A IMPENHORABILIDADE DO SALÁRIO NA EXECUÇÃO DOS TÍTULOS...

Por ingrid brandao dos santos | 27/06/2016 | Direito

A IMPENHORABILIDADE DO SALÁRIO NA EXECUÇÃO DOS TÍTULOS DE CRÉDITOS EXTRAJUDICIAIS ATRAVÉS DA PENHORA ONLINE[1] 

Raissa Luzia Braga Dias[2]

Ingrid Brandão dos Santos[3]

Paulo Ricardo da Luz Martins[4]

José Humberto de Oliveira[5]

Sumário: Introdução; 1. Evolução histórica da execução de Títulos Extrajudiciais; 1.1. O Surgimento da Penhora On-line; 2. A Penhora On-line no Ordenamento Jurídico brasileiro; 3. A impenhorabilidade do salário: entendimentos jurisprudenciais e doutrinários; Considerações Finais. 

RESUMO 

O presente trabalho tem por finalidade explanar sobre a impenhorabilidade do salário frente à execução de títulos extrajudiciais que são feitos através da penhora online. Além disso, analisar-se-á os diferentes entendimentos jurisprudenciais e doutrinários que tratam do referido assunto, para, assim, poder-se apurar, no plano fático, como esse tema é tratado. Sendo assim, entende-se que a execução de títulos extrajudiciais através da penhora on line é uma medida de extrema importância para o âmbito econômico, visto que, o judiciário possui um poderoso instrumento para fazer valer o direito do credor, porém, quando se trata do salário, há uma dualidade entre o benefício do credor e as necessidades do devedor, surgindo, assim, importantes discussões doutrinárias e jurisprudenciais a respeito da (im)penhorabilidade do salário.

Palavras-Chave: Penhora On line; Salário; Títulos de Crédito Extrajudiciais; 

INTRODUÇÃO 

A penhora online tem sido um instrumento de grande utilização na execução de títulos extrajudiciais no Brasil. Para que se possa realizar uma análise sobre o assunto torna-se necessário um estudo sequencial, abordando sobre a execução dos títulos extrajudiciais no Direito Brasileiro desde o seu surgimento até a sua aplicação atual em planos fáticos. Dessa forma, deverão ser apontados fatores que levaram ao surgimento da penhora online, e os propulsores da mesma.

Tratar-se-á também da importância da penhora online no ordenamento jurídico brasileiro, sua conceituação, principais características e finalidade da sua criação e implantação no ordenamento.

A análise das particularidades, apontando pontos positivos e negativos, se faz necessária para que se possa entender de forma clara as hipóteses em que a penhora online será utilizada ou não, bem como as alterações feitas na Legislação Brasileira.

Falar-se-á, também, a respeito das opiniões e divergências doutrinárias sobre os objetivos, procedimentos, formas e ocasiões de aplicação. Serão elencadas algumas críticas sobre tal procedimento, principalmente no que diz respeito a sua inconstitucionalidade, por ter surgido de um acordo entre os Tribunais e o Banco Central, e não em virtude de Lei. Outra cítrica feita a aplicação da penhora online na execução de títulos extrajudiciais é como a suposta violação da intimidade e do sigilo bancário do executado. Após tais esclarecimentos poderá ser analisada a (im)penhorabilidade do salário na execução de Títulos de Crédito Extrajudiciais através da Penhora Online.

Por fim, serão feitas considerações finais sobre o tema e fundamentações abordadas no decorrer do trabalho. Ressalta-se a dimensão do tema, apesar de discutir e destacar alguns pontos, não se pretende, nem se pode, esgotá-lo. 

  • EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA EXECUÇÃO DE TÍTULOS EXTRAJUDICIAIS 

Antes de se falar em evolução histórica da execução de títulos extrajudiciais, deve-se pautar o conceito de títulos judiciais para depois entender como foram surgidos. Por lógica, os títulos extrajudiciais são aqueles formados fora do processo e que reconhecem um direito que tem probabilidade de ser violado, ou seja, são dotados de força executiva por causa da existência de um direito que estes reconhecem. Sobre os títulos de crédito extrajudiciais, Wambier (2004, p. 55) afirma que:

Existem determinadas situações que indicam grande chance da existência do direito, um elevado grau de probabilidade da sua violação, ensejadora de sanção. O legislador, levando em conta os valores jurídicos envolvidos, elege abstratamente atos que, na experiência comum, normalmente indicam a existência efetiva de crédito e atribui-lhes a condição de títulos executivos. Essa plausibilidade é imprescindível para que seja constitucional a criação legislativa de um título executivo extrajudicial.

                No tocante ao respeito do surgimento dos títulos de execução extrajudiciais temos que o Brasil, mesmo após sua independência, ainda era regulado pelas normas portuguesas oriundas das Ordenações Filipinas, onde as atividades tinham características privadas, incluindo as executivas. De acordo com Cândido Rangel Dinamarco (1998, p. 72) o primeiro diploma processual brasileiro foi o Regulamento 737, onde disciplinava institutos como competência, no qual regulava que o Juiz competente era o que tivesse conduzido o processo de conhecimento, também mencionava as partes legítimas. Ainda no entendimento do autor, o regulamento tratava apenas de execução de espécie expropriativa.

            A expropriação está intimamente ligada à penhora, porque é através dessa que serão individualizados os bens do devedor para satisfazer o direito do credor, e, assim, prepara a expropriação para ser praticada, para que se dê o pagamento da prestação em dinheiro. (BELLATO,?, p.9). Após o regulamento, foi promulgado o Código de Processo Civil de 1939, que regulamentava dois tipos de execução de títulos, os títulos judiciais e os extrajudiciais, porém não havia distinção de rito entre a execução fundada entre títulos judiciais e títulos extrajudiciais, segundo Didier (2011, p.34).

            Atualmente, o procedimento de execução é feito de acordo com o tipo do título, e no que diz respeito a títulos extrajudiciais, está disposto o procedimento a partir do art. 652 do CPC. Segundo o atual Código de Processo Civil vigente, os títulos extrajudiciais, que foram criados para terem força executiva sobre direitos com alta probabilidade de violação e regulamentados pelo mesmo, são: a letra de câmbio, a nota promissória, a duplicata, a debênture, cheque, a escritura pública ou outro documento público assinado pelo devedor; o documento particular assinado pelo devedor e por duas testemunhas, o instrumento de transação referendado pelo Ministério Público, pela Defensoria Pública ou pelos advogados dos transatores, os contratos garantidos por hipoteca, penhor, anticrese e caução, bem como os de seguro de vida, o crédito decorrente de foro e laudêmio, o crédito, documentalmente comprovado, decorrente de aluguel de imóvel, bem como de encargos acessórios, tais como taxas e despesas de condomínio, o crédito de serventuário de justiça, de perito, de intérprete, ou de tradutor, quando as custas, emolumentos ou honorários forem aprovados por decisão judicial, o crédito de serventuário de justiça, de perito, de intérprete, ou de tradutor, quando as custas, emolumentos ou honorários forem aprovados por decisão judicial.

Sendo assim, todos eram dotados expressamente de força executiva. O instituto para execução por quantia certa contra devedor solvente e que será analisado no trabalho é a penhora. A penhora é o procedimento de segregação dos bens que efetivamente se sujeitarão à execução, respondendo pela dívida inadimplida. Até a penhora, a responsabilidade patrimonial do executado é ampla, de modo que praticamente todos os seus bens respondem por suas dívidas (art. 591 do CPC e art. 391 do CPC). Por meio da penhora, são individualizados os bens que responderão pela dívida do objeto da execução. Assim, a penhora é o ato processual pelo qual determinados os bens do devedor (ou de terceiro responsável) sujeitam-se diretamente à execução. (MARINONI, 2011, p. 258).

O dinheiro é o principal bem em que a penhora deve recair na execução forçada por quantia certa contra devedor solvente, haja vista o próprio objetivo desse processo, que é a expropriação de bens do executado até o limite da dívida – caso esse não cumpra a obrigação espontaneamente – para que seja adimplida a obrigação de pagar quantia em dinheiro no qual ele é devedor. Sobre o assunto, afirma Marinoni (2011, p. 278) que:

A penhora de dinheiro é a melhor forma de viabilizar a realização do direito de crédito, já que dispensa todo o procedimento destinado a permitir a justa e adequada transformação de bem penhorado – como o imóvel – em dinheiro, eliminando a demora e o custo de atos como a avaliação e a alienação do bem a terceiro.

O Código de Processo Civil estabelece no artigo 655 - alterado pela Lei 11.382/2006 o inciso I - uma ordem preferencial de bens que a penhora deve recair, então:

Art. 655. A penhora observará, preferencialmente, a seguinte ordem:

I – dinheiro, em espécie ou em depósito ou aplicação em instituição financeira;

II – veículos de via terrestre;

III – bens móveis em geral;

IV – bens imóveis;

[...]

            Porém, o que impedia a penhora de dinheiro, até recentemente, era que o disposto no art. 655, I, do CPC só tratava expressamente de dinheiro em espécie, fazendo com que o devedor acabasse tendo que indicar outro bem à penhora. Sobre o assunto, o autor Luis Guilherme Marinoni (2011, p. 274) entende que o acréscimo ao inciso I, após a expressão dinheiro, foi necessário para esclarecer que pode ser penhorado não apenas direito em espécie, mas também dinheiro depositado em instituição financeira. Ainda assim, o problema é que muitas vezes o exequente não encontrava a localização dos depósitos financeiros do executado, devendo então requerer ao juiz que este requisitasse as informações ao Banco Central, quando exauridas as tentativas de localização pelo mesmo. 

  • O SURGIMENTO DA PENHORA ON-LINE 

Visando combater a falta de instrumentos que localizassem as contas de devedor solvente nas instituições financeiras para que houvesse a possibilidade de ser executada a penhora, preferencialmente de dinheiro, fora incorporado o novo instituto da penhora on-line, em 6 de dezembro de 2006, pela Lei n º. 11.382, utilizado através do sistema “Bacen Jud”, este, desenvolvido pelo Banco Central do Brasil desde 2001, com o objetivo de automatizar o envio e o tratamento das solicitações e ordens judiciais ao Sistema Financeiro Nacional.

A Lei 11382/2006, que entrou em vigor em 22 de janeiro de 2007 acrescentou o art. 655-A ao CPC que prevê expressamente a utilização da penhora on-line ou eletrônica, nos seguintes termos: ‘’para possibilitar a penhora de dinheiro em depósito ou aplicação financeira, o juiz, a requerimento do exequente, requisitará à autoridade supervisora do sistema bancário, preferencialmente por meio eletrônico, informações sobre a existência de ativos em nome do executado, podendo no mesmo ato determinar sua indisponibilidade, até o valor indicado na execução’’. Conforme afirma sobre o assunto, Luiz Guilherme Marinoni, 2011, p. 279-280:

Se o exequente, para penhorar dinheiro, necessita saber se o executado possui – e em que local – dinheiro depositado em instituição financeira, deve ter ao seu dispor uma forma que lhe garante essa verificação. Para viabilizar o acesso a tais informações, o Superior Tribunal de Justiça, o Tribunal Superior do Trabalho e o Conselho de Justiça Federal firmaram convênio com o Banco em Central – há bastante tempo -, por meio do qual os juízes com senhas cadastradas têm acesso, através da internet, a um sistema de consultas – desenvolvido pelo Banco Central do Brasil, denominado “Bacen Jud”.

O acesso a esse sistema confere ao juiz a possibilidade de obter informações sobre depósitos bancários – em conta corrente ou aplicação financeira do País. Com isso, o magistrado também fica com o poder de determinar o bloqueio do valor do crédito executado, concretizando o direito do exeqüente à penhora de dinheiro.

Sendo assim, trata-se de arresto executivo eletrônico (DIDIER, 2011, p. 613). Portanto, a penhora online é tida como preferencial em relação a qualquer outro meio de penhora atualmente, pois o dinheiro como disposto no art. 655, I, do CPC é o bem prioritário para execução dos bens do devedor por meio da penhora, e a via eletrônica é o caminho eleito pelo art. 655-A, do CPC para a realização da penhora desse tipo de bem. (MARINONI, 2011, p. 282).

            Em suma, entende-se que com o surgimento da penhora online, ou seja, a execução de dívida por quantia certa de devedor solvente por via eletrônica ter facilitado que o exequente requisite à autoridade supervisora do sistema bancário, preferencialmente por meio eletrônico, informações sobre a existência de ativos em nome do executado, podendo estes ser bloqueados através da penhora online, ela também recebe muitas críticas, tanto em relação a sua constitucionalidade, quanto em relação aos seus mecanismos de utilização.

  • A PENHORA ON-LINE NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO

 

Antes que se conceitue a penhora on-line é, mister, salientar que não se trata de um novo instituto, e, sim, de uma mudança na aplicação da penhora tradicional, devido a morosidade na aplicação da penhora em dinheiro. Pois os juízes deveriam enviar ofícios para que fossem bloqueados os valores contidos e depositados nas contas dos executados. Tal procedimento por ser bastante demorado dificultava a execução, pois o executado tinha tempo hábil para retirar ou transferir os valores, afetando diretamente na efetividade da execução.

Atualmente a penhora é feita através da internet, o juiz não precisa mais enviar ofícios às instituições financeiras ou ao Banco Central. Através de um convênio entre o Poder Judiciário e o Banco Central a penhora pode ser realizada de forma mais efetiva, essa comunicação eletrônica é denominada de BACENJUD.

A penhora online surgiu no ano de 2001 como explana Redondo e Lojo:

É possível apontar o mês de maio de 2001 como a data do surgimento da “penhora on-line”, ocasião em que foi firmado o primeiro Convênio entre juízes federais e estaduais e o Banco Central, cujo objeto foi o desenvolvimento de sistema informatizado que viabilizasse o envio de ordem eletrônica de bloqueio de contas, expedida diretamente do computador do magistrado para o Banco Central. Em 2002, também no mês de maio, foi firmado um segundo Convênio, dessa vez de abrangência mais significativa. Celebrado entre o Superior Tribunal de Justiça, o Conselho da Justiça Federal, o Tribunal Superior do Trabalho e o Banco Central, o Convênio BACEN / TST / 2002 (“Convênio de Cooperação Técnico-Institucional para fins de acesso ao Sistema Bacen-Jud”) alcançou notoriedade em razão de seu objeto: ao formalizar a criação do Sistema Bacen-Jud, ampliou a possibilidade de sua utilização por todos os magistrados, sendo bastante que os Tribunais assinassem Termo de Adesão. (2009, p.84)

De acordo com o citado acima se percebe que o Tribunal Superior do Trabalho também aderiu ao convênio, mediante a celeridade resultante do sistema BACENJUD.

O grande número de adesão, por parte dos Tribunais e Juízes, e a celeridade alcançada por meio da penhora on-line motivou a positivação do sistema pelo Ordenamento Jurídico, onde foi acrescentado o art. 655-A, por meio da Lei 11.382/2006, ao Código de Processo Civil:

Art. 655 – A. Para possibilitar a penhora de dinheiro em depósito ou aplicação financeira, o juiz, a requerimento do exequente, requisitará à autoridade supervisora do sistema bancário, preferencialmente por meio eletrônico, informações sobre a existência de ativos em nome do executado, podendo no mesmo ato determinar sua indisponibilidade, até o valor indicado na execução.

Portanto, a penhora online surgiu com o intuito de dar celeridade ao procedimento de execução da penhora tradicional, já que esta era bastante morosa. Entretanto, a penhora online vem sofrendo algumas críticas pela forma como tem sido utilizada, em que muitas vezes há o abuso na utilização desse procedimento, o que acarreta em algo prejudicial ao executado.

A penhora online foi bastante questionada principalmente em relação aos seus procedimentos e constitucionalidade. Questionamentos que já foram superados, embora ainda seja objeto de discussão. Em relação à constitucionalidade, a crítica foi em relação a, inicialmente, forma como foi criada, através de um acordo entre Tribunais e o Banco Central, algo que foi superado com a positivação através da Lei 11.382/2006 como já foi citado.

A crítica mais pertinente se deu em relação a suposta violação da intimidade e dos dados bancários do executado que são garantidos pela Constituição Federal em seu art. 5º nos incisos X e XII:

X: São invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;

 XII: É inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados, e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal.

A argumentação utilizada, por meio do que fora acima citado, é que o juiz ao executar a penhora online junto ao Banco Central obtém dados bancários do executado, dados estes que deveriam ser sigilosos.

Entretanto, há o entendimento de que essa violação, tanto da intimidade quanto do sigilo bancário do executado, inexiste, pois o Banco Central transmite apenas se há o valor disponível para a execução da sentença e consequentemente sanar as dívidas do executado, como disposto no Parágrafo Único do art. 655-A do Código de Processo Civil “As informações limitar-se-ão à existência ou não de depósito ou aplicação até o valor indicado na execução”.

Em consonância com esse posicionamento Marinoni diz que “o exequente necessita saber se existe depósito ou aplicação em valor suficiente para garantir a execução, sem ter a necessidade de conhecer os valores dos últimos movimentos bancários, como tais valores forem empregados ou quais foram os seus beneficiários”. (2008, p. 276).

Nessa mesma linha de raciocínio dissertam Gomes Neto e Suellen Poncell do Nascimento:

Antes de tudo, é necessário esclarecer que o exequente tem o direito de saber se o executado possui dinheiro depositado ou aplicado em instituição financeira, da mesma forma que possui o direito de saber se o executado é proprietário de bem imóvel ou móvel. Tal direito é consequência do direito à penhora, que é corolário do direito de crédito e do direito fundamental à tutela jurisdicional efetiva (art. 5º, XXXV da CF). (2009, p. 267)

Portanto, entende-se que, de acordo com o que fora supracitado, que não há violação da intimidade e dos dados de sigilo bancários do executado. Visto que as informações cedidas ao juiz, pelo Banco Central, através do BACENJUD, são apenas para conhecimento do poder de quitação da dívida por parte do executado, não dando informações detalhadas sobre depósitos ou transações bancárias. Tal infração só ocorrerá em caso de abuso dos limites legais previstos.

As discussões remanescentes não se dão em relação a penhora online em si, mas na maneira como ela é executada, na sua utilização. Um dos problemas em relação a utilização da penhora online se dá em relação a múltiplas contas do executado, pois se em cada uma delas dispor do valor da execução, o valor será bloqueado em todas elas, como dispõe Guilherme Goldschmidt:

Assim, se um suposto credor requer ao juiz o bloqueio eletrônico da quantia hipotética de R$ 10.000,00 (dez mil reais), essa solicitação será remetida para o Banco Central, que buscará encontrar, pelo CPF ou CNPJ do devedor, contas e aplicações financeiras, bloqueando a quantia requerida pelo credor em todas as suas contas cadastradas. Dessa forma, se o devedor for titular de três contas em bancos distintos, com saldo disponível, será bloqueado o valor correspondente à solicitação do credor, nas três contas encontradas, havendo, assim, múltiplas penhoras e, o que é pior, excesso de execução. (2008, p. 62)

Assim sendo, pode-se perceber que se o executado possuir várias contas com saldos que possam quitar o valor da dívida, resultará em um bloqueio de valores superiores ao que havia sido discutido durante o processo, o que caracterizaria um abuso ou extrapolação na utilização da penhora online.

3  A IMPENHORABILIDADE DO SALÁRIO: ENTENDIMENTOS JURISPRUDENCIAIS E DOUTRINÁRIOS

A grande discussão dentro do referido assunto é: se é admitido ou não a penhora On-line da conta corrente salário, ou seja, se o salário está dentro do rol da impenhorabilidade absoluta ou relativa. A jurisprudência não é pacífica, enquanto há entendimento que defendem piamente a impenhorabilidade do salário, há, também, os que defendem ser penhorável 30% do mesmo.

Defendendo a impenhorabilidade absoluta do salário tem-se o renomado autor Alexandre Freitas Câmara, o qual afirma que o “direito objetivo teve a intenção de preservar a sobrevivência digna do executado, estabelecendo limites para a execução” (2009, p.274). Destacando que, o art. 649, inciso IV, do Código de Processo Civil brasileiro, o qual trata da impenhorabilidade dos vencimentos, subsídios, soldos, salários, remuneração, proventos de aposentadoria, pensões, pecúlios e montepios, teve o seu §3º vetado pelo Presidente, o qual tratava da possibilidade de penhorar 40% das rendas elencadas no inc. IV do art. 649 do CPC. Sendo assim, através desse veto, manteve-se a absoluta impenhorabilidade dos salários.

A posição de Câmara, que preza pela impenhorabilidade do salário, encontra respaldo na Constituição Federal, a qual traz no seu art.7, inciso X:

Art. 7: São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

[...]

X - proteção do salário na forma da lei, constituindo crime sua retenção dolosa.

As jurisprudências, em grande maioria, tendem pela não realização da penhora on line quando a conta, comprovadamente, é, apenas, conta salário. Nesse sentido está o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul e o Tribunal Superior do Trabalho:

Ementa: AGRAVO DE INSTRUMENTO. ENSINO PARTICULAR. AÇÃO MONITÓRIA. PENHORA ONLINE. IMPENHORABILIDADE. CONTA SALÁRIO. Penhora online foi realizado em contas nas quais as agravadas recebem salário, de modo que impenhorável. Negado seguimento ao agravo de instrumento, de plano. (Agravo de Instrumento Nº 70058399627, Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Elisa Carpim Corrêa, Julgado em 07/02/2014)

Ementa: AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO. IMPENHORABILIDADE DOS SALÁRIOS DOS SÓCIOS EXECUTADOS. Conforme jurisprudência pacífica desta Corte superior -Ofende direito líquido e certo decisão que determina o bloqueio de numerário existente em conta salário, para satisfação de crédito trabalhista, ainda que seja limitado a determinado percentual dos valores recebidos ou a valor revertido para fundo de aplicação ou poupança, visto que o art. 649 , IV , do CPC contém norma imperativa que não admite interpretação ampliativa, sendo a exceção prevista no art. 649 , § 2º , do CPC espécie e não gênero de crédito de natureza alimentícia, não englobando o crédito trabalhista- (Orientação Jurisprudencial n.º 153 da SBDI-II desta Corte superior). Agravo de instrumento a que se nega provimento . (AIRR 1424004720005150017 142400-47.2000.5.15.0017, 1ª Turma, TST, Relator: Hugo Carlos Scheuermann, Publicado no DEJT em 09/12/2011).

Existem, no entanto, aqueles que defendem que a impenhorabilidade do salário é relativa. Dentre eles está Fredie Didier (2011), que traz duas possibilidades: a) quando se estar diante de um crédito que também possui natureza alimentar; b) quando o valor exceder consideravelmente o que se impõe para a proteção do executado. O fundamento é de que essa restrição a penhorar todo o salário só beneficia e assegura os direitos do executado, enquanto que os direitos do exequente são esquecidos, o que torna inconstitucional, pois apenas o direito fundamental de uma das partes da relação é respeitado.  Nesse sentido:

A impenhorabilidade de certos bens é uma restrição ao direito fundamental à tutela executiva. É técnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteção de alguns bens jurídicos relevantes, como a dignidade do executado, o direito ao patrimônio mínimo e a função social da empresa. São regras que compõem o devido processo legal, servindo como limitações políticas à execução forçada. (DIDIER, 2011, p.546)

Atualmente, algumas jurisprudências estão defendendo a possibilidade de  penhorar 30% do salário, como traz o Tribunal de Justiça de Minas Gerais:

Ementa:AGRAVO DE INSTRUMENTO. DESBLOQUEIO DE VALORES. PENHORA ONLINE. SALÁRIOS. CARÁTER ALIMENTAR. LIMITE DE 30%. POSSIBILIDADE. RECURSO PROVIDO EM PARTE.Nossos Tribunais vêm se posicionando no sentido de que é possível o desconto de parcela de dívidas em conta-corrente recebedora de salário, devendo, porém, o decote ser limitado ao percentual máximo de 30% (trinta por cento) dos vencimentos do devedor.

Destarte, não há jurisprudência pacificada a respeito da impenhorabilidade do salário, em cada caso concreto o julgador irá analisar, fazendo uma ponderação entre o direito do credor e a proteção do executado.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

A penhora on-line foi um dos grandes avanços do Judiciário para assegurar o direito do exequente, é um instrumento que permite prevenir a perda daquilo que é devido. Esse instrumento é fundamental no processo de Execução de Títulos Extrajudiciais, em decorrência da natureza dessa ação, que visa justamente fazer valer o direito do credor.

Diante de todos os benefícios advindos com a penhora on line, vieram, também, limitações, tais como as presentes no artigo 649 do Código de Processo Civil brasileiro, o qual traz um rol de todas as possibilidades de impenhorabilidade. Dentre a qual tratou-se especificamente do inciso IV do referido assunto, que diz respeito sobre a impenhorabilidade do salário.

Antes de adentrar na discussão fulcral, sobre as divergências quanto a impenhorabilidade absoluta ou relativa do salário, é importante entender como funciona a execução de títulos extrajudiciais, bem como, o desenrolar da penhora on line. Ao final, após a análise de todos esses pontos, conclui-se que não há um único posicionamento correto e que dependerá do caso concreto para afirmar se parte do salário poderá ou não ser penhorado.

 

 

 

 

 

REFERENCIAS

 

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BELLATO, Júnior Fernando. Evolução histórica da Execução. Disponível em> file:///C:/Users/user/Downloads/1752-3871-1-PB.pdf< Acesso em: 04/05/14.

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CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de Direito Processual Civil. vol. 2. 17ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009.

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DIDIER JR., Fredie; CUNHA, Leonardo José Carneiro da; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso de Direito Processual Civil: execução. 3 ed. Salvador : Juspodivm,2011.

DINAMARCO, Candido Rangel. Execução Civil. 6ª Edição. São Paulo: Editora Malheiros, 1998.

MARINONI, Luis Guiherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Curso de Processo Civil; v.3: processo de execução. 3 ed. rev. e atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011.


OLIVEIRA, Josildo Muniz de. A relativização da impenhorabilidade do salário e o novo CPC. Jus Navigandi, Teresina, ano 18, n. 3728, 15 set. 2013. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/25296>. Acesso em: 5 abr. 2014.

REDONDO, Bruno Garcia; LOJO, Mário Vitor Suarez. Ainda e sempre a penhora on-line: constitucionalidade, princípios e procedimento. Leituras complementares de processo civil. 7 ed. rev. e ampl. Bahia: Juspodium, 2009.

 

WAMBIER, Luiz Rodrigues; COREIA DE ALMEIDA, Flávio Renato; TALAMINI, Eduardo. Curso Avançado de Processo Civil, volume 2: processo de execução. 6. Ed. rev,. atual e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2004.

______.______. Código de Processo Civil. Lei n 5.869 de 11 de janeiro de 1973. Institui o Código de Processo Civil. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L5869.htm. Acesso em: 30 abr. 2014.

[1] Paper apresentado à disciplina de Títulos de Crédito, da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco-UNDB

[2] Aluna do 5º período noturno do curso de direito da UNDB;

[3] Aluna do 5º período noturno do curso de direito da UNDB;

[4] Aluno do 5º período noturno do curso de direito da UNDB;

[5] Professor, Especialista, Orientador.

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