A IRREGULARIDADE DOS CAMELÔS FRENTE ÀS OBRIGAÇÕES EMPRESARIAIS

Por Letícia Prazeres Falcão | 18/08/2016 | Direito

RESUMO

A prática mercantil informal dos camelôs remonta uma discussão não necessariamente hodierna da temática estudada no presente artigo. As características que revestem a qualidade da informalidade dos praticantes desta atividade comum tanto nas ruas de centros comerciais brasileiros quanto fora do país são de essencial compreensão para que se desenvolva a explicação clara de sua irregularidade baseada e fundamentada em dispositivos legais assim como no próprio cotidiano vivido por eles. Devido a estes fatores ocorrem também impactos internos e externos à nação brasileira em se tratando da informalidade com a qual se pratica a atividade, porém é necessário esclarecer que ainda há atrelado ao preconceito a falta de conhecimentos verídicos relacionados ao assunto, tendo em vista que deve ser analizados todos os aspectos que revestem a existência, realização e continuação do ilícito. As exigências que estruturam a atividade empresarial regularizada (registro na Junta Comercial e prática habitual) que não são cumpridas e preenchidas formam lacunas de insatisfação por parte dos envolvidos na seara comercial e também pelo Estado no desempenho de suas funções fiscalizatórias imperativas. 

INTRODUÇÃO

Exercer a função de empresário nos dias hodiernos não é simples, o Direito, o Estado e a sociedade exigem dele muito mais do que uma postura que esteja de acordo com novas demandas comerciais globais, como também estar rigorosamente inserido em um quadro de obrigações que dá ao empresário o aval legal para exercer sua atividade. O camelô é um profissional conhecido há muito tempo na história da humanidade, geralmente vende mercadorias que não estão devidamente regulamentadas pelos órgãos estatais, assim como sua atuação é exercida em alguns lugares proibidos, facilitando o contrabando dos produtos. No Brasil, o comerciante ambulante acabou criando uma imagem positiva para com a sociedade, já que além de ter o famoso jeitinho brasileiro e a malandragem, oferece também produtos com preços bem abaixo do estipulado no mercado.

Embora possa ser considerado uma espécie de empresário, o comerciante informal está revestido de uma verdadeira irregularidade que vai desde o exercício de sua atividade ao objeto de compra e venda. Ele não está em conformidade com as obrigações empresariais, e assim passa a estar sujeito às sanções de natureza fiscal e administrativa impostas pelo Estado. A falta do não enquadramento nos requisitos obrigacionais coloca o camelô numa situação em que este não dispõe de direitos reconhecidos, tirando até a possibilidade de receber benefícios que sirvam de incentivo para sua profissão, que facilitem a manobra comercial tanto para ele quanto para a sociedade.

Os comerciantes ambulantes geralmente estão concentrados nas zonas urbanas mais populosas, em que o setor terciário tem grande força e assim encontram espaço para comercializar suas mercadorias. Entender onde nasce a irregularidade deles é possibilitar um estudo da própria atividade econômica brasileira, apontando sua falhas e propondo soluções que podem proporcionar impactos não somente na esfera econômica, como também na politica e na social. A atividade ambulante acaba sendo uma forma de recurso ilegal encontrada por quem não tem conhecimento da lei e de seus dispositivos ou por quem até tem, porém prefere não arcar com a possibilidade de contrair obrigações e deveres e foge para a clandestinidade.

Obrigações referentes ao regime do empresário como o reconhecimento feito mediante registro na Junta Comercial e o balanço financeiro são pontos carentes na atividade informal e contribuem para um circulo vicioso em que a ilegalidade fecha portas e acaba taxando indivíduos como não capazes de construir a imagem empresarial. Porém é importante lembrar que a atuação estatal não é suficiente para suprir essa demanda, cabe então fazer uma analise de ambos os lados, apontando direitos e deveres. A regularização e capacitação dos camelôs frente às obrigações empresariais é muito mais que o enquadramento a um dispositivo normativo previsto, na verdade passa a ser o resguardo de direitos que serão  reconhecidos e concedidos aos comerciantes ambulantes  e também passa a ser um passo de avanço na econômica brasileira, afinal possuir um exercício completo e normalizado da economia de um país é estar de acordo ás demandas oriundas da postura neoliberal e da globalização, conseguindo concretizar o ainda abstrato slogan da ordem e do progresso.           

1 A ATIVIDADE COMERCIAL AMBULANTE  E SUAS PARTCULARIDADES

Primeiramente é importante lembrar que a prática comercial é tão antiga quanto a história do homem, passou por evoluções como a troca, o escambo, posteriormente veio a utilização da moeda como forma valorativa e atualmente são utilizados os créditos mediante preços pré-estabelecidos e tabelados. O comerciante ambulante também sempre esteve presente nessas fases, só que muitas vezes de forma obscura, não sendo visto nas práticas comerciais oficiais. Vendiam seus produtos por um preço abaixo do mercado em grandes feiras, fora dos locais mais conhecidos e autorizados pelos governos, também visitavam seus fregueses em trailers e viajavam de cidade em cidade promovendo a troca de produtos e  adquirindo novos. Na Idade Média com o aumento populacional e o surgimento das cidades, por exemplo, alguns deles ficavam fora dos burgos para a prática da atividade comercial e negociavam com burgueses para ter uma espécie de patrocínio e posteriormente prestavam serviços em troca.

A origem da palavra camelô é francesa e foi com a influência do português que ganhou o status referente ao comerciante ambulante que revende produtos de pouca referência e reconhecimento. Segundo o conceito jurídico fixado na Lei nº 6.586 de 6 de novembro de 1978 em seu artigo 1º, “ considera-se comerciante ambulante aquele que, pessoalmente, por conta própria e a seus riscos, exerce pequena atividade comercial em via pública, ou de porta em porta”. É possível observar que o comerciante ambulante, popularmente conhecido como camelô, é considerado de certa forma um pequeno empresário que exerce sua atividade de forma autônoma e independente, com o objetivo de lucratividade (já que está ligada ao seu meio de subsistência), pratica de forma profissional tendo habitualidade a circulação promovida entre a compra e venda de produtos.

O camelô geralmente compra a mercadoria por meio da distribuição de uma empresa, sendo um agente externo e que não possui um vínculo empregatício, ele compra a mercadoria para revendê-la em outros lugares e possuir uma margem de lucro maior. Chega a ser uma característica típica desse comerciante a dita “manha” para ganhar os consumidores, são feitos acordos para diminuição de preço de modo que agrade o vendedor e o cliente, realizadas demonstrações para assegurar a qualidade e funcionalidade do produto, aliás, a pluralidade de mercadorias para a venda é uma forte marca desse agente comercial que vende desde pilhas a um celular dito de última geração, possuem produtos do ramo de eletrônicos, artesanais, de limpeza, cosmético dentre outros.

É perceptível que o camelô é considerado um atuante do comercio informal já que muitos produtos não possuem notas fiscais comprovando sua origem ou são até mesmo contrabandeados e importados de outros países como a China e o Paraguai. São taxados como vendedores de produtos de baixa qualidade e que podem até terem sido fruto de roubo, por muitas vezes alguns criminosos revenderam o que conseguiram com a prática do delito. A profissão de camelô não deixa de ser uma prática ilegal muitas vezes oriunda de poucas ou nenhuma oportunidade na vida dessas pessoas, que geralmente são de classe baixa com pouca escolaridade, residem em locais escassos de saneamento básico, assistência médica e governamental e que possuem índices de violência. E para complementar a situação difícil ainda têm que lidar com a atuação policial que muitas vezes é além de triste, traumática como e perceptível em depoimentos como o de Afonso José da Silve, um dos personagens verídicos que compõem a obra Trabalhadores de Rua em São Paulo, de autoria de Anne Galvão e Leonardo Freitas.

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