A LIBERDADE DE IMPRENSA E O DIREITO À PRIVACIDADE DE PESSOAS PÚBLICAS NO ORDENAMENTO JURÍDICO
Por Darla de Medeiros Gonçalves Gaspar | 27/10/2015 | DireitoA LIBERDADE DE IMPRENSA E O DIREITO À PRIVACIDADE DE PESSOAS PÚBLICAS NO ORDENAMENTO JURÍDICO[1]
Darla de Medeiros Gonçalves Gaspar[2]
Laysa Ribeiro Soares[3]
Amanda Costa Thomé Travincas[4]
Sumário: Introdução; 1. Conceitos e noções acerca da liberdade de imprensa e do direito a imagem; 2. A possibilidade de restrição dos direitos fundamentais; 3. Breve análise de um caso concreto; 4. Considerações Finais e Referências.
RESUMO
O presente trabalho tem como finalidade principal, analisar as relações entre a liberdade de imprensa e o direito à privacidade envolvendo pessoas públicas. Para isso, procura-se primeiramente verificar as diferenças e limites entre tais direitos. Buscando base na legislação, na doutrina e na jurisprudência, procurar-se-á analisar o que as diversas fontes defendem acerca de tais direitos. Posteriormente, pretende-se analisar um caso verídico que tenha utilizado a ponderação entre os direitos envolvidos, as decisões e conflitos que fizeram prevalecer certos direitos em face de outros.
Palavras-chave: Liberdade de imprensa. Direito à privacidade
Introdução
Este trabalho tem por pretensão discorrer sobre os conceitos prévios envolvendo a liberdade de imprensa (direito de expressão) e o direito a imagem, principalmente em relação às pessoas públicas. O direito a imagem é um direito personalíssimo, previsto no art. 5, X, CF e inerente às pessoas, ou seja, é um direito que só pode ser exercido por um titular e compete a todas as pessoas. Esse direito é intransferível na maioria dos casos, podendo ser permitido o seu uso para uma atividade específica, como é o caso do uso da imagem de alguém para propagandas para fins comerciais, porém essa permissão surge mediante autorização dada pelo titular de direito.
A liberdade de imprensa proporciona o surgimento do direito de expressão previsto no art. 220, CF, sendo um meio que auxilia e protege o Estado democrático de direito, já que exerce a função de noticiar e informar os possíveis abusos por parte do Estado. Contudo, essa não é a única função da impressa nos dias atuais, ela tem se voltado para outro âmbito de atuação, que visa independente de qualquer coisa, o lucro. É notável que exista o direito de expressão e a liberdade de impressa, porém deve-se considerar algumas limitações, que não permitem abusos a outro direito, o direito a privacidade.
Tornou-se comum, com o uso da internet, o compartilhamento de imagens próprias ou alheias sem restrições em relação à autorização. Em um campo difícil de combater abusos, como é o caso da internet em específico, vários acreditam estarem protegidos por trás da tela de um computador. Em um número crescente de sites e revistas sensacionalistas, a busca por uma informação nova é fundamental para alimentar parte da população sedenta por notícias fúteis e sem conteúdo e para isso muitos meios de comunicação caluniam e difamam pessoas públicas.
As pessoas públicas são aquelas pessoas que exercem algum tipo de atividade pública, podendo ser artística ou política, por exemplo, de grande visualização por meio de um público. Essas pessoas que estão expostas na mídia também possuem o direito a honra, a privacidade e a imagem, portanto, poderão ser protegidas em âmbito judicial. Busca-se com o trabalho, encontrar um limite entre a exposição das pessoas públicas e a liberdade dos meios de comunicação.
1. Conceitos e noções acerca da liberdade de imprensa e do direito a imagem
A Constituição de 1988 veio contribuir de forma contundente acerca das liberdades de imprensa e de expressão principalmente no sentido de afirmar o espírito democrático da nova ordem social, advinda de um período de cerceamento desses direitos. Após o período da ditadura militar, sentiu-se a necessidade de positivar tais direitos a fim de garantir que não haveria um retrocesso social. Como afirma Lorenzo (2011, p.392), “A Carta de 1988 foi pródiga em disposições que, direta ou indiretamente, estão relacionadas ao tema. Com efeito, ela assegura a livre manifestação do pensamento e a liberdade de expressão intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença (art. 5º, IV e IX)”. Conforme o próprio texto constitucional, Título II, Capítulo I, Artigo 5º,
IV – é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;
V – é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem;
(...)
IX – é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença;
X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.
Nota-se que houve uma preocupação em assegurar tais direitos positivando-os na Lei Maior. Vários são os dispositivos espalhados por toda a Constituição acerca desses direitos. Assim, tem-se que a positivação de tal direito pode ser tida também como veículo de afirmação da democracia. Um Estado democrático defende e respeita a liberdade de expressão de seu povo em todas as suas vertentes, como marca de uma política onde todos são iguais e garante com isso, a dignidade da pessoa humana – outro direito fundamental para uma sociedade democrática. Entretanto, o direito à imagem também pode ser entendido como decorrente do direito de livre expressão. Entende-se, dessa forma, que a liberdade de imprensa consiste na liberdade de troca de informações, experiências e ideias acerca dos mais variados assuntos.
A liberdade de expressar o pensamento provém da liberdade de opinar e por sua vez, chamar a atenção dos interlocutores para determinada área de interesse, muitas vezes coletivo. Por se tratar de uma ampla expressão de ideias, a liberdade de imprensa muitas vezes, fere outros direitos fundamentais, como interesses e divergências políticas, pensamentos e opiniões que agridem ideologias e por sua vez, ajuda a criar correntes de pensamento crítico que incomodam principalmente pessoas públicas. Dessa forma, direitos individuais e coletivos podem ser diretamente afetados pelo direito de liberdade de imprensa.
Porém, como afirma Lorenzo (2012, p. 401), “A liberdade de expressão não é um direito absoluto, nem ilimitado. Nenhum direito fundamental o é. (...). Assim, em caso de conflito, ela poderá, eventualmente, ceder lugar em favor de outros bens e valores constitucionalmente protegidos”. Isso significa que embora importante para o Estado democrático de direito, a liberdade de imprensa e expressão pode ficar em segundo plano num determinado caso concreto. É necessário que se avaliem valores e direitos para sopesar aquele mais primordial dependendo do caso avaliado.
Nas palavras de Lorenzo (2011, p. 403):
Em seu voto na ADPF nº 130, o Min. Carlos Ayres de Britto sustentou que o legislador não poderia estabelecer nenhum limite em relação às matérias essencialmente de imprensa, mas apenas às questões lateralmente de imprensa. Para ele, só seriam admissíveis restrições decorrentes do próprio texto constitucional. O Min. Gilmar Mendes, no entanto, consignou em seu voto na ADPF nº 130 e, posteriormente, reafirmou o ponto no voto condutor que proferiu no RE nº 511.961/SP, que seriam admissíveis restrições legais à liberdade de expressão e de imprensa, desde que visem a promover outros bens e valores constitucionais relevantes e passem pelo teste da proporcionalidade.
Isso pressupõe que a liberdade de imprensa, embora apresente opiniões divergentes na jurisprudência, é sem dúvida, um direito inerente ao estado democrático e funciona como suporte de exercício de outros direitos. Por esse motivo, a Constituição de 1988 veio proibir veementemente a censura como forma de reprovar as ações cometidas no período da ditadura militar e como meio de reafirmar o posicionamento democrático da nova carta. Como afirma Barroso (?),
Em todos os tempos e em todos os lugares, a censura jamais se apresenta com instrumento da intolerância, da prepotência ou de outras perversões ocultas. Ao contrário, como regra, ela destrói em nome da segurança, da moral, da família, dos bons costumes Na prática, todavia, oscila entre o arbítrio, o capricho, o preconceito e o ridículo. Assim é porque sempre foi.
A censura é assim, uma forma de privar as massas de entendimento, de pensamento crítico e assim, impede que a situação de opressão se perpetue. Entretanto, alguns pontos divergentes surgem constantemente no panorama nacional e a jurisprudência se posiciona no sentido de defender antes de tudo, os interesses envolvidos em cada caso concreto. Daí se conclui que, embora primordial, o direito de liberdade de imprensa pode colidir com direitos mais importantes, dependendo do caso concreto. Como bem explica Sarmento (?),
Hoje, no Brasil, a imprensa trabalha com liberdade, exercendo o seu legítimo papel de controle sobre os atos do Estado, e os artistas podem produzir as suas obras sem o temor das idiossincrasias dos censores de plantão. Respira-se, enfim, um ar mais livre. Mas é justamente neste novo cenário que surgem as questões mais complexas relacionadas à liberdade de expressão, envolvendo a imposição de limites a este direito fundamental, necessários à proteção de outros direitos igualmente importantes, como igualdade, privacidade, honra e devido processo legal.
Nesse ponto, entra em conflito o direito de imagem, que por sua vez, também representa um direito inerente à dignidade da pessoa humana e tem sido ultimamente muito afrontado, principalmente em face dos avanços tecnológicos, os quais indicam o estilo de vida valorizado em dado período de tempo no contexto social, cultural e econômico.
Atualmente, a televisão, o cinema, a imprensa escrita e falada, enfim, os mais diversos meios de comunicação promovem a cada momento, pessoas que são eleitas pelo público, um ícone de admiração. Pessoas que levam um estilo de vida que provoca no público, sentimentos de desejo. A economia, por sua vez, utiliza esses ícones como fonte de renda, uma vez que tais sujeitos, tidos como atores sociais, propagam objetos e estilo de vida que favorecem o desejo das massas.
Entretanto, quando essas pessoas tidas como públicas têm sua privacidade invadida, surge nesse momento, uma afronta a esse direito. Um meio de se atingir a privacidade é a divulgação de imagens de pessoas públicas sem seu consentimento. Essas pessoas sentem suas vidas devassadas pela liberdade de imprensa e então se forma o conflito entre tais direitos: o de imagem e o de liberdade de imprensa. Como afirma Luís Gustavo Grandinetti Castanho de Carvalho (apud Barroso, ?),
Tanto a liberdade de expressão quanto a de informação encontram limites constitucionais. (...). Vivemos em um Estado de Direito em que o exercício dos vários direitos devem ser harmônicos entre si e em relação ao ordenamento jurídico. Desse modo, a liberdade de expressão também se limita pela proteção assegurada constitucionalmente aos direitos da personalidade, como a honra, imagem, intimidade etc.
Consequentemente, pode a jurisprudência resolver problemas de conflito entre os direitos de imprensa e de imagem a partir da provocação feita pela pessoa ofendida. Também a doutrina encontra soluções acerca da colisão de direitos, entretanto, como afirma Barroso, a opinião doutrinária se restringe aos valores morais e sociais da família.
Nesse aspecto, há também a opinião particular de cada indivíduo, que concebe valores individuais, mas ao mesmo tempo, coletivos e em conjunto, tais indivíduos, formam opiniões propagadas pelo exercício da liberdade de imprensa.
2. A possibilidade de restrição dos direitos fundamentais
Na solução de conflitos entre direitos, procura-se estabelecer razoavelmente, qual deles deve prevalecer em face do outro. A teoria de Robert Alexy serve de base para melhor se compreender como se dá a resolução em caso de conflito de direitos. Segundo esse teórico, a diferença entre regras e princípios reside não na amplitude de sua abrangência, mas na própria estrutura de cada um deles.
Enquanto as regras podem ser utilizadas num ângulo de vigência mais específico, os princípios são mais amplos e permitem uma aplicação mais abstrata sobre determinado direito. Enquanto as regras podem ou não ser aplicadas, os princípios podem ser utilizados de forma maximizada ou minimizada em face de outros princípios.
Dessa concepção decorre a lei de colisão, a qual permite que se avaliem os critérios utilizados para sopesar os princípios entre si e garantir uma melhor resolução desse conflito. De acordo com esse teórico, (2011, p. 117), “Quando uma norma de direito fundamental com caráter de princípio colide com um princípio antagônico, a possibilidade jurídica para a realização dessa norma depende do princípio antagônico. Para se chegar a uma decisão é necessário um sopesamento nos termos da lei de colisão”.
Citando Alexy (2011, p. 95), “O objetivo desse sopesamento é definir qual dos interesses – que abstratamente estão no mesmo nível – tem maior peso no caso concreto”. Pela lei de colisão, o conflito entre dois princípios pode ser resolvido a partir do seguinte procedimento:
(P1 P P2) C, se (P1) C → R, logo C →R. Onde,
- P1 é representado pelo princípio 1;
- P intermediário entre os dois princípios, significa que um prevalece em face do outro;
- P2 é o princípio 2;
- C é o caso concreto ou circunstância;
- R é o resultado.
No caso de conflito entre o direito de imagem e o de direito de imprensa, o procedimento seria o mesmo, porém o resultado dependeria do caso concreto. A precedência de um direito em relação a outro é discutível, uma vez que, segundo Alexy (2011, p.97),
O Tribunal Constitucional Federal exclui a possibilidade dessa forma de relação de precedência com a afirmação: ‘nenhum desses interesses goza, em si mesmo, de precedência sobre o outro’. Essa afirmação vale de forma geral para as colisões entre princípios de direito constitucional. (...). A questão decisiva é, portanto, sob quais condições qual princípio deve prevalecer e qual deve ceder. Nesse contexto, o Tribunal Constitucional Federal utiliza-se da muito difundida metáfora do peso. Em suas palavras, o que importa é se os ‘interesses do acusado no caso concreto têm manifestamente um peso significativamente maior que os interesses a cuja preservação a atividade estatal deve servir’. Esses interesses não têm um peso quantificável. Por isso, é necessário indagar o que se quer dizer quando se fala em ‘pesos’. O conceito de relação condicionada de precedência oferece uma resposta simples. Em um caso concreto, o princípio P1 tem um peso maior que o princípio colidente P2 sob as condições C, presentes nesse caso concreto.
A precedência, de acordo com o Tribunal acima citado, relaciona-se àqueles direitos diretamente ligados à vida, à saúde, à dignidade da pessoa humana, enfim, a direitos primordiais e principais, em segundo plano, aos direitos decorrentes destes. Nas palavras de Alexy (2011, p. 98), “Salta aos olhos que nela não se faz menção à precedência de um princípio, de um interesse, de uma pretensão, de um direito ou de um objeto semelhante; na verdade, são indicadas condições sob as quais se verifica uma violação a um direito fundamental”.
Pode-se afirmar, portanto, que embora se deva colocar cautelosamente um direito precedente a outro, tal método é o que mais garante a segurança jurídica e consequentemente, afasta a possibilidade de decisões arbitrárias.
3. Breve análise de um caso concreto
A fim de exemplificar melhor como ocorre esse abuso da liberdade de imprensa, utiliza-se o caso da apresentadora Maria da Graça Meneguel (Xuxa), que teve fotos suas exibidas pelo canal de televisão Rede Record. A apresentadora participou de um ensaio fotográfico de nu artístico há mais de vinte anos atrás, quando recentemente no programa Gugu, foram exibidas as tais fotos sem autorização da mesma. Xuxa moveu uma ação para proibir o uso das fotos pela Record com o pediu de uma indenização por danos morais.
A emissora afirmou que as imagens exibidas em um curto espaço de tempo já haviam sido expostas antes quando publicadas nas revistas e que a divulgação das imagens teriam sido permitidas pela a apresentadora. A justificativa dada pela emissora envolve a exposição anterior de Xuxa para as determinadas fotos, que ao participar do ensaio fotográfico ela já estaria violando o seu direito a privacidade e a intimidade, já que as fotos foram divulgadas na mídia. . Como afirma Maria Helena Diniz (2004, p. 105):
A intimidade é a zona espiritual íntima e reservada de uma pessoa ou de um grupo de indivíduos, constituindo um direito de personalidade, daí o interesse jurídico pelo respeito à esfera privada. Desse modo o autor da intrusão arbitrária à intimidade alheia deverá pagar uma indenização pecuniária, fixada pelo órgão judicante de acordo com as circunstâncias, para reparar dano moral ou patrimonial que causou. Além disso, deverá o magistrado ordenar medida que obrigue o ofensor a cessar suas ingerências na intimidade alheia, se estas ainda continuarem e, se possível, devera exigir o restabelecimento da situação anterior à violação, às expensas do lesante, como, p. ex., a destruição da coisa produzida pelo atentado à intimidade.
Contudo, a decisão dada pelo TJRJ por meio do desembargador Eduardo Gusmão Alves de Brito, da 16ª Câmara Cível do TJRJ discordou das justificativas dadas pela emissora e proibiu a vinculação das imagens, bem como estipulou uma multa no valor de R$ 1 milhão no caso de descumprimento da decisão. A decisão tomada pelo desembargador levou em consideração dois fatores: o fato de a Rede Record ser uma emissora de grande porte no país e o público que foi atingindo com a divulgação das imagens.
A Rede Record pretendia diminuir a multa consideravelmente a um valor ínfimo considerando-se o patamar da emissora, que ocupa o segundo lugar dentre as demais emissoras de televisão, o que poderia gerar com maior facilidade o descumprimento da decisão do magistrado. Outro ponto relevante é o público, que com a exibição das imagens atingiu. Originalmente as fotos foram destinadas para o público masculino, já que o teor das imagens era de cunho sensual, inadequadas, portanto, para crianças e adolescentes, porém, o programa colocou no ar as imagens em um horário livre e para uma faixa etária que permitia com que crianças e famílias pudessem ter conhecimento das fotos.
No mundo moderno, as relações sociais se multiplicam rapidamente, o acesso às informações e o desenvolvimento das redes de comunicação favorecem o constante surgimento de pessoas que rapidamente se tornam ícones de personalidade, moda, estilo de vida, enfim, de uma gama de aspectos explorados continuamente pelos vários canais de comunicação. A internet é um canal que permite que pessoas antes anônimas se tornem públicas em frações de segundos, como afirma Rogério Greco (2013, p. 597):
A internet, dentro de um mundo considerado globalizado, se transformou em uma necessidade da modernidade, de que não podemos abrir mão. Nunca as pesquisas foram tão velozes. Bibliotecas inteiras podem ser resumidas a um comando no computador. No entanto, toda essa modernidade de informática traz consigo os seus problemas.
Dessa forma, muitas vezes ocorre que a imagem utilizada por esses canais, a fim de chamar a atenção da sociedade ou mesmo para vender seu acesso, não passa por autorização. As pessoas públicas, embora, desempenhem um papel social, possuem os seus direitos à privacidade e à imagem, os quais, muitas vezes são desrespeitados. Cabem as pessoas públicas, o respeito as suas vidas privadas envolvendo, no entanto, ações em âmbito privado ou público. Embora, as pessoas públicas sejam reconhecidas, é restrito somente a elas revelarem os fatos particulares das suas vidas, bem como é facultado às mesmas manterem ou não o resguardo à intimidade (GONÇALVES, 2004. p. ?).
Uma parte da doutrina afirma que as pessoas públicas possuem o âmbito de proteção do direito a privacidade mais restrito em relação às pessoas comuns, ou seja, aquelas que não são conhecidas e não estão expostas na mídia, já que as pessoas públicas ao alcançarem o desejado reconhecimento do público e a fama, se expõem por livre e espontânea vontade. Contudo, a corrente majoritária da doutrina afirma que embora as pessoas públicas estejam expostas espontaneamente na mídia, ainda sim elas são detentoras do direito a intimidade, já que estes são direitos personalíssimos que cabem restrições, contudo não cabe a retenção. Segundo Oliveira (apud Vasconcellos, 2012, p.10), “os direitos da personalidade são supralegais e hierarquicamente superiores aos outros direitos, mesmo em relação aos direitos fundamentais que não sejam direitos da personalidade, como, por exemplo, o direito de imprensa, que não se insere entre os direitos da personalidade”.
Em relação à liberdade de imprensa e o direito à liberdade de informação deve existir um propósito por trás de toda informação. Propósito esse voltado para o esclarecimento de fatos importantes para toda a sociedade, que tenha um cunho político, social e mesmo de entretenimento, porém respeitando a vida privada das outras pessoas. Como afirma Maria Helena Diniz (2004, p. 130):
Esses limites, delineados pelo art. 20, caput, do Código Civil, são impostos pelo direito à liberdade de informação, traduzido na forma peculiar da liberdade de pensamento e de expressão, contida no art. 19 da Declaração Universal dos Direitos do Homem e no art. 10 da Convenção Europeia e adotada por quase todas as Constituições do mundo, desde que se atenta ao interesse público da busca pela verdade para a formação da opinião pública sem, contudo ferir a vida privada do retrato, que deve ser preservada.
Portanto, a divulgação das fotos da apresentadora Xuxa não teve o intuito de informar a sociedade, a intenção era somente aumentar a audiência do programa e gerar comentários, além disso, não se preocuparam em buscar autorização, o que prova que a intenção de fato não tinha um cunho jornalístico e sim de polemizar.
4. Considerações Finais
Tendo em vista o amplo caráter protetor da Constituição Brasileira de 1988 acerca dos direitos fundamentais, a existência de conflitos de direitos relativos à liberdade de expressão e direito de imagem nos dias atuais, carregados por toda sorte de meios de comunicação, os quais buscam a todo o momento, fabricar notícias e vender imagens, surgem problemas que buscam amparo na legislação. Porém, tanto a doutrina quanto a jurisprudência ajudam nesse campo, procurando sanar tais conflitos e permitindo que abusos sejam contidos.
De acordo com o exposto, conclui-se que a análise da colisão entre direitos tão inerentes ao estabelecimento do estado democrático, da dignidade da pessoa humana, é um exercício de reflexão sobre o que realmente importa para o indivíduo, no sentido de promover o bem estar individual e coletivo.
No caso de conflito entre o direito de liberdade de imprensa e o direito à imagem, depreende-se que direito de liberdade de imprensa pode e deve ser exercitado, desde que não viole o direito de imagem das pessoas, mesmo as pessoas ditas públicas. Nos casos em que o direito à imagem é ofendido, também está prevista constitucionalmente sua defesa, e a violação desse direito deve ser veementemente reprimida.
Pode-se perceber que a ciência do direito é algo tão rico e complexo, que não tem fórmulas prontas, mas depende sempre do caso concreto, buscando uma solução que não agrida o indivíduo em sua intimidade nem a coletividade em seu direito de expressão. Nesse trabalho, buscou-se principalmente entender como pode ocorrer esse conflito e a partir da teoria de Robert Alexy encontrar-se uma solução imparcial, uma vez que se está diante de princípios e direitos primordiais defendidos pela Constituição.
Vale lembrar que se deve levar em conta o período pelo qual o país enfrentou durante a ditadura militar e por esse motivo, compreender e valorizar a amplitude dos direitos de liberdade de imprensa e livre expressão e todos os direitos desses decorrentes. A partir dessa observação, pode-se perceber que a nossa Constituição é a mais completa obra de defesa dos interesses do povo, especificamente, de cada indivíduo e da coletividade como um todo. Portanto, a complexidade da abrangência dos princípios constitucionais relativos aos direitos fundamentais permite a colisão de interesses os quais muitas vezes devem ser entendidos como pressupostos de cidadania e defesa da dignidade da pessoa humana.
Levando em conta os limites impostos pelos próprios direitos, cada indivíduo goza de sua liberdade e por sua vez, não pode invadir o direito do outro. Essa é uma grande lição que a Constituição ensina: exercitar direitos e ao mesmo tempo, respeitar o direito do outro. Esse pode ser entendido um requisito básico para a vida harmoniosa da sociedade, assim como todo Estado que defende tais direitos, objetiva a qualidade de vida de seu povo.
REFERÊNCIAS
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