A legitimidade de agir em debate nas relações processuais

Por Sergio Henrique Sorocaba Ayoub Omena | 28/06/2016 | Direito

A legitimidade de agir em debate nas relações  

processuais1 

Raissa Campagnaro de Oliveira,  Teodora Silva Santos2  

Sérgio Sorocaba3 

Valdênio Caminha4  

RESUMO 

Entende-se primeiramente o conceito de parte, assim como suas características. Em seguida ao analisar a ideia de legitimação para figurar como parte, percebemos algumas lacunas no direito processual que permitem a anulação de vários processos. Um questionamento sobre o que é legitimo e o que justo numa sociedade democrática faz-se necessário, portanto. Discute-se um pouco sobre acesso à justiça como problema inicial, contudo o foco está no cidadão que é impedido de defender seu direito, ou de seu ente querido por conta de conceitos ultrapassados e formais existentes no processo. Transmitindo a ideia de um direito atual ainda muito dogmático, com o discurso de dignidade da pessoa humana perfeito, porém a pratica não condiz com tal discurso.  

Palavras-chave: Partes. Legitimação. Justiça. Direito dogmático. 

1 INTRODUÇÃO 

O direito processual é responsável pela organização das regras de ação. Todo o ordenamento jurídico prima pela harmonia da sociedade e sua paz.  Contudo é na jurisdição que os conflitos são levados efetivamente para serem resolvidos. Estabelecendo o Estado- juiz como o responsável por analisar tal disputa de interesses e declarar um vencedor (em regra, podendo haver situações aonde os dois litigantes perdem em partes e ganham em partes).  

Logo, um problema dentro deste direito vem sendo observado. O fato de que diversos indivíduos vem tentando pleitear um direito de forma ilegítima, um direito que não é seu, mas que lhe interessa paradoxalmente. E fatores como a falta de informação a estes cidadãos, para saber como ingressar em juízo, e a análise dogmática da lei por vezes não permitem que cidadãos defendam os direitos de pessoas próximas, ou até mesmo parentes.  

Mediante um entendimento sobre o conceito de partes, e quem pode figurar como parte de um processo, nos permite primeiramente entender o que a lei diz, e o que a lei entendeu como justo. Após, com uma analise de casos recentes como as relações multiparentais com registros de certidões de nascimento com três pais, assim como as relações homoafetivas, e também casos excepcionais de enfermidade veremos que talvez esta lei não esteja alcançando todas as necessidades da população brasileira, e talvez precise rever essa ideia de legitimidade para agir.  

Contrapondo ao final a ideia a grande defesa dos direitos humanos, encontrada agora no Estado de direito contemporâneo, com a ideia de uma mente ainda muito fechada dos juristas. No sentido de que estes precisam primar pela democracia e pela justiça, fazendo ajustes posteriores à legislação, se esta não estiver mais condizendo com a realidade social. 

2 ACESSO À JUSTIÇA 

O acesso à justiça, ou a falta deste é responsável pela anulação de vários processos diariamente. O acesso à justiça é direito assegurado pela Constituição brasileira, contudo ainda percebemos várias falhas no cumprimento deste dever do Estado para com o cidadão. Observamos isso através da seguinte enquete feita com 18.400 pessoas aonde 24,31% considera a justiça brasileira péssima, 32,73% injusta e 36,22% inexiste (José Rebelo, 2003).  

Vários são os problemas da acessibilidade, muito se deve à falta de recursos financeiros (status social) de grande parcela da população, à morosidade da justiça, aos altos custos para ingressar em juízo. Contudo nos atentaremos aqui, à falta de conhecimento sobre o direito, e consequentemente sobre a justiça. Alguns direitos são famosos, ou comuns em nossa sociedade, porém uma enorme gama de direitos e deveres do cidadão não é conhecida por estes, apresentando o primeiro fator deste problema de acessibilidade (MAURO CAPPELLETTI, 2002).  

Outro grande fator reside na maneira como são requeridos tais direitos, os poucos que possuem ciência do seu direito e estão dispostos a enfrentar o sistema judiciário não sabem como proceder corretamente em busca deste direito, Cappelletti (2002) resume e traz uma proposta neste sentido: 

Ademais, as pessoas tem limitados conhecimentos a respeito da maneira de ajuizar uma demanda. O principal estudo empírico inglês, a respeito deste assunto concluiu: “na medida em que o conhecimento daquilo que está disponível constitui pré-requisito da solução do problema da necessidade jurídica não atendida, é preciso fazer muito mais para aumentar o grau de conhecimento do publico a respeito dos meios disponíveis e de como utilizados. 

Veremos que o acesso à justiça não é o único fator que atrapalha o direito processual. Entretanto, se os cidadãos possuíssem mais informações sobre a justiça, vários erros poderiam ser evitados no andamento dos processos. Neste sentido José Rabelo, traz a ideia de que uma reforma processual com toda certeza é necessária, porém uma reforma completa e não apenas na legislação, no texto normativo. É preciso buscar a real efetividade destas leis, através dos operadores do direito. 

Rabelo traz ainda um questionamento acompanhado de uma proposta de solução de tal problemática. No art. 24, inciso XI da constituição temos que a União, os Estados e o DF possuem competência concorrente para legislar sobre procedimentos em matéria processual. O autor afirma que não existe uma lei estadual sequer exercendo tal competência, ou seja, adaptando os procedimentos de acordo com as peculiaridades de cada região. Pois em algumas áreas dos Estados brasileiros “[...] dolorosamente pobres e atrasados onde analfabetos e marginalizados vivem nos lugares precariamente servidos de meios de comunicação e nos quais muitas vezes nunca foi visto um profissional de direito, onde as partes sem ser raridade, nem mesmo sabem o real significado de uma citação”. Podemos imaginar que se fosse devidamente regulamentado tal artigo, muito poderia ser facilitado no tocante a procedimentos em matérias processuais, promovendo melhores ações e consequentemente uma melhor justiça.  

3 As Partes 

Para que se faça uma conceituação de parte, faz-se necessário primeiramente entendermos o que é o processo. Pois sem processo, não existiriam as partes e vice-versa. Sendo assim um fundamento do outro. Traremos aqui especificamente, a ideia de processo jurídico, entendendo que o termo processo pode ser utilizado em mais de uma área do conhecimento. Antonio Cintra et al. (2013) conceituam da seguinte maneira (o processo) “ [...] é instrumento através do qual a jurisdição opera (instrumento para a positivação do poder)”. Alexandre Câmara (2005, p.145) traz a seguinte definição (processo é) “[...] procedimento realizado em contraditório, animado pela relação jurídica processual”.  

Uma vez que se deixou de lado, a auto tutela, o Estado passou a se responsabilizar pela resolução de conflitos da sociedade. Sendo assim, ele atinge este objetivo através do processo, obedecendo às regras deste. Que por sua vez, é uma forma de organizar tal dever Estatal. A partir de insatisfações, ou disputas de interesses é que surge o processo, geralmente iniciado por pessoa física ou jurídica, o que nos leva de volta às partes.  

Por Galeno Lacerda (caput CHIOVENDA, 2006) temos a definição mais abrangente “Parte é todo aquele que pede ou contra quem é pedida a aplicação de um direito”. Logo, podemos perceber que o processo possui dois tipos de partes: o autor e o réu. Sendo o autor aquele que demanda o direito, e o réu aquele de quem é exigido o direito. É necessário pontuarmos a existência de uma tríplice mínima na relação processual sendo O Estado-Juiz no topo do triangulo, o autor e o réu na base. O juiz aqui figura apenas como agente representante do Estado, ele deve se abster de subjetividades ao exercer tal função. Dessa forma o autor é o sujeito que entrará com o pedido para o Juiz, e este citará o réu, que a partir daí fará parte da relação processual. Apesar da problemática ser entregue ao Juiz, para que este decida da forma que lhe for justa, cabe às partes “auxiliar o juízo no descobrimento da verdade e na efetivação das decisões judiciais, sem utilizar expedientes antiéticos” (ALEXANDRE CÂMARA, 2005).  

Outro ponto importante para o entendimento de partes do processo são os sujeitos passivos e ativos. Muitos autores tendem a colocar o autor como o sujeito ativo do processo, pelo fato deste ter iniciado o processo, e estar querendo buscar o seu direito de modo primeiro. E portanto o réu estaria figurando como sujeito passivo, pelo fato deste ter sido trazido para dentro do processo, e não ter iniciado por vontade própria e primeira tal ação.  

Contudo analisando o principio da igualdade das partes, aonde a corrente da doutrina majoritária afirma que a relação estabelecida entre autor-juiz, é a mesma relação entre réu-juiz. Lacerda (2006) vai dizer “O réu assume diante do Estado uma posição de postulação idêntica à do autor. Todos os pedidos do réu devem ser julgados em pé de igualdade com os do autor”. Neste principio reside a ideia de contraditório, característica colocada acima no conceito de processo. Aonde mesmo que o réu tenha ingressado depois, este possui direitos de defender seus direitos tanto quanto o autor. Este critério, portanto embasa a seguinte teoria: o autor e o réu são sujeitos iguais na relação processual, e o Estado é o sujeito passivo, tentando primar pela imparcialidade para resolver o conflito. No entanto a corrente majoritária segue o primeiro raciocínio elaborado no paragrafo anterior, aonde passivo é o réu, e ativo é o autor.  

Como já pontuado, uma relação processual precisa minimamente de três sujeitos: Autor, réu e Estado-Juiz. Contudo podem existir algumas variações como o litisconsórcio, a intervenção de terceiros e a intervenção do ministério público. O litisconsórcio é simplesmente o nome dado para pluralidades das partes, ou seja, quando existem mais de dois autores, ou mais de dois réus na relação processual. Podendo também ocorrer simultaneamente nos dois polos. A intervenção do Ministério se dá quando faz-se necessário uma fiscalização do cumprimento da lei, e este órgão funcionará como uma parte qualquer, sendo dispensável descrever de forma extensa sua atuação. 

A intervenção de terceiros, contudo, merece maior destaque para que uma diferenciação possa ser feita no futuro deste mesmo trabalho. O terceiro também vai configurar uma pluralidade de partes, porém de inicio o terceiro não é parte. Na verdade é este conceito de terceiro que Câmara (2005) utiliza, terceiro é todo aquele que não é parte. O terceiro é chamado, ou até mesmo procura o processo posteriormente. Uma vez que ficou decidido que o interesse ali em questão iria afeta-lo de alguma forma, ou que o direito ali debatido lhe pertence, como no caso de direitos autorais. E logo, a partir do momento que o terceiro intervém no processo ele se torna parte.  

É de extrema importância ressaltar que o terceiro uma vez que começa a participar efetivamente do processo, se torna parte do processo e não parte da demanda, como coloca Câmara (2005). Mesmo que o terceiro intervenha de forma voluntaria, ou seja porque pretende pleitear algum interesse, não foi este terceiro que demandou inicialmente o direito. o terceiro entra no processo, uma vez que ele já existe e já está em andamento. Apenas a titulo de informação existe portanto, contrario a intervenção voluntária, a intervenção forçada quando o individuo é chamado ao processo por qualquer das partes (Câmara 2005).O caso mais frequente de intervenção de terceiro é a assistência. Onde, um indivíduo entra no processo para ajudar outrem a defender seu direito.   

Findo o estudo geral sobre partes do processo, é de suma importância estudar as condições da ação, mais especificamente as condições que se relacionam diretamente com as partes. Dando maior enfoque a temática sobre legitimação. Tendo em vista o surgimento de novas ações que nos levam a questionar tais regras do direito processual.  

4 CONDIÇÕES DA AÇÃO 

É valido citar algumas condições, a titulo de conhecimento. A primeira condição é a possibilidade jurídica do pedido. Podemos entender isso de forma comparativa ao objeto para o direito civil, não há negocio, não há contrato se o objeto é impossível, ou ilícito por exemplo. Da mesma forma o pedido para quem entra com uma ação tem que ser viável. Por exemplo, um sujeito não pode entrar com uma ação pedindo que outro sujeito lhe dê uma estrela, ou a lua.  

A segunda condição se relaciona a primeira no sentido de que é preciso que a jurisdição tenha necessidade, interesse de agir e esteja agindo de forma adequada. Assim, uma ação deve ser proposta somente quando o interesse de um alguém não puder ser resolvido de maneira simplória, ou quando o próprio ordenamento determinar que tal conflito deve ir direto para jurisdição. Então, a jurisdição se fará necessária, para resolver o problema, a disputa de direitos entre dois ou mais indivíduos. Da mesma forma a atuação do judiciário deve ser adequada Antonio Cintra et al. (2013) colaboram exemplificando “ Quem alegar p. ex., o adultério do cônjuge não poderá pedir anulação do casamento, mas o divorcio [...]” Até porque a única condição para adultério, como determina a lei, é estar casado. Logo, o Estado-juiz não seria adequado para realizar a anulação de tal casamento.  

Corroborando com esse entendimento Humberto Theodoro (2006 apud Alfredo Buzaid) afirma: 

 O interesse de agir, que é instrumental e secundário, surge da necessidade de obter através do processo a proteção ao interesse substancial. Entende-se, dessa maneira, que há interesse processual “se a parte sofre um prejuízo, não propondo a demanda, e daí resulta que, para evitar esse prejuízo, necessita exatamente da intervenção dos órgãos jurisdicionais. 

De forma mais especifica agora temos as condições mais subjetivas. Com relação direta aos indivíduos que se constituem como partes. Galeno Lacerda (2006) inicia falando da capacidade para ser parte, que ainda não é a capacidade civil. Esta primeira condição beira o absurdo, mas é de extrema necessidade para estabelecer uma base de quem pode ser parte ou não em um processo. Em resumo significa que só a pessoa, o ser humano pode ser parte. Como o código civil coloca toda pessoa é titular de direitos, logo, em principio o que deve ser analisado é esta titularidade de direitos. Um exemplo: um cachorro não pode requerer seus direitos diante um tribunal. Isso não significa que animais não possuam direitos. Contudo, pessoas deveram pleitear tais direitos.  

A próxima condição se encontra na capacidade civil. Esta é a capacidade de exercer seus direitos. Onde não são todas as pessoas que possuem. O Código civil especifica quem são os sujeitos relativamente incapazes e absolutamente incapazes, e portanto, não podem  figurar como partes de um processo, segundo o mesmo código. Artigos 3º e 4º do CC comportam 

Art. 3º “ São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil: I- os menores de dezesseis anos; II- os que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para a prática desses atos; III- os que, mesmo por causa transitória, não puderem exprimir sua vontade. Art.4º “São incapazes, relativamente a certos atos, ou à maneira de os exercer: I- os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos; II- os ébrios habituais, os viciados em tóxicos, e os que, por deficiência mental tenham o discernimento reduzido; III- os excepcionais, sem desenvolvimento mental completo; IV- os pródigos 

A capacidade de exercer todos os seus direitos inicia-se com os dezoito anos como indica o Art. 5º do CC. Havendo também as exceções da questão da emancipação, que concedem essa capacidade em algumas situações para menores de dezoito anos. E no Art. 7º do CPC temos “Toda pessoa que se acha no exercício dos seus direitos tem capacidade para estar em juízo”. Seguindo os Art. 8º e 9º do CPC, determinarão de que forma os incapazes serão representados ou assistidos em juízo. Regulamentando a curadoria e a tutela estão os capítulos VIII e IX do CPC. Essa questão será melhor abordada quando após uma breve analise sobre a próxima condição que é a legitimação.  

A legitimação das partes encontra-se em destaque neste trabalho. Ausente qualquer uma das condições levará a carência da ação. Porém a legitimação será mais discutida. Esta condição encontra embasamento no Art. 3º do CPC “Para propor ou contestar ação é necessário ter interesse e legitimidade”. Veremos que os conceitos de interesse e legitimidade deveriam se relacionar de forma mais profunda, do que o ordenamento já propõe.  

O conceito de legitimidade envolve muito a opinião de terceiros. Ou melhor, uma opinião exterior. Geralmente alguém dá ao individuo legitimidade para agir de tal maneira, podendo ser o ordenamento, ou ate mesmo o senso comum. Como exemplo, a população dá legitimidade ao Estado para que este exerça uma violência legal sobre nós indivíduos, especialmente aqueles que fazem qualquer conduta ilícita. De outro lado, a Constituição Federal é considerada por seus estudiosos como Lei Maior que é legitima em si mesmo.  

No sentido de entrar com ações, iniciar um processo o ordenamento jurídico é quem legitima a pessoa ou não. A regra geral para essa legitimação se encontra no Art. 6º do CPC “Ninguém poderá pleitear, em nome próprio, direito alheio, salvo quando autorizado por lei”. Ou seja, a regra é que um individuo deve pleitear seus próprios direitos, em seu nome. Existindo, contudo a legitimação extraordinária, que são os casos “autorizados por lei”, aonde um individuo pleiteia em seu próprio nome, direitos alheios.  

É mister salientar a diferenciação entre representação, assistência e legitimação extraordinária. Enquanto o representante, por exemplo, o pai de uma criança vai defender os direitos da criança, em nome da criança, e o que promove assistência entra no processo apenas para ajudar o autor ou o réu, sem excluir qualquer uma das partes, o legitimado de forma extraordinária faz essa defesa de direito de outrem, em seu próprio nome, substituindo-o processualmente, se tornando parte efetivamente. É o caso, como colocam Antonio Cintra  et al. (2013) “ [...] da ação popular, em que o cidadão, em nome próprio, defende  interesse da administração pública.  

Para haver essa substituição processual, ou legitimação extraordinária a lei precisa autoriza-la, como vimos no Art. 6º. Logo, percebemos uma taxatividade do ordenamento jurídico neste sentido. Assim como um caráter de exceção para tal atuação. Existem vários casos, citaremos alguns: “Interessado na sucessão para propor ação declaratória de exclusão de herdeiro ou legatário por indignidade (Artigo 1596 do Código Civil Brasileiro); Co-herdeiro para reclamar a universalidade da herança de terceiro que indevidamente a possui (Artigo 1580, parágrafo único do Código Civil Brasileiro); Conselho Federal da OAB para ações na tutela de direitos individuais dos advogados (Artigo 54, II da Lei N.º 8906/94 – Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil);” (Ana Flavia Torres).  

Após entendermos alguns desses conceitos, e o que a legislação brasileira nos traz, analisaremos alguns casos reais, que estão se tornando cada vez mais frequentes em nossa sociedade, e não se constituem mais como exceções. É bem verdade que o direito não possui somente falhas, alguns avanços devem ser apontados com sucesso.  

5 RELAÇÕES MULTIPARENTAIS E ADOÇÃO POR CASAIS HOMOSSEXUAIS.  

A família brasileira já sofreu muitas mudanças. Há muito que o conceito de pai, mãe e filhos, como família perfeita começou a se tornar ultrapassado. Hoje, “[...] o reconhecimento da família monoparental, da união estável, do casamento e adoção por pares homoafetivos, da proibição de distinção da filiação e da paternidade socioafetiva demonstra o avanço do Direito de Família brasileiro no reconhecimento, promoção e efetivação dos direitos das pessoas e das famílias.” (Aline Taiane Kirch, 2013). Ou seja, as famílias são constituídas de diversas maneiras. Porém um caso recorrente se encontra na seguinte situação: um casal com filhos, se separa, o homem ou a mulher, e as vezes até mesmo os dois, encontram novos relacionamentos afetivos, e os filhos frutos do antigo casamento passam a ser filhos de duas famílias distintas e novas agora.  

Para analisarmos como se dá uma problemática processual, façamos uso de um exemplo relatado no Estadão (jornal de São Paulo):  

Foi justamente uma briga entre uma madrasta e uma mãe que terminou em mais um precedente para o registro triplo, no Recife, em março. Sem recursos para cuidar do filho, a mãe biológica deixou o encargo à mulher do ex-companheiro. A madrasta exigiu que o menino de 4 anos tivesse seu sobrenome. A saída foi o registro triplo. 

Neste caso quem possuía o maior interesse, e o maior poder de defender e cuidar dos direitos da criança era a nova mulher do sujeito. Porém, quem possui legitimidade legal para entrar em juízo representando a criança são os pais biológicos apenas. Desta forma, pode-se imaginar inúmeros casos como este, aonde uma pessa que atua como pai efetivo( mesmo que apenas por afeição e não biologicamente) da criança foi impedido de entrar com um processo para defender os direitos dessa criança. No caso relatado, a saída foi adicionar o nome da “madrasta” na certidão de nascimento. Contudo tal providencia ainda é relativamente nova, poucos são os registros triplos no Brasil.  

Questiona-se assim, o que é efetivamente legitimidade para agir. Pois apesar de ser necessário existir uma regra, aonde os legítimos são os pais biológicos da criança, é preciso existir um olhar mais aberto e mais critico para as novas demandas da sociedade. Com a grande defesa do principio da dignidade humana é de se pensar que juristas estariam mais flexíveis para esses tipos de situações, contudo o que se vê são varias ações sendo extintas pela simples falta de legitimidade da parte, caracterizando uma ação muito dogmática e pouco justa.  

Um grande avanço do direito, contudo, se encontra na possibilidade de adoção de crianças e adolescentes por casais homoafetivos e principalmente o registro dos dois pais ou das duas mães na certidão de nascimento. A decisão do STF também é relativamente nova.  

Adoção diferencia de inseminação artificial aonde, por exemplo, um casal de lesbicas quer ter um filho e pede o sêmen de um amigo ou algo parecido, pois neste caso a mae será quem a dona do ovulo, quem gerou o filho e o pai será o dono do espermatozoide.  

Um caso de 2012, encontrado no Bahia Noticias traz: 

Dois adolescentes de Santa Catarina (PR) adotados por um casal homoafetivo terão registrados em suas certidões de nascimento o nome dos dois pais. Os adotantes, identificados  como” Pai 1” e “Pai 2” conseguiram a guarda definitiva das crianças que estavam abrigadas e em razão da idade provavelmente não conseguiriam ser adotadas pelas famílias inscritas no Cadastro Nacional de Adoção, que geralmente preferem bebês ou crianças bem pequenas. O casal os adolescentes realizaram todo o processo necessário para adoção, passaram pelo estágio de convivência com acompanhamento do juiz e da assistente social [...] 

Sem tal decisão do tribunal, em regra apenas um dos pais seria registrado como pai da criança. Podendo gerar problemas, no caso de falecimento deste pai adotivo registrado, a criança seria mandada de volta para adoção. Sendo o cônjuge, o viúvo ilegítimo para entrar com qualquer pedido em relação a criança, sendo ele pai que criava e dava afeto para a criança.  

Sem este registro o juiz se prenderia às opções taxativas de legitimidade extraordinária, e ás regras de representação e excluiria por completo o segundo pai. Por que não abrir para estudo esta legitimidade? O papel do Estado não é resolver conflitos de maneira a defender os direitos humanos e a dignidade da pessoa humana? Tirar uma criança de uma estrutura familiar pelo simples argumento de cumprimento necessário do texto normativo não condiz com o conceito de Estado Democrático de Direito.  

6 CONCLUSÃO 

Percebemos que o direito processual como direito essencial a jurisdição, ainda comporta algumas falhas, e precisa se atualizar ou até mesmo possuir maior liberdade na interpretação da norma. O que temos hoje é um numero imenso de carências de Ações, quando é ausente qualquer um dos elementos das condições de ação. Segundo Antonio Cintra et al.  (2013) “ A consequência é que o juiz, exercendo embora o poder jurisdicional, não chegará a apreciar o mérito, ou seja o pedido do autor”. 

A questão pode ser discutida primeiramente pela falta de interesse do poder publico em informar aos cidadãos como ingressar em juízo de forma correta: quem pode ser autor, qual poderá ser o pedido, e qual jurisdição será adequada. De outra maneira, o Art. 3º afirma que é preciso ter legitimidade para pleitear direito, permitindo uma serie de interpretações sobre legitimidade. Contudo o Art. 6º limita tal conceito afirmando que um indivíduo só poderá defender seu direito em nome próprio, com algumas poucas exceções taxativas em lei. 

Como resolver algumas questões não retratadas em lei, mas que necessitam da atuação do Estado-Juiz, porém não é concedida por mera falta de legitimidade da parte? A legitimidade deveria ser melhor discutida, o real interesse de um individuo em querer defender o direito do ente querido deveria ser levado em consideração antes do Juiz determinar a carência da ação, deixando a questão mal resolvida. O direito precisa evoluir juntamente com a sociedade, pois este reflete a realidade social.  

REFERÊNCIAS  

CINTRA, Antônio Carlos; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo. São Paulo: Malheiro, 2012. 

CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de direito processual civil. v. 1. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006.  

LACERDA, Galeno. Teoria Geral do Processo. 2006. 

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