A IMPORTÂNCIA DO HABEAS CORPUS E DO HABEAS DATAS EM UM ESTADO CONSTITUCIONAL DE DIREITO

Por Lucas Brito Ferreira Sousa | 21/06/2018 | Direito

A IMPORTÂNCIA DO HABEAS CORPUS E DO HABEAS DATAS EM UM ESTADO CONSTITUCIONAL DE DIREITO¹

 

Integrantes²

Luiza de Fátima Amorim Oliveira³

 

1 CONSTRUNÇÃO DO PROBLEMA

 

Perante esse contexto, cabe a seguinte pergunta: de que forma o habeas corpus e o habeas datas contribuem como um instrumento constitucional?

 

2 OBJETIVOS

2.1 Geral

 

Traçar a importância do habeas corpus e habeas datas como instrumentos para a garantia de direitos e a proteção de indivíduos que estão diante de uma ilegalidade ou abuso cometido por Poder Público. 

 

 

2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.1 Surgimento dos Direitos Coletivos

 

Não há como abordar os direitos coletivos sem retomar a compreensão dos direitos e garantias fundamentais expressos pelo título II da Constituição Federal Brasileira. Haja vista que a maioria dos doutrinadores evidenciam, assim como Ingo Sarlet (2008) que esses direitos passaram por uma evolução histórica sendo a primeira dimensão marcada pelo princípio da liberdade e uma não intervenção estatal ao ponto que ultrapassassem as barreiras do absolutismo na limitação dos seus poderes. A segunda dimensão compreende o surgimento dos direitos atrelados ao princípio da isonomia, chamados de direitos sociais que se manifestaram no período de transição do estado liberal para o estado social.

O impacto da industrialização e os graves problemas sociais e econômicos que a acompanharam, as doutrinas socialistas e a constatação de que a consagração formal de liberdade e igualdade não gerava a garantia do seu efetivo gozo acabaram, já no decorrer do século XIX, gerando amplos movimentos reivindicatórios e o reconhecimento progressivo de direitos, atribuindo ao Estado comportamento ativo na realização da justiça social. (SARLET,2008,p.47).

Nota-se que a ideia de direitos coletivos surge com os movimentos reivindicatórios que impulsionaram a segunda dimensão dos direitos fundamentais impondo deveres a serem realizados pelo Estado, no propósito de viabilizar aos cidadãos uma vida mais digna que facilitasse a sobrevivência e a diminuição da desigualdade. Porém, a concepção de direitos coletivos se estabiliza com o advento da terceira dimensão marcada pelo princípio da fraternidade, ao proteger interesses coletivos e não mais destinado à proteção de indivíduos ou de um pequeno e determinado grupo.

Os direitos da terceira geração tendem a cristalizar-se no fim do século XX enquanto direitos que não se destinam especificamente à proteção dos interesses de um indivíduo, de um grupo ou de um determinado Estado. Tem primeiro por destinatário o gênero humano mesmo, num momento expressivo de sua afirmação como valor supremo em termos de existencialidade concreta. (BONAVIDES, 2006).

Atual no ordenamento jurídico brasileiro uma classificação legal para os direitos coletivos é positivada no artigo 81 do Código de Defesa do Consumidor (1990) ao citar que a defesa coletiva será executada quando se tratar de direitos difusos e direitos coletivos. O direito difuso é caracterizado pela indeterminação de sujeitos titulares unidos por um vínculo meramente de fato, como o caso das comunidades indígenas. Enquanto no direito coletivo se observa a nítida determinação dos sujeitos titulares formada por um grupo de pessoas unidas por uma relação jurídica como os moradores de um mesmo condomínio.

2.1.2 Êxodo Rural, Crise Habitacional e as Favelas

 

O êxodo rural descreve uma modalidade de migração em que uma população de zona rural se desloca em direção às cidades. Esse tipo de migração é consequência da globalização, do aumento de grandes indústrias e a mecanização das atividades agrícolas que substituiu o trabalho humano por maquinas ao ponto que inúmeras pessoas se deslocaram para a zona urbana a fim de conseguir empregos e meios de manter uma boa qualidade de vida.  “O êxodo rural no Brasil ocorreu, de forma mais intensa, em apenas duas décadas: entre 1960 e 1980, mantendo patamares relativamente elevados nas décadas seguintes e perdendo força total na entrada dos anos 2000”. (PENA, 2012).

O mercado de trabalho das áreas urbanas não conseguiu absorver o crescimento acelerado da população ocasionando um aumento nas taxas de desemprego. Em tese o que seria um avanço na vida de cada família que realizou esse deslocamento, acabou tornando-se um pesadelo, pois a baixa renda e a falta de oportunidades de emprego geraram uma grande crise no sistema habitacional. Sem dinheiro e sem espaços dignos para a moradia, inúmeras pessoas encontraram em áreas periféricas e de risco a única oportunidade para se estabelecerem em um local ao passo que se utilizava de formas de apropriação irregular do solo.

O êxodo rural foi grande responsável pelo crescimento da população urbana e o despreparo dos órgãos públicos resultou em uma crise habitacional. Sem políticas públicas com finalidade de prevenir ou resolver o problema do direito à moradia surgiu as grandes favelas. Com o passar do tempo e a estabilização dessas áreas periféricas, o Estado com a finalidade de resolver tais problemas instituiu Lei n° 10.257, de 10 de julho de 2001, conhecida como Estatuto da Cidade com o intuito de utiliza-la como instrumento público ao observar a função social das propriedades.

 

2.2 Posse, Propriedade e a Usucapião Especial Urbana Coletiva

 

2.2.1 Posse

 

De acordo com artigo 1.196 do Código Civil, “considera-se possuidor todo aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade” (BRASIL, 2002). Perante esse artigo, observa-se que o direito brasileiro em relação à posse está de acordo com a Teoria de Ihering, pois para o mesmo de acordo com Assis, Jesus e Melo (2014) a posse existe quando é exercida de forma a parentar o domínio sobre a coisa, ou seja, para Ihering, a posse é a exteriorização do domínio, porque para que haja posse não é necessário que o possuidor tenha ânimo de dono sobre a coisa, mas apenas que detenha o corpus de forma a exercer poderes próprios de proprietário.

 

2.2.2 Propriedade

 

O conceito de propriedade encontra-se no artigo 1.228 do Código Civil, sendo como “o direito de usar, gozar e dispor de uma coisa, bem como reavê-la de quem quer que injustamente a possua ou detenha” (BRASIL, 2002). Nota-se que o referido artigo fala sobre três elementos essências da propriedade: usar, gozar e dispor da coisa.

Jus Utendi é o direito de usar a coisa envolvendo a posse seja ela direta ou indireta, podendo usar a própria coisa e seus acessórios como partes integrantes. “Funda-se na prerrogativa que o titular tem de servir-se da coisa, como dirigir um automóvel ou ocupar um imóvel.” (LEITE, 2008).

Jus Fruendi é direito de gozo envolvendo a percepção dos frutos e as demais vantagens que advém da coisa e está regulado pelo artigo 1.232 do Código Civil: “frutos e mais produtos da coisa pertencem, ainda quando separados, ao seu proprietário, salvo se, por preceito jurídico especial, couberem a outrem.” (BRASIL, 2002).

Jus Abutendi é o direito de dispor da coisa, seja alienando, transferindo o direito a outra pessoa, destruindo a própria coisa se assim o proprietário quiser ou até mesmo dividir o bem.

 

2.2.3 Usucapião Especial Urbana Coletiva

 

A usucapião é uma forma originaria de aquisição de propriedade, considera-se originária quando a aquisição é obtida sem o intermédio de uma relação negocial e nem sucessória. A usucapião é caracterizada pelo exercício da posse de forma continua e sem oposição por um período suficiente determinado por lei para que haja a aquisição desse determinado imóvel.

A usucapião possui inúmeras espécies como a extraordinária, a ordinária, a especial familiar, a especial rural e dentre essas espécies será abordada a usucapião especial urbana coletiva.  O Estatuto da Cidade no seu artigo 10 previu a usucapião coletiva:

Art. 10. As áreas urbanas com mais de duzentos e cinqüenta metros quadrados, ocupadas por população de baixa renda para sua moradia, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, onde não for possível identificar os terrenos ocupados por cada possuidor, são susceptíveis de serem usucapidas coletivamente, desde que os possuidores não sejam proprietários de outro imóvel urbano ou rural. [...] § 2o A usucapião especial coletiva de imóvel urbano será declarada pelo juiz, mediante sentença, a qual servirá de título para registro no cartório de registro de imóveis.  (BRASIL, 2001).

São requisitos necessários para a usucapião coletiva, o fato do imóvel ter mais de duzentos e cinquenta metros quadrados, a ocupação deve ser feita por população de baixa renda sendo que a finalidade deve ser para moradia por um lapso temporal de posse de cinco anos ininterruptos, a impossibilidade de identificação dos terrenos ocupados por cada possuidor e por fim os possuidores não podem ser proprietários de outros imóveis.

 

2.3 Usucapião coletiva como instrumento para efetivar o direito à moradia.

 

Os direitos sociais têm como papel crucial evidenciar que o Estado tem o dever de proporcionar o exercício de determinados direitos que são fundamentais para que cada cidadão possua uma vida digna e igualitária, sem detrimento de determinadas minorias. O direito à moradia e a propriedade é de suma importância para estabelecer um mínimo existencial e uma vida digna que valha ser vivida. Autoridades públicas omitem-se nas mais básicas e necessárias prestações de serviço à coletividade alegando falta de recurso. Daí a necessidade de intervenções para suprir tais omissões. A Constituição Federal de 1988 no seu artigo 5° repaginou o conceito de direito à propriedade inserindo o princípio da função social: “XXIII - a propriedade atenderá a sua função social”.

“A finalidade da usucapião coletiva, sem dúvida alguma, é tornar possível não apenas a regularização fundiária das favelas urbanas brasileiras, mas também a sua urbanização”. (OLIMPIO, 2012, p.2)

De acordo com o princípio da função social, o homem deve utilizar a propriedade de forma que supra os interesses da coletividade. Uma propriedade sem produção e desemparada que não atenda os interesses sociais é passível de usucapião especial urbana coletiva. Desta forma, essa espécie de usucapião para a aquisição de propriedade é um mecanismo encontrado por populações e grupos que não tiveram o seu direito à moradia assegurado por um Estado nitidamente falho em efetivar os direitos sociais.

 

3. DISCUSSÃO DO TEMA

 

O surgimento dos sujeitos coletivos de direito foi um grande salto para a consolidação de um Estado Democrático de Direito que possui como seus fundamentos a dignidade da pessoa humana e o pluralismo político. Reforça-se esta importância quando se constata que um grupo de pessoas, antes desconsiderados como sujeito de direito, contribuiu para a uma revolução legislativa ao impulsionar o surgimento do instituto jurídico da usucapião coletiva urbana.

Tal instituto, além de regularizar a situação fundiária das favelas, acentua a função social da propriedade, enseja uma urbanização daquele local e chama a atenção dos órgãos governamentais e da sociedade civil para uma questão não só jurídica, mas ambiental, social, econômica e política.

 

4. CONCLUSÃO

 

Perante a crise habitacional que décadas anteriores alcançou elevados números devido o êxodo rural, tornou-se comum à apropriação de propriedades em áreas periféricas, vulgarmente conhecidas como favelas. O desenvolvimento apresentado explicitou a importância da criação da Lei n° 10.257/2001, denominada Estatuto da Cidade e o principio constitucional da função social que possibilitaram a usucapião daquelas propriedades que não atendesse os interesses sociais. Diante da explanação do surgimento dos direitos coletivos, assim como a situação comum vivenciada no Brasil em relação às grandes quantidades de terras em poucas mãos, além do estudo levantado a partir do instituto de posse, propriedade e usucapião especial urbana coletiva e de acordo com Rangel (2012) a usucapião detém a aplaudida capacidade de favorecer os interesses individuais considerados como homogêneos da coletividade, uma vez que atende os anseios do direito à propriedade.

Analisados tais aspectos, notório é a relevância da aplicação dos direitos reais para a solução dos problemas apresentados no âmbito das coisas, mais especificamente no campo das propriedades.

 

REFERÊNCIAS

 

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ASSIS, Sebastião  Neto de; JESUS, Marcelo de; MELO, Maria Izabel de. Manual de Direito Civil. Volume único. 2 ed.  Salvador: Editora JusPodivm, 2014.

 

BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 19ª Edição, São Paulo : Editora Malheiros, 2006.

 

BRASIL. Código civil, 2002. Código civil. 53.ed. São Paulo: Saraiva; 2002

 

BRASIL. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. Lei 8.078 de 11/09/90. Brasília, Diário Oficial da União, 1990.

 

 

BRASIL. Constituição, 1988. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal; 1988

 

BRASIL. Estatuto da Cidade: Lei 10.257/2001 que estabelece diretrizes gerais da política urbana. Brasília, Câmara dos Deputados, 2001, 1 Edição.

 

CARVALHO, Celso Santos; ROSSBACH, Anaclaudia. O Estatuto da Cidade Comentado: The City Statute of Brazil: a commentary. São Paulo: Ministério das Cidades: Aliança das Cidades, 2010.

 

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: direito das coisas. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2015.

 

LEITE, Gisele. Propriedade em geral em poucas palavras. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, XI, n. 50, fev 2008. Disponível em: . Acesso em set 2015.

 

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RODRIGUES, Arlete Moysés. Na Procura do Lugar o Encontro da Identidade: um estudo de processo de ocupação de terras. Osasco: FFCLH, 2009, 314.

 

RODRIGUES, William Costa. Metodologia Científica. Disponível em: Acesso em: 2015.

 

SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. 9 .ed., rev., ampl. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008.

 

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