dos mediadores, assim como as particularidades envolvendo os casos familiares, que muitas vezes incluem elementos emocionais intensos e questões de longo prazo. Além disso, será dada especial atenção ao código de ética dos mediadores, que delineia as diretrizes para a prática profissional responsável e eficaz.
Este artigo tem como objetivo explorar os princípios fundamentais da mediação, com foco especial na sua aplicação no contexto familiar, onde as relações contínuas exigem abordagens sensíveis e sustentáveis para a resolução de conflitos.
Metodologicamente, este estudo se apoia na revisão de literatura especializada, analisando documentos jurídicos, artigos acadêmicos e manuais de prática em mediação.
Ao final, espera-se que este artigo contribua para o entendimento mais aprofundado da mediação como uma ferramenta valiosa para a resolução de conflitos, especialmente em situações onde a preservação das relações interpessoais é crucial. A promoção de uma compreensão mais ampla sobre as capacidades e limitações da mediação pode servir como base para políticas mais efetivas e para a formação de profissionais mais bem preparados nesta área.
2 SOBRE A ESTRUTURA FAMILIAR E SUA EVOLUÇÃO
A noção de família tem suas raízes na palavra latina "famulus". Atualmente, é vista como o alicerce da comunidade, definida na Constituição vigente como um grupo de indivíduos unidos por vínculos de consanguinidade ou afinidade. Além disso, esse agrupamento inclui não somente as conexões civis decorrentes do casamento ou da convivência duradoura, mas também os vínculos entre parentes diretos ou colaterais, abrangendo os parentes por afinidade. Anteriormente, o conceito de família era mais limitado, exigindo a união conjugal entre um homem e uma mulher como sua única base (Dama, 2023).
De acordo com Gonçalves (2019), a família é percebida como uma entidade tanto jurídica quanto social, emergindo do casamento ou da convivência estável, formada por duas pessoas de sexos distintos com o intuito de compartilharem uma vida em comum.
É amplamente reconhecido que, com a evolução da sociedade, da cultura e do direito, especialmente após a solidificação da constituição que introduziu uma série de direitos e garantias fundamentais para a sustentação do ordenamento jurídico, a família foi significativamente moldada por diversos modelos históricos. Exemplos incluem a família romana, germânica e canônica, com este último ainda influenciando o Código Civil de 2002. Contudo, a nova redação do código propõe uma visão mais atual e ampla do conceito de família (Dama,2023).
Hoje, é essencial enfatizar que a família é percebida de várias formas, incluindo a tradicional, conjugal, informal, monoparental, sem filhos, recomposta, solitária e voltada para o bem-estar. Portanto, fica claro que o conceito de família é extenso e não deve ser confinado a uma única definição. Assim, com a promulgação da Constituição Federal de 1988, a definição de família foi ampliada.
Conforme Gonçalves (2019), a nova Constituição eliminou a exigência do casamento como pré-requisito fundamental para a formação de uma família. A constituição de uma família não exige mais necessariamente a união de um casal.
O artigo 226 da Constituição Federal de 1988 estabelece a família como alicerce da sociedade, recebendo proteção especial do Estado. Ademais, o parágrafo 1º deste artigo esclarece que o casamento é civil e gratuito, sem especificar os termos "homem" e "mulher".
Diante disso, o pluralismo familiar proposto pela Constituição proíbe limitações aos indivíduos que buscam sua própria felicidade, a menos que infrinjam os direitos de terceiros, o que não é o caso aqui. Famílias de diversas configurações, independentemente do gênero, têm garantia de proteção estatal (Dama,2023).
Diniz (2009) aponta que a família vai além da consanguinidade, englobando também a afinidade. Com base nesse entendimento, a doutrina brasileira passou a reconhecer a afinidade como um dos pilares da família. Segundo Tartuce (2017), um marido que reconhece como seu o filho de sua esposa, formando um vínculo afetivo, não deve desfazer esse laço após a consolidação do afeto.
Assim, o afeto se tornou um elemento crucial para a manutenção de vínculos afetivos, permitindo uma convivência harmoniosa. Percebe-se, então, que a forma como uma família é estabelecida é menos importante do que sua base afetiva estrutural, ou seja, sua essência e dignidade.
É crucial enfatizar que no âmbito jurídico, especialmente no direito de família, existem princípios que devem ser observados em questões familiares, tais como o princípio da dignidade da pessoa humana, considerado o princípio máximo do Estado democrático de direito, conforme estabelecido no artigo 1º, inciso III da Constituição Federal (Dama,2023).
O princípio da igualdade jurídica entre cônjuges e companheiros é sustentado pelo artigo 226, parágrafo 5º, da CF/88 e pelo artigo 1.511 do Código Civil. Ambos asseguram a igualdade entre cônjuges em relação à sociedade conjugal formada pelo casamento ou união estável, baseada na equiparação de direitos e deveres.
O princípio da igualdade jurídica de todos os filhos assegura que filhos, independentemente de serem fruto de casamento, adoção ou não, possuem os mesmos direitos e qualificações, sendo vedada qualquer forma de discriminação relativa à filiação (Dama,2023).
O princípio da paternidade responsável e do planejamento familiar, conforme o artigo 227, é uma garantia fundamental que exige a responsabilidade dos pais perante os filhos, conforme determinado pela lei ( Diniz, 2019).
O princípio da comunhão plena de vida reconhece o casamento como uma união completa entre os cônjuges, inaugurando um tipo de família originária do casamento, recebendo proteção especial do Estado (Dama,2023).
Finalmente, o princípio da liberdade para formar uma comunhão familiar é um direito de escolha entre o casal no regime de bens do casamento, na aquisição e administração do poder familiar, bem como na tomada de decisões culturais, religiosas e educacionais para os filhos (Diniz, 2019).
Consequentemente, devido a esses princípios e valores estabelecidos pela Constituição, é evidente que a função da família é garantir a dignidade da pessoa humana para todos os membros do grupo familiar.
2.2 AUTORIDADE PARENTAL: ASPECTOS, POSSE E CONSEQUÊNCIAS
O termo "autoridade parental" é uma nomenclatura jurídica moderna que descreve os direitos e deveres dos pais em relação aos seus filhos menores. Anteriormente conhecido como "poder paternal", o termo foi atualizado para "autoridade parental" no sistema jurídico brasileiro, por sugestão de Reale (2003).
A legislação Civil de 1916 referia-se a ele como “poder paterno”, indicando que o comando familiar era predominantemente exercido pelo pai, cuja autoridade era vista como suprema. Historicamente, essa autoridade paterna absoluta garantia o seu exercício com o apoio da mãe, considerando que em caso de discrepâncias, prevalecia a decisão do pai, refletindo a menor influência e autoridade legal das mães sobre os filhos.
É inequívoco que a adoção da terminologia "autoridade parental" na legislação brasileira é uma mudança bem fundamentada, conforme evidenciado pela alteração promovida pelo artigo 3º da Lei Federal nº 12.010/2009, que substituiu a expressão "poder paternal" por "autoridade parental".
Conforme Dias (2015), a autoridade parental é "intransferível, inalienável e imprescritível, originando-se tanto da paternidade natural quanto da filiação legal e socioafetiva. As obrigações decorrentes são extremamente pessoais. Assim como os pais não podem abdicar dos filhos, os encargos provenientes da paternidade também são intransferíveis e inalienáveis."
Gonçalves (2020) define a autoridade parental como "um conjunto de direitos e deveres conferidos aos pais, relacionados à pessoa e aos bens dos filhos menores".
A Constituição expressamente declara que a família é a base da sociedade (art. 226, CF/1988). Adicionalmente, como cita Dias (2015) no Manual de Direito das Famílias: "A Declaração Universal dos Direitos Humanos estabelece que 'A família é o núcleo natural e fundamental da sociedade e tem direito à proteção da sociedade e do Estado'".
Essencialmente, a autoridade parental é concebida com o objetivo de promover o bem-estar das crianças e fortalecer a unidade familiar, em vez de beneficiar exclusivamente os pais.
O Estado tem um interesse claro em proteger o bem-estar das futuras gerações, que representam o futuro da nação, e vê a autoridade parental como uma função pública, atribuída com o propósito de proteger os filhos. Esse conceito está alinhado com o princípio da paternidade responsável, estabelecido no artigo 226, § 7º, da Constituição de 1988.
Sandoval (2014) ressalta que a família é uma instituição mais antiga que a sociedade e o Estado, e desempenha um papel fundamental. A família é a primeira comunidade na vida de um indivíduo, onde as primeiras interações humanas ocorrem e o desenvolvimento inicial da personalidade e do caráter começa.
Os aspectos da autoridade parental estão intrinsecamente ligados à preservação do vínculo entre pais e filhos, caracterizados por serem irrenunciáveis, inalienáveis, imprescritíveis e protetivos.
Diniz (2015) afirma que a autoridade parental é uma responsabilidade pública, agindo como uma incumbência que corresponde a um papel privado. Ela é simultaneamente um direito e um dever dos pais, inalienável e imprescritível, significando que os pais não podem desistir de exercê-la, a não ser nos casos estabelecidos em lei.
A titularidade da autoridade parental é geralmente compartilhada entre os pais, a menos que uma decisão judicial determine o contrário, como em casos de divórcio ou separação. Em muitos sistemas legais, há igualdade de direitos e deveres entre os pais no cuidado dos filhos, promovendo o melhor interesse da criança.
É importante notar que, em algumas situações, quando os pais falham em suas obrigações de cuidado ou quando o bem-estar da criança está em risco, a autoridade parental pode ser suspensa ou revogada judicialmente, e um tutor ou guardião pode ser nomeado para cuidar da criança.
De acordo com o art. 21 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), a autoridade parental deve ser exercida de forma igualitária por ambos os pais, conforme as leis civis. Em caso de discordância, qualquer dos pais pode recorrer ao judiciário para resolver o conflito.
Sendo assim, a autoridade parental gera uma série de efeitos que impactam diretamente os direitos e responsabilidades dos pais em relação aos seus filhos, incluindo o cuidado, proteção, educação, e a administração de seus bens. Em casos de separação, surge o dever de pensão alimentícia, e os pais também têm o direito de orientar seus filhos em questões religiosas e morais. O princípio orientador é sempre o bem-estar da criança, e em caso de discordância, a justiça pode intervir para proteger os interesses das crianças.
3 FUNDAMENTOS DA MEDIAÇÃO
No âmbito geral, o mediador prioriza a escuta ativa das partes envolvidas e busca alternativas para resolver os conflitos. As competências técnicas elevadas são essenciais nas análises dos depoimentos, e a abordagem voluntária e confidencial do mediador proporciona segurança ao processo.
A prática da mediação exige conhecimento específico e um treinamento contínuo em técnicas dedicadas. O mediador deve buscar constante qualificação e aprimoramento de suas competências e atitudes profissionais, mantendo sempre a ética e a credibilidade do processo (CONIMA, Código de Ética para Mediadores).
A voluntariedade do processo de mediação permite que as partes tenham controle sobre a agenda da audiência, possibilitando a expressão de opiniões e a liberdade de tomar decisões em qualquer momento do processo.
Este profissional deve aderir a princípios éticos fundamentais como clareza, competência, confiança, confidencialidade, diligência, harmonia, honestidade, imparcialidade, neutralidade e prudência.
De acordo com o Código de Ética do Mediador, a mediação é um método de resolução de conflitos onde um terceiro, o mediador, facilita a comunicação entre as partes que mantêm uma relação contínua ao longo do tempo, esse processo busca identificar os interesses das partes e alcançar uma solução satisfatória para ambos. A mediação caracteriza-se por ser um processo não-adversarial e voluntário, contando com a assistência de um mediador-especialista para manter a neutralidade e impulsionar o diálogo (Mello, 2004).
Os métodos de mediação avaliam o comportamento das partes e buscam proteger a justiça de maneira evidente, especialmente para aqueles que se mostram mais exaltados durante a audiência, perdendo o controle ou necessitando de suporte psicológico para manter uma conduta ética adequada.
No contexto de mediadores psicólogos, estes profissionais são frequentemente buscados por pessoas em estados de fragilidade emocional, cansaço psicológico, procrastinação ou estresse psicossocial. Segundo Mello (2004), esses mediadores percebem que as projeções são mecanismos de defesa dos mediandos contra o sofrimento emocional como a dor, o luto e a tristeza. A falta de reconhecimento desses fenômenos pode limitar as possibilidades do processo, enquanto sua compreensão pode melhorar significativamente os pontos cruciais afetados pela comunicação anteriormente negligenciada.
Adentrando na Terapia Familiar Sistêmica, a mediação utiliza a Teoria da Comunicação e outras técnicas especializadas para enfrentar os desencadeadores de crises. Em resumo, a mediação se distingue por não operar sob a lógica tradicional de justiça, não envolvendo juízes no processo. O que torna os acordos satisfatórios é que as decisões são tomadas diretamente pelos envolvidos, valorizando a autonomia e a autoresolução.
4 A MEDIAÇÃO NO ÂMBITO FAMILIAR
As transformações comportamentais têm influenciado profundamente o núcleo familiar, gerando discussões sobre essa estrutura contemporânea e fomentando um vínculo de ideias que agilizam os procedimentos judiciais. A mediação de conflitos internos facilita acordos mais fluidos no ambiente jurídico, reforçando o direito das partes em consolidar suas relações de maneira democrática.
Dentro desse contexto, a mediação torna-se um elemento central nas estruturas familiares, pois a escuta ativa das partes auxilia na identificação de soluções eficazes, segundo Toaldo e Oliveira (2011), a mediação familiar procura fomentar uma conduta adequada para a pacificação social, promovendo a comunicação entre pessoas em relações já dissolvidas. Essa prática é vista como um desafio moderno no Direito de Família, onde a afetividade humana nas relações de parentesco — entre pais, filhos, cônjuges — é fundamental. A mediação valoriza o diálogo e a escuta ativa, sendo altamente valorizada por advogados, juízes e outros profissionais do Direito envolvidos em casos familiares.
Nesse papel, o mediador facilita uma maior aproximação com o judiciário e, em alguns casos, pode simplificar questões de menor complexidade que aguardam julgamento. Toaldo e Oliveira (2011) descrevem o mediador como "uma pessoa imparcial e neutra, que facilita o diálogo e a negociação entre as partes, ajudando-as a identificar seus conflitos e desejos".
As rupturas e perdas são experiências comuns, mas profundamente pessoais, como destaca Kovács (1996). Cada indivíduo vivencia esses momentos de maneira única, o que personaliza sua experiência de vida.
A mediação também se estende a diversos tipos de relações familiares, como casamentos, uniões estáveis, relações homoafetivas e poliamorosas, entre outras. Estas formas de relacionamento buscam aceitação, liberdade e convivência harmoniosa, e são cada vez mais reconhecidas e protegidas legalmente em diversos países, em respeito à dignidade humana e aos direitos humanos (Toaldo e Oliveira, 2011).
A ética direta é essencial na prática da mediação, dada a sua natureza delicada e colaborativa, os mediadores, ao atuarem confidencialmente, assumem uma responsabilidade crescente frente à justiça. Por exemplo, na mediação de casos onde um menor revela sua identidade sexual aos pais que não aceitam, o mediador auxilia na compreensão e aceitação dessas questões.
Segundo Viana (2000), o Estado regula a família sob uma ótica política, protegendo todas as formas de estrutura familiar, não apenas aquelas estabelecidas pelo casamento.
A Constituição Brasileira destaca a igualdade de todos perante a lei, assegurando direitos fundamentais como a vida, a liberdade e a igualdade (Art. 5º). A proteção se estende a casais homossexuais em uniões estáveis, reconhecendo seu direito ao amor, afeto e à formação familiar, inclusive através da adoção (Art. 226, CF/88).
Assim sendo, o compromisso com a cidadania demanda um novo caminho para o reconhecimento das famílias, ampliando a compreensão do direito familiar para além do Código Civil e incorporando os princípios da Constituição e as decisões jurisprudenciais, para abraçar a dinâmica dos novos tempos (Fachin, 2003).
Dessa forma, o papel do mediador é crucial para alcançar um consenso rápido e uma harmonia social efetiva, garantindo que as obrigações éticas sejam cumpridas em todos os processos de mediação.
4.1 VANTAGENS DA MEDIAÇÃO FAMILIAR
O conflito é uma constante nas interações humanas, sendo considerado um elemento natural e essencial para o desenvolvimento humano. Silveira (1998, p.791) descreve o conflito como "um estado desencadeado pela coexistência de dois estímulos opostos, resultando em reações que se excluem mutuamente. A opção por um estímulo acarreta a exclusão do outro [...]". Assim, optar por uma das partes gera um antagonismo que provoca respostas adversas.
Dentro do contexto familiar, as crises surgem naturalmente ao longo dos ciclos de vida da família, provocando mudanças nos papéis de seus membros e originando desejos, insatisfações, ressentimentos e perdas. A crescente incidência de rupturas conjugais e a diversidade nas formações familiares, marcadas por laços afetivos, têm propiciado o surgimento de conflitos. Diante dessas circunstâncias, torna-se essencial adotar ferramentas que facilitem a resolução de conflitos, abordando-os em sua origem. A mediação emerge como uma ferramenta eficaz para a prevenção e resolução de disputas, sendo um recurso valioso para preservar as relações familiares (pais e filhos) e promover a harmonia entre as partes, mesmo em situações de separação ou divórcio. Parkinson (2016, p. 39) destaca que:
A mediação familiar é primordialmente utilizada para auxiliar casais em processo de separação a alcançarem acordos mutuamente satisfatórios. Todos os membros da família são considerados — crianças, adolescentes, avós e até padrastos e madrastas. A mediação é benéfica tanto em momentos de crise quanto de transição, melhorando a comunicação entre os membros da família e facilitando acordos e a manutenção de relações, especialmente entre pais e filhos.
É evidente que o restabelecimento da comunicação é um passo crucial para a aproximação dos membros familiares, visto que muitos conflitos se originam de interações inadequadas e hostis.
Para restaurar o diálogo, o mediador deve garantir que cada parte tenha a oportunidade de expressar-se sem interrupções, permitindo que todos tenham tempo suficiente para expor suas ideias e serem entendidos. Com a recuperação da comunicação e o entendimento mútuo, os ex-cônjuges podem definir suas novas responsabilidades dentro da dinâmica alterada da relação, que deixa de ser conjugal.
A mediação familiar deve ser concebida com uma abordagem interdisciplinar, permitindo ao mediador compreender profundamente os diversos aspectos do conflito, estendendo sua visão além das disputas aparentes. Barbosa (2015, p. 86) afirma que:
A mediação interdisciplinar pode desfazer o conflito, transformando a crise em uma oportunidade de crescimento, ao levar os envolvidos a entender a complexa rede que constitui a base do conflito, equipando-os com o conhecimento e reconhecimento de seus direitos e deveres nas relações afetivas. Essa abordagem é denominada responsabilidade.
Portanto, a mediação é uma ferramenta singular que, ao integrar conhecimentos de outras disciplinas como psicologia e sociologia, amplia a compreensão do conflito familiar, possibilitando que os envolvidos percebam a disputa de maneira construtiva ou como uma chance de resolver antigas mágoas.
A mediação familiar enfatiza a responsabilidade ao reconhecer que as partes têm a capacidade de decidir sobre suas próprias necessidades, com base em uma análise criteriosa das informações disponíveis. Este empoderamento permite que as soluções propostas levem em conta as particularidades do caso, reduzindo a probabilidade de novos conflitos.
Neste contexto, é crucial destacar que a mediação promove a inclusão social ao permitir que os interessados participem ativamente do planejamento de suas vidas. Este método consensual foca no futuro e convida seus participantes a engajarem-se ativamente nesse processo, visando atender aos interesses de todos os envolvidos na família (Ganancia, 2001).
A família, portanto, não é apenas vista como uma entidade abstrata; ela adquire uma nova dimensão ao colocar o afeto como base de seu vínculo. Na perspectiva do afeto como o principal elo desse núcleo social, a mediação familiar se apresenta como uma ferramenta destinada a encerrar disputas e restaurar o diálogo, permitindo que, conscientes de seus direitos e deveres, os indivíduos possam continuar suas relações parentais de forma saudável.
No caso de separações, divórcios ou dissoluções de união estável, é comum surgirem divergências sobre a guarda dos filhos. A implementação da guarda compartilhada permite que ambos os pais exerçam igualmente o poder familiar, sempre que possível. Esse avanço consagra o princípio do melhor interesse da criança, embora em algumas situações a guarda unilateral seja considerada mais apropriada. Em tais casos de disputa, os filhos são frequentemente vistos como propriedades, e o conflito se transforma numa competição pela custódia. Ganancia (2001, p. 7) reflete sobre essa rivalidade:
[...] muitos desses conflitos ao redor da criança não são mais do que desavenças conjugais não resolvidas: a criança torna-se o instrumento através do qual os pais, incapazes de superar o fim de seu relacionamento, continuam ligados pelo conflito. Eles usam a criança como um bálsamo para suas feridas narcísicas e, às vezes, como munição na guerra que travam. Reconciliar-se ou punir o outro pode levar a comportamentos de 'apossamento' da criança.
Percebe-se, portanto, que o ressentimento, a hostilidade e o desprezo são emoções negativas frequentes em muitos processos de dissolução conjugal, principalmente devido à perda da comunicação. A restauração do diálogo na mediação familiar oferece o melhor caminho para superar essas barreiras, possibilitando que as partes, através da conversa, retomem o controle de suas vidas ao definirem as responsabilidades de cada um no novo contexto familiar. Assim, a eliminação do ambiente litigioso contribui para a preservação dos vínculos entre pais e filhos e garante uma convivência mais harmônica. Nazareth (2001, p. 66) comenta:
A família, diferentemente de outras sociedades, não se dissolve. Uma vez formada, persiste. A estrutura pode alterar-se com uma separação ou morte, por exemplo, mas a organização familiar continua. Apesar das mudanças estruturais, essas organizações persistem no mundo interno dos indivíduos e influenciam seu universo de relações [...].
Essa "família" interna é responsável pela construção e manutenção de um espaço interno, mental, de relações emocionais. Esse espaço, por sua vez, constrói e abriga o senso de pertencimento, composto pelos sentimentos que cada um nutre em relação ao grupo, fundamentando o que será reconhecido posteriormente como cidadania.
É fundamental ressaltar que a manutenção dos laços afetivos entre os membros de uma família é um dos principais objetivos da mediação. Por meio dessa ferramenta, são criadas condições para refletir sobre as necessidades humanas presentes no conflito, transformando a percepção da disputa em cooperação. Esse resultado é fruto da cultura de paz promovida nas sessões de mediação, que incentivam uma mudança de comportamento e orientam os litigantes (ex-cônjuges) a considerar os interesses de todos os envolvidos na disputa familiar, especialmente os filhos. Parkinson (2016, p. 243) afirma:
Muitos pais enfrentam dificuldades ao se separarem, tornando-se desafiador para eles considerarem o que seus filhos estão experienciando. A mediação é, portanto, extremamente útil para os pais, pois os ajuda a focar nas crianças como indivíduos, além de considerar os sentimentos e necessidades das crianças, bem como os seus próprios. Os pais geralmente desejam priorizar os filhos e são encorajados a fazê-lo.
Importante destacar que a mediação não se confunde com terapia, pois enquanto esta última busca a recomposição da vida conjugal e é conduzida por profissionais especializados com um objetivo de longo prazo, a mediação aborda o conflito familiar de modo a permitir que os envolvidos reestabeleçam a comunicação interrompida para alcançar um acordo que atenda às necessidades de todos. Além disso, a mediação familiar dá autonomia às partes para resolverem seus interesses e os posiciona como responsáveis pelas próprias regras que irão reger suas vidas.
CONCLUSÃO
Este artigo examinou os princípios e práticas da mediação, com um foco especial no contexto familiar, destacando a importância de abordagens não adversariais para a resolução de conflitos onde as relações contínuas são uma preocupação central. Através da análise de literatura, foi possível identificar as competências essenciais que os mediadores devem possuir, bem como as técnicas eficazes que facilitam a comunicação e promovem soluções consensuais entre as partes.
Os resultados deste estudo reforçam a visão de que a mediação não apenas oferece uma alternativa ao litígio convencional, mas também serve como um mecanismo de fortalecimento das relações e de promoção da harmonia social. A habilidade do mediador em manter a neutralidade e promover um diálogo eficaz é fundamental para o sucesso do processo, especialmente em casos familiares onde o emocional e o relacional são intensamente interligados.
Além disso, a pesquisa destacou a importância de um código de ética rigoroso para guiar a prática dos mediadores, assegurando que a confidencialidade, a imparcialidade e a competência sejam mantidas em todos os processos. A aceitação crescente da mediação como uma forma legítima e eficaz de resolver disputas sugere uma tendência positiva na busca por justiça que é mais inclusiva e acessível.
Para futuras investigações, seria benéfico expandir o escopo da pesquisa para incluir uma análise comparativa entre diferentes culturas e sistemas jurídicos, a fim de explorar como a mediação é adaptada e implementada em diversos contextos sociais e legais. Além disso, um foco em treinamento e educação para mediadores pode fornecer insights valiosos sobre como aprimorar ainda mais a eficácia dessa prática.
Em conclusão, este estudo sublinha a mediação como uma ferramenta vital para a resolução de conflitos, especialmente aqueles dentro do ambiente familiar, a promoção de práticas de mediação mais robustas e éticas não apenas beneficiam as partes envolvidas, mas também contribui para uma sociedade mais justa e equilibrada. A continuidade no aperfeiçoamento das práticas de mediação garantirá que ela continue a ser uma opção valiosa para a gestão de conflitos no futuro.
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