A inconstitucionalidade do depósito prévio na ação anulatória de débito fiscal perante a Justiça do Trabalho.
Por Pedro Paulo Grizzo Serignolli | 11/12/2009 | Direito
- Introdução.
No presente estudo veremos os contornos gerais da ação anulatória de débito fiscal ajuizada perante a Justiça do Trabalho em virtude débitos resultantes de penalidades administrativas impostas por autoridades do Ministério do Trabalho e Emprego. Constataremos a competência para julgamento destas ações. Também veremos a natureza jurídica dos créditos resultantes destas penalidades; se o auto de infração pode constituir tais créditos; os contornos gerais da ação anulatória de débito na lei e na jurisprudência; a relação das Instruções Normativas TST n.º 3/1993 e 27/2005 com a ação de anulação de débito. Após, seguiremos à nossas conclusões.
Iniciemos, então, o nosso estudo.
- Instrução Normativa n.º 34 – TST – DOU em 20/11/2009.
O Tribunal Superior do Trabalho (TST) editou Instrução Normativa (IN) n.º 34, publicada no DOU em 20/11/2009, dispondo sobre a guia a ser utilizada, na Justiça do Trabalho, para o recolhimento do depósito prévio destinado à propositura de ação anulatória de débito fiscal resultante de penalidade administrativa imposta por autoridade do Ministério do Trabalho e Emprego.
A guia mencionada na aludida IN TST n.º 34/2009 é questão de somenos importância. O que importa saber é se tem fundamento constitucional a exigência do depósito prévio como condição da ação anulatória de débito fiscal proveniente da aplicação de penalidades aplicadas pelos órgãos de fiscalização das relações de trabalho.
Vejamos o texto da referida Instrução Normativa:
“Art. 1.º - Na Justiça do Trabalho, o depósito prévio para o ajuizamento de ação anulatória de débito fiscal, resultante de penalidade administrativa imposta por autoridade do Ministério do Trabalho e Emprego, será efetuado em guia definida em instrução normativa específica da Secretaria da Receita Federal do Brasil, presentemente objeto do Anexo I da Instrução Normativa n.º 421/2004-SRF.
Art. 2.º - Esta Instrução Normativa entrará em vigor na data de sua publicação.”
Passemos, agora, às nossas reflexões sobre os itens indicados na introdução.
- Da competência da Justiça do Trabalho para as ações relativas às penalidades administrativas aplicadas pela fiscalização do trabalho.
Com o advento da Emenda Constitucional (EC) n.º 45/2004, a competência para o julgamento das ações relativas às penalidades administrativas impostas aos empregadores pelos órgãos de fiscalização das relações de trabalho passou a ser da Justiça do Trabalho, conforme inciso VII do art. 114 da Constituição Federal de 1988 (CF/88).
Sendo assim, o empregador que desejar impugnar judicialmente referidas penalidades administrativas deverá dirigir-se ao Judiciário Trabalhista, e não mais ao Judiciário Federal, como era antes do advento da mencionada EC 45/2004.
Um dos instrumentos processuais à disposição dos empregadores para esta finalidade, é a ação anulatória de débito cujos contornos legais veremos em breves linhas mais adiante.
- Da natureza jurídica dos créditos decorrentes das penalidades administrativas aplicadas pelos órgãos de fiscalização das relações de trabalho.
Antes, porém, de analisarmos a ação anulatória de débito perante a Justiça do Trabalho, é interessante verificar a natureza jurídica dos créditos em comento, e de que maneira eles podem ser cobrados.
As autuações aplicadas pelos órgãos de fiscalização das relações de trabalho geram créditos de natureza não-tributária, nos moldes do que dispõe o § 2.º do art. 39 da Lei 4.320/1964, que assim está redigido:
“Art. 39. Os créditos da Fazenda Pública, de natureza tributária ou não tributária, serão escriturados como receita do exercício em que forem arrecadados, nas respectivas rubricas orçamentárias.
§ 1.º - [...].
§ 2.º - Dívida Ativa Tributária é o crédito da Fazenda Pública dessa natureza, proveniente de obrigação legal relativa a tributos e respectivos adicionais e multas, e Dívida Ativa não Tributária são os demais créditos da Fazenda Pública, tais como os provenientes de empréstimos compulsórios, contribuições estabelecidas em lei, multa de qualquer origem ou natureza, exceto as tributárias, foros, laudêmios, alugueis ou taxas de ocupação, custas processuais, preços de serviços prestados por estabelecimentos públicos, indenizações, reposições, restituições, alcances dos responsáveis definitivamente julgados, bem assim os créditos decorrentes de obrigações em moeda estrangeira, de subrogação de hipoteca, fiança, aval ou outra garantia, de contratos em geral ou de outras obrigações legais.
[....].” (grifamos).
O § 1.º do art. 2.º da Lei 6.830/80 corrobora o disposto no § 2.º do art. 39 da Lei 4.320/1964, e assim dispõe:
“Art. 2.º - Constitui Dívida Ativa da Fazenda Pública aquela definida como tributária ou não-tributária na Lei n.º 4.320, de 17 de março de 1964, com as alterações posteriores, que estatui normas gerais de direito financeiro para elaboração e controle dos orçamentos e balanços da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal.
§ 1.º - Qualquer valor, cuja cobrança seja atribuída por lei às entidades de que trata o artigo 1.º, será considerado Dívida Ativa da Fazenda Pública.
[...].” (grifamos).
A lei que legitima a fiscalização das relações de trabalho e a aplicação das respectivas penalidades, entre outras, é a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT – art. 626 e seguintes).
Mesmo sendo não-tributária, estas dívidas serão cobradas pelo rito da Lei de Execução Fiscal (LEF) – Lei 6.830/1980. De qualquer modo, tais dívidas devem ser regularmente inscritas na Dívida Ativa, com a emissão da respectiva certidão (Certidão de Dívida Ativa – CDA) a qual será o título executivo que dará suporte à execução, tudo conforme a LEF e as disposições da CLT (art. 636, § 3.º e 641).
- Auto de infração e constituição do crédito não-tributário.
No item anterior vimos a natureza não-tributária dos créditos em comento e o modo pelo qual os mesmos podem ser cobrados perante o Poder Judiciário. Vejamos, então, rapidamente, se tal crédito pode ser constituído através de um auto de infração.
Alertamos o leitor que não é intenção deste breve estudo abordar as formas de constituição dos créditos tributários e não-tributários. Faremos, apenas, a constatação na legislação e na jurisprudência à respeito da possibilidade e admissibilidade de sua constituição através do auto de infração, sem especular sobre seus requisitos, sua legalidade ou sua constitucionalidade.
Comecemos pela legislação. Conforme já mencionado, o art. 641 da CLT estabelece que o não pagamento das multas aplicadas pelos agentes da fiscalização das relações do trabalho serão inscritas, na forma da lei, em livro especial, e valerão como título de dívida líquida e certa, nestes termos:
“Art. 641. Não comparecendo o infrator, ou não depositando a importância da multa ou penalidade, far-se-á a competente inscrição em livro especial, existente nas repartições das quais se tiver originado a multa ou penalidade, ou de onde tenha provindo a reclamação que a determinou, sendo extraída cópia autêntica dessa inscrição e enviada às autoridades competentes para a respectiva cobrança judicial, valendo tal instrumento como título de dívida líquida e certa.” (grifamos).
Do mesmo modo, o § 7.º do art. 33 da Lei 8.212/1991, na redação dada pela Lei 11.941/2009, dispõe que o crédito da seguridade social é constituído por meio de auto de infração, dentre outras formas, in verbis:
“Art. 33. À Secretaria da Receita Federal do Brasil compete planejar, executar, acompanhar e avaliar as atividades relativas à tributação, à fiscalização, à arrecadação, à cobrança e ao recolhimento das contribuições sociais previstas no parágrafo único do art. 11 desta Lei, das contribuições incidentes a título de substituição e das devidas a outras entidades e fundos. (Caput com redação determinada na Lei n.º 11.941, de 27.5.2009, DOU 28.5.2009).
[...]
§ 7.º. O crédito da seguridade social é constituído por meio de notificação de lançamento, de auto de infração e de confissão de valores devidos e não recolhidos pelo contribuinte. (Parágrafo com redação determinada na Lei n.º 11.941, de 27.5.2009, DOU 28.5.2009).” (grifamos).
Portanto, há previsão legal quanto à possibilidade da constituição do crédito não-tributário através do auto de infração. Esta constatação é o suficiente para os fins deste estudo.
Na jurisprudência a questão não enseja controvérsias. Aliás, o extinto Tribunal Federal de Recursos (TFR) já havia sumulado a matéria, no verbete n.º 153 de sua súmula de jurisprudência. Confira:
“Súmula 153 TFR – Constituído, no qüinqüênio, através de auto de infração ou notificação de lançamento, o crédito tributário, não há falar em decadência, fluindo, a partir daí, em princípio, o prazo prescricional, que, todavia, fica em suspenso, até que sejam decididos os recursos administrativos.” DJ 17.04.1984.
Veja também:
“PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. MULTA DE NATUREZA ADMINISTRATIVA. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. APLICAÇÃO DO DECRETO N° 20.910/32. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. CONDENAÇÃO. DESCABIMENTO.
- Entendimento jurisprudencial assente de que a prescrição para a cobrança de multa administrativa é de cinco anos, prevista no art. 1.º do decreto 20.910/32, em observância aos Princípios da Simetria e da Isonomia, não cabendo invocação das disposições do Código Civil ou do CTN. Precedentes do Eg. STJ: AGA 951568/SP, Rel. Min. Luiz Fux, j. em 22.04.2008, DJU 02.06.2008, RESP 946232/RS, Rel. Min. Castro Meira, j. em 04.09.2007, DJU 18.09.2007; RESP 539187/SC, Rel. Ministra Denise Arruda, j. em 21.02.2006, DJU 03.04.2006.
- Constituído o crédito por auto de infração, no período de 29.07.1986 a 17.07.1990, resta evidenciado que, quando do ajuizamento da execução fiscal em 16.08.2006, já havia decorrido o prazo superior a cinco anos, a que alude o art. 1.º do decreto 20.910/32.
- [...]
(Tribunal Regional Federal - 5ª Região - Apelação Cível - Número do Processo: 2006.83.00.010701-5 – 2.ª Turma - Relator Desembargador Federal Rubens de Mendonça Canuto (Substituto) - Data Julgamento 20/10/2009 - Documento nº: 204954 - Diário da Justiça Eletrônico - Data: 28/10/2009 - Página: 304).” (grifamos).
No mesmo sentido: Tribunal Regional Federal – 4.ª Região, AC 2002.70.01.028698-5, 2.ª Turma, Relator Artur César de Souza, D.E. 18/11/2009.
Como visto, há a previsão legal e a respectiva aceitação jurisprudencial sobre a possibilidade da constituição do crédito não-tributário através do auto de infração. Vejamos, agora, a ação anulatória de débito e seus contornos gerais.
- Ação anulatória de débito.
Constatamos que a CF/88 atribui competência à Justiça do Trabalho para o conhecimento da ação anulatória de débito fiscal dos créditos advindos das multas aplicadas pela fiscalização das relações de trabalho. Vimos, também, a natureza não-tributária de tais créditos, e a possibilidade de sua constituição através do auto de infração, condutas estas admitidas pela lei e pela jurisprudência. Verificamos, também, que a cobrança de tais créditos será feita através da execução fiscal pelo rito previsto na Lei 6.830/1980. Vamos, agora, observar os contornos legais e jurisprudenciais da ação anulatória de débito das multas aplicadas pela fiscalização das relações de trabalho.
Partiremos do pressuposto da legalidade da constituição do crédito não-tributário através do auto de infração e da sua regular inscrição em dívida ativa. Neste caso, temos já identificados o sujeito ativo da obrigação (Estado), o sujeito passivo (o empregador), e o montante exigível (que é o valor da multa e eventuais acréscimos) e o fundamento legal (que são as infrações às relações de trabalho previstas na lei, e aplicadas segundo a ótica do agente de fiscalização). Portanto, há presunção de liquidez e certeza da dívida inscrita. Presunção esta relativa, a teor do que dispõe o art. 3.º e seu parágrafo único da Lei 6.830/1980.
Caminhemos, agora, para a análise da ação de anulação de débito propriamente dita. O art. 38 da Lei 6.830/1980 arrola os meios pelos quais o contribuinte, no caso o empregador, pode discutir a dívida ativa judicialmente. Os meios ali previstos são meramente exemplificativos face ao teor do art. 5.º inciso XXXV da CF/88 que garante à todos o acesso ao Poder Judiciário contra qualquer ameaça ou lesão à direito, sem qualquer tipo de restrição.
Normalmente, a ação em comento é utilizada para anular um lançamento tributário ou decisão proferida em processo administrativo onde se contesta o tributo, e, no caso em análise, a aplicação das multas previstas na legislação trabalhista.
Pode ser proposta após a lavratura do auto de infração, ou mesmo após o desfecho do processo administrativo que o questione. Portanto, é condição indispensável para o manejo de tal ação um lançamento fiscal que se pretende anular. Neste “lançamento fiscal” está compreendida a aplicação de multas provenientes da legislação trabalhista, entre outras. Também pode ser objeto da ação anulatória a decisão administrativa que denega o pedido de restituição do indébito feito pelo contribuinte, conforme apregoado pelo art. 169 do Código Tributário Nacional (CTN). Porém, este não é o foco do presente estudo.
De qualquer maneira, a ação anulatória de débito fiscal pressupõe um crédito definitivamente constituído. Sobre o assunto, realçando a diferença entre a ação anulatória e a ação declaratória tributária, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) já decidiu:
“A ação declaratória pressupõe crédito fiscal ainda não constituído definitivamente, uma vez que, se já o estiver, a hipótese será de ação anulatória. (TJSP – Ap. 77.853-2 – reexame – 14.ª C. – j. 25.9.84 – rel. Des. Dínio Garcia – RT 591/98).”
Controverte-se, também, sobre a necessidade ou não do depósito previsto no art. 38 da Lei n.º 6.830/1980 para o ajuizamento da ação anulatória, e que foi objeto da IN TST n.º 34 de 20/11/2009.
Tem prevalecido o entendimento contrário à essa exigência, que julgamos acertado. O depósito em foco não é condição da ação anulatória de débito. Tem, apenas, a função de obstar a propositura da respectiva execução fiscal, tornando inexigível o crédito através da via executiva, com o que está de acordo a jurisprudência. Confira:
“Na ação anulatória de débito fiscal, o depósito previsto no art. 38 da Lei n.º 6.830 não é pressuposto de admissibilidade de ação, mas simplesmente, de suspensão da exigibilidade do crédito, e por conseqüência, da ação de execução, nos termos do art. 151, do CTN. (TRF 3.ª R.; AC 135798; Proc. 93.03.088783-2; SP; Turma Suplementar da Segunda Seção; Rel. Juiz Fed. Conv. Souza Ribeiro; DJU 24/05/2007; Pág. 693).”
No mesmo sentido:
1) TJRS; AC 70022259519; Planalto; 22.ª Câmara Cível; Rel.ª Des.ª Rejane Maria Dias de Castro Bins; Julg. 29/11/2007; DOERS 06/12/2007; Pág. 88;
2) TRT 3ª R.; RO 01443-2005-031-03-00-2; Quarta Turma; Rel. Juiz Carlos Humberto Pinto Viana; Julg. 26/07/2006; DJMG 05/08/2006;
3) TRF 1ª R.; REO 1997.38.00.051236-4; MG; Oitava Turma; Rel.ª Des.ª Fed. Maria do Carmo Cardoso; Julg. 01/03/2005; DJU 29/04/2005; Pág. 69.
A Súmula 247 do extinto TFR já dispunha que:
“Súmula 247 – Não constitui pressuposto da ação anulatória do débito fiscal o depósito de que cuida o art. 38 da Lei n.º 6.830, de 1980.”
Aliás, o depósito do montante integral é um meio previsto em lei para se suspender a exigibilidade do crédito tributário (art. 151, II CTN), e não condição da ação anulatória de débito. Poder-se-ia questionar que o crédito é não-tributário, e, portanto, não teria aplicação o referido art. 151, II do CTN. Ainda que se admita tal raciocínio, eventual execução fiscal padeceria de nulidade, porque o valor postulado na execução deixou de ser exigível em face do depósito efetuado. Se julgada improcedente a ação anulatória o depósito será convertido em renda (art. 156, VI CTN e Lei 9.703/1998). Contudo, e reiterando, se efetuado o depósito, a execução será nula face à inexigibilidade do crédito, segundo dispõem os artigos 586 e 618, inciso I, ambos do Código de Processo Civil (CPC), na redação da Lei 11.382/2006:
“Art. 586. A execução para cobrança de crédito fundar-se-á sempre em título de obrigação certa, líquida e exigível.”
“Art. 618. É nula a execução:
I - se o título executivo extrajudicial não corresponder a obrigação certa, líquida e exigível (art. 586); [...].”
Há que se atentar, ainda, que “o depósito somente suspende a exigibilidade do crédito tributário se for integral e em dinheiro”, a teor do verbete da Súmula 112 STJ. Uma vez suspensa a exigibilidade do crédito tributário pelo depósito integral feito na ação anulatória, não poderá o fisco promover a ação de execução fiscal do débito correspondente.
Porém, se a ação anulatória não é acompanhada do depósito do montante integral em dinheiro, o fisco poderá ajuizar a ação de execução fiscal do débito objeto da ação anulatória sem que haja relação de prejudicialidade entre ambas as ações. Neste caso tem aplicação o § 1.º do art. 585 CPC, na redação da Lei n.º 8.953/1994, que estipula que:
“Art. 585. São títulos executivos extrajudiciais:
[...]
§ 1.º A propositura de qualquer ação relativa ao débito constante do título executivo não inibe o credor de promover-lhe a execução.”
Sendo assim, pode-se afirmar que o depósito integral não é condição para a propositura da ação anulatória de débito, mas, apenas, obsta a exigência do mesmo através de execução fiscal. O Judiciário trabalhista tem se manifestado nesse sentido. Vejamos algumas decisões que abordam a questão.
“AÇÃO ANULATÓRIA DE AUTO DE INFRAÇÃO E DE MULTA ADMINISTRATIVA. DESNECESSIDADE DE DEPÓSITO PRÉVIO. O Supremo Tribunal Federal, revendo posição anterior, entende que é inconstitucional o depósito prévio, a que alude o parágrafo 1.º do artigo 636 da CLT, como condição para interposição de recurso administrativo. No âmbito deste Regional, na esteira do entendimento do STF, tem prevalecido o entendimento de que o depósito preparatório, de que trata o artigo 38 da Lei nº 6.830/80, contraria o princípio instituído no artigo 5.º, XXXV, da CF/88, segundo o qual “a Lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”. (TRT 3ª R.; RO 508/2008-054-03-00.9; Segunda Turma; Rel. Des. Luiz Ronan Neves Koury; DJEMG 15/07/2009).”
“EXIGENCIA DE DEPÓSITO PRÉVIO DA MULTA COMO PRESSUPOSTO DO RECURSO ADMINISTRATIVO E DA AÇÃO ANULATORIA DE DÉBITO FISCAL. INCONSTITUCIONALIDADE. VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS PREVISTOS NO ART. 5.º, INCISOS XXXV, LIV e LV, DA CARTA FEDERAL DO ACESSO JUSTIÇA E O DEVIDO PROCESSO LEGAL, DO CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA. NÃO OBSERVÂNCIA DO POSTULADO DA RAZOABILIDADE ESPECIALMENTE EXIGIDO NAS RELAÇÕES ENTRE O ESTADO E O PARTICULAR. SUMULA 247 TRF. PRECEDENTES DO STF (RE 210.246-6/GO; 210.234-2/GO; 210.369-1/MG, 210.380-2/MG, 218.752-8/GO, 388.359/PE; RE-AgR370.927/RJ; ED/AREG./AI 351.042-RJ.)
1. A exigência de depósito prévio do valor da multa, como pressuposto de recurso administrativo ou ação judicial, constitui óbice ao exercício do direito de ação e de defesa. Logo, não se coaduna com os princípios do devido processo legal e acesso à Justiça, encravados na Carta Federal, artigo 5.º, incisos XXXV, LIV e LV.
2. O art. 636, parágrafo 1.º, da CLT, que exige o depósito prévio da multa, como condição de prosseguimento do recurso administrativo não foi recepcionado pela Carta Federal de 1988, por incompatibilidade vertical material.
3. O mesmo raciocínio se aplica quanto à exigência do depósito da multa como condição do manejo da ação anulatória de débitos fiscais.
4. Recurso provido para afastar a extinção da ação anulatória fundada na falta do depósito prévio. Devolução dos autos à origem para prosseguimento. Interpretação nesse sentido é encontrado em precedentes do Supremo Tribunal Federal.
(TRT2 - Recurso Ordinário - Acórdão n.º 20080448067 - Processo n.º 00799-2007-065-02-00-3 - Ano: 2008 – 6.ª Turma - data do julgamento: 20/05/2008 - Relator(a): Ivani Contini Bramante - Revisor(a): Ivete Ribeiro - data de publicação: 06/06/2008).”
“EXECUÇÃO FISCAL. EXIGÊNCIA LEGAL DE DEPÓSITO PRÉVIO DO VALOR DA MULTA COMO PRESSUPOSTO RECURSAL ADMINISTRATIVO. VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA AMPLA DEFESA E DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. INCONSTITUCIONALIDADE DO § 1.º DO ART. 636 DA CLT. É inconstitucional o § 1.º do art. 636 da CLT, que condiciona o seguimento do recurso administrativo ao prévio depósito do débito discutido, por afronta ao princípio constitucional da ampla defesa. A decisão da autoridade administrativa, que não admitiu recurso por falta de depósito prévio e determinou a inscrição do débito em dívida ativa é nula por desrespeitar o devido processo legal (CF, art. 5.º, LIV). Ausentes os pressupostos de constituição e desenvolvimento válido do processo, à falta de título executivo. Agravo provido. (TRT 24.ª R.; RXOF-AP 763/2005-4-24-0-8; Segunda Turma; Rel. Juiz João Marcelo Balsanelli; Julg. 23/01/2008; DOEMS 07/02/2008).”
Não se desconhece as posições em contrário no próprio Judiciário Trabalhista que exigem o depósito como condição da ação anulatória. Mas, pelo exposto, pensamos ser a posição aqui defendida a mais condizente com o ordenamento jurídico, e, principalmente, com a Constituição Federal.
- Das Instruções Normativas TST n.º 3/1993 e 27/2005.
Vimos acima que o depósito integral não é condição para a ação anulatória de débito fiscal perante a Justiça do Trabalho. Porém, o empregador encontrará outro óbice para a sua defesa neste setor do Poder Judiciário, inclusive na própria ação anulatória de débito, que são os depósitos recursais previstos nas Instruções Normativas TST 3/1993 e 27/2005, na Súmula 128 TST e no art. 899 da CLT. Estes dispositivos são incompatíveis com a Constituição Federa, e geram incompatibilidade de entendimentos sobre assuntos que, se não exatamente iguais, são muitíssimo semelhantes.
Pois, se a exigência de depósito prévio do valor da multa, como pressuposto de recurso administrativo ou ação judicial, constitui óbice ao exercício do direito de ação e de defesa. E, se tal depósito não se coaduna com os princípios do devido processo legal e acesso à Justiça, previstos na Constituição Federal (art. 5.º, incisos XXXV, LIV e LV). Como conciliar tal entendimento com a aplicação das normas veiculadas nas Instruções Normativas TST n.º 3/1993 e 27/2005, na Súmula 128 do TST e no art. 899 da CLT?
Vejamos, primeiro, o que dizem tais atos:
“Instrução Normativa n.º 3 de 1993:
I - Os depósitos de que trata o art. 40, e seus parágrafos, da Lei n.º 8177/91, com a redação dada pelo art. 8.º da Lei n.º 8542/92, não têm natureza jurídica de taxa de recurso, mas de garantia do juízo recursal, que pressupõe decisão condenatória ou executória de obrigação de pagamento em pecúnia, com valor líquido ou arbitrado.
[...]
IX - é exigido depósito recursal para o recurso adesivo, observados os mesmos critérios e procedimentos do recurso principal previsto nesta Instrução Normativa.”
“Instrução Normativa n.º 27 de 2005
Art.2.º A sistemática recursal a ser observada é a prevista na Consolidação das Leis do Trabalho, inclusive no tocante à nomenclatura, à alçada, aos prazos e às competências.
Parágrafo único. O depósito recursal a que se refere o art. 899 da CLT é sempre exigível como requisito extrínseco do recurso, quando houver condenação em pecúnia.”
Súmula 128 TST - DEPÓSITO RECURSAL (incorporadas as Orientações Jurisprudenciais n.ºs 139, 189 e 190 da SBDI-1) - Res. 129/2005, DJ 20, 22 e 25.04.2005.
I - É ônus da parte recorrente efetuar o depósito legal, integralmente, em relação a cada novo recurso interposto, sob pena de deserção. Atingido o valor da condenação, nenhum depósito mais é exigido para qualquer recurso. (ex-Súmula n.º 128 - alterada pela Res. 121/2003, DJ 21.11.03, que incorporou a OJ n.º 139 da SBDI-1 - inserida em 27.11.1998)
II - Garantido o juízo, na fase executória, a exigência de depósito para recorrer de qualquer decisão viola os incisos II e LV do art. 5.º da CF/1988. Havendo, porém, elevação do valor do débito, exige-se a complementação da garantia do juízo. (ex-OJ n.º 189 da SBDI-1 - inserida em 08.11.2000).
III - Havendo condenação solidária de duas ou mais empresas, o depósito recursal efetuado por uma delas aproveita as demais, quando a empresa que efetuou o depósito não pleiteia sua exclusão da lide. (ex-OJ n.º 190 da SBDI-1 - inserida em 08.11.2000).
O art. 899 da CLT será analisado mais adiante. Porém, como se vê, todos estes atos administrativos exigem o depósito como condição para o manejo do recurso. A IN TST 27/2005 chega a estabelecer que o depósito é requisito extrínseco do recurso. Portanto, ainda que o recurso seja o adequado e interposto tempestivamente, nada disso importa se não for acompanhado do depósito. Será julgado deserto.
O Judiciário Trabalhista tem referendado tais atos em várias oportunidades. Vejamos alguns julgados neste sentido.
“AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. AÇÃO ANULATÓRIA. MULTA ADMINISTRATIVA. DEPÓSITO RECURSAL. AUSÊNCIA. DESERÇÃO. Nas ações anulatórias de multa administrativa impostas pela Fiscalização do Trabalho, torna-se exigível o depósito recursal como pressuposto de admissibilidade do recurso interposto. Incidência do artigo 899, § 1.º, da CLT e artigo 2.º, parágrafo único, da IN n.º 27/2005 do TST. Constatando-se de plano que o Recurso de Revista se encontra deserto, ante a insuficiência de depósito recursal, deve ser negado provimento ao agravo de instrumento que visa o destrancamento daquele recurso. Agravo de instrumento conhecido e não provido. (TST - Processo: AIRR - 96033/2005-011-09-40.9 Data de Julgamento: 25/04/2007, Relator Juiz Convocado: Luiz Antonio Lazarim, 6ª Turma, Data de Publicação: DJ 18/05/2007).”
AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. PENALIDADE ADMINISTRATIVA. AÇÃO ANULATÓRIA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. NORMAS PROCEDIMENTAIS APLICÁVEIS AO PROCESSO DO TRABALHO. DESERÇÃO. APLICAÇÃO DA SÚMULA N.º 128 DO TST. A inovação introduzida pela EC n.º 45/2004 alterou a redação do art. 114 da Constituição Federal, outorgando competência material à Justiça do Trabalho para processar e julgar as ações relativas às penalidades administrativas impostas aos empregadores pelos órgãos de fiscalização das relações de trabalho. Em face da citada alteração, esta Corte editou a Instrução Normativa n.º 27/2005, em que dispôs sobre as normas procedimentais aplicáveis ao processo do trabalho, daí porque o recurso de revista não prosperou, pois lhe faltou o pressuposto do depósito para recorrer, atraindo a aplicação, ao presente caso, da Súmula n.º 128, inciso I, do TST, eis que não satisfeitas as exigências ali contidas, pois não atingido o valor da condenação, que socorreria a agravante, e tampouco o depósito legal exigido à época da interposição do apelo. Agravo a que se nega provimento.
(TST - Processo: AIRR - 958/2005-005-08-40.6 Data de Julgamento: 14/02/2007, Relator Juiz Convocado: José Ronald Cavalcante Soares, 6.ª Turma, Data de Publicação: DJ 23/03/2007).
Em vista disso, ficamos com dois pesos e duas medidas. Pois, como vimos, o depósito prévio do valor da multa, como pressuposto de recurso administrativo ou ação judicial, constitui óbice ao exercício do direito de ação e de defesa. E, por isso, não se coaduna com os princípios do devido processo legal e acesso à Justiça, previstos na Constituição Federal. Portanto, não é condição da ação anulatória de débito.
Acontece, entretanto, que, por ocasião do recurso este raciocínio não é aplicado. Isto gera uma contradição de entendimentos sobre assuntos muito semelhantes, além de ferir dispositivos constitucionais. Vejamos como.
A exigência de depósito para a admissibilidade de recurso ordinário viola o direito de petição e o direito à ampla defesa garantidos pelo art. 5.º, incisos XXXIV, “a” e LV ambos da Constituição Federal. Isto sem dizer do princípio da isonomia, previsto no caput do art. 5.º também da Constituição Federal, pois do empregado não se exige o depósito.
Tal postura caracteriza o impedimento do exercício do direito de petição aos Poderes Públicos, nos quais se inclui o Poder Judiciário. Questões meramente financeiras impedem que o interessado tenha seu recurso apreciado pela superior instância. E não há que se falar que o depósito recursal seria a garantia da execução, vez que esta é garantida somente pela penhora e nunca por depósito exigido quando a sentença a ser executada ainda é passível de modificação.
EDUARDO GABRIEL SAAD, bem explica a questão. Pedimos vênia para transcrever seus ensinamentos:
“O TST, pela Instrução Normativa n. 3/93, sustenta que tal depósito é para a ‘garantia da execução’. Não se deu conta do paradoxo desse entendimento. A execução é garantida pela penhora e nunca por um depósito exigido quando a sentença a ser executada ainda é passível de modificação, por mercê de recursos como o ordinário, de revista e embargos. E, antes do processo de execução, havendo o risco de a sentença, a final, não ser cumprida, restam as medidas cautelares. Como se vê, numa e outra hipótese não se justifica o depósito recursal. Em verdade, tal exigência desestimula a interposição de recursos, os quais se vinculam ao duplo grau de jurisdição.” (SAAD, Gabriel Eduardo. Consolidação das Leis do Trabalho Comentada – 42.ª edição atual. e rev. e ampl. por José Eduardo Duarte Saad, Ana Maria Saad Castello Branco – São Paulo: LTr, 2009 - pág. 1333).
Isto sem dizer que uma instrução normativa, ato administrativo, portanto, não pode modificar ou contrariar a Constituição Federal (art. 5.º, XXXIV, “a” e LV). Não esquecendo que somente a lei (e não instruções normativas, decretos, etc.) é que pode criar obrigações, conforme expressa dicção do inciso II do art. 5.º da mesma Constituição Federal.
O art. 99 do Código Tributário Nacional, embora inserido em código específico, é verdadeira norma geral de direito, e confirma o quanto alegado acima, confira:
“Art. 99. O conteúdo e o alcance dos decretos restringem-se aos das leis em função das quais sejam expedidos, determinados com observância das regras de interpretação estabelecidas nesta Lei.” (destacamos e grifamos).
Os decretos, assim como as instruções normativas, são atos administrativos, e, assim, somente obrigam se tiverem base legal, o que não acontece com a Instrução Normativa 3/93 TST que diz que o depósito recursal é garantia da execução. Além disso, de maneira alguma tais atos administrativos podem violar a Constituição Federal, especialmente os incisos XXXIV, “a” e LV do art. 5.º.
Sem falar que a competência para legislar sobre direito processual é atribuída à União (e, data vênia, não aos Tribunais), conforme art. 22, inciso I da Constituição Federal. Por conseguinte, não podem os Tribunais, neste particular, adentrar a seara legal reservada à União sob pena de inconstitucionalidade, como é o caso da Instrução Normativa 3/93 (item I e IX) e também da Instrução Normativa 27/2005 (art. 2.º, parágrafo único) ambas do Tribunal Superior do Trabalho.
E mesmo as leis aprovadas pelo Congresso Nacional devem amoldar-se à Constituição Federal sob pena de inconstitucionalidade. Desse modo, também é inconstitucional o art. 899 da CLT que exige o prévio depósito como condição para o processamento do recurso, nestes termos:
“Art. 899. Os recursos serão interpostos por simples petição e terão efeito meramente devolutivo, salvo as exceções previstas neste Título, permitida a execução provisória até a penhora. (Caput com redação determinada na Lei n.º 5.442, de 24.5.1968, DOU 28.5.1968).
§ 1.º Sendo a condenação de valor até 10 (dez) vezes o salário-mínimo regional, nos dissídios individuais, só será admitido o recurso, inclusive o extraordinário, mediante prévio depósito da respectiva importância. Transitada em julgado a decisão recorrida, ordenar-se-á o levantamento imediato da importância do depósito, em favor da parte vencedora, por simples despacho do juiz. (Parágrafo com redação determinada na Lei n.º 5.442, de 24.5.1968, DOU 28.5.1968).
§ 2.º Tratando-se de condenação de valor indeterminado, o depósito corresponderá ao que for arbitrado, para efeito de custas, pela Junta ou Juízo de Direito, até o limite de 10 (dez) vezes o salário-mínimo da região. (Parágrafo com redação determinada na Lei n.º 5.442, de 24.5.1968, DOU 28.5.1968).
§ 3.º (Revogado conforme determinado na Lei n.º 7.033, de 5.10.1982, DOU 6.10.1982).
§ 4.º O depósito de que trata o § 1.º far-se-á na conta vinculada do empregado a que se refere o art. 2.º da Lei nº 5.107, de 13 de setembro de 1966, aplicando-se-lhe os preceitos dessa lei observado, quanto ao respectivo levantamento, o disposto no § 1.º (Parágrafo com redação determinada na Lei n.º 5.442, de 24.5.1968, DOU 28.5.1968).
§ 5.º Se o empregado ainda não tiver conta vinculada aberta em seu nome, nos termos do art. 2.º da Lei nº 5.107, de 13 de setembro de 1966, a empresa procederá à respectiva abertura, para efeito do disposto no § 2.º (Parágrafo com redação determinada na Lei n.º 5.442, de 24.5.1968, DOU 28.5.1968).
§ 6.º Quando o valor da condenação, ou o arbitrado para fins de custas, exceder o limite de 10 (dez) vezes o salário-mínimo da região, o depósito para fins de recursos será limitado a este valor. (Parágrafo acrescentado conforme determinado na Lei n.º 5.442, de 24.5.1968, DOU 28.5.1968).
Tal exigência, embora veiculada por lei, igualmente viola os princípios constitucionais acima indicados.
As disposições da CLT que regulam o depósito recursal são todas anteriores à Constituição Federal e não foram por ela recepcionadas. Estão, portanto, revogadas. As leis é que devem ser interpretadas conforme a Constituição e não o contrário. Repita-se, as alterações do art. 899 da CLT foram feitas pela Lei 5.442 de 24.05.1968, portanto, muito antes da Constituição Federal de 05.10.1988.
Sendo assim, se o art. 899 e parágrafos da CLT, com as alterações da Lei 5.442 de 24.05.1968, contraria a Constituição Federal de 1988, está revogado, pois não há inconstitucionalidade de lei em face de Constituição posterior. Há, por conseguinte, revogação e não inconstitucionalidade. (Confira: STF - ADI-5/SP, DJ em 24/4/1992 – Rel. Min. Néri da Silveira; e ADI-381/DF, DJ em 18/9/1992 – rel. Min. Moreira Alves).
O Supremo Tribunal Federal já deu mostras deste entendimento no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade n.º 1976, quando decidiu que a exigência de depósito ou arrolamento prévio de bens e direitos é inconstitucional por caracterizar obstáculo ao direito de petição e ao princípio do contraditório, além de violar o princípio da proporcionalidade, confira:
“[...] A exigência de depósito ou arrolamento prévio de bens e direitos como condição de admissibilidade de recurso administrativo constitui obstáculo sério (e intransponível, para consideráveis parcelas da população) ao exercício do direito de petição (CF, art. 5.º, XXXIV), além de caracterizar ofensa ao princípio do contraditório (CF, art. 5.º, LV). A exigência de depósito ou arrolamento prévio de bens e direitos pode converter-se, na prática, em determinadas situações, em supressão do direito de recorrer, constituindo-se, assim, em nítida violação ao princípio da proporcionalidade. Ação direta julgada procedente para declarar a inconstitucionalidade do art. 32 da MP 1699-41 - posteriormente convertida na lei 10.522/2002 -, que deu nova redação ao art. 33, § 2.º, do Decreto 70.235/72.” (STF - ADI 1976/DF - DISTRITO FEDERAL - AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - Relator(a): Min. JOAQUIM BARBOSA - Julgamento: 28/03/2007 - Órgão Julgador: Tribunal Pleno – Publicação: DJe-018 - DIVULG. 17.05.2007 - PUBLIC 18.05.2007). (destacamos e grifamos).
Tal decisão (STF - ADI 1976/DF – Dje-018 – divulg. 17.05.2007 – public. 18.05.2007) possui eficácia contra todos e efeito vinculante, relativamente aos demais órgãos do Poder Judiciário, nos moldes previstos no § 2.º do art. 102 da Constituição Federal, na redação dada pela Emenda Constitucional n.º 45, de 08.12.2004. Portanto, exigir-se o depósito recursal será violar a autoridade do julgado proferido em Ação Direta de Inconstitucionalidade.
O referido precedente do Supremo Tribunal Federal é perfeitamente aplicável ao âmbito judicial, tendo em vista que a razão de decidir é exatamente a mesma. Ou seja, está em jogo o mesmo direito de petição, o mesmo princípio da ampla defesa, o princípio da proporcionalidade, e, por fim, o princípio da isonomia.
Ora, se o empregado não se submete à exigência do depósito recursal, por qual razão se exige o referido depósito do empregador para o exercício do mesmo direito, qual seja, o direito de recorrer à superior instância? Não há razão alguma plausível que justifique esta discriminação.
Repita-se, para a garantia de eventual execução existe a penhora e/ou as medidas cautelares, conforme melhor doutrina acima colacionada, sendo inconstitucional a exigência de depósito prévio para a admissão do recurso. Não se pode exigir o prévio depósito para a garantia de uma execução que sequer existe.
Sendo assim, a exigência de depósito prévio como requisito para a admissibilidade do recurso no processo de conhecimento:
1) Conflita com a Constituição Federal, especialmente os incisos XXXIV, “a” e LV do art. 5.º, por violar o direito de petição, ampla defesa, a isonomia e o princípio da proporcionalidade, conforme explicitado acima.
2) Não se coaduna com o que foi decidido pelo Supremo Tribunal Federal na ADI 1976/DF – Dje-018 – divulg. 17.05.2007 – public. 18.05.2007, que tem efeito vinculante conforme § 2.º do art. 102 da Constituição Federal, na redação da EC 45/2004, onde ficou reconhecida a inconstitucionalidade da exigência de depósito prévio como requisito para a admissibilidade do recurso.
3) É inconstitucional por basear-se em Instruções normativas (IN 3/93, item I e IX e IN 27/2005, art. 2.º parágrafo único, ambas do TST) que inovaram em matéria processual, violando a competência legislativa da União prevista no inciso I do art. 22 da Constituição Federal.
4) As alterações do art. 899 da CLT foram feitas pela Lei 5.442 de 24.05.1968, portanto, muito antes da Constituição Federal de 05.10.1988, e estão revogadas, pois não foram recepcionadas pela nova ordem constitucional.
5) É ilegal (o prévio depósito), pois, para a garantia de eventual execução existe a penhora e/ou as medidas cautelares.
- Conclusão.
De todo o exposto, e à guisa de conclusão, podemos sintetizar as seguintes premissas.
O depósito prévio à propositura da ação anulatória de débito fiscal resultante de penalidades administrativas impostas por autoridades do Ministério do Trabalho e Emprego não é condição desta ação. Apenas obsta o manejo da execução fiscal dos créditos decorrentes de tais penalidades. Porém, se o depósito for realizado na ação anulatória e a execução fiscal for proposta, esta será nula, pois o depósito torna o respectivo crédito inexigível através da execução fiscal.
Por fim, a exigência de depósito prévio do valor da multa, como pressuposto de recurso administrativo ou ação judicial, constitui óbice ao exercício do direito de ação e de defesa, e, não se coaduna com os princípios do devido processo legal e acesso à Justiça, previstos na Constituição Federal (art. 5.º, incisos XXXV, LIV e LV). Do mesmo modo, a exigência de depósito recursal carece de fundamento constitucional. Por consequência, são inconstitucionais as Instruções Normativas TST 3/1993 (item I e IX) e 27/2005 (art. 2.º, parágrafo único).