A Justiça em John Rawls: notas preliminares para estudo em Filosofia do Direito

Por Gisele Salgado | 23/04/2013 | Direito

A Justiça em John Rawls: notas preliminares para estudo em Filosofia do Direito

 

  Gisele Mascarelli Salgado                                                                   pós-doutora em Direito pela FD-USP, doutora e mestre em Filosofia do Direito pela PUC-SP, bacharel em Direito e Filosofia

 

Resumo: Este artigo pretende fornecer um roteiro para estudo do conceito de justiça na obra de John Rawls: A Teoria da Justiça.

Sumário: Introdução - Concepção de justiça em John Rawls; 1. Definição de justiça ; 2. "Justiça como justo" e a Teoria da justiça; 3. Princípios da justiça, Bibliografia

Palavras-chave: filosofia do Direito, Rawls, teoria da justiça

 

Introdução- Concepção de justiça em John Rawls

            Rawls elabora uma teoria da justiça que de certo modo pode-se considerar complexa devido aos vários conceitos que ele elabora em torno do conceito de justiça. A aceitação de suas premissas, condições e dos conceitos é necessária para que sua teoria da justiça funcione. Esta teoria de Rawls tem sido duramente criticada, não só pelos conceitos que apresenta, mas também em seu aspecto metodológico.

 John Rawls, que traça sua teoria a partir da Common Law e tem forte influência kantiana sua teoria da justiça que pretende suplantar o utilitarismo. Muitos comentadores consideram Rawls um pensador de linha marxista, em especial por sua teoria da justiça admitir a distribuição dos Direitos reais; outros comentadores consideram Rawls de linha liberal, por admitir e confirmar a desigualdade natural entre as pessoas.  Por estes aspectos controversos é que a obra de Rawls é polêmica e apresenta uma dificuldade grande para sua exposição, pois sua obra não é marxista nem liberal, nem um misto entre as duas, é sim uma obra complexa, matizada e que não pode ser bem estudada se não se entender a complexidade e se evitar ao máximo classificá-la dicotomicamente.

A tese exposta por Rawls em seu livro Teoria da Justiça, devido as várias crítica jás, foi alterada parcialmente pelo próprio autor em edições subsequentes a de 1971. Outra alteração que os críticos de Rawls costumam apontar é a reformulação de certos conceitos, ou mesmo parte destes, em seus artigos mais recentes e em especial nos seus livros:  Liberalismo Político e Justiça como Equidade.

            Para analisar o conceito de justiça de Rawls será analisada sua obra Teoria da Justiça. Deve-se analisar todo o sistema onde o conceito está inserido, isto porque, há particularidades no sistema de Rawls que inviabilizam a definição da parte sem o todo em que ela foi pensada. Porém, o foco não é a Teoria da Justiça como um todo, mas sim como o conceito de justiça é desenvolvido por Rawls.

Para tanto, pretende-se analisar aqui os primeiros três capítulos do livro, que compreendem a primeira parte, ou seja, a Teoria. As outras duas partes do livro dizem respeito as instituições e aos objetivos da teoria da justiça; e não interessa diretamente ao estudo desse trabalho pois visa esclarecer aspectos já abordados na primeira parte do livro onde é exposta a teoria da justiça.  Os capítulos analisados se denominam: 1) Justiça como equidade, 2) Os princípios da justiça e 3) posição original. 

O objetivo de Rawls com a teoria da justiça é: "elaborar uma teoria da justiça que seja uma alternativa para essas doutrinas (utilitarista e intuicionista) que há muito tempo dominam a nossa tradição filosófica"[1]. Ao elaborar sua teoria, a "intenção de Rawls é a de demonstrar a exequibilidade prática de seu projeto, ainda que admita não haver condições sociais em parte alguma para sua aplicação"[2].

Devido a este caráter a teoria da justiça de Rawls parece falar sobre a antessala do paraíso, onde algumas pessoas discutem princípios de justiça. Esses princípios são discutidos e estabelecidos para o paraíso, mas essas pessoas não sabem quais as regras vigentes em lá chegando. Essas pessoas perderam sua história e, portanto, também seus preconceitos, e também não sabem o que lhes espera num mundo em que não sabem suas regras.

A teoria de Rawls serve para essa antessala do paraíso, mas serve. Respeitados as premissas e os limites que Rawls impõe, além de todos os seus conceitos, sua teoria é se sustenta. A teoria da justiça de Rawls é possível, pois ela é uma hipótese lógica, e não necessariamente uma hipótese a ser realizada. Rawls com sua teoria:

"não visa perscrutar estados de natureza remotos, erigir grandes sistemas dedutivos de corte transcendental ou realizar uma 'Grande Instauração', à la Bacon, que substitua todos os grandes sistemas de pensamento na seara da filosofia política. Almeja, antes, identificar na cultura política dessas sociedades elementos consentâneos com sua teoria da justiça que expressem valores mínimos embutidos no (bom) senso político comum das pessoas. A ideia de democracia, portanto, já pertence à cultura política geral das sociedades ocidentais e não requer elaborações rebuscadas para ser compreendida. Assim, o construto teórico rawlsiano, erguido num primeiro momento sobre instituições imaginárias e relativamente complexas, se materializará sobre instituições políticas e sociais já conhecidas, ao mesmo tempo que nelas encontrará um ponto de partida para o processo de aperfeiçoamento das sociedades em seus aspectos morais, políticos e sociais, fundamentado em seus princípios de justiça"[3].

            Rawls deixa claro que sua teoria da justiça é política e não propriamente filosófica:

"A epistemologia política de Rawls consciste na ideia central de 'aplicar o conceito de tolerância à própria filosofia. Com isso quer Rawls salientar que sua teoria da justiça constitui uma categoria 'política', em contraposição a 'filosófica'. Aqui opera uma curiosa e aparente inversão de sentido que esses adjetivos normalmente denotam. O espaço político é entendido pelo senso comum como o espaço em que doutrinas e visões de mundo diferenciadas, movidas por princípios ideológicos mais ou menos, disputam a capacidade de gerir e distribuir os recursos socialmente produzidos e de gerar oportunidades simétricas de ascensão social com base em critérios estáveis. A filosofia, por sua vez, denotaria uma ideia contrária, segundo a qual não se estaria em discussão, em princípio, formas subjetivas de realização de ideais como justiça e igualdade, mas uma análise objetiva e normativa e, portanto, transcendente, da forma 'ótima' de realização e definição ideais"[4].

1. Definição de justiça

Rawls define a justiça como "primeira virtude das instituições sociais"[5]. Sua concepção de justiça é a da justiça social, pois o "objeto primário da justiça é a estrutura básica da sociedade"[6]. Com isso Rawls afasta as diversas concepções de justiça que existem, restringindo-se a uma especificamente, e esta uma é uma concepção de justiça que é definida a partir de indivíduo, mas que visa o indivíduo inserido na sua coletividade. Esta concepção de justiça sofre restrições na teoria de Rawls, que diz:

"Ficarei satisfeito se for possível formular uma concepção razoável da justiça para a estrutura básica da sociedade concebida por ora como um sistema fechado, isolado de outras sociedades"[7].

A concepção de justiça de Rawls é uma concepção social, onde os princípios da justiça desempenham papel fundamental. Como a justiça depende da sociedade em que essa concepção de justiça é construída, para cada sociedade tem-se uma justiça. "As diversas concepções da justiça são o resultado de diferentes noções de sociedade em oposição ao conjunto de visões opostas das necessidades e oportunidades humanas"[8].

Rawls diz que seu conceito de justiça apesar de ser uma concepção social, não se afasta, nem é incompatível com a da tradição e em especial de Aristóteles, em especial na concepção de justiça aristotélica que é a de evitar a pleonexia[9].

Portanto, o que se pode ver em Rawls é que mesmo partindo de um conceito de justiça que não é total, permite diversas conceituações. Poderia-se resumir algumas delas: 1) "equilíbrio adequado entre reivindicações concorrentes e uma concepção da justiça  como um conjunto de princípios correlacionados com a identificação das causas principais que determinam esse equilíbrio, 2) parte de um ideal social, 3) interação da atuação de princípios da atribuição de direitos e deveres e na definição da divisão apropriada das vantagens sociais[10]. Rawls formula seus princípios de justiça como 'justiça como equidade'.

Equidade é por sua vez um termo que se deve ter cuidado, já que Rawls utiliza a expressão "justice as fairness", e fairness não tem equivalente no português, sendo portanto utilizado equidade. Faz-se essa ressalva para salientar que Rawls não emprega a expressão 'justice as equity'.  Sobre a tradução de fairness comenta Ademar Seabra da Cruz Jr:

"A opção por 'equidade' tem como incoveniente confundir 'fairness' com um dos princípios gerais de direito nas tradições herdeiras do sistema romano-germânico, e traz uma conotação mais positiva (no sentido jurídico-legal) do que a sugerida pelo equivalente anglo-saxônico. A complexidade dessa ideia de 'justice as fairness' fica evidente quando se conclui que a melhor tradução seria 'justiça como justiça', o primeiro termo denotando um aspecto fromal, isto é, os critérios finalmente adotados para a realização desse bem moral, e o segundo representando o conteúdo desse critério, ou seja, os princípios substantivos (consubstanciados no conceito de 'fairness') que dão forma ao conceito de justiça. O termo 'justiça' em português, como, creio, em todas as línguas românicas - e coincidentenmente adeptas do sistema jurídico correspondente - não dispõe de termo ou locução para marcar essa diferença de sentido. O pensamento de Rawls, aliás - como todo sistema filosófico articulado - é marcado por identidades lógicas que não raro podem passar por tautologias"[11].


2.  "Justiça como o justo" e a Teoria da Justiça

            Para compreender o que Rawls denomina como 'justiça como equidade', que aqui se preferiu a tradução 'justiça como justiça', deve-se entender o sistema teórico em que essa concepção de justiça é concebida. Para tanto, pretende-se expor resumidamente os principais pontos da teoria da justiça de Rawls, e como em todo resumo corre-se o risco de se diminuir a complexidade da obra, porém para este pequeno trabalho onde o que se visa é estudar o termo justiça, e não a teoria da justiça em si, o risco parece valer a pena.

            A concepção de justiça de Rawls "generaliza e leva a um plano superior a abstração a conhecida teoria do contrato social"[12]. O que na teoria tradicional é considerado como estado de natureza, Rawls considera como posição original de igualdade dada pela justiça como equidade.  Nas palavras de Rawls:

"a justiça como equidade começa (...) com uma das mais genéricas dentre todas as escolhas que as pessoas podem fazer em conjunto, especificamente, a escolha dos primeiros princípios de uma concepção da justiça que deve regular todas as subsequentes críticas e reformas das instituições"[13].

            A hipótese de Rawls para uma teoria da justiça: pessoas livres e racionais em uma posição original definem os princípios fundamentais que irão reger toda a sociedade. Sobre estes princípios, que são os princípios da justiça irão se fundar todos os outros. Porém, estas pessoas não conhecem ao formular os princípios (que não são verdades necessárias) os lugares que ocuparão na sociedade, e a isso Rawls chama de véu de ignorância.

Estas pessoas aceitam essa situação de igualdade, pois simplesmente não sabem que regras, quais são os parâmetros que vigem na sociedade em que serão inseridas. Só o que conhecem essas pessoas são fatos genéricos da sociedade humana, esses fatos entrarão como parte nas premissas das deliberações e na escolha dos princípios de justiça e deve-se atentar para que essas premissas sejam verdadeiras e gerais[14]. Há entre essas pessoas uma necessidade de se compatibilizar a liberdade e a igualdade.

            Essa condição original não é para Rawls necessariamente justa, mas o que pretende mostrar é que é a única escolha possível frente ao véu de ignorância, ou seja, não importando as circunstâncias da sociedade; isto porque, "as partes na posição original são mutuamente indiferentes, elas não estão dispostas a sacrificar seus interesses em benefício dos outros"[15] e ainda "são obrigadas a avaliar os princípios unicamente com base nas considerações gerais"[16].

            O véu de ignorância é um importante conceito na teoria da justiça, pois é ele que garante a possibilidade da justiça. Porém, se apresenta vantagens como por exemplo, possibilitar que os princípios possam ser adotados independente da época[17] , mas apresenta algumas dificuldades, faz com que o registro histórico seja inacessível para essas pessoas[18]. Pessoas sem história, só são possíveis em situações extremadas, quase hipotéticas, porque para que isso se verifique seriam necessários muitos Adãos e muitas Evas (depois de descidos do paraíso), pessoas sem passado, sem experiências, sem descendentes e ascendentes, pessoas que seriam o marco zero da humanidade.

            Na condição de igualdade inicial há pra Rawls um estado que denomina equilibrio reflexivo. "Trata-se de um equilíbrio porque finalmente nossos princípios e opiniões coincidem; e é reflexivo porque sabemos com quais princípios nossos julgamentos se conformam e conhecemos as premissas das quais derivam"[19].  Essa noção é diferente da de equilíbrio refletido, também presente na obra de Rawls. Equilíbrio refletido ocorre quando na posição original os princípios de justiça escolhidos coincidem com os juízos ponderados, descrevendo um senso de justiça[20]. Por juízo ponderado, Rawls entende que são "simplesmente os que são feitos sob condições favoráveis ao exercício do senso de justiça" e que não são, portanto, juízos arbitrários.

            Sua teoria da justiça é uma teoria contratualista, porém diferente das teorias tradicionais como a de Locke, Hobbes, Rousseau:

"A diferença entre o contratualismo rawlsiano e os demais, no entanto, é que este é mais sofisticado na medida em que nele foi introduzido o conceito de 'razoabilidade das partes' ('reasonableness') em conjunção estreita com a ideia de racionalidade, esta de corte mais tradicional". Rawls além introduz este conceito baseado filosofia moral de Kant, em que: "a ideia do racional como pressuposto do razoável (... ) em que ambas as ideias estão conjugadas em sentido mais ou menos indistinto"[21].

            De acordo com Cruz, Rawls:

"sofisticou o conceito de 'estado de natureza' das teorias contratualistas clássicas de modo a fazer com a ideia de justiça fosse extraída do senso comum universal, submetida ao teste-condição de universalidade proposto por Kant, e refletida em princípios aceitáveis que observassem, sobretudo, as reinvindicações multi seriais e entrecruzadas que seriam apresentadas em seu nome. Embora em os fundamentos a ideia dos princípios da justiça de Rawls deite profundas raízes nas três formulações combinadas do imperativo categórico de Kant, aquela difere destes por diversas razões, mas sobretudo pelo método filosófico.... (onde) Rawls incorpora a teoria da escolha racional à sua teoria e faz com que a ideia de justiça não seja antinômica ao interesse próprio em condições de egoísmo moderado"[22].

            A teoria contratualista de Rawls é considerada como tendo as seguintes características: 1) é um contrato de avaliação e não legitimador, logo não visa justificar as instituições, 2) é heurístico e não meramente definicional, ou seja, "é heurístico na medida em que não conhece aprioristicamente o resultado das deliberações, e o conceito do que seja justo ou equânime não é adiantado ab initio; não há definição, ou uma propriedade do que seja justo que possa ser adiantado pelas partes"[23], 3) é de caráter econômico ou político, podendo-se inferir isto pela posição dos atores do contrato que visam evitar decisões arriscadas e  visam maximizar seus interesses, sendo assim racional, 4) é não interativo,  ou seja, as "partes não barganham entre si com vistas à maximização limitada de seus benefícios"[24].

            Rawls procura com sua teoria superar as concepções intuicionista e utilitarista da teoria da justiça. Como uma doutrina intuicionista Rawls entende de maneira genérica:

"a doutrina segundo a qual há um conjunto irredutível de princípios básicos que devemos pesar e comparar perguntado-nos qual equilíbrio, em nosso entendimento amis refletido, é o mais justo. Uma vez atingido certo nível de generalidade, o intuicionista afirma que não existem critérios construtivos de ordem superior para determinar a importância adequada de princípios concorrentes da justiça"[25].

 São duas as características principais das teorias intuicionistas: "consistem em uma pluralidade de princípios básicos que podem chocar-se e apontar diretrizes contrárias em certos casos" e "não incluem nenhum método específico, nenhuma regra de prioridade, para avaliar esses princípios e compará-los entre si"[26].

            A concepção utilitarista é a que defende que o "princípio da utilidade é o princípio correto para a concepção pública de justiça de uma sociedade. E para demonstrar tal fato devemos argumentar que esse critério seria o escolhido na posição original"[27]. No princípio da utilidade não há a garantia de que todos se beneficiem da cooperação social, como ocorre quando se utiliza os princípios da teoria da justiça de Rawls[28].

"O utilitarismo é uma teoria ética teleológica, isto é, uma teoria que define o que é correto ou justo fazer em função de uma concepção da boa vida humana. Esta concepção, no caso do utilitarismo, é vazia de conteúdo próprio, já que resulta da agregação de preferência e desejos de fato dos agentes, sem que a motivação ou a validade dessas preferências e desejos sejam colocados em questão. Uma vez que essa agregação tenha sido de alguma forma realizada em determinada sociedade, isso nos dá  a concepção da boa vida dessa sociedade, definindo-se então a maximização do bem assim concebido como o que é direito fazer. Uma das objeções de liberais como Rawls e Dworkin a uma teoria éticas como essa é a base excessivamente frágil em que se apoia a proteção dos direitos e liberdades fundamentais dos cidadãos"[29].

 

Rawls inviabiliza também o possibilidade da utilização do princípio da utilidade, como utilidade média, isto por que:

"não há fundamentos objetivos na posição original para a aceitação de probabilidades iguais, ou, na verdade, nenhuma outra distribuição probabilística, essas probabilidades são meras suposições" e "supõe que as partes não tem vontade ou caráter definidos, e que não tem objetivos finais determinados, nem uma concepção particular de seu próprio bem, que estejam interessadas a proteger"[30].

 

3. Princípios da justiça

            Seriam, portanto, dois os principais princípios da justiça para Rawls: 1) "cada pessoa deve ter um direito igual ao mais abrangente sistema de liberdades básicas iguais que seja compatível com um sistema semelhante de liberdades para as outras", 2)"as desigualdades sociais e econômicas devem ser ordenadas de tal modo que sejam ao mesmo tempo (a) consideradas como vantajosas para todos dentro dos limites do razoável e (b) vinculadas a posições e cargos acessíveis a todos"[31].

            Rawls se preocupa em explicar principalmente o segundo princípio, pois este teria para ele, quatro significados possíveis. A primeira das interpretações é a que chama de sistema de liberdade natural e nesta:

"a primeira parte do segundo princípio é entendida como o princípio da eficiência ajustado de modo a se aplicar a instituições ou , neste caso, à estrutura básica da sociedade; e a segunda parte é entendida como um sistema social aberto no qual para usarmos da frase tradicional, as carreiras estão abertas aos talentos"[32].

A segunda interpretação é a chamada igualdade liberal onde a primeira parte é interpretada como o princípio da eficiência e a segunda parte como igualdade como igualdade de oportunidades equitativas. A terceira interpretação é a igualdade democrática onde a primeira parte é interpretada como princípio da diferença e a segunda como igualdade como igualdade de oportunidades equitativas. A última é a aristocracia natural, onde a primeira parte é interpretada como princípio da diferença e a segunda como igualdade como carreiras abertas a talentos[33]. Rawls é criterioso ao definir o que vem a ser princípio da eficiência e da diferença.

            A partir desses dois princípios e suas interpretações é que a posição original pode ser compreendida, lembrando que o objeto da justiça para Rawls é a estrutura básica da sociedade. As pessoas irão escolher os princípios sem saber se terão ou não posições sociais relevantes, procuram escolher princípios que "tentam mitigar a arbitrariedade do acaso natural e da boa sorte social"[34]. Rawls deixa claro que o princípio da oportunidade equitativa presente no segundo princípio, não pretende conduzir a uma sociedade meritocrática, isto porque a sociedade para tratar os seus de modo igual deve observar as diferenças, "deve dar mais atenção àqueles com menos dotes inatos e aos oriundos de posições sociais menos favoráveis"[35].

            Além desses dois princípios fundamentais que se aplicam a estrutura básica da sociedade, ou seja, às instituições, deve-se adotar outros princípios. "O importante é que os vários princípios devem ser adotados em uma sequência definida e os motivos dessa ordenação estão ligados às partes mais difíceis da teoria da justiça"[36].

Bibliografia

BARRY, Brian. La teoría liberal de la justicia: examem crítico de las principales doctrinas de Teoría de la justicia de John Rawls. México, Fondo de Cultura  Económica, 1993.

CRUZ Jr., Ademar Seabra da. Ontologia Social do Sistema de 'justiça com equidade':  liberais, comunitaristas e a autocrítica de John Rawls. Tese de Doutourado, FFLCH-  USP, 2001.

KUKATHAS, Chandran & PETTIT, Philip. Rawls: a Theory of Justice and its Critics.  Gran Bretanha, Polity Press, 1995.

RAWLS, John. Uma Teoria da Justiça. São Paulo, Martins Fontes, 1997.

VITA, Álvaro. A tarefa prática da filosofia política de John Rawls. Lua Nova: revista de  cultura e política. n 25, 1992, p. 5-24.

_____. Justiça Liberal. Dissertação de Mestrado. FFLCH-USP, 1992.



[1] RAWLS, J. Teoria da Justiça. p. 3

[2] CRUZ Jr., Ademar Seabra da. Ontologia Social do Sistema de 'justiça com equidade': liberais, comunitaristas e a autocrítica de John Rawls. p. 8

[3] CRUZ Jr., Ademar Seabra da. Ontologia Social do Sistema de 'justiça com equidade.. p 40

[4] CRUZ Jr., Ademar Seabra da. Ontologia Social do Sistema de 'justiça com equidade'. p 108

[5] RAWLS, J. Teoria da Justiça. p.3

[6] RAWLS, J. Teoria da Justiça. p.7

[7] RAWLS, J. Teoria da Justiça. p. 9

[8] RAWLS, J. Teoria da Justiça. p 11

[9] RAWLS, J. Teoria da Justiça. p11

[10] RAWLS, J. Teoria da Justiça. p 11

[11] CRUZ Jr, Ademar Seabra da. A ontologia social do sistema de justiça com equidade.... p.3

[12] RAWLS, J. Teoria da Justiça. p 12

[13] RAWLS, J. Teoria da Justiça. p 14

[14] RAWLS, J. Teoria da Justiça. p 170

[15] RAWLS, J. Teoria da Justiça. p 140

[16] RAWLS, J. Teoria da Justiça. p 147

[17] RAWLS, J. Teoria da Justiça. p 149

[18] RAWLS, J. Teoria da Justiça. p 200

[19] RAWLS, J. Teoria da Justiça. p 23

[20] RAWLS, J. Teoria da Justiça. p 51

[21] CRUZ Jr., Ademar Seabra da. Ontologia Social do Sistema de 'justiça com equidade'. p 44

[22] CRUZ Jr., Ademar Seabra da. Ontologia Social do Sistema de 'justiça com equidade'. p 57

[23] CRUZ Jr., Ademar Seabra da. Ontologia Social do Sistema de 'justiça com equidade', p.47

[24] características citadas por Cruz e originalmente formuladas pro Kukhatas e Pettit

[25] RAWLS, J. Teoria da Justiça. p 37

[26] RAWLS, J. Teoria da Justiça. p 37

[27] RAWLS, J. Teoria da Justiça. p 198

[28] RAWLS, J. Teoria da Justiça. p 193

[29] VITTA. Justiça Liberal. p. 6

[30] RAWLS, J. Teoria da Justiça. p 190

[31] RAWLS, J. Teoria da Justiça. p. 64

[32] RAWLS, J. Teoria da Justiça. p 71

[33] RAWLS, J. Teoria da Justiça. p 70

[34] RAWLS, J. Teoria da Justiça. p 102

[35] RAWLS, J. Teoria da Justiça. p 107

[36] RAWLS, J. Teoria da Justiça. p 116