A LEI 12.694/12 PROTEGENDO OS JUÍZES DAS AMEAÇAS DE ORGANIZAÇÕES CRIMINOSAS EM DETRIMENTO DA INSTAURAÇÃO DE UM DEVIDO PROCESSO PENAL LEGAL: críticas e considerações frente à legislação infra e supralegal

Por Andre Crescenti Abdalla Saad Helal | 01/10/2014 | Direito

A LEI 12.694/12 PROTEGENDO OS JUÍZES DAS AMEAÇAS DE ORGANIZAÇÕES CRIMINOSAS EM DETRIMENTO DA INSTAURAÇÃO DE UM DEVIDO PROCESSO PENAL LEGAL: críticas e considerações frente à legislação infra e supralegal Andre Crescenti Abdalla Saad Helal; Cleopas Isaías Santos Sumário: Introdução; 1 Noções gerais do devido processo penal legal brasileiro; 2 A problemática do ‘juiz sem rosto’ diante das garantias processuais do imputado; 2.1 A (in)conformidade constitucional da lei 12.694/2012; 3 A interferência midiática na edição legislativa processual penal; Considerações Finais; Referências; RESUMO Este paper tem como propósito entender se, dado o fato de que o princípio do juiz natural confere aos indivíduos o direito de ter conhecimento acerca do juiz que julgará o processo aos quais estão submetidos, há uma conformidade da lei 12.694/2012 para com o sistema constitucional brasileiro. Assim, questionar-se-á a legitimidade que existe no fato de uma organização criminosa desconhecer a maneira pela qual fora conduzido seu julgamento. Além de se considerar se há violação às garantias constitucionais processuais do devido processo legal, nos princípios do juiz natural, da publicidade dos atos processuais e outros. E, ainda, se não seria, a medida do “juiz sem rosto” com o fim pela qual foi criada, apressada e mal aferida pelo legislador frente à pressão midiática. PALAVRAS-CHAVE Lei 12.694/2012; Devido processo legal penal; Princípio do juiz natural; Organizações criminosas; INTRODUÇÃO Dentre as contribuições filosóficas modernas que visaram à construção de um Estado racional, inadmitindo qualquer tipo de abuso frente ao que se começava a entender como liberdade e dignidade humana, sobreveio um Direito Processual Penal de garantias. No contexto brasileiro, faz-se mister destacar que a Carta Magna de 1988 fora a responsável por trazer a noção de garantias individuais - ou ainda garantias da própria jurisdição - àqueles que necessitassem passar por um processo judicial. Daí vem a insurgência do devido processo penal legal na realidade nacional. A Lei 12.694/12, a qual neste estudo será tratada, traz consigo alguns dispositivos que implicam diretamente na atividade dos membros do Judiciário e do Ministério Público brasileiro no que concerne aos atos processuais e às medidas de segurança dos mesmos. Dentre as novidades advindas na lei, destaca-se a possibilidade de o magistrado, por sua iniciativa, instaurar um colegiado de julgadores de competência criminal na primeira instância, indicados aleatoriamente via sorteio eletrônico, para que o réu não saiba quem foi o magistrado que julgou na possibilidade de risco à integridade física do juiz titular do órgão que julga o processo. Dando, desse modo, legalidade ao que tem se chamado de “juiz sem rosto”, como afere o art. 1º, §6º do mesmo dispositivo legal. No entanto, apesar da boa intenção do legislador em proteger a vida e a integridade física do magistrado que pudesse sofrer retaliações decorrentes de decisões prejudiciais aos componentes de organizações criminosas, cabe ressaltar que tal modificação da atividade judiciária implica numa série de questionamentos referentes às violações às garantias fundamentais do acusado a partir do sigilo que reza a lei. Assim, será analisado neste paper algumas delas: devido processo legal, juiz natural, publicidade dos atos processuais, motivação das decisões judiciais, identidade física do juiz e outros aspectos constitucionais que já começam a provocar a lida crítica doutrinária. Por fim, indaga-se, será que a proteção aos magistrados pelos meios encontrados pela lei realmente prevalece em detrimento da supressão de garantias individuais dos jurisdicionados durante o curso do processo, considerando a rege constitucional do sistema jurídico? O método utilizado é o da pesquisa bibliográfica e de análise crítica e contundente da nova legislação frente aos dispositivos infra e supra-legais cabíveis. 1 Noções gerais do devido processo penal legal brasileiro O princípio do devido processo legal - due process of law - está previsto na Constituição Federal de 1988, em seu artigo 5°, LIV, in verbis: “ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”. Como se vê, tal dogma constitucional assegura aos indivíduos que os mesmos não passarão por um processo cujo não se siga a forma estabelecida em lei. Deve-se, portanto, haver um processo legal, justo e adequado. Doravante, cumpre esclarecer que o devido processo legal impõe ao Estado um dever, e garante aos cidadãos que seus direitos sejam respeitados. Nesta análise tratar-se-á, com especificidade, do devido processo penal legal. Visto que acerca do destino dos acusados em um processo criminal, Ruy Barbosa recita: “não há pena sem processo e nem processo senão pela Justiça”. O processo devido, então, faz parte do caminho percorrido pelos atores da Justiça quando da possível existência de uma conduta tipificada penalmente. O direito processual é, assim, do ponto-de-vista de sua função jurídica, um instrumento a serviço do direito material: todos os seus institutos básicos (...) são concebidos e justificam-se no quadro das instituições do Estado pela necessidade de garantir a autoridade do ordenamento jurídico (CINTRA. GRINOVER. DINAMARCO; p. 46, 2011). O que se pretende, todavia, é questionar o motivo que levou o legislador a editar a Lei 12.694/12 e permitir que o juiz modifique o processo penal pelo qual passam as organizações criminosas. E também observar se a norma procedimental que realiza a mudança do modos operandi tem respaldo infra e supra-legal, visto que, segundo Guimarães e Carvalho (p. 87, 2008), todas as pessoas deveriam ter, de forma absoluta, o mesmo tratamento em sede de direito penal instrumental. 2 A problemática do ‘juiz sem rosto’ diante das garantias processuais do imputado Para Tourinho (p. 42, 2006), o juiz natural consiste no “órgão previsto explícita ou implicitamente no texto da Carta Magna e investido do poder de julgar” ou ainda, “aquele constituído antes do fato delituoso a ser julgado, mediante regras taxativas de competência estabelecidas pela lei” (LIMA, p. 52, 2011). Impera o entendimento de que o juiz natural, portanto, seria aquele que já era investido da competência no momento em que o ato criminoso fora praticado. Essa premissa, então, ainda nas vistas do mesmo autor, Renato Brasileiro, seria proveniente da “preocupação de preservar o acusado e sua liberdade de possíveis desmandos dos detentores do poder”, para que se faça valer a regra do tempus criminis regit iudicem. O ministro Celso de Mello, por seu turno, fala ainda de uma dupla função instrumental do princípio do juiz natural. Uma faceta de garantia indisponível que tem como titular qualquer pessoa à execução criminal. E outra de limitação insuperável, que restringe aos órgãos estatais a judicial repressão criminal (STF, HC nº 81.963/RS, 2º turma, DJ 28/10/2004). No caso que se revela, como a lei é recente, no momento do ato delituoso a mesma disposição já teria que estar vigendo para que não se possa emergir a ideia de um tribunal de exceção. Contudo, ainda assim, sustenta-se que o tribunal de exceção não estaria configurado até porque, observa-se que o juiz natural não é afastado do processo, mas sim contará, na formação do colegiado, com mais dois juízes de mesma competência material. O procedimento normativo em voga, quanto à seleção desses dois magistrados, é, pois, viável, visto que o sistema aleatório do sorteio eletrônico afasta qualquer possível interferência externa da vontade de terceiros no processo, o que também poderia caracterizar, do contrário, o tribunal de exceção. Desse modo, entende-se neste artigo que a vertente temporal, obedecida ambas facetas do princípio do juiz natural não estaria sendo violada. Contudo, existem outras maneiras de violar o mesmo princípio, como se conceberá adiante. Embora não haja expressamente na Carta Constitucional a previsão do juiz natural, é possível percebê-lo implicitamente em alguns dispositivos, tais como: Art. 5º, XXXVII e LIII, que rezam, respectivamente: “não haverá juízo ou tribunal de exceção” e “ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente”. Com todo esse respaldo supremo, fica viável dizer que o juiz natural é o que também se chama de juiz constitucional. No que se refere a estes incisos, observada a ocorrência do art. 1º da lei em comento, já se eliminou a existência da violação do primeiro no parágrafo anterior. Entretanto, o segundo merece maior atenção ao questionar-se: serão os dois julgadores sorteados a pedido do juiz que julga os crimes praticados por organizações criminosas, competentes para possivelmente sentenciar no processo? Para responder a essa indagação, considera-se a doutrina: “somente se considera juiz natural ou autoridade competente, no direito brasileiro, o órgão judiciário cujo poder de julgar derive de fontes constitucionais” (MARQUES, p. 447 apud FERNANDES, p. 133, 2005). No tópico três se explorarão explicações quanto ao (in)conformismo constitucional do dispositivo sob análise frente à figura do ‘juiz sem rosto’. Prosseguindo pelas vias de outros princípios derivados da garantia do devido processo penal legal, encontra-se o princípio da publicidade, segundo o qual todos os atos processuais são públicos. Para justificar tal destaque da relevância deste princípio para o processo penal, o autor Eberhard Schmidt (apud TOURINHO, p. 44, 2006) afirma que se ocorresse a eliminação da publicidade da Justiça Penal perante a sociedade, que se demonstra como grande interessada nos debates judiciais, isso significaria uma ‘crise de confiança’ gerada pela mesma. Portanto, constata-se que, o art. 1º da Lei 12.694/12, ao mesmo tempo que intenta a proteção do magistrado, peca ao proceder às medidas de segurança por meio do sigilo, impedindo que os atos processuais sejam publicizados, impossibilitando a transparência da atividade jurisdicional. Neste mesmo sentido, defende Tourinho (p. 36, 2006) que “quanto mais democrático for o regime, o processo penal mais se apresenta como um notável instrumento a serviço da liberdade”. E ainda, a favor da prestação jurisdicional democrática, completa Ferrajolli (p. 567, 2006 apud LIMA, p. 42, 2006) que “são evitados excessos ou arbitrariedades no desenrolar da causa, surgindo, por isso, a garantia como reação aos processos secretos, proporcionando aos cidadãos a oportunidade de fiscalizar a distribuição da justiça”. A publicidade é vislumbrada, desse modo, como uma garantia da garantia, se comportando como requisito indispensável do sistema acusatório brasileiro, como pressuposto de validade dos atos processuais e das próprias decisões que são tomadas pelo Poder Judiciário. Ressalta-se, ademais, que a publicidade ganha diferentes nomenclaturas nas suas duas vertentes, sendo elas plenas/gerais/populares ou para as partes/restritas/especiais/mediatas. Atualmente a regra é a da publicidade popular, de modo a influir no conceito de Justiça Criminal transparente, que está expressa legalmente no art. 792 do CPP , porém existem casos em que há uma limitação da publicidade. A própria CF em seu art. 5º, LX, prevê o sigilo, em casos em que a exigência provém do interesse público ou em casos de preservação da intimidade. Todavia, não é o caso da lei em comento, em que é nítido que o sigilo interposto é completo, não sendo sabedores das decisões tomadas pelo julgador nem o público, sequer as partes. O princípio da oralidade, entendido como decorrência do princípio da identidade física do juiz, por sua vez, evidencia-se também violado haja vista que aquele juiz que colhe depoimentos, provas de toda e qualquer natureza, que consegue abstrair um mínimo de contato com os acusados, são aqueles que devem realizar os atos processuais. Não é o que se consegue verificar na ocorrência da formação do colegiado, no qual o comporão dois julgadores estranhos à causa. Do mesmo modo se mostra ferida a garantia da motivação das decisões. Fernandes explana que é uma garantia da própria jurisdição e não apenas das partes. Pois a comunidade, por meio dessa garantia “tem condições de verificar se o juiz, e por consequência a própria Justiça, decide com imparcialidade e com conhecimento da causa” (op. cit, p. 135, 2005). Continua ele: “a falta de motivação da decisão interlocutória ou da sentença é causa de nulidade absoluta, porque há ofensa a importante garantia do devido processo legal e a preceito constitucional” (FERNANDES, p. 137, 2005). 2.1 A (in)conformidade constitucional da lei 12.694/2012 Renato Brasileiro diz serem os princípios, mandamentos nucleares de um sistema. Como se demonstrou no tópico que antecedeu, vários princípios norteadores do processo penal são ‘ignorados’ pelo dispositivo que se estuda. Mas não é só por contrariar os princípios, que têm inclusive fundamento constitucional, que se critica o art. 1º da Lei 12.694/12. A crítica encontra respaldo também quando observados os tratados internacionais, que são majoritariamente entendidos como supra legais pelo STF. A exemplo da violação destaca-se o art. 8º do Pacto de São José da Costa Rica: Garantias judiciais. 1. Toda pessoa terá o direito de ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável, por um juiz ou Tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido anteriormente por lei, na apuração de qualquer acusação penal formulada contra ela, ou na determinação de seus direitos e obrigações de caráter civil, trabalhista, fiscal ou de qualquer outra natureza (grifo nosso). Assim, percebe-se que também viola-se a Lei Suprema quando não se segue o processo da forma em que o tratado expressa, uma vez que as garantias da independência e da imparcialidade são postas em perigo pela lei infraconstitucional. A situação se agrava se se recorda que “o direito processual penal chega a ser apontado como direito constitucional aplicado às relações entre autoridade e liberdade” (CINTRA. GRINOVER. DINAMARCO; p. 84, 2011). A obediência infra-legal à Constituição, lembra-se, é requisito fundamental para que se erija o chamado ‘Estado Democrátido de Direito’, tanto é que, se os pressupostos da força normativa encontram correspondência na Constituição, se as forças em condições de violá-la ou de alterá-la mostrarem-se dispostas a render-lhe homogeneamente, se, também em tempos difíceis, a Constituição lograr preservar a sua força normativa, então ela configura verdadeira força viva capaz de proteger a vida do Estado contra as desmedidas investidas do arbítrio (HESSE, p. 25, 1991). Em contrapartida, em favor da conformidade da lei em análise, considera-se: se é declarada a constitucionalidade do Tribunal do Júri em realizar a votação em sala secreta, pode-se questionar que o mesmo argumento que serviu para tal situação é adequado para o que aqui se analisa. Todavia a hipótese logo é refutada quando salienta-se que segundo Renato Brasileiro Lima (p. 46, 2011), o caso do Tribunal do Júri é publicizado, ainda que restritamente. Isso porque estarão presentes na sala vários ‘atores’ do processo, só se retira o público externo no intuito de se preservar a tranqüilidade dos jurados durante a votação. Assim, a restrição legal é justificada. Contudo a justificativa da restrição sim, quiçá por analogia, seria possível também para fundamentar a inovação trazida pela lei e questão. O mesmo se verificará quanto à inovação da proteção legal às vítimas e testemunhas. Comparar-se-á a possibilidade de resguardo às vítimas e testemunhas por meio da não publicização de determinados atos processuais no que tangem à identidade das mesmas. A sustentação desse limite ao princípio da publicidade tem base um uma lei recente (Lei 11.690/2008) e é digna de elogios da doutrina, uma vez que oferece medidas protetivas pelo Estado às vítimas e testemunhas nos processos criminais. A despeito do tema, Bedê Júnior e Senna (p. 342-343, 2009) comentam: aliás, especialmente nos casos de criminalidade organizada é que a medida extrema de ocultamento da identidade da testemunha terá maior aplicação, pois é notório que uma das características marcantes dessas organizações é a intimidação, impondo a ‘lei do silêncio’, não raramente por meio de eliminação da testemunha. Logo, é possível que se releve que, se foi restringido o princípio da publicidade em favor da proteção das vítimas e testemunhas, porque o mesmo não seria admitido em benefício do direito à vida dos juízes? Talvez então o erro legislativo restaria apenas em relação à violação do princípio do juiz natural, pelo que se conclui. 3 A interferência midiática na edição legislativa processual penal Entende-se que o legislador, durante sua atividade de edição do texto normativo, deve recordar-se de que tais dispositivos se dirigem a seres humanos em conflito com a Justiça Penal, e, que, por mais que estejam sob a mira punitiva do Estado, não podem ser cerceados no que diz respeito aos seus direitos processuais penais adquiridos. Contudo, o imediatismo legislativo da atual política criminal brasileira insurge, ao ponto de os autores Guimarães e Carvalho (p. 94, 2008) questionarem: “é uma política voltada à emergência, à pressa do legislador em atender aos reclames da população e oriunda da inegável manipulação midiática?”. Acredita-se que sim. O princípio da publicidade, que fora explorado neste artigo, objetiva prover à opinião pública do conhecimento e do andamento dos processos penais e possibilitar a fiscalização do bom andamento da Justiça Criminal. Porém, “qualquer irresponsável clama por vingança nos meios massivos de comunicação, abertos aos discursos mais disparatados. E os políticos exibicionistas produzem leis penais, que é mais barato e lhes dá publicidade por um dia” (Zaffaroni apud Guimarães; Carvalho, p. 95, 2008). A mídia, portanto, acaba impondo ao processo legislativo a aparente necessidade de leis processuais penais intolerantes, dando surgimento a escabrosas contradições a um Direito Processual Penal garantista. É o que se pode exemplificar com a lei em questão. Em agosto de 2011, com a morte da juíza Patrícia Acioli supostamente por policiais corruptos aos quais a magistrada combatia, a mídia insistiu tanto em reiterar a relevância da proteção aos membros do Poder Judiciário que não tardou para que o legislador respondesse aos anseios – quiçá apressados – da população em oferecer segurança a esses indivíduos, resultando na Lei 12.694/12. CONSIDERAÇÕES FINAIS Conclui-se que, a partir dos ganhos advindos por meio do Estado pós-moderno, a liberdade e a dignidade humana, sobrevieram como sendo os valores intrínsecos a um Direito Processual Penal de garantias. Garantias estas que, disponibilizadas ao imputado pelos princípios com fundamentação constitucional, constituíram o que se chama de devido processo penal legal. A Lei 12.694/12, que fora trabalhada, sobretudo a partir da norma procedimental constante no seu art. 1º, trouxe inovações quanto à forma de se conduzir o processo penal. Tais novações já chamam a atenção da doutrina e causam polêmicas, visto que o fato de permitir aos magistrados a formação de um colegiado que decidirá sigilosamente os rumos dados ao processo em que se apuram os crimes de organizações criminosas nos casos em que estes se sentirem ameaçados na sua integridade física, faz surgir um ‘juiz sem rosto’. Seria viável a medida se não fosse a violação de vários princípios processuais penais. Dentre eles o do juiz natural, em parte, o da publicidade, da identidade física do juiz, da decisão motivada, da oralidade, implicando na impossibilidade de se aferir um devido processo legal, portanto. Ainda, se observou se haveria mesmo inconformismo do dispositivo em relação à Constituição, levando-se em conta o fato da mesma ser a responsável pelas garantias processuais do imputado, também de ser o nosso Estado signatário do tratado internacional do Pacto de São José da Costa Rica. Mas, por outro lado, a mesma CF que viabilizou a edição de leis recentes que protegem as vítimas e testemunhas de ocorrências relacionadas às organizações criminosas, em que, por ser o temor às ameaças presente, configurou-se a restrição do princípio da publicidade dos atos processuais. Assim como se restringiu também à ‘sala secreta’ do Tribunal do Júri. E por último, constatou-se a forte interferência da mídia no processo legislativo. Uma vez que casos envolvendo a Justiça Criminal, que são alvos da cobertura massiva e reiterada da imprensa, dão a aparente necessidade da edição desenfreada e sem a devida coerência de leis processuais penais. Ensejando assim em uma legislação infra-legal duvidosa frente à disposição da Constituição Federal. REFERÊNCIAS BEDÊ JÚNIOR, Américo; SENNA, Gustavo. Princípios do processo penal: entre o garantismo e a afetividade da sanção. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009. BRASIL. LEI Nº 12.694, DE 24 DE JULHO DE 2012. Dispõe sobre o processo e o julgamento colegiado em primeiro grau de jurisdição de crimes praticados por organizações criminosas; altera o Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, o Decreto-Lei no 3.689, de 3 de outubro de 1941 - Código de Processo Penal, e as Leis nos 9.503, de 23 de setembro de 1997 - Código de Trânsito Brasileiro, e 10.826, de 22 de dezembro de 2003; e dá outras providências. Disponível em: . Acesso em: 03 nov. 2012. BRASIL. DECRETO-LEI Nº 3.689, DE 3 DE OUTUBRO DE 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: . Acesso em: 03 nov. 2012. BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. 31. ed. atual. ampl. Brasília: Saraiva, 2007. CINTRA, A. C. A; GRINOVER, A. P.; DINAMARCO, C. R. Teoria Geral do Processo. 27ª edição. São Paulo: Malheiros Editores, 2011. FERNANDES, Antonio Scarance. Processo penal constitucional. 4. ed. rev., atual. e ampl. 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