A IMPORTÂNCIA DA RETÓRICA E DOS CONCEITOS-CHAVE ARISTOTÉLICOS PARA OS ESTUDOS LITERÁRIOS

Por Manoel Huires Alves | 11/07/2011 | Literatura

A IMPORTÂNCIA DA RETÓRICA E DOS CONCEITOS-CHAVE ARISTOTÉLICOS - VEROSSIMILHANÇA, CATARSE E MODALIDADES OU GÊNEROS LITERÁRIOS - PARA OS ESTUDOS LITERÁRIOS


Manoel Huires Alves


Pois bem, certamente, não pode haver uma definição de retórica sem uma referência à cultura grega, não só porque retórica é etimologicamente um termo grego (rhetoriké), mas, sobretudo, porque a retórica constitui um dos traços fundamentais e distintivos do gênio grego. Sendo, pois, afim, o termo grego rhetoriké, aos termos rhetor (orador) e rhetoreia (discurso público, eloquência) retórica, portanto, significa tanto a arte oratória como a disciplina que versa essa arte, ou seja, o sentido genuíno do termo "retórica" só se alcança quando se percebe como a civilização grega se distinguiu de todas as outras por assentar na palavra pública.

Poderia, enfim, definir a retórica como a arte da persuasão por meio de uma argumentação, ou seja, a arte de argumentar, mas prefiro o conceito aristotélico que define a retórica como "a faculdade de ver teoricamente o que, em cada caso, pode ser capaz de gerar persuasão".

A retórica, desde que não a confunda com outras formas de linguagem - nomeadamente a conversa - ela se faz um poderoso instrumento de ação pública que, por sua aplicação nas mais diversas circunstâncias, a torna assim imprescindível na formação da estética literária e nos estudos literários.
Diante da necessidade de uma elocução ornada e projetada para o bom efeito dos escritos literários a retórica, por não se preocupar com a veracidade das informações expostas nem com o conteúdo presente, se torna essencialmente importante, pelo seu valor estético, na composição do discurso literário e, por fim, de um modo geral, nos estudos de caráter literários.

Decididamente, uma vez que a própria retórica é usada para persuadir (convencer) qualquer tipo de público, neste caso, ela se torna uma importante aliada na criação e nos estudos gerais da linguagem literária, uma vez que a literatura trata e faz uso da linguagem cotidiana direcionada a todo tipo de público, onde o escritor envolve as emoções e os sentimentos do público.


Conceitos-Chave Aristotélicos: Mimese, Verossimilhança, Catarse e Modalidades ou Gêneros Literários


Um dos textos - legados pela antiguidade - mais influentes e controvertidos é "A Poética" de Aristóteles. Nele, o filósofo expôs, analisou e sistematizou, pela primeira vez, de forma ordenada e coerente, as idéias sobre a composição poética, onde, por seu caráter expositivo, semelhante ao de uma preleção oral, fundou, praticamente, a disciplina conhecida atualmente por "teoria literária". Na obra, o filósofo grego, faz um apanhado geral a respeito de alguns conceitos-chave, que são: mimese, verossimilhança, catarse e modalidades ou gêneros literários.


Mimese


O termo mimese ? do grego mímesis, "imitação" ? que designa a ação ou faculdade de imitar, copiar, reproduzir e representar a natureza (que na filosofia aristotélica constitui o fundamento de toda a arte), surgiu pela primeira vez com Platão, no início da civilização grega. Nessa época, a palavra não possuía uma significação única, e foi Platão que lhe concedeu relevância fundamental.


Verossimilhança


Verossimilhança, termo cunhado por Aristóteles ao estudar as tragédias gregas, diz respeito ao sentido de realidade que a narrativa deve ter, ou seja, a qualidade ou o caráter do que é semelhante à verdade, que tem a aparência de verdadeiro, que não repugna à verdade provável. Sendo assim, o conceito de verossimilhança, tornou-se fundamental para o estudo da literatura e das artes em geral desde a "A Poética" de Aristóteles, onde este entendia que "pelas precedentes considerações se manifesta que não é ofício do poeta narrar o que aconteceu; é, sim, o de representar o que poderia acontecer, quer dizer: o que é possível segundo a verossimilhança e a necessidade" (Aristóteles, Poética, Abril Cultural, 1984).


Catarse


Catarse (do grego kátharsis, "purificação" ou "purgação" ou "evacuação") é uma palavra utilizada em diversos contextos, como a tragédia, a medicina ou a psicanálise. Mas, para o nosso estudo e segundo Aristóteles, o termo refere-se à purificação das almas por meio de uma descarga emocional provocada por um drama, onde, a tragédia ou a representação trágica, é um estilo derivado da poética dramática, consistindo na reprodução de ações nobres, por intermédio de atores, os quais imitam no palco as desventuras dos heróis trágicos que, por escolhas mal realizadas, passam da felicidade para a infelicidade, provocando na platéia sentimentos de terror e piedade, purgando assim as emoções humanas, ou seja, é como define ainda Aristóteles em sua poética: "A missão da tragédia consiste em produzir, através do exercício do medo e da piedade, a liberdade de tais emoções".


Modalidades ou Gêneros Literários


Os estudos das Modalidades ou Gêneros Literários aparecem pela primeira vez na obra "A República", de Platão como um tipo de classificação da obra literária tendo em vista principalmente o seu conteúdo ou sua temática. Aristóteles, o discípulo mais famoso de Platão, retoma o estudo dos gêneros e suas modalidades em sua obra-prima "A Poética", onde já apresenta os três tipos de Gênero a que um poema (texto em versos*) pode pertencer: o Lírico, o Épico e o Dramático.

1. Gênero Lírico: Pertence ao Gênero Lírico o poema que consiste numa forma de expressão dos sentimentos, das emoções, dos desejos, dos conhecimentos, enfim, da visão de mundo de alguém, isto é, são textos de caráter emocional, centrada na subjetividade dos sentimentos da alma, que, segundo Aristóteles, a palavra cantada.

2. Gênero Épico ou Narrativo: Pertence ao gênero épico, o poema que conta uma história, um episódio, isto é, são narrações de fatos grandiosos, centrados na figura de um herói, que, segundo Aristóteles, a palavra narrada.

3. Gênero Dramático: Pertence ao gênero dramático toda e qualquer peça teatral em versos. O texto dramático é o único elaborado com o fito de ser representado num palco e, por isso, é o único que contém instruções para o momento da representação, isto é, são textos destinados para a representação cênica, na forma de tragédia ou na forma de comedia, que, segundo Aristóteles, a palavra representada.

Finalmente, é importante reafirmar a importância da obra de Aristóteles (384-322 a.C.) e sua imensa influência sobre a cultura ocidental nesses mais de dois mil e quatrocentos anos. Principalmente duas delas, "A Retórica" e a "A Poética", pois enquanto a "Retórica" cuida da oratória e do raciocínio, a "Poética" cuida da literatura, com conceitos-chave definidos por mimese, verossimilhança, catarse e gêneros literários.



*Aqui devo lembrar que, para os antigos, a poesia era um texto em versos, com rima, métrica e ritmo definidos. Em suma: o poema obedecia às normas da versificação.