A JUDICIALIZAÇÃO DA SAÚDE: ENTRE O POLÍTICO E O JURÍDICO
Por Maysa Pinheiro dos Reis | 27/03/2014 | DireitoA JUDICIALIZAÇÃO DA SAÚDE: ENTRE O POLÍTICO E O JURÍDICO[1]
Maysa Pinheiro dos Reis[2]
Mariana de Jesus Cardoso[3]
Sumário: INTRODUÇÃO; 1 A CONSTITUCIONALIZAÇÃO DA SAÚDE; 2 INOPERÂNCIA ESTATAL VS JUSTIÇA PRÓ-ATIVA; 3 AS DEMANDAS JUDICIAIS DE SAÚDE PÚBLICA; CONSIDERAÇÕES FINAIS; REFERÊNCIAS
RESUMO
A presente pesquisa visa discutir, a princípio, sobre o direito fundamental à saúde, evidenciando sua previsão constitucional, bem com como o dever do Estado de oferecer assistência médica e farmacêutica de qualidade a todos. Em segundo momento, propende-se para uma valorização do atuar jurisdicional em prol da coletividade que demanda a saúde pública, no instante em que esta apresenta problemas de gerenciamento do repasse de verbas e demais recursos destinados à prestação de serviços do Sistema Único de Saúde – SUS. Por fim, analisa-se a possibilidade de conferir efetividade ao direito em tela utilizando-se dos mecanismos processuais vigentes.
PALAVRAS-CHAVE: Constituição, Poder Executivo, Saúde, Gerenciamento, Poder Judiciário, Judicialização.
INTRODUÇÃO
A princípio, será analisado brevemente o direito à saúde e sua regulamentação constitucional e infraconstitucional, bem como o dever do Estado em originar seu acesso de qualidade a medicamentos farmacêuticos, além de tratamentos médicos de urgência, assim como terapêutico, dentre outros. Nesse sentido, o Poder Público tem demonstrado eficácia na prestação da saúde ou a sociedade precisa recorrer a uma segunda via de acesso aos seus direitos?
Para que todos esses fins sejam executados, cabe ao Executivo, mediante programas governamentais e políticos, administrar os recursos destinados aos Estados e Municípios pelo governo Federal. Analisar-se-á os principais aspectos a serem observados por aqueles que pleiteiam e concedem à saúde, tendo em vista o precário acesso da população no que diz respeito às Unidades de Saúde que são credenciadas pelo Sistema Único de Saúde.
No decorrer deste estudo, observar-se-á com mais propriedades a má administração do Poder Executivo e a falta de implantação de políticas públicas assistencialistas com fins de melhoria e manutenção dos serviços do SUS oferecidos aos cidadãos. Quais são as justificativas para os problemas enfrentados pela saúde pública?
Como se dá a atuação da justiça mediante tais problemas? O Poder Judiciário é chamado a agir em prol da coletividade, embora se saiba que não poderá sozinho solucionar todos os transtornos e mesmo as carências da grande demanda desassistida pelo Poder Executivo, que não consegue efetivar satisfatoriamente o direito fundamental e social à saúde, disposto na Constituição Federal de 1988.
Que procedimentos são utilizados para auferir a assistência médica? Tratar-se-á, posteriormente, a despeito do manejo das ações judiciais na questão da escolha do procedimento para as demandas.
1 A CONSTITUCIONALIZAÇÃO DA SAÚDE
Ao Estado compete o dever de garantir o direito à saúde, mediante políticas sociais e econômicas com vista à redução dos riscos de doenças, proporcionando acesso universal e igualitário às ações destinadas à promoção, proteção e recuperação, consoante ao art. 196 da Carta Política (MORAES, 2002). Cabe ainda ao Poder Público dispor sobre a regulamentação, fiscalização e controle do serviço de saúde, com fulcro no art. 197, executando-o por meio de entidades públicas, ora pertencentes à administração direta, ora à administração indireta, bem como criar mecanismos de cooperação entre essas entidades, de forma que a execução das políticas públicas de saúde se efetive com observância para as peculiaridades regionais e sociais da população que atende.
A Constitucionalização do direito à saúde determinou o aumento formal e material de sua força normativa com consequências para a efetividade, no que tange à aproximação entre o dever-ser normativo e o ser da realidade social, ou ainda à realização do direito e desempenho concreto de sua função social (BARROSO, 1996).
Com alicerce no juízo de Gomes Canotilho e Vital Moreira, verifica-se que o direito à saúde comporta duas vertentes, quais sejam: “uma, de natureza negativa, que consiste no direito de exigir do Estado (ou de terceiros) que se abstenha de qualquer ato que prejudique a saúde, outra de natureza positiva, que significa o direito às medidas e prestações estaduais visando à prevenção das doenças às medidas e o tratamento delas” (SILVA, 2001). Nesses termos, a saúde é um direito fundamental social subjetivo, passível de ser tutelado judicialmente nos casos onde há omissão do Estado em promover prestações materiais à sua completa realização. Assim sendo, o judiciário tem sido provocado a coagir a administração a cumprir com o dever referente ao art. 5º XXXV da Constituição de garantir à prestação de atendimento médico e assistência farmacêutica.
O poder público promove a saúde por meio do Sistema Único de Saúde – SUS, que constitui uma rede regionalizada e hierarquizada de ações e serviços de saúde, sendo organizado por diretrizes de descentralização, com direção única em cada esfera de governo; atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais e participação da comunidade, conforme disposto no art. 198 (PAULO, ALEXANDRINO, 2010).
O SUS é financiado com o orçamento da seguridade social, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, além de outras fontes que aplicam, anualmente, recursos do produto de suas arrecadações tributárias em percentagens e critérios previstos em lei complementar (PAULO, ALEXANDRINO, 2010).
2 INOPERÂNCIA ESTATAL VS JUSTIÇA PRÓ-ATIVA
O Estado tem se mostrado pouco eficaz na efetivação do direito à saúde, principalmente no que versa sobre a prestação da assistência médica e farmacêutica, suscitando, desse modo, o fenômeno compreendido como judicialização do direito à saúde (GANDINI; BARIONE; SOUZA, 2010). Os direitos fundamentais possuem aplicabilidade direta e imediata, com suporte no §2º do art. 5º da Magna Carta, portanto, jamais podem ser meras promessas do constituinte originário, destituídas de efetividade. Mais do que nunca, o poder público precisa implementar a prestação dos direitos sociais com investimentos em políticas públicas que atendam tais demandas.
Averiguando o relato do ministro Celso de Melo na ADI 2.075, constata-se que os tribunais se valem do argumento de que não compete ao judiciário atuar como legislador positivo, ampliando o alcance da norma, para beneficiar quem carece de assistência médica, pois deste modo transgrediria a separação dos poderes. Eis que tal princípio traduz limitação ao exercício das atividades administrativas e jurisdicionais do Estado, evidenciando a necessária submissão aos comandos estatais emanados do legislador.
Todavia, uma atuação mais pró ativa do Poder Judiciário em promover a concretização de direitos que dependam diretamente de políticas públicas efetivadas pelo Poder Executivo, não estaria a macular o princípio da separação dos poderes, nem tão pouco ofenderia à Constituição, visto que se realiza conforme as peculiaridades de cada caso, fundamentando-se na dignidade da pessoa humana, na necessidade de preservação do núcleo essencial dos direitos fundamentais em que se inserem os direitos de subsistência, tais como saúde, moradia, educação e alimentação (GANDINI; BARIONE; SOUZA, 2010).
Com a promulgação da Constituição Cidadã, cujos direitos fundamentais ganham destaque no ordenamento jurídico como um todo, observa-se que houve uma valorização da função da justiça, na medida em que o judiciário foi atirado no epicentro dos conflitos sociais reprimidos, consagrando-se como efetivador dos direitos e garantias fundamentais, passando a decidir questões inovadoras e matérias de caráter estritamente político diante da inoperância do Poder Executivo na realização das políticas públicas. Essa omissão por parte do Executivo e ainda, muitas vezes, do Legislativo, incita o exercício de uma atividade jurisdicional na garantia de direitos, de forma a atender aos anseios sociais, mediante a tarefa de efetivar o ordenamento constitucional pelo critério do sistema de direitos fundamentais (REIS, 2009).
A principal alegação dos Estados e, principalmente, dos Municípios para evitar condenações ou ainda suspender liminares já deferidas, onde se pleiteiam cirurgias, transplantes e tratamentos médicos em geral, além do fornecimento de remédios, é de que há insuficiência de provisão orçamentária e disponibilidade de material e recursos para a realização de tais serviços. No entanto, esta justificação não sensibiliza os tribunais, para os quais as normas não podem converter-se em vãs promessas constitucionais, de modo a fraudar justas expectativas da coletividade pelo descumprimento do dever estatal, num gesto irresponsável perante as determinações da Lei Fundamental. (GANDINI; BARIONE; SOUZA, 2010).
Nesse sentido, segundo dados do Fundo Nacional de Saúde (FNS), no mês de janeiro do ano de 2011, o município de São Luís - MA recebeu do governo federal a importância de R$ 19.875.684,85 destinados à melhoria e manutenção de suas unidades de saúde para amparar pouco menos de 1.028 milhões do total de habitantes que dispõe deste serviço. Já no município do Rio de Janeiro – RJ, foram enviados no mesmo período, financiamento equivalente à R$ 66.872.543,51 para servir a 140 milhões do total de habitantes, em média. Verifica-se portanto que o governo federal repassa verba suficiente para suplantar as necessidades de gestão da saúde nos municípios, cabendo aos entes administrativos aprimorar o gerenciamento de tais recursos, a fim de qualificar a oferta do serviço público de saúde.
Sobre este aspecto, recai ao Poder Público, a incumbência de efetuar prestações de saúde, promovendo em favor da população medidas preventivas e de recuperação, além de garantir políticas públicas bem consolidadas com o desígnio de materializar o que preconiza o art. 196 da Carta Magna.
Estamos diante de normas em colisão, nas quais seus respectivos termos abrangem contextos constitucionais com fins de utilização dos recursos públicos voltados para a qualidade de vida da população. Porém, o uso destes recursos pelo Poder Público é uma verdadeira parábola a ser estudada pelos diversos ramos do conhecimento, tais como a economia, a sociologia e o próprio direito. Não obstante, a Constituição, nos art. 165 a 169, abordou situações de despesas que excedam os créditos orçamentários (art. 167, inc. II), além da possibilidade de transposição, remanejamento ou transferência de recursos de uma categoria de programação para outra ou de um órgão para o outro, sem autorização legislativa (art. 167, inc. VI). (ALEXY, 1999)
Pode-se perceber que o problema não é jurídico constitucional, tendo em vista que não decorre da ausência de normas a disciplinar a forma de aplicação dos recursos pelo Poder Público, mas sim na própria gestão administrativa do setor da saúde. A verdade é que o poder público arrecada muito e emprega muito mal suas finanças e demais recursos.
Assim, a limitação orçamentária jamais foi argumento de defesa para o não comprometimento com a melhor concretização do direito fundamental à saúde pelo Poder Executivo e, neste âmbito, como aduz o ministro do STF, Celso de Mello, o Poder Judiciário privilegia o respeito indeclinável à vida e à saúde humana, que se qualifica como direito subjetivo inalienável, assegurado a todos pela própria Constituição da República (art. 5º, caput e art. 196) em detrimento do interesse financeiro e secundário do Estado.
3 AS DEMANDAS JUDICIAIS DE SAÚDE PÚBLICA
O direito à saúde, à educação, bem como à alimentação, estão elencados no art. 6º da Constituição Federal. Estes, são as bases que sustentam o mínimo existencial permitindo uma vida digna para cada cidadão, gerando para o Estado a responsabilidade de cumprir com obrigações de fazer mediante implementações de planos de políticos governamentais, proporcionando assim respeito à dignidade à pessoa humana (SILVA, 2001).
Assim, para a efetivação de tais políticas, os Estados e Municípios dependem de repasse de recursos financeiros de âmbito federal, como já visto, em que diante de uma omissão ou de atos negligentes da aplicação deles, caberá ao Poder Judiciário intervir com a finalidade de garantir a seguridade de tais direitos sociais. Com isso, o Poder Judiciário intervém mediantes alguns instrumentos processuais, tais como a ação civil pública, o mandado de segurança, além das ações condenatórias de dar e de fazer (MEIRELES, 1997). Desta forma, a ação civil pública regulamentadas pela lei nº 7.347/85, consiste em um instrumento processual, do âmbito constitucional destinado à defesa de interesses difuso e coletivo e/ou individuais homogêneos, cabendo, pois ao Ministério Público a função de promovê-la como aduz o art. 129 da Constituição Federal no seu inciso III, e ainda o art. 5º da supramencionada lei, o qual ele pleiteia no interesse de um único paciente ou de um grupo determinado e restrito (MEIRELES, 1997). Nesse sentido, o julgado extraído pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul exemplifica a função do Ministério Público, que ingressa com tal ação alegando a obrigação de dar:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. OBRIGATORIEDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA DIRETA. O Estatuto da Criança e do Adolescente confere ao Ministério Público, através dos seus artigos 201 e 212, legitimidade para litigar na defesa dos seus interesses individuais e homogêneos das crianças e adolescentes, protegidos pelo estatuto menorista. A saúde é um direito de todos (art. 196, CF), e a obrigatoriedade do fornecimento de medicamentos a quem deles precisa está em conformidade com o parágrafo segundo do artigo 11, letras ‘a’ e ‘b’ do parágrafo único do art. 4º, inciso V do art. 201, e art. 213, todos do Estatuto do da Criança e do Adolescente, visto em combinação com o artigo 23, inciso II, art. 196, art. 198, caput e incisos e art. 227, todos da Carta Constitucional Brasileira. Apelo desprovido (Apelação e Reexame Necessário Nº 70010656163, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Antônio Carlos Stangler Pereira, Julgado em 07/04/2005).
Já o mandado de segurança, consiste em uma ação constitucional de natureza cível, que ocorre através do rito sumário, a fim de proteger direito liquido e certo mediante ato ilegal ou abusivo de autoridade pública ou de agente que esteja no exercício do poder público, em que não foi amparado pelos habeas corpus ou pelo habeas data, isto segundo o art. 5º, LXIX da CF/88 (MORAES, 2002).
Desta forma, as leis nº 1.533/51 e 438/64 disciplinam tal processo, alegando que caberá mandando de segurança apenas quando tenha havido violação ou grave ameaça ao direito líquido e certo (MEIRELES, 1997). Com isso, segundo Vicente Paulo e Marcelo Alexandrino, a exigência de liquidez e de certeza recai sobre a matéria de fato, necessitando de comprovação inequívoca de plano, caso contrário não é necessário a dilação probatória, pois elas devem ser pré constituídas, em regra, documentadas e levadas aos autos do processo no momento da sua impetração (PAULO; ALEXANDRINO, 2010). Desta forma, há vários julgados referentes à impetração de mandado de segurança, como o seguinte proveniente do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, em que o impetrante reivindica a obrigação de fazer:
MANDADO DE SEGURANÇA – INTERNAÇÃO EM HOSPITAL PÚBLICO – S.U.S. – GARANTIA CONSTITUCIONAL DO DIREITO À SAÚDE – ARTIGO 6º E 196 DA C.F. “É de responsabilidade concorrente da União, Estados e Municípios o dever de garantir saúde a todos; tal lição emana da Carta Maior (TJMG – APCV 000.308.437-3/00 – 7ª C. Civ. – Rel. Des. Alvim Soares – J. 03.02.2003).
E por fim, a ação condenatória de obrigação de fazer (art. 461, CPC) tal como a obrigação de dar (art. 461-A do CPC), consiste em ações comuns que são disciplinadas pelo Código de Processo Civil, ocorrendo mediante o rito ordinário, em poucos casos podem ocorrer no rito sumário além da impossibilidade da ocorrência do mesmo no rito sumaríssimo, segundo as leis nº 9.099/95 e 10.259/01 (CAMARA, 2008).
A competência em qualquer dos procedimentos, será da Justiça Estadual, no momento em que a mesma for pleiteada em face da Fazenda Estadual e/ou da Fazenda Municipal, quando este é pleiteado em face de ato de autoridade estadual e/ou municipal. Só caberá a competência para apreciação pela Justiça Federal, quando a União pleitear isoladamente ou solidariamente no polo passivo. Assim, nas comarcas onde há vara da fazenda pública a ação deve ser designada a ela, oposto a isso deverá tramitar na vara cível comum (CAMARA, 2008).
Também é totalmente cabível o pedido de antecipação de tutela (art. 273,461 e 461-A do CPC), quando o pedido de tutela é de tal urgência que não há a possibilidade de espera da tramitação do mesmo no rito ordinário. Isto ocorre com muita frequência quando se trata de urgência para obtenção de cirurgias (obrigação de fazer), tal como de obtenção de medicamentos, como diabetes (obrigação de dar), dentre outras. Com relação a isso, há vários outros exemplos, como este que ocorreram em julgados no Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul:
EMENTA: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO DE DECISÃO MONOCRÁTICA. AGRAVO DE INSTRUMENTO. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. CONDENAÇÃO DO ESTADO AO PAGAMENTO DE HONORÁRIOS. Merecem prosperar os embargos de declaração, porquanto cabível a condenação do Estado do Rio Grande do Sul ao pagamento de honorários advocatícios ao patrono do recorrente, conforme preceitua o art. 20 do CPC. Embargos acolhidos. (Embargos de Declaração Nº 70025695800, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: José Ataídes Siqueira Trindade, Julgado em 22/10/2008).
AGRAVO DE INSTRUMENTO. ECA. DIREITO À SAÚDE. MEDICAMENTOS. OBRIGAÇÃO DO ENTE PÚBLICO DE FORNECÊ-LO. BLOQUEIO DE VALORES. CABIMENTO. 1. O ECA estabelece tratamento preferencial a crianças e adolescentes, mostrando-se necessário o pronto fornecimento do medicamento de que necessita a adolescente. 2. A antecipação de tutela consiste na concessão imediata da tutela reclamada na petição inicial, desde que haja prova inequívoca capaz de convencer da verossimilhança da alegação e, ainda, que haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação, o que vem demonstrado nos autos. Inteligência do art. 273 do CPC. 3. É cabível o bloqueio de valores quando permanece situação de inadimplência imotivada do ente público, pois o objetivo é garantir o célere cumprimento da obrigação de fazer estabelecida na decisão judicial. Recurso desprovido (Agravo de Instrumento Nº 70028487411, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves, Julgado em 25/03/2009).
Com isso, observa-se que mesmo na lacuna da efetividade do Poder Executivo, em cumprir com as prerrogativas determinadas pelo Poder Legislativo, caberá, pois, ao Poder Judiciário, mediante ações constitucionais, como o mandado de segurança e a ação civil pública, além das ações cíveis processuais, como a ação condenatória com a obrigação de dar e de fazer, assegurar aos cidadãos aquilo que fora determinado pelo legislativo como direito fundamental, a fim de proporcionar uma melhor qualidade de vida destes, cumprindo e respeitando com o princípio à dignidade da pessoa humana.
Assim, caberá ao judiciário controlar e a fiscalizar os entes administrativos no seu gerenciamento de repasse como na utilização dos recursos destinados à saúde, proporcionando maior disponibilidade de medicamentos farmacêuticos a fim de atender a todos que os precise, tal como disponibilizando mais vagas para contratação de médicos e de enfermeiros proporcionando melhor funcionamento nas unidades de saúde, dentre outros meios que de forma direta ou indireta levaria a maior qualidade de vida de todos diminuindo problemas agravantes como o elevado número de mortalidade infantil, que no Brasil ainda há um índice bem elevado comparado a países desenvolvidos. Somente assim, ter-se-á respeito e cumprimento, além de efetivação dos direitos fundamentais e sociais designados pelo legislador na Constituição Federal Brasileira, proporcionando desta forma, o mínimo existencial para uma vida digna dos cidadãos.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir do contexto em análise foi possível perceber o mau gerenciamento por parte dos Entes Administrativos Executivos no que tange a incorreta aplicação dos recursos disponíveis, para qualificar e manter o atendimento satisfatório aos cidadãos que necessitam do Sistema Único de Saúde.
De toda sorte, o direito à saúde é um direito fundamental subjetivo, tutelado pelo Estado, que dispõe de assistência médica, terapêutica e farmacêutica para todos, fornecendo suporte à vasta esfera populacional que carece deste recurso para obter uma vida mais saudável e digna. Destarte, diante da omissão do Poder Executivo em por em prática as políticas públicas para dispor de tal direito antevisto pelo legislador constituinte nos artigos 5º, XXXV, 6º, 196 e 197 da Constituição Federal, faz-se necessária a intervenção judicial para efetivá-los.
Não é suficiente ter políticas públicas ou ações inapropriadas, diagnosticar doenças e não oferecer o devido tratamento para o paciente por insuficiência de equipamentos, de profissionais especializados, ou ainda por ter uma medicina muito precária em avanços tecnológicos ou científicos, pois isto é desperdiçar recursos e, desta forma, majorar o sofrimento dos que padecem à espera deste amparo.
Um sistema maduro e eficiente requer, além de verbas e recursos materiais, profissionais competentes no sentido técnico, honestos e que primem por valores éticos e morais no contexto saúde pública. Esta é uma barreira a ser enfrentada pela pelo nosso sistema, embora se tenha a ciência de que estamos longe de bem servir a todos.
Consoante isto, aqueles que sofrem algum tipo de dano pela falta de atendimento médico e hospitalar adequado, ou mesmo por ausência de medicamentos necessários, recorrem à justiça, por via de procedimentos processuais que visam tornar acessíveis tais benefícios, mediante impetrações de mandados de segurança e de ação civil pública, assim como ajuizamentos de ações condenatórias com obrigações de dar e de fazer, e também por meio de pedidos liminares de tutela antecipada, quando a questão for de tal urgência que a morosidade do processo em rito ordinário, torna-se ineficaz para o caso. Tais provimentos judiciais geram satisfação aos casos concretos de maneira isolada, pois garante de forma subsidiária o direito à saúde para a população. No entanto, seria bem melhor que não fosse necessária a intervenção do judiciário para a efetivação dos direitos sociais, ou mesmo que não fosse preciso desenvolver estratégias para conter abusos e evitar erros quando do provimento das tutelas.
Porém, constata-se que isso ainda está longe de acontecer e os abusos que envolvem esse fenômeno devem ser rigorosamente enfrentados, no intento de proporcionar à população meios eficazes para conseguir diagnosticar e prevenir doenças, além de prestar assistência clínica e hospitalar adequada aos pacientes.
Desta forma, considerando o direito ao acesso à saúde como um direito subjetivo inalienável assegurado a todos pela Constituição da República, não se pode mais permitir que cidadãos fiquem destituídos de atendimentos médicos, nem tão pouco de medicamentos para fins terapêuticos, visto que é dever do Estado administrar e gerenciar os recursos recebidos para o setor da saúde pública, fazendo valer desta maneira, o respeito à dignidade da pessoa humana.
REFERÊNCIAS
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[1] Paper apresentado para obtenção de nota parcial referente ao 5º período do curso de Direito da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco, na disciplina Direito de Processo de Conhecimento II, ministrada pelo Prof. Msc. Hugo Passos.
[2] Graduando no curso de Direito da Universidade de Ensino Superior Dom Bosco (UNDB).
[3] Graduando no curso de Direito da Universidade de Ensino Superior Dom Bosco (UNDB).