A Imagem de Si nos Fragmentos Discursivos de Nelson Mandela.

Por Maria Aparecida Santos Oliveira | 06/08/2011 | Educação


A IMAGEM DE SI NOS FRAGMENTOS DISCURSIVOS DE NELSON MANDELA


Maria Aparecida dos Santos Oliveira*


Resumo: Este estudo aborda a Análise do Discurso, evidenciando o discurso político do presidente africano Nelson Mandela. O objetivo é compreender os efeitos de sentido que os discursos causam no ouvinte. Para isso, baseou-se em estudiosos da Análise do Discurso, tais como Gregolin (2007), Fiorin (1993), Brandão (2004), identificando as formações ideológicas e discursivas presentes no discurso político de Mandela. Apresenta-se, ainda, os conceitos de enunciado e polifonia na perspectiva bakhtiniana, para quem o sujeito é interativo e seu discurso atravessado por uma multiplicidade de vozes. E ainda neste estudo destaca-se Saussure com seu conceito de língua como um sistema abstrato separado da fala. Também analisa-se o corpus com base na noção de ethos, conforme a perspectiva de Ruthy Amossy (2008), Dominique Maingueneau (1997) e Patrick Charaudeau (2008), buscando identificar as imagens que o sujeito cria ao formular seu discurso.

Palavras-chave: Discurso. Ideologia. Ethos. Enunciado. Político.


INTRODUÇÃO

Vivemos em um mundo em constante transformação. A política é a grande estrutura que promove essas transformações, produzindo discursos diferentes em todo o mundo. São muito comuns os discursos políticos proferidos através de palanques, que têm como finalidade persuadir o público a aderir aos seus valores ideológicos. Visto dessa forma, o objetivo deste artigo é investigar as formações discursivas e ideológicas presentes nos fragmentos do discurso político de Nelson Mandela em 10 de março de 1994, com base nas teorias dos estudiosos da Análise do Discurso.
Saussure exclui os elementos como a fala, o sujeito, a ideologia e a história. Na proposta pecheutiana, o objeto de estudo da análise do discurso (discurso) surge a partir da crítica, a esse corte entre língua e fala, operado por Saussure, que foram trazidos depois para os estudos linguísticos. A Análise do Discurso de linha francesa vê o sujeito assujeitado aos aparelhos ideológicos (sociais religiosos e políticos); é a linguagem que circula nos discursos que permite e se constitui espaços de discussão, de persuasão e de atração nos quais se elaboram o pensamento e a ação política.
O povo tem um forte respeito em relação do poder de hierarquia que é dado ao político sobre o indivíduo. Esses teóricos citados diferenciam de Saussure por acreditar que a fala, história e o sujeito é que contribui na formação do discurso ideológico. O todo do sujeito é que lhe confere a sua fala, o seu discurso é construído por tudo que lhe circunda.
O tipo de discurso escolhido nesta pesquisa foi o discurso político, sendo este um acontecimento discursivo bastante proferido em todo meio social. Isto é, não há política sem discurso. Assim todo político se faz merecedor do seu mandato através do seu enunciado, que é construído com dizeres direcionados para a população, compostos de argumentos que mostram uma preocupação com as causas sociais. Isto é, o político usa esses recursos com interesse de garantir crédito e confiança enquanto representante do povo.
Nessa perspectiva, este trabalho possui como objetivo identificar os efeitos de sentido causados por alguns fragmentos dos discursos de Nelson Mandela, como uma forma de evidenciar os pressupostos ideológicos que se escondem sob a linguagem do discurso político. Para tanto, a primeira parte deste artigo, expõe sobre os pressupostos teóricos da Análise do Discurso de linha francesa. No segundo momento, serão expostos os fragmentos discursivos do corpus, baseando-nos na teoria do discurso propostas por Bakhtin, enfocando a enunciação e a polifonia. A partir de Patrick Charaudeau (2008) e outros teóricos, serão estudados a persuasão e o ethos, analisando os fragmentos do discurso de Mandela.
O corpus deste trabalho é composto por dois discursos de Nelson Mandela, que foram retirados do blog Maiores discursos da história (todo conteúdo do corpus está em anexo). Esses fragmentos foram pronunciados por Mandela em seus discursos logo após sair da prisão e se tornar presidente da África do sul. A escolha dos discursos de Nelson Mandela justifica-se pelo fato de serem voltados para uma nação que sofreu todos os tipos de preconceitos e por ter sido marco de mudanças na história daquele país. Nesse sentido, compreende-se que a divisão racial e os constantes conflitos corroboraram para provocar determinados efeitos de sentido nos discursos de Mandela, que o diferenciou como político.
Infere-se que o desejo de permanência e a perseverança são recorrentes em seus discursos, provocando um efeito persuasivo. É evidente que esse homem político usa a política como meio pacífico, mostrando que é possível fazer paz através da paz.

Conceito de língua e fala segundo Saussure e Bakhtin

Saussure é considerado um dos estudiosos mais influentes da linguística. Atribui-se a ele os primeiros estudos da língua e da fala. Segundo Saussure (2002), a língua é um sistema abstrato, um objeto por excelência da linguística, A linguagem, nessa perspectiva, não pode ser um ponto de partida para uma análise linguística, mas sim a língua. Saussure (2002, p. 22) separa a "língua da fala, ele coloca a língua num plano social e a fala no sentido individual".
Ao fazer essa separação, mostra que a "língua não consiste, pois, uma função do falante: é o produto que o indivíduo registra passivamente; não supõe jamais premeditações, e a reflexão nela intervém somente para atividade de classificação". Já a fala, é um ato de vontade e inteligência, em que o falante expõe seus pensamentos, sendo de caráter individual. Logo, são atos individuais que explicam a mudança histórica das formas da língua.
Saussure aponta algumas características próprias da língua, que é um objeto definido dentro dos acontecimentos da linguagem. "Como instituição social a língua é, ao mesmo tempo, um produto social da faculdade da linguagem e um conjunto de convenções necessárias, adotadas pelo social para permitir o exercício dessa faculdade nos indivíduos". (SAUSSURE, 2002, p.17).
A língua, nesse caso, é considerada um objeto concreto o que facilita seu estudo. Sendo ela psíquica, não é feita de abstrações, e acontece no cérebro do indivíduo e nela encontra a imagem acústica que pode converter em imagem visual constante na escrita. Segundo Saussure (2002, p. 23),

A língua, não menos que a fala, é um objeto de natureza concreta, o que oferece grande vantagem para seu estudo. Os signos linguísticos, embora sendo essencialmente psíquicos, não são abstrações; as associações, ratificadas pelo consentimento coletivo e cujo conjunto constitui a língua, são realidades que tem sua sede no cérebro.


Mesmo Saussure sendo o responsável pelos estudos da linguagem, nascem, posteriormente, vários outros pensamentos se opondo a ele. Dentre eles está Bakhtin que propõe um novo conceito de língua e fala, confrontando com a visão abstrata que Saussure tem da língua. Na concepção de Bakhtin (2007), tudo está em movimento constante, sendo que a língua muda conforme o estado histórico em que os atos humanos se desenvolvem.
O processo de interação passa a ser a verdade fundamental da língua. "A visão da linguagem como interação social, em que o Outro desempenha papel fundamental na constituição do significado integra todo ato de enunciação individual num contexto mais amplo, revelando as relações intrínsecas entre o lingüístico e o social". (BRANDÂO, 2004, p. 08)
Bakhtin, diferentemente de Saussure, coloca a fala como objeto de estudo da linguagem. A fala é para Bakhtin o elemento necessário para compreender e explicar a estrutura semântica de qualquer tipo de interação verbal. A cada acontecimento de fala constitui uma realidade fundamental da língua.
Segundo Brandão (2004, p. 10), "a linguagem enquanto discurso e interação é um modo de produção social; ela não é neutra, inocente e nem natural, por isso o lugar privilegiado de manifestação da ideologia". Nessa perspectiva, a linguagem é o mediador preciso entre indivíduo e o seu convívio social, é um lugar de coerções sociais, debates e conflitos ideológicos, não podendo ser questionada fora do vínculo social, sendo que o acontecimento da linguagem se dá através das ações históricas sociais.
Enquanto Saussure defende a língua como um sistema de regras imutáveis, Bakhtin afirma que a língua não pode ser uma organização de regras, onde nada permanece estável sendo que há uma constante evolução no convívio social de cada indivíduo. Este trabalho pauta-se, sobretudo, nessa última concepção, tendo em vista que a língua deve ser encarada como produto da interação social entre os falantes. Partimos agora para os conceitos relevantes nesta pesquisa da Análise do Discurso de linha francesa.
Análise do discurso de linha francesa

A escola francesa de análise do discurso - AD - surge na década de 60 na França, tendo o discurso como seu principal objeto de estudo. Um dos estudiosos da AD francesa foi Michel Pêcheux. A linha francesa é estruturalista é interligada com a lingüística e com a história. No Brasil, os estudos da AD são de origem francesa, e têm um espaço aceitável com uma ampla área de estudos e linguistas, com visões diferentes. Os estudos da AD de linha francesa veem o sujeito acondicionado a uma ideologia que antecede o que pode ou não dizer em uma determinada situação histórica e social.

O papel da teoria materialista do discurso é desconstruir a aparente unidade do sujeito, pois a sua relação com a língua é atravessada por essa construção da subjetividade: a língua tem seu real valor próprio, assim como a história também tem seu real. O discurso é o lugar de encontro entre esses dois reais, atravessados pelo processo histórico ideológico de constituição do sujeito. (GREGOLIN, 2007, p. 140)

Dessa forma, o sujeito é assujeitado aos aparelhos ideológicos e "a ideologia interpela os indivíduos como sujeitos" (GREGOLIN, 2007, p. 134). O sujeito da AD é histórico e social: histórico porque não está alienado do mundo que o cerca; social porque não é o indivíduo, mas aquele compreendido num espaço coletivo. Segundo Brandão (2004, p. 34): "O sujeito deixa de ser uma noção idealista imanente, o sujeito da linguagem não é o sujeito em si, tal como existe socialmente, interpelado pela ideologia. Dessa forma, o sujeito não é a origem, a fonte absoluta do sentido, porque na sua fala outras falas se dizem".
O que define o sujeito é o lugar de onde fala. assim sendo constituído por vários "eus", não existe uma só voz em seu ser, não é o dono do seu dizer. Tendo em vista que o discurso é onde se materializa a linguagem e traz com ele as formações ideológicas, é no enunciado que a ideologia se manifesta, sendo dirigida por formações ideológicas. Segundo Brandão (2004, p. 19), "[...] a ideologia é a separação que se faz entre produção das idéias e as condições sociais é históricas em que são produzidas".
Para Fiorin (1993, p. 28), "[...] as condições de vida do homem e as relações que ele mantém com os outros homens é o que comumente se chama ideologia". Nota-se que há um conjunto de fatores necessários para o que se pode chamar de ideologia, tais como condições sociais do indivíduo e sua forma de relacionamento com outros grupos sociais, sendo fenômeno da realidade.
Ricoeur (apud BRANDÃO, 2004, p. 30) afirma que "tem a noção de ideologia como uma visão, uma concepção de mundo de uma determinada comunidade social numa determinada circunstância histórica". Althusser (apud GREGOLIN, 2007 p. 50) ressalta a ideologia como "[...] uma relação imaginária que os homens mantêm com suas condições reais de existência. Derivando do domínio do concreto, do vivido a ideologia sedimenta as relações sociais, produzindo uma ilusão que as torna suportáveis para os sujeitos".
Seja qual for a posição de classe, religiosa jurídica ou política, a ideologia está inserida, e mostra para cada classe social uma dada visão de mundo diferente, pois a maneira de uma certa sociedade ver o mundo é de uma para outra classe social, com os diferentes modos de pensar dos seus participantes.
Bakhtin (apud BRAIT, 2007, p. 170) afirma que "[...] todo signo e ideológico. O ponto de vista, o lugar valorativo e a situação são sempre determinado sócio-historicamente". A ideologia se constitui e materializa na interação constantes dos grupos organizados em torno das atividades humanas. A linguagem seria, então, o lugar completo das manifestações ideológicas. Bakhtin vê na comunicação da vida cotidiana o lugar de constituição ideológica. Essa interação no cotidiano resulta das diversas ideologias existentes na sociedade. A ideologia se organiza,

[...] como um sistema lógico e coerente de representações (ideias e valores) e de normas ou regras (de conduta) que indicam e prescrevem aos membros da sociedade o que devem pensar e como devem pensar o que devem valorizar o que devem sentir o que devem fazer e como devem fazer. (BRAIT, 2007, p. 169)

Pode-se afirmar que os políticos se comunicam permeados por várias ideologias e por suas relações históricas estabelecidas com o partido político e sua vida social, evidenciando as formações discursivas as quais o sujeito do discurso político está submetido.
Nos estudos da Análise do discurso, é utilizado o conceito fundamental de formações discursivas que estão vinculadas às formações ideológicas. Numa formação ideológica - FI - podem existir várias formações discursivas - FD, as quais designam discursos diferentes, sendo seu espaço atravessado por discursos que surgiram de outros lugares. As formações discursivas vivem em constantes reformulações, um discurso proferindo outro, e estão inseridas em um lugar de lutas ideológicas. Segundo Brandão (2004, p. 48), "[...] são as formações discursivas que em uma formação ideológica específica e levando em conta uma relação de classe determinam o que pode e deve ser dito a partir de uma posição dada em uma conjuntura dada".
Imerso nas formações discursivas, o homem constrói seu discurso. Logo, o sentido de um discurso está relacionado a uma dada formação discursiva, que muda de acordo com a formação ideológica inserida e o posicionamento que o sujeito ocupa dentro do seu espaço de produção. Segundo Pêcheux (apud GREGOLIN, 2007, p. 68), "as palavras mudam de sentido ao passar de uma formação discursiva a outra".
Uma formação discursiva não é uma única linguagem para todos. Considerando-se que uma ou mais formações discursivas interligadas determinam aquilo que se pode e se deve dizer, o sentido muda conforme ela vai ser dita se é em forma de um sermão de uma exposição ou um programa. Isto é, as posições que a sustentam que estabelecem as mudanças de sentido de uma formação discursiva à outra.
Portanto, ao longo de uma vida, o homem aprende a enxergar o mundo através dos contatos discursivos a qual ele foi participante. "Que haja justiça para todos. Que haja paz para todos. Que haja trabalho, pão água e sal para todos. Que cada um de nós saiba que o seu corpo, a sua mente e a sua alma foram libertados para se realizarem". (MANDELA, 10 DE MAIO DE 1994).
Em um discurso político, deve-se considerar o contexto de comunicação como parte essencial da formação discursiva. Sendo que tudo que é dito nos discursos faz parte de uma formação discursiva. Esse fragmento mostra o tratamento que o político deseja que o povo tenha. Percebe-se que o discurso desse sujeito é formado a partir de diferentes formações discursivas que defendem os direitos do povo. O sujeito expressa sua ideologia pacifista, mostrando que tudo é fruto de formações discursivas as quais ele esteve imerso. Na sequência, apresentaremos uma síntese da proposta de Bakhtin sobre o discurso enunciado e polifonia.

Bakhtin e o discurso ? enunciado e polifonia

As teorias de Bakhtin têm grande contribuição para os estudos da linguagem. Para ele, é possível estudar as relações entre língua, linguagem, história e sujeitos, como lugares que produzem conhecimentos de forma séria e responsável sem precisar o uso de teorias e métodos dominantes de cada época. Diferente da proposta de AD de linha francesa que vê o sujeito assujeitado, submetido a fatores sociais, históricos e ideológicos, Bakhtin vê o sujeito ativo, interativo, de certa maneira livre para escolher as vozes que falam em seu discurso.
Brait destaca que o círculo de Bakhtin apresenta "o sujeito não como um fantoche das relações sociais, mas como um agente, um organizador de discursos, responsáveis por seus atos e responsivo ao outro" (2007, p. 25). O sujeito em Bakhtin se dá através da interação, e o seu contexto imediato, social se reproduz na sua fala e prática, em caráter dialógico.
Em Marxismo e Filosofia da Linguagem, (2004, p. 113), Bakhtin ressalta que "a situação social mais imediata e o meio social mais amplo determinam completamente e por assim dizer a partir do seu próprio interior a estrutura da enunciação". Entende-se que a situação é que dá forma a enunciação e os participantes do momento são quem determinam a forma e o estilo ocasionais da enunciação. A enunciação, por ser de natureza histórica e social, é ligada a enunciações anteriores e posteriores, o que gera novos discursos.
Desse modo, os discursos variam de acordo com a posição social e a interação que os sujeitos estabelecem entre si. É na interação constante dos grupos, que se organiza ao redor das atividades humanas, que se materializam os signos, que são compostos por uma duplicidade de sentidos, sendo diferenciado a partir do valor que cada sujeito ocupa. Diante de tais afirmações, podemos observar que é através da linguagem na interação verbal que o mundo se comunica, que é diante do outro e dos outros que os enunciados são proferidos.
Conforme Bakhtin (apud, BRAIT, 2007, p. 1994), "a polifonia se define pela convivência e pela interação, em um mesmo espaço da enunciação, de uma multiplicidade de vozes e consciências independentes e imiscíveis". Na perspectiva bakhtiniana, o discurso é constituído das relações dialógicas, como um palco de lutas e ideologias. Bakhtin concebe o enunciado discursivo como um lugar de diálogos onde vozes se cruzam. Sendo a linguagem diversificada socialmente, essas vozes podem criar polêmicas ou completar um discurso ou trazer respostas uma as outras.
Então, a polifonia ocorre como resultante da pluralidade de vozes sociais no discurso. Pode-se afirmar que o discurso analisado nesta pesquisa (discurso de posse de Nelson Mandela 1994) é atravessado por uma multiplicidade de vozes. Neste fragmento do seu discurso, "nosso grande medo não é o de que sejamos incapazes. Nosso maior medo é que sejamos poderosos além da medida", podemos perceber um discurso tecido por vozes provenientes da vida social e cultural, as quais não são definidas pelo autor discursante, mas o sujeito permite que elas interajam em seu discurso.
Essas são vozes das representações sociais e dos sistemas de pensamento revelam o quanto Mandela é um político que profere em seu discurso o livre arbítrio de um povo. Segundo Bakhtin (apud BRAIT, 2007, p. 135), "a consciência da personagem é a consciência do outro, não se objetifica, não se torna objeto da consciência do autor , não se fecha , está sempre aberta à interação com a minha e com outras consciências". Aquele que fala, fala usando aquilo que ouviu de outros, o que o personagem fala é tudo aquilo que já vivenciou, que presenciou, por isso serve como meio de transmissão de seu conhecimento, em consonância com o conhecimentos de outros.
Nesse trecho, percebe-se que o sujeito mantém a sua consciência interagindo com outras vozes que se tornam também sujeitos desse discurso. Embora no campo da política o político é visto de certa forma como um sujeito hierárquico que estabelece "poder" sobre o povo, Mandela através dessas vozes inseridas em seu discurso, estabelece uma ligação de igual para igual com seu público.
Nesse outro fragmento do discurso: "quem sou eu para ser brilhante atraente talentoso e incrível?" "Na verdade, quem é você para não ser tudo isso?" (MANDELA, 10 DE MARÇO DE 1994), ressalta-se que Mandela quer que seu público faça uma adesão aos mesmos valores ideológicos que constitui a sua formação, sendo que tais valores foram adquiridos no meio político. O capitalismo, a igreja, o estado e os anseios de um povo são vozes que soam em seu ambiente discursivo, cada uma com um sentido diferente, tais como, poder, valores e coerções. Mandela não se julga melhor que seu povo. Ele expõe a ideia de um governo igual para todos. Reconhecendo no "outro" (povo) os sujeitos de seu discurso, ele usa a noção de interação como condição para a construção de uma pátria melhor.
Segundo Bakhtin (2004, p. 113), "[...] a palavra é o território comum do locutor e do interlocutor". O discurso não é apenas transmissão de informação, mas sim efeito de sentido entre locutor e interlocutor. O sujeito usa a palavra como uma espécie de mediação entre ele e o povo, facilitando a compreensão das suas ideias. O político, antes de proferir o seu discurso, passa a conhecer o seu publico. Isso facilita os efeitos de sentidos que o discurso pode causar.
Segundo Orlandi (2002, p. 43), "os sentidos sempre são determinados ideologicamente. Não há sentido que não o seja. Tudo que dizemos tem, pois um traço ideológico em relação a outros traços ideológicos". Assim, o sentido do discurso se dá através de uma seqüência de fatores, a situação social do sujeito em que formação discursiva ele se inscreve, o lugar de onde o discurso vai ser proferido e o publico alvo.
Na afirmação "Não há nada de brilhante em encolher-se para que as outras pessoas não se sintam inseguras em torno de você". (MANDELA 10 DE MARÇO DE 1994). Mandela consciente que o público desse discurso é marcado por vários fatores sociais e, como qualquer político, quer ganhar aprovação do povo, faz crítica aos seus antecessores no poder sem provocar ofensas, desarmando a agressão. Ele diz que não está longe do seu povo, que não faz nada de diferente, quando se encolhe, pois é uma forma de falar com proximidade, uma maneira de deixar as pessoas à vontade ao seu lado.
Considerando-se que a África foi um país em que parte da população por ser negra era privada de todos os seus direitos, para que esse povo pudesse usufruir de certas liberdades foi preciso uma grande força política entrar em ação. Os efeitos de sentidos que esse discurso causou naquele povo foram um marco histórico para o recomeço e a para a permanência do político em seu poder.

O discurso político e o Ethos discursivo

Segundo Charaudeau (2008, p. 32), "toda fala política é, evidentemente por definição, um fato social". E qualquer enunciado por mais simples que seja, pode ganhar um sentido político, isto e, a situação do momento é que vai autorizar esse sentido. Charaudeau (2008, p. 40) afirma que "não é, portanto, o discurso que é político, mas a situação de comunicação que assim o torna. Não é o conteúdo do discurso que assim o faz, mas é a situação que o politiza". Percebe-se que sem uma situação de comunicação, nem o conteúdo nem o discurso político teria em si um sentido, sendo, portanto, necessário haver uma circunstância para poder gerar uma situação política.
Charaudeau (2008, p. 40) discute o discurso político em três tópicos:
? "O discurso político como sistema de pensamento" é o resultado de uma atividade discursiva que procura fundar um ideal político em função de certos princípios que devem servir de referência para a construção das opiniões e dos posicionamentos. É em nome dos sistemas de pensamentos que se determinam as filiações ideológicas.
? "O discurso político como ato de comunicação" concerne mais diretamente aos atores que participam da cena de comunicação política, cujo desafio consiste em influenciar as opiniões a fim de obter adesões, rejeições ou consensos. Ele resulta de aglomerações que estruturam parcialmente a ação política: comícios, debates, apresentação de slogans, reuniões, ajuntamentos, marchas, cerimônias, declarações televisivas e constroem imaginários da filiação comunitária, mas dessa vez, mais em nome de um comportamento comum, mais ou menos ritualizado, do que de um sistema de pensamento, mesmo que este perpasse aquele. Aqui o discurso político dedica se a construir imagens de atores e a usar estratégias de persuasão e de sedução.
? "O discurso político como comentário" não está necessariamente voltado para um fim político. O propósito é o conceito político, mas o discurso inscreve-se em uma situação cuja finalidade está fora do campo de ação política: é um discurso a respeito do político, sem risco político. Nesse caso, o discurso pode revelar a opinião do sujeito que fala, sem que se saiba o grau de comprometimento em relação à certa opinião. O discurso político pode ser construído de forma rigorosa, com teorias, em seu desafio de construir um sistema de pensamento e que mais tarde aparece em variadas situações de comunicação.
Segundo Charaudeau (2008, p. 42), "o discurso é constitutivo do político" que está ligado no interior da organização da vida social como poder e discussão. O discurso é, ao mesmo tempo, um lugar de envolvimento do sujeito, onde há justificação de seu pensamento e de influência do outro. Cada prática de discurso varia segundo os atos de comunicação.
O discurso político é acometido por uma questão de assujeitamento que se torna fundamental para sua construção. Desse modo, ao mesmo tempo em que se constroem sujeitos, enfrenta-se sujeitos já construídos. Na África do sul devido aos conflitos é as desigualdades sociais a maior parte da população comumente não se constitui como portadora de direitos. São esses os sujeitos que se encontram acolhidos em discursos políticos como de Mandela, que relata a questão da desigualdade é o preconceito social, um dos maiores problemas vividos pelo povo africano.
Ao afirmar: "da experiência de um extraordinário desastre humano que durou demais, deve nascer uma sociedade da qual toda humanidade se orgulhará". (MANDELA, 10 DE MARÇO DE 1994). Destaca tanto do desgaste físico quanto emocional que o povo africano foi acometido, sendo que Mandela foi um dos personagens centrais dessa história. Ele experimentou a prisão durante 27 anos, e, como um político, enxerga isso como experiência de vida.
É relevante destacar que neste trabalho a idéia de discurso mais apropriada é de o discurso político como sistema de pensamento. Mandela fundamenta seus discursos em um ideal político em função das lutas sociais, que a partir desses conflitos, constrói opiniões e posicionamentos que são por meio dos ideais políticos que determinam sua filiação ideológica. Vale afirmar que o discurso que compõe o corpus deste trabalho foi pronunciado em palanque na a presença de centenas de pessoas todas com olhares voltados para um mesmo ideal, a liberdade. Segundo Charaudeau (2008, p. 78),

Não é de se admirar que o político procure construir para si a imagem de um antecessor benfeitor, capaz de unir a condição humana da realidade social a um invisível ideal social, pois ele deve retribuir ao povo esse porquê que o fez conferir-lhe um mandato: o benefício de uma felicidade de ser.

É a população que consagra o político é o faz merecedor do seu cargo na política, é um servidor do bem comum, que passa a representar uma sociedade e ser um mediador responsável pelos problemas coletivos do povo. O discurso de Mandela é voltado para um público de pessoas menos favorecidas, excluídas. Esse povo atribui ao Mandela à responsabilidade de mudança e ao resgate social, acredita que, por ser um político, pode trazer o direito à liberdade para o povo africano.
Nesse fragmento do seu discurso (10 DE MARÇO DE 1994), Mandela diz que "cada vez que tocamos no solo desta terra, experimentamos uma sensação de renovação pessoal. O clima da nação muda com as estações". Ao afirmar isso, Mandela vê o público como aliado político e o convida o povo a fazer um trabalho coletivo para a reconstrução daquele país (África), palco de lutas raciais. Nota-se que o discurso político pode ser usado para tentar seduzir, como é o caso de Mandela, que tenta atrair seu ouvinte com um discurso de esperança cheio de sentimentos positivos.
Compreende-se que Mandela usa essa forma de discurso porque sabe que seu público passou por todas as experiências de sofrimentos. Assim como Mandela viveu anos privado de liberdade seu país, também participou dessa "prisão", escravizado pelas imposições das leis capitalistas. Para Charaudeau (2008, p. 79),

O político deve, portanto, construir para si uma dupla identidade discursiva; uma que corresponda ao conceito político, enquanto lugar de constituição de um pensamento sobre a vida dos homens em sociedade: outra que corresponda à pratica política, lugar das estratégias da gestão do poder.

Visto dessa forma, o político deve criar duas instâncias para o discurso: uma voltada para o posicionamento ideológico e outra que corresponda à prática política, o lugar do gestor e do poder. Logo, o político está envolvido em dois lados: a emoção e a razão.

Esta união espiritual e física que partilhamos com esta pátria comum explica a profunda dor que trazíamos no nosso coração quando víamos o nosso país despedaçar-se num terrível conflito, quando víamos desprezados , proscrito e isolado pelos povos do mundo, precisamente por se ter tornado a sede universal da perniciosa ideologia e prática do racismo e da opressão social. (MANDELA, 10 DE MAIO DE 1994)

Nota-se que, nesse trecho, o político Mandela partilha com seu interlocutor os mesmos interesses. Mandela constrói um ideal para seu ouvinte, uma espécie de pacto de aliança, uma vez que ele oferece a África um sonho supostamente desejado por ele. E volta afirmar que sofreram juntos e juntos construíram uma sociedade melhor. Percebe-se que, nesse discurso, as marcas ideológicas do Estado e da igreja que também contribuíram para as coerções nesse país.
Segundo Charaudeau (2008, p. 241), "a arte do discurso político é a arte de dirigir-se ao maior número de indivíduos para fazê-los aderir a valores comuns." É nessa perspectiva que em outro fragmento do discurso Mandela (10 DE MAIO DE 1994) usa o seguinte posicionamento:

Agradecemos a todos os nossos distintos convidados internacionais por terem vindo tomar posse, juntamente com o nosso povo, daquilo que é, afinal, uma vitória comum pela justiça pela paz e pela dignidade humana, acreditamos que continuarão a apoiar-nos à medida que enfrentamos os desafios da construção da paz, da prosperidade, da democracia e da erradicação do sexismo e do racismo.

Mandela, em Conversas que tive comigo (2010), reconhece que o político precisa conhecer e estabelecer contatos com outras culturas, e nesse fragmento discursivo, faz agradecimentos às autoridades políticas que estavam presentes em seu discurso. Isso demonstra que é um político popular e usa as palavras como forma de fazer com que as pessoas, junto com ele, continuam os planos de fazer a África (mundo), uma nação livre em igualdade de direitos.
Segundo Charaudeau (2008, p. 86), "não existe um ato de linguagem que não passe pela construção de uma imagem de si". A partir do momento em que falamos, aparece uma imagem daquilo que somos por meio daquilo que dizemos. O posicionamento ideológico, o conteúdo do pensamento e a opinião não é tão levado em conta, mas aquilo que sobressai da relação que mantemos conosco e que oferecemos a percepção dos outros. O sujeito que fala não escapa à questão do Ethos.
O processo da construção da figura de Mandela no domínio político se deu através dos grandes acontecimentos que houve na sua vida e naquele país (prisão, conflitos e opressões raciais). Esses são fatores que contribuíram para a formação de seu personagem como um gestor público. A imagem de Mandela como político reflete no povo os seus desejos em comum.
O seu discurso menciona os dois lados: o dos menos favorecidos e o da alta sociedade. De um lado ele convence o povo de que sonhar é possível e de outro ele agradece e continua dizendo que a ajuda e a união entre os povos são necessárias.
Na imagem de um político que governa para o povo, Mandela coloca à frente de um ideal que é fazer da África um país democrático, construindo para o povo o retrato de um homem que resistiu a todas as práticas capitalistas possíveis. Pode se afirmar que intenção é mostrar ao mundo o seu projeto político, buscando convencer as pessoas a aderirem a sua ideologia de vida e seus valores.
Segundo Amossy (2008, p. 09), "[...] todo ato de tomar a palavra implica a construção de uma imagem de si". Para tanto, não é necessário que o locutor faça seu auto-retrato ou detalhe suas qualidades nem mesmo que fale explicitamente de si. Nota-se que a imagem vai se revelando conforme o desenvolvimento do discurso, sem precisar que o sujeito faça por ele mesmo uma autodefinição de sua imagem ao longo do processo discursivo.
É diante dessa visão que o político pode mostrar-se verdadeiro ou digno de fé. Segundo Maingueneau (apud AMOSSY, 2008, p. 16), "a maneira de dizer autoriza a construção de uma verdadeira imagem de si, na medida, que o locutório se vê obrigado a depreendê-la a partir de diversos índices discursivos ela contribui para o estabelecimento de uma inter-relação entre o locutor e seu parceiro". É no discurso político que a noção de ethos adquire para maingueneau, toda sua importância.
Não se pode dizer que existem marcas específicas do Ethos, o sujeito desenvolve diversos tipos de comportamento no espaço discursivo tais como o tom de voz, os gestos e as maneiras de falar e o conteúdo de suas propostas. Esses elementos fazem com que o sujeito se mostra de forma mais implícita do que explicita. Segundo Charaudeau (2008, p. 118), "[...] não se pode separar Ethos das idéias, pois a maneira de apresentá-las tem o poder de construir imagens".
No discurso político, a credibilidade é fundamental, uma vez que o desafio consiste em tentar persuadir determinado público de que se tem certo poder. Segundo os relatos de sua trajetória política no livro de Uma lição de vida, (2007), Jack Lang afirma que Mandela, através da sua história de vida política e social, assume como político defensor do povo a bandeira da libertação, condenando as leis injustas do estado.
Antes de produzir seu enunciado, Mandela se organizou usando estratégias políticas de acordo com aquilo que o povo africano necessitava e esperava do seu discurso e como político ligado ao povo ele sabia das condições do seu público para que ele pudesse expressar seu discurso.

Também gostaríamos de prestar homenagens às nossas forças de segurança, a todas as suas patentes, pelo destacado papel que desempenharam para garantir as nossas primeiras eleições democráticas e a transição para a democracia protegendo-nos das forças sanguinárias que ainda se recusam a ver a luz (10 DE MARÇO DE 1994).

Mandela como um político que veio para o povo como uma promessa não pode deixar dúvidas acerca da sua vida política e convoca o povo a apagar o passado e praticar o perdão. Ele "acredita" que pedir ao povo para perdoar o inimigo é uma forma de ele mostrar seu caráter passivo de um político dotado de virtude demonstrando uma forma de governar diferente, de um político religioso que vai a favor das leis da igreja em que o perdão é visto como um ingresso para o homem chegar ao céu. Mandela, como um político que interage com o povo, sabe da influência da igreja na vida das pessoas.
Esse ethos virtuoso revelado em Mandela coloca nele a marca de um político "diferente" dos outros que sempre teve em si o desejo de permanência, mostrando que seu engajamento com a política não foi motivado por uma ambição pessoal, mas sim por um ideal de vida.
Segundo Charaudeau (2008, p. 125), "o ethos da competência" exige saber e habilidade. Seriam domínio e conhecimento do seu campo de atuação mostrando suas experiências e poder que ele possui como um político. O político deve provar que tem os meios, o poder e a experiência necessária para realizar seus objetivos, obtendo bons resultados. É o que Mandela através dos seus discursos demonstra a seu público que conhece todos os princípios da vida política.
É pela visão do conjunto do percurso de um político que se pode julgar seu grau de competência. Mandela invoca esse ethos de competência que se construiu com suas experiências, estudos e funções exercidas ao longo do tempo. A imagem que se nota é que ele como político se mostra preparado para governar o seu país. Isso é o que pode ser percebido pelo interlocutor diante do seu ato discursivo.

Triunfamos no nosso intento de implantar a esperança no coração de milhões de compatriotas. Assumimos o compromisso de construir uma sociedade na qual todos os sul-africanos, quer, sejam negros ou brancos, possam caminhar de cabeça erguida sem receios no coração, certos do seu inalienável direito a dignidade humana uma nação arco íris, em paz consigo própria e com o mundo. (MANDELA, 10 DE MAIO DE 1994)
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O povo africano passava por momentos de conflitos e a solução salvadora consistia em propor medidas que deveriam reparar o mal existente. Mandela manifesta em seu discurso o defensor dessas medidas, aparece persuasivo e constrói para si a imagem forte de salvador da pátria. O público encontra nele o libertador de seus problemas. Isso refere a que ponto a construção do ethos é inerante ao discurso político.
Segundo Charaudeau (2008, p.163), "[...] o Ethos de solidariedade faz do político um ser que não somente está atento às necessidades do outro, mas que as partilha e se torna responsável por elas". O político,como um bom representante do povo deve estar atento às necessidades de seu público, desenvolvendo uma imagem de um político solidário voltado para as causas sociais, tais como moradia, educação e lazer, que são alguns dos fatores que compõem a vida de um indivíduo.
Esse ethos de homem solidário, generoso, preocupado comparece nos seus discursos, constituindo-se como um meio de fortalecer seu vínculo político. Nesse outro fragmento do seu discurso (10 DE MARÇO DE 1994) destaca "comprometemo-nos a libertar todo o nosso povo do continuado cativeiro da pobreza, das privações, do sofrimento da discriminação sexual e de quaisquer outros". Em grande parte dos trechos do discurso selecionado Mandela mantém argumentações religiosas retratando a prática do perdão da humildade.
Para isso apóia-se em crenças fortes, supostamente partilhadas por todos para causar efeitos em seus discursos, provando que é através da fé e do seu mandato como político que a África não será mais a mesma. As ações políticas de Mandela não surgiram dele sozinho, mas sim de um grupo político organizado que adere às mesmas ideologias de vida defendida por Mandela.
O político se fortalece através de suas propostas e de seu desempenho no seu partido a qual está vinculado. Segundo relata Jack Lang (2007), as lideranças políticas as quais Mandela pertence defende os mesmos ideais políticos que ele defendi em seus discursos, de ver a África um país livre.
Segundo Charaudeau (2008, p. 79), "o sujeito político deve também se mostrar crível e persuadir o maior número de indivíduos de que ele partilha certos valores". Mandela (2010) encontra na democracia uma forma de governar para todos. Ele consegue através de atos generosos na política partilhar valores com vários outros povos, espalhados por todo mundo. Mandela persuade seu público criando uma espécie de político dos menos favorecidos, sua forma de persuasão nasce do seu jeito político de ser e de se fazer política. Partilha com os ouvintes das mesmas idéias e dos mesmos sonhos, buscando o apoio de outras nações. Sua meta é caminhar juntos em um só pensamento com olhares múltiplos rumo à liberdade.
Em todo seu percurso enunciativo, Mandela faz o uso de suas palavras como métodos de auto-ajuda elevam a auto-estima do seu público com palavras confortantes de esperança, comportando-se como um líder religioso. Portanto Mandela como político sabia da necessidade de tais falas persuasiva no seu discurso para a construção de um novo tempo. Os discursos constituídos por Mandela têm o sentido de aproximar o seu público e de repassar a imagem de homem do "povo", que caminha junto com seu país. O seu papel é ajudar a África a se reconstruir e encontrar seu espaço no mundo.
CONSIDERAÇÕES FINAIS

O corpus de análise nesta pesquisa é o discurso político, sendo um discurso social que circula no interior dos grupos que o constitui. O discurso é constitutivo do político; ele está ligado à organização da vida social como governo e como discussão, para o melhor e para o pior. Ele é o lugar de engajamento do sujeito, de justificação de seu posicionamento e de influência do outro, cuja forma de discurso varia segundo as circunstâncias de comunicação.
De acordo com os conceitos da Análise do discurso, o sujeito se mostra assujeitado aos aparelhos ideológicos, o que diferencia dos estudos realizados por Bakhtin, que vê o sujeito, como sendo livre para escolher, seus dizeres, um sujeito interativo. No corpus analisado, reconhece-se um sujeito que interage com o povo e seu enunciado é portador de várias vozes enunciativas, que segundo Bakhtin, são vozes que manifestam em seu discurso, tais como a igreja, Estado, família. Mandela usa o discurso para conseguir apoio político do povo. No campo do discurso político, há uma forte presença ideológica referente às relações sociais e políticas do sujeito.
Tendo em vista que o sujeito procura persuadir o ouvinte a aderir suas mesmas ideologias de vida, neste trabalho foi abordada a noção de ethos, no intuito de mostrar a construção da imagem que o político faz de si em seus discursos, transparecendo seu caráter, seu estilo discursivo e suas crenças e valores. Nota-se que nos discursos de Mandela há uma forte ligação do sujeito com o público-alvo. O sujeito participa das mesmas ideologias de seus ouvintes.
O político se mostra preocupado com o povo, por ter vivido os mesmos conflitos que seu país sofreu. Isso é o que faz de Mandela um político diferenciado, com um jeito de governar, que traz para seu povo a esperança de tempos melhores. Entendemos que o discurso é uma prática, uma ação do sujeito sobre o mundo, quando pronunciamos um discurso, seja em qualquer contexto, agimos sobre o mundo. Análise do Discurso veio ajudar na compreensão dos sujeitos de uma sociedade e os efeitos de sentidos produzidos por seus diferentes discursos.

Abstract: This study present the Analysis of discourse, showing the political discourse of African President Nelson Mandela. The goal is to understand the effects of meaning that the discourse have on the listener. For this, based in studious of Analysis of discourse, like Gregolin (2007), Fiorin (1993), Brandão (2004), identifying discursive and ideological formation present in the political discourse of Mandela. This study presents also the concepts of statement and polyphony of Bakhtin, for who the subject is interactive and his discourse have done by multiplicity of voices. And yet this study show Saussure with his concept of language as an abstract system separate of speaks. It also analyses the corpus based on the notion of ethos, as the prospect of Ruthy Amossy (2008), Dominique Maingueneau (1997), and Patrick Charaudeau (2008), seeking to identify the images that the subject creates when makes your discourse.

Keywords: Discourse. Ideology. Ethos. Enunciate. political.



REFERÊNCIAS

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BAKHTIN, Mikhail. (Volochinov) Marxismo e Filosofia da Linguagem. São Paulo: Hucitec, 2004.

BRAIT, Beth. Bakhtin: conceitos-chave. 4ª Ed. São Paulo: Contexto, 2007.

__________. Bakhtin: outros conceitos-chaves. São Paulo: Contexto, 2008.

BRANDÂO, Helena H. Nagamine. Introdução à análise do discurso. Campinas: Editora da UNICAMP, 2004.

CHARAUDEAU, Patrick. Discurso Político. Tradução de Dílson Ferreira da Cruz e Fabiana Komesu. São Paulo: Contexto, 2008.

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FIORIN, José Luiz. Linguagem e Ideologia. São Paulo: Ática, 2007.

GREGOLIN, Maria do Rosário. Foucault e Pêcheux na Análise do Discurso: Diálogos & Duelos. São Paulo: Claraluz, 2007.

LANG, Jack. Uma Lição de Vida: Nelson Mandela /Jack Lang; Tradução Rubia Goldoni. São Bernardo do Campo: Mundo Editorial, 2007.

MANDELA. Nelson. Conversas que tive comigo/ Tradução de Ângela Lobo de Andrade, Nivaldo montingelli Jr. Ana Deiró. Rio de Janeiro: Rocco, 2010.

_______________. In: <http://maioresdiscursos.blogspot.com/2010/10discurso-de-nelsonmandela.html>. Acessado em 20 de março de 2011.

ORLANDI, Eni Puccinelli. Análise de Discurso: princípios e procedimentos. Campinas: Pontes, 2003.

SAUSSURRE, Ferdinand de. Curso de Linguística Geral. São Paulo: Cultrix, 2002.