A Gestão Escolar na Perspectiva Emancipatória

Por José Sena da Silva | 03/04/2011 | Educação

A GESTÃO ESCOLAR NA PERSPECTIVA EMANCIPATÓRIA

Autor: José Sena da Silva (*)


RESUMO:

Com base na premissa defendida pelos autores Bordignon e Gracindo de que a gestão democrática se constrói ao serem respeitados os princípios de uma escola voltados para a inclusão social e que as relações de poder não se realizam na particularidade, mas na intersubjetividade da comunicação entre atores sociais. A gestão democrática da escola coloca-se numa perspectiva emancipatória (Saul, 2001), na medida em que se utiliza de instrumentos que conduzem ao debate, à co-participação e ao comprometimento dos segmentos da escola e da comunidade em seu entorno, que se traduz dentro do microcosmo da escola na realização de eleições diretas para diretores e na utilização dos Conselhos Escolares como instâncias deliberativas e fóruns consultivos, e no macrocosmo social no estímulo à participação em outras instâncias organizadas da sociedade. A Constituição de 1988 e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDB de 1996, estatutos que formalizam a legislação sobre a educação determinam a gestão democrática da escola como princípio na forma da lei. Porém, as conquistas que orientam os atores educativos são obtidas na vivência diária do cotidiano escolar, quebrando as esferas fechadas das estruturas democráticas do sistema e as barreiras do pensamento de alguns, acostumados à ação centralizadora e às rotinas autoritárias, ou seja, no enfrentamento da estrutura de poder existente, em qualquer esfera, seja municipal, estadual ou federal.

PALAVRA - CHAVE: Gestão democrática, Projeto Político-Pedagógico, Participação.

ABSTRACT

Based on the premise advocated by the authors and Bordignon Gracindo that democratic management is built on being the principles of a school focused on social inclusion and the power relations are carried out in particularity, but in intersubjectivity of communication between social actors. The democratic management of school places in an emancipatory perspective (Saul, 2001), in that it uses instruments that lead to the debate, co-participation and commitment of the segments of the school and the community around it, which is reflected within the microcosm of school in carrying out direct elections for directors and the use of School Councils as a deliberative and consultative forums, and social macrocosm in stimulating interest in other instances of organized society. The 1988 Constitution and the Law of Directives and Bases of Education - LDB 1996 statutes that provide for the legislation on education shall determine the democratic management of the school as a principle in the law. However, the gains that drive the actors are given by the educational experience of daily school routine, breaking balls closed system of democratic structures and the barriers of thought of some, accustomed to action centralizing and authoritarian routines, ie in the confrontation of current power structure in any sphere, whether municipal, state or federal.

WORD - KEY: Management democratic, political-pedagogical project, participation.


Introdução
Organizar o trabalho pedagógico na escola pública não é uma tarefa fácil. Além da complexidade que envolve todo o processo, a gestão escolar é algo abrangente, requer uma formação de boa qualidade exige do gestor um trabalho coletivo que busque incessantemente a autonomia, liberdade, emancipação e a participação na construção do principal instrumento da gestão participativa que é o projeto político-pedagógico.
Numa gestão democrática, o gestor precisará saber como trabalhar os conflitos e desencontros, deverá ter competência para buscar novas alternativas e que as mesmas atendam aos interesses da comunidade escolar, deverá compreender que a qualidade da escola dependerá da participação ativa de todos os membros da comunidade escolar, respeitando a individualidade de cada um e buscando nos conhecimentos individuais novas fontes de enriquecer o trabalho coletivo, mas da sua habilidade, principalmente, depende o sucesso da gestão.
A organização do trabalho pedagógico constitui-se numa estratégia educacional da qual depende a possibilidade para democratizar o processo ensino-aprendizagem. Então é de suma relevância para um gestor, implementar novas formas de administrar em que a comunicação e o diálogo estejam inseridos na prática gestora, dessa competência depende, também, a prática pedagógica do docente. Cabe ao gestor assumir a liderança deste processo com competência técnica e política.
A gestão escolar encontra eco no processo histórico do nosso País. Nesse processo de organização e reorganização da sociedade brasileira, as relações de poder dão o tom do avanço ou do retrocesso da democratização no sistema educacional. Não se pode negar que a estrutura do ensino, que insere a gestão da escola pública, é um reflexo desse contexto. Não há como não considerar que o processo histórico é um dos principais intervenientes da organização escolar e sua gestão.
Neste artigo discutiremos a gestão escolar sob a ótica defendida por Bordignon e Gracindo (2001) de que a gestão democrática se constrói aos serem respeitados os princípios de uma escola voltada para a inclusão social.

Gestão Educacional X Gestão Escolar

A educação é o objeto do fazer escolar. É pela educação que a escola existe. Ao longo de todo processo de desenvolvimento do Brasil, a educação foi o instrumento primordial para a formação do povo brasileiro e que, em última análise, viabiliza a prática da gestão escolar. O perfil da gestão educacional, pelo qual perpassa a gestão da escola ? do autoritarismo-conservadorismo à democrática ? há longo caminho ainda a ser percorrido. Qualquer avaliação que se faça verifica-se que a escola constituiu-se na instituição social mais importante neste panorama, um termômetro por assim dizer, pois seu papel é de conformação ou de transformação de acordo com a filosofia, o pensamento, o comportamento gerencial e as relações humanas que se estabelecem no cerne do modelo que se adota.
Sob este prisma se submetem os estudantes que necessitam, para viver numa sociedade democrática, de uma formação que lhes dê condições de construir uma visão sólida e crítica da realidade educativa, buscando alternativas coletivas para a superação dos problemas no âmbito social e escolar.
Historicamente, sabe-se que o catolicismo foi o principal interlocutor educativo desde os primórdios da colonização cujos evidentes resquícios perduram até nossos dias. No campo pedagógico o catolicismo foi responsável por um significativo espaço temporal e ideológico da escola pública. A estrutura gerencial educacional, nesse período, caracteriza-se absolutamente autoritário e centralizador respondendo ao sistema colonizador e de submissão à Coroa portuguesa, fortalecendo os valores da cultura escravagista de quase três séculos (Azevedo, 2001).
Com o advento dos movimentos republicamos e após superar alguns períodos revolucionários, a sociedade brasileira inicia um processo de discussão relativo à laisicização e o caráter democrático da educação nacional. É oportuno lembrar, neste ponto, as especificidades das transformações sócio-econômicas e políticas ocorridas no país a partir do século XIX. Neste panorama ainda não se coloca a questão do exercício dos direitos sociais e políticos da maior parte da sociedade brasileira. Ressalte-se que a centralização de poder e a hegemonia das classes dominantes faziam da educação ainda um problema. O mandonismo e o poder pessoal como formas de articulação de interesses sociais garantiam, seja pelas teias da lealdade, seja pela violência explicita, o conformismo das massas (Franco citado por Azevedo, 2001).
A educação entra no século XX com novas indicações, a problemática educacional emerge com vigor em meio à efervescência que tomava conta do país a partir da Primeira grande Guerra Mundial (Azevedo, 201); Surgem os movimentos nacionalistas e as transformações que, lentamente, vão se operando na sociedade brasileira.
Segundo NAGLE (citado por Azevedo, 2001):
No campo educacional, essas forças vão pugnar pela escolarização das massas, mediante campanhas de alfabetização, e pela universalização do ensino primário. Cobravam-se ações do poder central tanto no sentido de promover fundos quanto de estabelecer uma política nacional de educação (p. 25)
Em meados do século XX, mais propriamente a partir da década de 60, com a edição das Leis de diretrizes e Bases da Educação Brasileira ? Lei nº 4.024/61, Lei nº 5.692/71 ? a estrutura e gestão do ensino público passam a ser melhor sistematizado. A partir das emendas constitucionais e das leis voltadas para a educação, apesar das condições em que muitos Estados brasileiros receberam essas leis ? praticamente sem condições de aplicá-las, o sistema educacional brasileiro passou a ser gerenciado por legislação de âmbito nacional, com definições de modelos gerenciais e sistemas nos três níveis da federação, cada qual com suas competências e incumbências, inclusive com os repasses econômicos para a gestão técnica-administrativa e financeira.
Entretanto, foi a partir da atual Constituição Federal de 1988, com a regulamentação do Art. 205, com a promulgação da Lei 9.394/96, que as normas, regulamentos e leis específicas foram definidas para as novas bases de gestão e operacionalização do ensino brasileiro.
É a partir de então que se estabelecem para os sistemas os novos parâmetros da gestão do ensino e essa concepção chega até as escolas para, numa visão de construir uma nova escola, o discurso da gestão democrática na escola pública. Nessa perspectiva a gestão escolar deixa de ser apenas um modelo de administração de recursos materiais, econômicos e pedagógico focado na burocracia, para ser uma gestão que envolve um planejamento, uma execução do planejado e uma avaliação de todo contexto educacional focalizando o pedagógico como cerne principal da gestão escolar, pois este instrumento pressupõe um papel social emancipatório.

Pressupostos da Gestão Escolar

Para Bordignon e Gracindo (2001) a gestão democratizada da escola consiste na mediação das relações intersubjetivas, compreendendo, antes e acima das rotinas administrativas, a identificação das necessidades; a negociação de propósitos; a definição clara de objetivos e estratégias de ação; linhas de compromisso; coordenação e acompanhamento de ações pactuadas e mediação de conflitos.
A gestão democrática, dessa forma, precisa ser vista não somente como premissa básica de um novo paradigma, mas como um objetivo a ser alcançado e aprimorado na prática do cotidiano escolar.
Alguns elementos são essenciais nessa nova prática, mas a ausência de dois deles seria incompatível com a visão emancipatória: a autonomia e a participação.
Considerando as atuais condições, inclusive legais e jurídicas, o exercício da autonomia na escola não se faz sem criatividade e negociação. Cabe aos gestores educacionais resgatarem a escola como centro do processo educativo, ocupando os espaços não cedidos pelo sistema, por meio da participação e do planejamento coletivos.
Para Habermas (apud Gutierrez e Catani,1998) participar significa que todos podem contribuir, com igualdade de oportunidades, nos processos de formação discursiva da vontade e, ainda, participar consiste em construir comunicativamente o consenso quanto a um plano coletivo.
Na escola, essa participação pode ser materializada com o funcionamento efetivo dos Conselhos Escolares ou outras organizações semelhantes como preconizam o estatuto legal expresso pela legislação vigente.
A Constituição Brasileira de 1988 incorporou a gestão democrática como princípio do ensino público na forma da lei. Em verdade, algumas práticas democratizantes pontuais já vinham ocorrendo em diversos sistemas de ensino estaduais e municipais.
A existência de um Fórum nacional em defesa do ensino público e gratuito, reunindo entidades de todo o país, foi preponderante para a inclusão da sociedade civil no processo constituinte, em defesa não apenas da escola para todos mas de uma plataforma avançada que já apontava para a idéia de democratização da escola pública "numa visão da escola como espaço de vivência democrática e de gestão participativa" (Mendonça,1998), tendo como fim a melhoria da qualidade de ensino na prática dessa gestão participativa que prepara o indivíduo para o exercício de seus direitos e deveres.
A seu modo e muito lentamente os sistemas de ensino, após a promulgação da Carta Constituinte, iniciaram um processo para dar forma ao ordenamento constitucional, na busca de adaptação de suas legislações, estruturas de poder e funcionamento às demandas por participação presentes na comunidade escolar e na sociedade.
Depois de intensa mobilização do Fórum em Defesa do Ensino Público, em seguida transformado no Fórum em Defesa da Escola Pública na LDB, e de um período de grandes dificuldades na tramitação no Senado, a LDB é promulgada em dezembro de 1996 como a Lei 9394/96, contemplando a gestão democrática do ensino público como princípio e determinando o atendimento às peculiaridades locais; abrindo a participação aos profissionais na elaboração do projeto pedagógico da escola e à comunidade escolar, representada por seus segmentos em Conselhos Escolares ou organizações equivalentes, conforme legisla a Constituição Federal de 1988.
Além disso, em seu Art.12, a LDB estabelece responsabilidades e fixa incumbências das unidades de ensino na elaboração e execução da proposta pedagógica e, no Art. 15, inclui a ampliação progressiva da autonomia pedagógica, administrativa e de gestão financeira nas escolas.

Eleições na escola, colegiados e o papel do(a) diretor(a): uma relação de interdependência

Ainda em princípios da década de 1980, as bandeiras de luta dos movimentos sociais ocupavam o espaço escolar. A luta por democracia e por meios crescentes de participação política no macrocosmo social levava a uma vinculação desses movimentos por liberdades e participação para dentro dos muros da escola.
A campanha das Diretas Já é exemplo disso e provocou, quando as discussões giravam em torno da questão da indicação dos dirigentes escolares, uma mobilização centrada nas eleições diretas para diretores de escola e que "a ampla temática da gestão democrática fosse, de certa maneira, reduzida a esse mecanismo" (Mendonça,1998).
A indicação de diretores por razões meramente políticas ainda é largamente utilizada em muitos municípios brasileiros, sendo o provimento de cargo de diretor por indicação, geralmente, política a mais utilizado pelos sistemas educacionais e o segundo em importância nesse processo.
Em investigação realizada pela ANPAE (Dourado e Costa,1998), conjugada com dados colhidos nos sistemas de ensino (Mendonça,1998) entre os anos de 1996 e 1998, é possível constatar que dentre as nove formas de provimento do cargo de diretores relatadas, a de eleições chega a 31,3% da totalidade dos sistemas. Esse percentual tem importante participação dos municípios-capitais, já que em 73% deles a eleição é o processo predominante.
Não há dúvida de que a implantação do processo de eleições diretas para diretores, como superador do processo de indicação, é o procedimento, no mínimo, adequado quando o que se propõe é a gestão democrática da escola, mas esta não se concretizará apenas com a eleição de diretores com perfis democráticos. Há a necessidade de mudanças na estrutura de poder da escola.
A força reguladora do esquema de poder que envolve o funcionamento da instituição escolar seria, pelo menos teoricamente, ao limitar o poder monocrático dos diretores, exercida pela existência dos colegiados, mecanismo de poder utilizado pelos sistemas de ensino como expressão da gestão democrática e introduzido nas escolas como pilar da descentralização:

As relações de poder não se realizam na particularidade, mas na intersubjetividade da comunicação entre atores sociais. Nesse sentido, o poder decisório necessita ser desenvolvido com base em colegiados consultivos e deliberativos" (Bordignon e Gracindo, 2001, p. 165).

A existência de um instrumento, no caso o colegiado, representando os diversos segmentos da escola, um outro membro de associações de moradores ou representante similar da comunidade, em detrimento de falhas eventuais em seu funcionamento, promoveu um ganho na ampliação dos processos participativos e contribuiu para uma alteração na estrutura do poder escolar.
A construção da gestão compartilhada não diminui, no entanto, a importância do(a) diretor(a) enquanto liderança e condutor(a) das práticas educativas, apenas redireciona o foco da gestão, anteriormente centrado numa forma de ação autocrática e "paternalista" para outra forma de ação , esta democrática e determinada por decisões descentralizadas e dialógicas.
Segundo Bordignon e Gracindo (2001), a gestão democrática se constrói ao serem respeitados os princípios de uma escola voltada para a inclusão social, e:
? fundada no modelo cognitivo/afetivo;
? com clareza de propósitos, subordinados apenas ao interesse dos cidadãos a que serve;
? com processos decisórios participativos e tão dinâmicos quanto a realidade, geradores de compromissos e responsabilidades;
? com ações transparentes e com processos auto-avaliativos geradores da crítica institucional e fiadores da construção coletiva.
Dessa forma, a gestão democrática constitui-se num componente decisivo em todo o processo coletivo de construção do planejamento, organização e desenvolvimento do projeto político-pedagógico e de um ensino de qualidade (Ferreira, 2001), podendo a escola cumprir sua função social e seu papel político-institucional na formação humana.
Ainda segundo Bordignon (2001) é preciso superar a visão simplificadora e reprodutivista da gestão escolar, resquício do paradigma positivista. Para Lück (citada por Bordignon) a escola supera essa concepção conservadora e vivencia a gestão democrática cumprindo seu papel social emancipador quando passa da:
? Ótica fragmentada para a ótica globalizadora;
? Da limitação de responsabilidade para sua expansão;
? Da ação episódica para o processo contínuo;
? Da hierarquização e burocratização para a coordenação;
? Da ação individual para a coletiva.

A gestão democrática da escola e sua função social emancipatória


Ao promover a participação e compromisso da comunidade em seu entorno, a gestão democrática consegue ultrapassar a estrutura física da escola e estabelecer um elo de co-responsabilidade com a comunidade externa, a quem na realidade a escola pertence.
Essa retomada da função política e social da escola a situa no exercício de um importante papel, o de contribuir para a organização da sociedade civil (Gutierrez e Catani, 1998) e, portanto, tornar-se agente de transformação, indo além da promoção da dinâmica do Estado e articulando os atores sociais.
Isso significa que a escola embora represente a esfera estatal, também forma e organiza os sujeitos sociais que irão constituir-se em cidadãos para o embate, a leitura de mundo e o debate, levando a posturas que possam construir novos posicionamentos na prática social e nas estruturas de poder mais amplas da sociedade. Ou seja, mudar o mundo, emancipar-se individualmente e coletivamente, emancipando o outro.
No pensamento de Ferreira (2000) a gestão democrática da educação é hoje um valor já consagrado. É indubitável sua importância como um recurso de participação humana e de formação para a cidadania. É indubitável sua necessidade para construção de uma sociedade mais justa e igualitária. É indubitável sua importância como fonte de humanização.
A gestão democrática se reveste, sob esse ponto de vista, de um canal de participação e de aprendizado para o jogo democrático e como contribuição efetiva para a reflexão e a ação cidadã.
Ao assumir o papel o gestor democrático deve necessariamente buscar a articulação dos diferentes atores em torno de uma educação de qualidade, o que implica uma liderança democrática, capaz de interagir com todos os segmentos da comunidade escolar. A liderança do gestor requer uma formação pedagógica crítica e autônoma frente aos ideais neoliberais. Nesse sentido, o objetivo é construir uma verdadeira educação com sensibilidade e também com destrezas para que se possa obter o máximo de contribuição e participação dos membros da comunidade. Conforme Libâneo (2001)
A participação é o principal meio de assegurar a gestão democrática da escola, possibilitando o envolvimento de profissionais e usuários no processo de tomada de decisões e no funcionamento da organização escolar. Além disso, proporcionar um melhor conhecimento dos objetivos e metas, da estrutura organizacional e de sua dinâmica das relações da escola com a comunidade, e favorece uma aproximação maior entre professores, alunos e pais. (p.102)
De acordo com o autor, pode-se observar que a escola precisa ter liderança de um gestor comprometido com a qualidade da educação e com as transformações sociais que possibilite avançar o aluno nos mais variados aspectos: social, político, intelectual e humano. Organizar o trabalho pedagógico requer enfrentar contradições oriundas das diversas realidades que se encontram numa escola pública, daí a necessidade da escola educar para a democracia, e essa tendência pedagógica deverá ser observada ao longo dessa labuta.
Há pouco tempo, o modelo de gestão escolar se configurava num diretor autoritário e submisso aos órgãos centrais e sua função se restringia a de administrador de determinações estabelecidas pelas instâncias superiores. O processo de autonomia da escola se deu a partir da década de oitenta quando tomaram posse os primeiros governantes eleitos pelo voto direto. A partir daí a discursam por uma educação democrática ganhou amplitude e vários movimentos começaram a incentivar a luta por uma escola participativa, autônoma e de qualidade.
Já foi o tempo da existência dos manuais escolares. A sociedade atual exige das instituições de ensino a formação do estudante participativo, polivalente, crítico e criativo. Os avanços científicos e tecnológicos, principalmente, ligados à comunicação e informação, exigem uma escola dinâmica, que vá além da transmissão de informações e se comprometa com a aprendizagem significativa de seus estudantes. Transformar a informação em conhecimentos, garantir o acesso do cidadão aos bens culturais produzidos histórica e socialmente pela humanidade e, contribuir para a formação da cidadania plena são os objetivos da educação neste novo milênio, fundamentados nos novos paradigmas científicos e tecnologia de ensino.
Por algum tempo acreditava-se que todos poderiam aprender as mesmas coisas ao mesmo tempo e da mesma forma. Os seres humanos precisam ser respeitados em suas singularidades e nas múltiplas interferências. Os contextos sócio-culturais formam novos sujeitos e, estes por sua vez, formam novos contextos. A globalização e as rápidas transformações pelas quais passam o mundo social, onde o homem é ao mesmo tempo, único e múltiplo (MORIN), exigem um ensino contextualizado e interdisciplinar.
Já foi o tempo em que se separava a razão da emoção. Percebemos aspectos da condição humana, inseparáveis e indissociáveis, que fazem da escola local de sentimentos e história de seus protagonistas. Não é possível conceber uma escola sem a experiência da comunidade onde ela está inserida. O contexto será sempre local de aprender, reaprender e ressignificar saberes e conhecimentos.
Hoje mais do que nunca se busca formar cidadãos no sentido ético diante de si mesmo, dos outros e diante da natureza ? não é possível maltratar, depredar e destruir o meio onde se vive ? é preciso preservar a vida, por isso, educar é, também, cuidar do planeta Terra.
Já foi o tempo em que a escola ? o gestor, professor e o técnico se fechavam numa caixa-preta. O ideal é que a atividade administrativo-pedagógica seja acompanhada, discutida e avaliada sistemática e coletivamente por todos os atores do processo que perpassam o ensino-aprendizagem, dando sentido e provocando novos olhares sobre o projeto educativo e os objetivos de ensino.
A grandeza da tarefa do gestor escolar para presidir o planejamento, a elaboração e avaliação do Projeto Político-Pedagógico requer deste gestor o cultivo da virtude da humildade, de saber-se não dono da verdade, de aprender sempre com os demais atores.

Considerações Finais

A gestão democrática da escola coloca-se numa perspectiva emancipatória, na medida em que se utiliza de instrumentos que conduzem ao debate, à co-participação e ao comprometimento dos segmentos da escola e da comunidade em seu entorno, que se traduz dentro do microcosmo da escola na realização de eleições diretas para diretores e na utilização dos Conselhos Escolares como instâncias deliberativas e fóruns consultivos, e no macrocosmo social no estímulo à participação em outras instâncias organizadas da sociedade.
A Constituição de 1988 e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDB de 1996, compuseram o cenário jurídico e legal, ao determinarem a gestão democrática da escola como princípio na forma da lei. Porém, as conquistas que orientam os atores educativos são obtidas na vivência diária do cotidiano escolar, quebrando as esferas fechadas das estruturas democráticas do sistema e as barreiras do pensamento de alguns, acostumados à ação centralizadora e às rotinas autoritárias.
A escola, apoiada no paradigma da participação e da solidariedade, precisa formar sujeitos capazes de pensar e construir com singularidade, compreendendo a multidimensionalidade das relações intersubjetivas na escola e na sociedade; aprendendo e lidar com as diferenças e cultivando o sentimento de igualdade, em relações horizontais de respeito ao outro.
Num mundo onde são favorecidos os processos de sujeição e exploração, a escola enquanto locus fundamental para o desenvolvimento das habilidades cognitivas e núcleo sistematizador do conhecimento e da cultura, precisa fazer o que lhe cabe, empreendendo um enfrentamento, com base no debate e na ação educativa, que se contraponha à lógica do consumismo, do produto descartável que tem transformado o homem e a natureza em meros objetos de consumo, e onde qualquer tentativa de resistência é punida com a exclusão.
Nesse sentido, um projeto político-pedagógico, construído com a participação de todos, considerando a existência dos Conselhos Escolares, tem importância fundamental na implementação dessa escola na nova sociedade do conhecimento, balizada por valores éticos de inclusão social e de saberes. Portanto,

O projeto pedagógico ao se constituir em processo participativo de decisões, preocupa-se em instaurar uma forma de organização do trabalho pedagógico que desvele os conflitos e as contradições, rompendo com a rotina do mundo pessoal e racionalizado da burocracia e permitindo relações horizontais no interior da escola. (Veiga, 1998, p.13)

Porém, para que ocorra o processo de democratização é preciso que se construa o consenso, que reivindica a igualdade nos processos decisórios, e este só pode ocorrer em relações dialógicas e num trabalho pedagógico centrado na critica reflexiva que possibilite a existência de espaços para desencadear momentos de reflexão, tanto individuais quanto coletivos.
Pensar, discutir, refletir, agir. Ou seja, Ação-reflexão-ação.
Essa dinâmica precisa estar integrada ao fazer da escola democrática, sempre tendo em mente que o conceito de democracia é diluído se ele não se orienta pela possibilidade da realização das condições de vida ideais para o ser humano.

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(*) Pedagogo, Especialista em Gestão Escolar.