A FORMAÇÃO DOCENTE NA PERSPECTIVA DA EDUCAÇÃO DO CAMPO
Por Daniela Fátima Bellé Ponsoni | 06/09/2018 | EducaçãoDaniela Fátima Bellé Ponsoni
UNEB - DCH CAMPUS IX BARREIRAS
Nilza da Silva Martins
GEPEC/CNPQ/UNEB
Resumo: O presente trabalho objetiva refletir sobre a formação de professores e sua relevância para a prática docente na educação do campo, o perfil dos docentes, sua atuação, o apoio pedagógico e as políticas para a formação de educadores do campo. Sua gênese ancora-se nos estudos realizados no componente curricular Educação do Campo realizado no Campus IX – Barreiras da Universidade do Estado da Bahia. Trata-se de uma pesquisa bibliográfica e, para tanto, tomam-se por base os estudos realizados por ARROYO, CALDART, MOLINA (2011), PIMENTA (2004) e FREIRE (1998), entre outros. O trabalho evidencia a realidade de muitos professores do meio rural, que possuem formação insuficiente ou inadequada, pouco ou nenhum apoio pedagógico, condições de trabalho precárias, materiais didáticos e projeto pedagógico desvinculados do contexto a que está inserida a escola. Desse modo, a formação de professores é fundamental tanto para criar condições favoráveis à prática docente, como também ser capaz de propor alternativas à sociedade, possibilitando aos alunos perceber a construção de sua identidade sociocultural, desconstruindo a homogeneização e os estereótipos produzidos pela sociedade.
Palavras – chave: Educação do Campo;Formação Docente; Movimentos Sociais.
Introdução
A estrutura da educação brasileira ainda se apresenta de maneira frágil no que se refere às discussões sobre a diversidade que constitui o país. Todos os anos, novas pesquisas surgem com o intuito de estudar os caminhos da educação, buscando contribuir para a diminuição das desigualdades que caracterizam o sistema de ensino brasileiro. Nesse trabalho, analisamos a formação do professor para a atuação na educação do campo, educação esta que foi incorporada ao projeto de políticas públicas a partir das fortes e históricas lutas dos movimentos sociais das últimas décadas.
Salientamos que a metodologia utilizada neste estudo ancora-se nos debates e reflexões realizados no componente curricular Educação do Campo do Curso de Pedagogia do Campus IX – Barreiras da Universidade do Estado da Bahia. No percurso deste componente tivemos a oportunidade de conhecermos a trajetória histórica da educação do campo e, neste texto específico, abordaremos a importância da formação do professor, os desafios pertinentes a esta temática e a importância das políticas de formação para os educadores do campo.
Para uma melhor compreensão de nossas reflexões, dividimos o texto em três momentos: o primeiro apresenta uma breve discussão histórica sobre a Educação do Campo na legislação educacional brasileira, em seguida trazemos a importância da formação do educador e, no terceiro momento os desafios em face do avanço das políticas neoconservadoras.
Caminhos de descaminhos da Educação do Campo
A Educação nos espaços rurais em nosso Brasil esteve sempre ligada aos interesses dos grupos hegemônicos, por isso não se efetivou como um espaço de construção de cidadania. Historicamente relegada pelas politicas públicas e também pelas leis educacionais, a educação era direcionada para atender os interesses da oligarquia rural. (LEITE, 2002)
É imperioso mencionar que a Educação do Campo foi deixada ao esquecimento e surgiu tardiamente pela iniciativa de latifundiários que visavam apenas preparar mão-de-obra especializada para operar as novas máquinas que estavam invadindo a zona rural em virtude da mecanização no campo. Criaram a escola no campo para capacitar o camponês, visando o aumento de seus lucros, advindos com a agroindústria.
Na atual conjuntura educacional percebe-se a preponderância de diversos problemas, dentre eles, a dicotomia urbano-rural, haja vista que o tipo de ensino realizado nas escolas do campo, não trabalha com conteúdos que fortaleçam a identidade e a cultura dos povos do campo, transmitindo conhecimentos urbanos, totalmente desarticulados e sem sentido ou significado para os sujeitos que vivem no campo.
As primeiras Constituições Federais do Brasil (1824 e 1889) não se referiram à educação rural, embora no século XIX nossa população fosse predominante camponesa, o que reforça a concepção de que para o povo pobre, escravizado da época a “caneta era a enxada”. “O poder público também se mostrou ausente, já que a agricultura apresentava-se como um setor em que as relações de trabalho não demandavam maiores qualificações para sua “modernização”. ( NETO, 2009, p.27) . Essa ideia prevaleceu por várias décadas e chegamos ainda no século XXI com a “escola cai não cai”.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (9.394/96) pautou em alguns artigos a educação do campo, conforme expresso no artigo 26, propondo que:
Os currículos de ensino fundamental e médio devem ter uma base nacional comum, a ser complementada em cada sistema de ensino e estabelecimento escolar, por uma base diversificada exigida pelas características regionais e locais da sociedade, da cultura, da economia e da clientela. ( BRASIL, 1996)
Complementando, o artigo 28 especifica os níveis de diferenciação a que deve se submeter uma proposta de educação do campo destacando:
[...] os sistemas de ensino promoverão as adaptações necessárias a sua adequação às peculiaridades da vida rural e de cada região, especificamente: I – conteúdos curriculares e metodologias apropriadas às reais necessidades e interesses dos alunos da zona rural; II – organização escolar própria, incluindo adequação do calendário escolar às fases do ciclo agrícola às condições climáticas; III – adequação à natureza do trabalho na zona rural. (BRASIL, 1996)
Nessa perspectiva percebe-se uma mudança significativa na forma de se pensar esse tipo de educação, pois a Lei determina que ocorram as adaptações necessárias para que o ensino se adeque a realidade do campo, respeitando o período de plantio e colheita, criando-se um currículo que articule as diversas áreas do conhecimento, propostas pedagógicas diferenciadas de modo a facilitar a aprendizagem do educando campesino. Em outros termos todo um arcabouço que faça os sujeitos do campo- homens, mulheres, jovens, crianças - reafirmarem sua identidade cultural.
Para construir a proposta de Educação do campo, é necessário que a escola e seus educadores tenham consciência do tipo de homem e mulher do campo que se pretende “formar”. Pois, numa perspectiva de transformação social, esta deve contribuir para a formação de seres autônomos, militantes sociais, e não de sujeitos dóceis, conformados com estrutura social vigente, oferecendo assim, uma educação efetiva, emancipadora e não compensatória.
Apesar dos avanços e conquistas, é conhecida a distância ainda existente entre a orientação da lei e sua aplicabilidade, sendo necessário observar como as questões de formação docente são vislumbradas na prática e o papel desse profissional na educação do campo. Há um sentido de urgência em tornar a educação do campo, cada vez mais um direito estruturado no objetivo de atender a diversidade cultural que permeia este espaço. O objetivo aqui é refletir sobre a relevância e os elementos necessários ao processo de formação docente para atuação na realidade da educação do campo.