A FILOSOFIA DE DESCARTES E A IDÉIA DO MÉTODO
Por Graça Mourão | 08/10/2010 | FilosofiaUNIVERSIDADE DO SUL DE SANTA CATARINA
Curso: Filosofia ? Bacharelado 3º período
A FILOSOFIA DE DESCARTES E A IDÉIA DO MÉTODO
Maria da Graça Silva Mourão
RESUMO:
A modernidade se configura em um período de grandes transformações nos mais diversos setores, trazendo em seu bojo a liberdade do homem em se posicionar através de questionamentos e reflexões, propiciando o desabrochar da racionalidade. Dentro desse contexto surge o racionalismo de Descartes, propondo um método que pretende universal, conduzindo o homem à valorização do pensamento ao propor um conhecimento completamente dominado pela razão.
Palavras-chave: Modernidade. Racionalidade. Método. Racionalismo Cartesiano
INTRODUÇÃO
Desde muito tempo, o homem busca explicação para suas próprias raízes e as bases para os fenômenos naturais percebidos por ele. Nesse sentido, cria e desenvolve a cultura, através de delimitações éticas e morais para a vida em sociedade. O pensar mais elaborado dá origem à filosofia, que se constitui em uma reflexão sistemática acerca da vida e de todas as coisas, cuja busca se faz em uma tentativa de aproximação com a sabedoria e a felicidade.
Várias são as vertentes filosóficas que antecedem o racionalismo da época moderna, que tem Descartes como um de seus maiores expoentes. A investigação acerca do conhecimento verdadeiro sempre contou com valiosas contribuições, encontrando na antiguidade grega uma base e um rico ponto de origem para conceituações que chegam à contemporaneidade.
RENÉ DESCARTES E A FILOSOFIA MODERNA
A modernidade constitui uma era de profundas transformações sociais, culturais, religiosa e científica. Fatores como a expansão marítima, a criação de novas cidades e um emergente modelo de sociedade, agora não mais feudal, entrelaçam-se, contribuindo e ao mesmo tempo, sendo possível pelo avanço da ciência. Vale lembrar as palavras de JUNGBLUT (2010) ao se referir à era Renascentista, prelúdio da fase moderna:
O crescimento gradativo da burguesia comercial e das atividades econômicas estimulou a vida urbana, que será típica da modernidade, diferentemente da vida rural do medievo. Com a ascenção da burguesia, evidencia-se uma maior mobilidade social. A partir dos novos (e mais individualistas valores), o prestígio do indivíduo passou a não recair somente em sua ascendência, podendo agora ser alcançado como resultado do esforço e do talento próprio. (p. 23)
O homem, a partir daí se vê livre para voltar sua lente sobre si mesmo e aos avanços tecnológicos crescentes. A arte se torna uma profissão bem conceituada e volta-se ao retrato de indivíduos. Concomitante a essas tendências, a racionalidade desabrocha, pois o questionamento e a reflexão são, a partir de então, características possíveis e capazes de propiciar mudanças.
No cenário de crise de indefinições e novos paradigmas próprios da Renascença surge o racionalismo de René Descartes e sua idéia sobre o método, servindo assim de uma espécie de modelo de transição entre o pensar renascentista e a filosofia da era Moderna. Segundo Marilena Chauí, cabe aí uma diferenciação relevante sobre as duas formas de pensamento:
(..) no Renascimento, o conhecimento operava com a noção de Semelhança, era descritivo e interpretativo. A diferença entre os renascentistas e os modernos consiste no fato de que estes últimos criticam a Semelhança, considerando-a causa dos erros e incapaz de alcançar a essência das coisas. (Chauí, 2010, p.5)
O Método cartesiano, referência principal da idade moderna institui um modelo que se propõe a buscar a verdade envolvendo as questões da metafísica e do problema do próprio conhecimento.
O GRANDE PENSADOR
René Descartes (1596-1650) , considerado o "pai da modernidade", desde muito jovem demonstrou interesse por matemática, geometria e álgebra. Embora fosse elogiado por seus professores, criticou a educação jesuítica que tivera, por considerar que o ensino da escolástica não conduzia a nenhuma verdade indiscutível.
Viveu em um período conturbado pelos desmandos da inquisição e, talvez por isso, após a condenação de Galileu, tenha decidido viver na Suécia a convite da rainha Cristina, onde veio a falecer, devido ao rigoroso inverno.
Foi um conhecedor da ciência de seu tempo, buscando o conhecimento em pessoas e lugares diferentes.
Meditações Metafísicas, Discurso sobre o Método, Regras para a Direção do Espírito, Tratado do Mundo, Princípios de Filosofia, Tratado de Paixões da Alma e inúmeras cartas constituem suas obras, tendo as duas primeiras como as mais relevantes no sentido de conduzir à razão a buscar a verdade das ciências.
O MÉTODO CARTESIANO
A palavra método origina-se do grego: caminho certo, correto, seguro, tendo um sentido vago e um sentido preciso, como afirma Chauí;
(...) Sentido vago, porque todos os filósofos possuem um método ou o seu método, havendo tantos métodos quantos filósofos. Sentido preciso, porque o bom método é aquele que permite conhecer verdadeiramente o maior número de coisas com o menor número de regras (...) (CHAUÍ, 2010, p.5)
Porém, é consenso entre os pensadores, a busca por um ideal matemático que sirva como uma verdade universal, a mathesis universalis. Descartes, como os estudiosos de seu tempo, também buscou a verdade, ocupando- se a aplicar a medida e a ordem a fim de obter uma afirmação indiscutivelmente verdadeira. Assim, ele parte do rigor matemático e de sua longa cadeia de razões. Para isso, estabelece quatro regras. São elas: da evidência ( aceitando como verdadeiro somente o que for claro e distinto), da análise ( dividir cada uma das dificuldades em quantas partes forem possíveis), da ordem ( ordenar os pensamentos pelos mais fáceis de resolver aos mais complexos) e da enumeração ( obter desmembramentos tão complexos para se ter a certeza de que nada tenha sido omitido).
Trata-se de um método que parte da dúvida metódica, onde começa duvidando voluntária e sistematicamente de tudo. Das sensações e afirmações do senso comum às próprias evidências científicas e verdades matemáticas. O pensador só interrompe a cadeia de dúvidas diante de seu próprio Ser que duvida. Nesse sentido, ao fazerem uma releitura de meditações do pensador, descrevem ARANHA e MARTINS (2010):
Enquanto eu queria assim pensar que tudo era falso, cumpria necessariamente que eu, que pensava, fosse alguma coisa. E, notando que essa verdade eu penso, logo existo era tão firme e tão certa que todas as mais extravagantes suposições dos céticos não seriam capazes de a abalar, julguei que podia aceitá-la, sem escrúpulo, como o primeiro princípio da filosofia que procurava. (p. 170).
Nesse viés, Descartes duvida até mesmo da bondade de Deus, colocando-o como um Ser enganador e maligno, capaz de empregar toda sua indústria para iludi-lo quanto a existência de todas as coisas. Supondo que tudo não passa de ilusão de um Deus ardiloso, termina por admitir que um Ser considerado soberanamente bom não o levaria ao engano, embora o permitisse. Vê-se aí que o sábio admite a existência de Deus, formulando uma prova, conhecida com prova ontológica;
(..) o pensamento desse objeto ? Deus ? é a idéia de um ser perfeito; se um ser é perfeito, deve ter a perfeição da existência, caso contrário lhe faltaria algo para ser perfeito. Portanto, ele existe. (ARANHA E MARTINS, 2010, p. 170)
Racionalista, percebe-se em seu método o caráter absoluto e incontestável da razão. Cogito, ergo sum. O intelecto aí cria uma dicotomia entre corpo e consciência. O primeiro possui uma natureza física, sujeito aos determinismos da natureza, como alimentar e caminhar. O segundo, expresso pelo pensamento, constitui para ele no único atributo que não pode ser separado de si próprio. "Logo, eu sou, eu existo por todo o tempo em que eu penso".
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Descartes estabeleceu princípios que valorizavam o raciocínio de forma radical e sistemática. Seu método veio a contribuir de modo definitivo para o pensar a partir de então. Não há como se falar em racionalidade sem citar a teoria criada por ele. Talvez a sua lição mais relevante no tocante ao conhecimento sobre o método cartesiano seja a idéia da dúvida a partir dos sentidos. Com efeito, esses podem enganar.
A leitura das "Meditações" suscita a reflexão de que o homem é capaz de utilizar o intelecto para chegar a grandes verdades, sejam elas universais ou apenas aquelas que dizem respeito às suas próprias crenças ao seguir um movimento de desconstrução de opiniões que lhe foram impostas.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ARANHA, Maria Lúcia de Arruda e MARTINS, Maria Helena Pires. Filosofando: Introdução à Filosofia. 4ª edição. São Paulo: Moderna, 2009.
CHAUÍ, Marilena. Filosofia Moderna. Universidade de São Paulo, USP. In: http.cfh.ufsc.br/Chauí.htm acesso em 05.09.2010
JUNGBLUT, César Augusto. História da Filosofia III: Livro Didático. 2. Ed. Palhoça: Unisul/Virtual, 2010.
MADJAROF, Rosana. In: HTTP// WWW.mundosdosfilósofos.com.br/descartes.htm