A INFLUÊNCIA DA TEOLOGIA CRISTÃ NO PENSAMENTO DE FRANCIS BACON

Por Luiz Tiago Vieira Santos | 06/02/2015 | Filosofia

A INFLUÊNCIA DA TEOLOGIA CRISTÃ NO PENSAMENTO DE FRANCIS BACON

 

Luiz Tiago Vieira Santos[1]

 

Paolo Rossi, no terceiro capítulo de seu livro intitulado “a ciência e a filosofia dos modernos” incita uma reflexão acerca das características marcantes do pensamento filosófico e científico predominante em grande parte dos textos do século XVII. Nesta época, permeava a idéia de que a finalidade do conhecimento era a de recuperar a primitiva condição humana, maculada pelo “pecado original” de Adão. No decorrer de seu raciocínio, Rossi demonstra como Francis Bacon utiliza-se do arquétipo teológico da época e o direciona fortalecendo suas próprias ideias em busca de uma nova visão de mundo e de conhecimento.

O autor mostra que, os textos dessa época traziam em seu escopo temas religiosos que, segundo ele, constituem um esquema teológico que vai além de um simples resquício da cultura medieval, mas que age de forma a influenciar a vida e a cultura atribuindo-lhes certo direcionamento, que poderia assumir dois sentidos distintos e opostos: ou para fortalecer a idéia da implacável decadência do mundo ou para incentivar o progresso, decorrente do aumento do saber e das invenções.

Ao tratar sobre Bacon, Rossi deixa claro que objetiva demonstrar não apenas as correlações bíblicas existentes na obra de Bacon, mas principalmente explicar os fundamentos da recusa baconiana das filosofias grega e escolástica e a maneira como o filósofo introduz conscientemente sua nova visão do saber no esquema teológico supracitado. A princípio, Rossi lança mão de recursos para mostrar a aversão de Bacon às ideias e filosofia de Aristóteles. Segundo o autor, na visão de Bacon, a filosofia de Aristóteles e de tantos outros, baseada em círculos viciosos de discussões meramente teóricas, era improdutiva, pois não produzia nenhum efeito prático para a vida do homem. Bacon culpa a tradição pelo atraso de séculos no progresso do conhecimento. Tradição esta que, de acordo com ele, era marcada pelo intelectualismo e representava falsamente a realidade, trazendo a impressão de existir uma grande variedade de doutrinas e filosofias quando, na verdade, todo conhecimento da época estava reduzido a poucas cabeças pensantes. Diante disto, Bacon defendia a substituição dessas filosofias por outra que se enveredasse por novos caminhos e que tivesse uma postura diferente diante da natureza, com uma nova forma de criação e transmissão do saber, em busca de um intelecto puro e refinado.

Outra crítica atribuída por Bacon à tradição era a de que eles, em sua filosofia, substituíram o culto à natureza, obra divina, pelo culto de alguns filósofos da antiguidade, renunciando assim as faculdades que Deus concedeu aos homens. O abandono dessas faculdades demonstram, sobremaneira, a soberba dos escolásticos, sobretudo em sua filosofia, e isto os levou a substituir as obras de Deus por uma visão deformada de mundo, que advinha das ideias de poucos pensadores.

Ao preterir o livro da natureza, obra grandiosa de Deus, os escolásticos construíam um saber vazio, limitado e obscuro, uma vez que era um saber demasiadamente sumário, e, por sua vez, necessitava de cada vez mais explicações. Essa obscuridade, segundo Rossi, ocasionou uma adulteração do cristianismo, decorrente do afastamento de Deus das escrituras em detrimento do pensamento de Aristóteles. Aliás, ainda segundo o autor, um dos motivos centrais da reforma cultural que propunha Bacon era o enfrentamento a filosofia insensível de Aristóteles.

Contudo, o autor evidencia que com o passar dos anos, começou-se a difundir a necessidade de se voltar a leitura direta dos textos sagrados e não mais deixar-se influenciar pelas interpretações escolásticas sobre os temas religiosos. Defendia-se que a base da teologia cristã se encontrava nos textos antigos, dos primórdios da Igreja que, segundo o autor, foram escritos numa linguagem acessível e longe da influência escolástica aristotélica. Estes, conforme o autor, tiveram uma conceituação positiva por parte de Bacon.

De acordo com Rossi, um os principais motivos da oposição de Bacon a tradição era a má associação entre teologia e ciência, que culminaram numa filosofia natural baseada na interpretação fantasiosa dos textos sagrados (exempladorismo e simbolismo, ambos expressamente rejeitados por Bacon), e que estabeleciam empreitadas para a não aceitação a quaisquer novas formas de investigação da natureza.

Em seguida, conforme Rossi, Bacon procura esclarecer a necessidade de manter separados os dois campos da teologia e da ciência e que a ciência não é mefistofélica, isto é, diabólica ou sarcástica e que, por isso, não há motivos para tal rejeição por parte dos religiosos. De acordo com Bacon, a decadência do homem não decorreu da ciência da natureza, mas sim da pretensão do homem à ciência do bem e do mal, tentando de forma nefasta se igualar a Deus. Essa atitude resultou na perda da liberdade e da iluminação do intelecto, pois antes do pecado, o homem possuía uma mente pura. Diante desta situação, Bacon defende que a purificação da mente e o retorno a tal estado iluminado de intelecto depende de uma reformulação da atitude humana diante do mundo, não só do ponto de vista do conhecimento, mas também sob a ótica moralista e do espírito religioso.

Ainda, Rossi afirma que, para Bacon, a reforma da ciência era apresentada como uma interpretação do cristianismo. Para ele, a verdadeira finalidade do conhecimento era a restauração do homem e da soberania que ele tinha, sobretudo a pureza de intelecto, no primeiro estágio da criação. Para tanto, afirmava que o homem poderia reconquistar aquilo que o pecado lhe tirou através de suas obras e que estas devem ser pautadas da caridade, isto é, os benefícios de suas descobertas devem ser estendidos a toda humanidade.

Paolo Rossi afirma ainda que Bacon se encontrava diante de dois tipos de filosofia na época, ambas diferentes e com quais ele discordava veementemente. De um lado, uma filosofia baseada no aristotelismo misturada com as verdades da religião e de outro um platonismo que remetia a Agostinho e concebia o mundo natural como a manifestação viva de Deus. Bacon simplesmente rejeita essa mistura de filosofia-teologia, que traz como pano de fundo uma crença mascarada de religiosidade, constituindo como um dos maiores obstáculos para o avanço do saber e o progresso das ciências. Segundo Bacon, o resultado dessa mistura é a distorção do sentido das escrituras e da realidade da natureza.

Por fim, o autor finaliza afirmando que Bacon foi além da utilização simples do esquema teológico da época para atingir um determinado fim, ele extraiu desse esquema as bases para sustentação de suas próprias ideias revolucionárias. Contribuindo assim, para a real separação da filosofia e teologia, que culminaria no nascedouro de uma nova forma de pesquisa científica, isto é, um novo saber, não mais meramente contemplativo, mas sim capaz de intervir na realidade e modificar as condições de vida dos homens sobre a Terra.

REFERÊNCIAS

ROSSI, Paolo. “Bacon e a Bíblia”. In ____________. a ciência e a filosofia dos modernos. São Paulo. UNESP; 1992.



[1] Possui LICENCIATURA PLENA EM CIÊNCIAS NATURAIS pela UNIVERSIDADE TIRADENTES UNIT (2009), com experiência docente na Educação Básica (Ensino Fundamental e Médio) nas disciplinas Ciências e Biologia respectivamente e na Educação Técnica (área da saúde) na disciplina Microbiologia e Parasitologia Humanas. Atualmente é graduando do BACHARELADO EM DIREITO pela UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE - UFS

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