A História se renova pelas nossas mãos

Por Edson Terto da Silva | 17/03/2010 | Sociedade

A História se renova pelas nossas mãos

 

Edson Silva

 

O genial poeta revolucionário Geraldo Vandré disse na música “Terra Plana”, de 1968, que: “ ... aos pés de muitas igrejas / Lá você vai encontrar/ Esperança e caridade/ Querendo se organizar/ E os cegos pedindo esmola/ E a Terra inteira a rezar...” Leio o livro Terra Nossa Prometida, de 2004, do meu amigo, jornalista José Pedro Martins, e não teve como não mergulhar na recente história social e política do Brasil, de nossa região e em especial de Sumaré, pois a obra trata dos 20 anos do Assentamento 1, fundado em 1984.

 

É a saga de homens e mulheres corajosos, operários, lavradores, religiosos, estudantes seminaristas, futuros lideres comunitários, enfim povo de valor e tanto cunho religioso, que o Zé Pedro não pode deixar de fazer analogia entre as famílias que zanzavam em busca de terra para plantar e o povo bíblico liderado por Moisés em busca da Terra Prometida, no livro do Êxodo. Uma comunhão com pão e vinho antecedeu a jornada em busca de terra.

 

Se eu fosse resumir o livro, apenas com o emocional, acredito que bastaria esta frase: "Quando sai de casa, meu filho perguntou onde eu ia. Eu disse que ia buscar um pedaço de chão pra nós morar e trabalhar. Ele disse que era pra mim não demorar. Com que cara eu vou voltar pra casa e encarar meu filhinho ? Eu vou continuar a luta". Não é pronunciamento de grandes generais ou ditos figurões de antigos livros de História. É a frase crua e simples do lavrador João Calixto, mineiro neto de índio e escravo, figura de brasilidade ímpar, mas que ainda buscava gentileza na sua própria pátria.

 

Infelizmente, o seu Calixto morreu há ano (11 de março de 2009), mas antes de ler a frase no livro do Zé Pedro, eu a tinha ouvido literalmente, com citação sobre quem era autor, da voz de outro personagem vivo do livro e da História sumareense, o professor de Teologia e Filosofia Francisco de Assis Pereira de Campos, o “Tito”, ou melhor, “Frei Tito”, que era seminarista, em 84, junto com o hoje prefeito de Sumaré José Antonio Bacchim(PT), jovens de coragem e ação, que não fecharam os olhos, não lavaram as mãos diante de injustiças e por isso, como citou o Ivan Lins numa música, podem sim se sentirem “... cada vez mais limpos...”

 

O impressionante é que ao apreciar um livro de História às vezes nem damos conta de que todos nós, exceto os omissos, somos personagens, mudando só os palcos das lutas em busca de conquistas. Calixto, Bacchim, Tito, Ulisses, Iram, padre Ferraro e tantos outros faziam História em Hortolândia, que era distrito de Sumaré; nós fazíamos História em Campinas em passeatas e comícios pelas Diretas Já, desafiando toques de recolher, dizendo que a luta era na rua e não nos camarotes.    

 

Acompanhamos palestras do Amazonas (João), da Beth Mendes, do Plínio Marcos, vimos o PT surgir e trazer Lula, fenômeno do sindicalismo paulista; a estrela colada no peito da  Regina Duarte, atriz que me decepcionaria, em 2002, com encenação de medo, mas que felizmente: “ a esperança venceu o medo”; o recebimento em primeira mão, em 88, da notícia da morte do líder seringueiro Chico Mendes (uma integrante da CUT me ligou no Correio, falava de Xapuri/AC, minutos após o crime, e temia que o fato fosse abafado). A História é mesmo dinâmica, se todos repararem somos personagens que nela se renovam e acredito que nossos atos tornam o travesseiro em macio repouso ou espinheiro de tortura.

 

 

Edson Silva, 48 anos, é jornalista da Assessoria de Imprensa da Prefeitura de Sumaré

Email: edsonsilvajornalista@yahoo.com.br