A IMPLEMENTAÇÃO DAS DECISÕES DA CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS NO BRASIL

Por Andressa Belmiro Soares | 17/01/2024 | Direito

A IMPLEMENTAÇÃO DAS DECISÕES DA CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS NO BRASIL

 

Andressa Belmiro Soares

 

Resumo: O artigo científico tem como objetivo analisar o caso dos trabalhadores da Fazenda Brasil Verde julgado no ano de 2016 pela Corte Interamericana de Direitos Humanos no Brasil, através da análise do caso e sua devida sentença. 

Palavras-chave: Direitos Humanos. Corte Interamericana. Direito Internacional. Direito do Trabalho.

 

Abstract: The scientific article aims to analyze the case of the workers of Fazenda Brasil Verde judged in 2016 by the Inter-American Court of Human Rights in Brazil, through the analysis of the case and its due sentence.

Keywords: Human rights. Interamerican Court. International right. Labor Law.

 

Sumário: 1. Introdução; 2. Metodologia; 2.1. O Caso dos Trabalhadores da Fazenda Brasil Verde vs Brasil; 2.2. A decisão da Corte; 4. Conclusão 5. Referências


 

  1. Introdução

A Constituição Federal de 1988 passou a valorizar o trabalho, prevendo princípios como da dignidade da pessoa humana e da valorização do trabalho.  Então, a partir da sua promulgação o trabalho passou a ser valorizado e visto que como um dos princípios centrais da democracia, visto que o trabalho regularizado é a forma que a maior parte da população brasileira se insere na sociedade.

Com a entrada do Brasil como Estado Parte da Convenção Americana sobre Direitos Humanos em 1992 e desde 1998 submete-se à jurisdição desta Corte. Até o momento, o Brasil já foi condenado em 12 casos pela Corte Interamericana de Direitos Humanos: Caso Ximenes Lopes (2006), Caso Nogueira de Carvalho (2006), Casou Escher (2009), Caso Garibaldi (2009), Caso Gomes Lund “Guerrilha do Araguaia (2010), Caso Trabalhadores Fazenda Brasil Verde (2016), Caso Cosme Rosa Genoveva, Evandro Oliveira (2017), Caso do Povo Indígena Xucuru (2018), Caso Herzog (2018), Caso Empresados da Fábrica de Fogos de Santo Antônio de Jesus (2020) e Caso Márcia Barbosa de Souza (2021), devendo o Brasil dar cumprimento a essas sentenças, conforme o art. 68 da Convenção Americana:

 

Artigo 68

1. Os Estados Partes na Convenção comprometem-se a cumprir a decisão da Corte em todo caso que forem partes. [...]

Neste artigo, será analisado em específico o Caso Trabalhadores da Fazenda Brasil Verde vs. Brasil que é o primeiro caso de trabalho escravo tratado pela Corte, sendo julgado em 20 de outubro de 2016, onde foi verificado a prática de trabalho forçado e servidão por dívidas, a decisão da Corte foi baseada em depoimentos dos trabalhadores que conseguiram fugir da Fazenda e alegaram que eram ameaçados de morte no caso de abandono do local, além de não terem condições mínimas de dignidade como salário, moradia, alimentação e saúde.

  1. Metodologia 

O presente trabalho foi desenvolvido de modo qualitativo, com o propósito mostrar o caso dos trabalhadores da Fazenda Brasil Verde a sentença condenatória do Brasil pela Corte Interamericana de Direitos Humanos.

  2.1 O Caso dos Trabalhadores da Fazenda Brasil Verde vs. Brasil

Em 04 de março de 2015, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos encaminhou à Corte o caso Trabalhadores da Fazenda Brasil Verde contra a República Federativa do Brasil, sendo debatido a suposta prática de trabalho escravo e servidão por dívidas na Fazenda Brasil Verde, localizada em Sapacuia no Pará.

Os trabalhadores eram levados à Fazenda com uma promessa de vida melhor, e ao chegar lá encontravam um ambiente indigno, sendo forçados a trabalhar mais de 12 horas por dia, com apenas 30 minutos de intervalo e uma folga por semana. Além das condições insalubres, os trabalhadores eram vigiados por pessoas armadas, e não podiam sair da fazenda, sendo submetidos a ameaças, de que se tentassem fugir seriam mortos.

No ano de 2000, os trabalhadores Antônio Francisco da Silva e Gonçalo Luiz Furtado conseguiram fugir e chegar até a Polícia Federal de Marabá, onde não foram ajudados em um primeiro momento, pois era feriado e o delegado não estava trabalhando, assim, tiveram que dormir na rua e posteriormente pediram ajuda à Comissão Pastoral da Terra e o agente policial encaminhou os fatos ao Ministério Público do Trabalho o qual se comprometeu de fazer inspeção no local.

Na inspeção realizada, todos os trabalhadores quando consultados a respeito de quererem sair da fazenda e voltar para suas casas responderam unanimemente que gostariam de sair da fazenda e retornarem para suas casas, também informaram que para conseguirem suas carteiras de trabalho de volta deveriam quitar as suas supostas dívidas. Após esta fiscalização o Ministério Público do Trabalho ajuizou uma Ação Civil Pública contra o proprietário da Fazenda, e no dia 9 de junho de 2000 foi realizada audiência onde o réu comprometeu-se a não empregar mais trabalhadores no regime de escravidão além de melhorar as condições de moradia, sob pena de multa em casa de descumprimento, porém, este processo foi arquivado em agosto de 2000.

Já, no ano de 2002, em nova fiscalização na região, com intuito de ver se o acordo entre o Ministério Público do Trabalho e o réu estava sendo cumprido, foi constatado que o empregador estava cumprindo seu compromisso, sendo eliminado o trabalho escravo.

 

2.2 A decisão da Corte

 

Em 20 de outubro de 2016 o Brasil foi condenado pela Corte, onde foi argumentado que o Brasil foi internacionalmente responsável pela violação do art. 6º da Convenção Americana: 

Art 6. Proibição da escravidão e da servidão:

1. Ninguém pode ser submetido a escravidão ou a servidão e tanto estas como o tráfico de escravos e o tráfico de mulheres são proibidos em todas as suas formas. 

2. Ninguém deve ser constrangido a executar trabalho forçado ou obrigatório. Nos países em que se prescreve, para certos delitos, pena privativa da liberdade acompanhada de trabalhos forçados, esta disposição não pode ser interpretada no sentido de que proíbe o cumprimento da dita pena, imposta por juiz ou tribunal competente. O trabalho forçado não deve afetar a dignidade nem a capacidade física e intelectual do recluso. 

3. Não constituem trabalhos forçados ou obrigatórios para os efeitos deste artigo: 

a. os trabalhos ou serviços normalmente exigidos de pessoa reclusa em cumprimento de sentença ou resolução formal expedida pela autoridade judiciária competente. Tais trabalhos ou serviços devem ser executados sob a vigilância e controle das autoridades públicas e os indivíduos que os executarem não devem ser postos à disposição de particulares, companhias ou pessoas jurídicas de caráter privado; 

b. o serviço militar e, nos países onde se admite a isenção por motivos de consciência, o serviço nacional que a lei estabelecer em lugar daquele; 

c. o serviço imposto em casos de perigo ou calamidade que ameace a existência ou o bem-estar da comunidade; e 

d. o trabalho ou serviço que faça parte das obrigações cívicas normais.


 

Conclui-se que o Brasil não adotou medidas necessárias para garantir os direitos dos trabalhadores. Decidindo a Corte, por unanimidade:

O Estado deve reiniciar, com a devida diligência, as investigações e/ou processos penais relacionados aos fatos constatados  em  março  de  2000  no presente caso para, em um prazo razoável, identificar, processar e, se  for  o  caso,  punir  os  responsáveis,  de  acordo  com  o  estabelecido  nos  parágrafos 444 a 446 da presente Sentença. Se for o caso, o Estado deve restabelecer (ou reconstruir) o processo penal 2001.39.01.000270-0, iniciado em 2001, perante a 2ª Vara de Justiça Federal de Marabá, Estado do Pará, de acordo com o estabelecido nos parágrafos 444 a 446 da presente Sentença. O Estado deve realizar, no prazo de seis meses a partir da notificação da presente Sentença, as publicações indicadas no parágrafo 450 da sentença, nos termos dispostos na mesma. O Estado deve, dentro de um prazo razoável a partir da notificação da presente Sentença, adotar às medidas necessárias para garantir que a prescrição não seja aplicada ao delito de Direito Internacional de escravidão e suas formas análogas, no sentido disposto nos parágrafos 454 e 455 da presente sentença. O Estado deve pagar os montantes fixados no parágrafo 487 da presente Sentença, a título de indenizações por dano imaterial e de reembolso de custas e gastos, nos termos  do  parágrafo  495  da  presente  Sentença. (CIDH, p 124).

Também foi constatado que o Estado não considerou a vulnerabilidade dos 85 trabalhadores resgatados, vista a posição econômica que eles estavam inseridos.

Mesmo sendo condenado internacionalmente o Brasil mantém-se inerte ao cumprimento integral da condenação da Corte neste caso, se restringindo apenas ao pagamento das indenizações e abstendo-se do cumprimento efetivo da sentença.

 

3. Conclusão

Mesmo com todos os avanços no Direito, os princípios e garantias estabelecidos na Constituição Federal de 1988, ainda temos o problema do trabalho escravo contemporâneo.

Em análise da decisão da Corte Interamericana de Direitos Humanos conclui-se que a legislação do Brasil ainda é limitada, não sendo eficaz para coibir a escravidão, sendo assim, é necessário o melhoramento do sistema legal e jurisdicional para assim serem supridas as lacunas, para que assim casos como o da Fazenda Brasil Verde não venham mais a ocorrer, e se ocorrer, sejam devidamente punidos, não se baseando apenas na aplicação da lei de forma ampla, mas sim analisando caso a caso, juntamente com as disposições jurídicas do sistema nacional e internacional, doutrinas e jurisprudência.

Por fim, diante do histórico de escravidão, não pode o Brasil admitir casos como este, devendo o estado tentar resolver estes casos sem precisar que sejam levados até órgãos internacionais, pois eles servem como um sistema subsidiário e só atuam em caso de falhas internas de garantia dos direitos humanos.

4.Referências  

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília: Senado Federal, 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 18 jun. 2023.

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MACHADO, Larissa R. F. A SENTENÇA DA CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS NO CASO FAZENDA BRASIL VERDE: análise da decisão que condenou o estado brasileiro por não prevenir a prática do trabalho escravo em seu território. Trabalho de Conclusão de Curso do Bacharelado em Direito. Centro Universitário de Brasília. 2019. Disponível em: https://repositorio.uniceub.br/jspui/bitstream/prefix/13682/1/21157066.pdf Acesso em: 20 jun. 2023

MONTENEGRO, Manuel C. CNJ RECOMENDA A TRIBUNAIS SEGUIR DECISÕES DA CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. Agência CNJ de Notícias. 2021. Disponível em: https://www.cnj.jus.br/cnj-recomenda-a-tribunais-seguir-decisoes-da-corte-interamericana-de-direitos-humanos/#:~:text=O%20Plenário%20do%20Conselho%20Nacional,Direitos%20HumHuma%20(Corte%20IDH).

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