A Festa no Céu

Por Ridete Marçal de Barros | 13/02/2014 | Literatura

A Festa no Céu

Num dia ensolarado, o Senhor do Universo convidou todos os animais da floresta para um grande acontecimento que ocorria de tempos em tempos – a festa no céu.

As aves certamente acreditavam que, por terem asas, seriam as únicas convidadas para aquele evento. Achavam que o restante da bicharada devia ficar de fora.

A notícia da festa entusiasmou demais as aves. Muito animadas com a novidade, não paravam de falar da grandiosa festa, pelos quatro cantos da floresta.

Um sapinho, muito sonhador, e inquietamente ansioso por participar daquele baile, espalhou para todos que também fora convidado.

Ele confiava em que, mesmo sem asas, conseguiria chegar até o dito evento festivo.

Os demais bichos da floresta não paravam de rir do pobre sapinho, deixando-o muito triste.

Mas, como bom sonhador, nosso gentil batráquio não cessava de pensar em mil e uma maneiras de viajar pelos ares até a tão desejada festa.

Tentou subir por uma escada bem alta, porém não conseguiu alcançar o céu. Buscou outro modo. Experimentou colar asas às costas. Quase logrou êxito... Mas, para sua tristeza, o sol derreteu a cola, e o pobre sapinho – mais uma vez – não conseguiu voar alto.

Já estava por desistir, quando lhe ocorreu uma boa idéia: viajar dentro da viola do Senhor Urubu.

Ao chegar ao céu, o Senhor Urubu deixou a sua viola num canto reservado, para que ninguém mexesse nela.

O sapinho – muito esperto – esperou que o cabeça-pelada de casaco preto e os demais convidados se afastassem do local, para pular fora da viola.

Desastrado que era, o sapinho, tentando várias vezes sair da viola, acabou por derrubá-la no meio de uma sacada.

O açum-preto, que, da sacada, estava contemplando a vista, se assustou  quando uma viola caiu ao seu lado.

_ Ôxe, que danado é isso, home! Exclamou o pássaro nordestino.

O nosso querido sapo correu imediatamente para o salão de festa, com medo de que sua trela fosse descoberta.

Assim, o teimoso pulador conseguiu chegar àquela comemoração e realizar o seu mais lindo sonho.

A alegria do sapito era contagiante. Para o encanto do Senhor da grande festa chamada Vida, ele pulava, cantava, dançava...

O sapinho sonhador não parava de desfrutar o prazer de apreciar uma boa música, um saboroso menu e a extraordinária companhia dos participantes daquele grande evento.

A festa estava rolando às mil maravilhas, quando as aves perceberam a presença do nosso herói. Todas se entreolhavam e diziam:

– Mas... se ele não tem asas, como conseguiu chegar até aqui?

– Esse penetra é muito folgado! Retrucavam elas.

– Esse sapinho é muito enxerido! Como é que um batráquio insignificante conseguiu alcançar o céu? Indagava a si mesmo o Senhor Urubu.

Ora, o mestre da viola ficou a pensar como aquele sapinho teria chegado até ali. Ele não conseguia acreditar naquela façanha e ficou a imaginar como tudo teria acontecido.

Quase que por acaso, deu um estalo na mente do invejoso urubu, fazendo-o lembrar-se a imensa dificuldade que teve de transportar a sua viola até a dita festa.

Naquele instante, o Senhor Urubu resolveu procurar a sua viola, na esperança de encontrar pelo menos uma pista que o ajudasse a desvendar o mistério.

Para sua surpresa, a viola não mais se encontrava no local em que ele a havia deixado, no momento da chegada.

Procurou, procurou, procurou... nada de encontrá-la. Foi então que exclamou:

– Aquele sapo metido sumiu com a minha viola, só para eu não descobrir sua artimanha!

– E agora, o que é que vou fazer? Questionava o Senhor Urubu.

Resolveu voltar à comemoração e perguntar às outras aves o que teria acontecido com a sua viola.

Perguntou a Dona Águia se ela sabia do paradeiro da sua viola, e ela muito formalmente retrucou:

– Ora, Mestre Urubu, o Senhora acha realmente que eu perderia meu precioso tempo em me preocupar com um instrumento tão pífio?

Mas o Senhor Urubu não lhe deu ouvidos, e continuou avidamente a procurar sua viola.

Sabia ele, naquele momento, que a única forma de descobrir o segredo da vinda do sapinho àquela festa no céu seria por meio do seu instrumento de cordas – sua bela viola.

No meio da festa, porém, misturado à multidão, tropeçou no camarada Açum-Preto, que, muito irritado, gritou:

– Eta, abestalhado! Tá cego? Não vê por onde anda?

Em voz baixinha, continuou a resmungar:

– Hoje é o dia! Primeiro, deparo com a queda daquele berimbau de doze cordas, que, por pouco, não me arrebenta todo. Depois, é a vez de esse urubulino aparecer do nada, e que quase me esmaga.

Ao escutar toda aquela lamúria, mestre Urubu abriu um largo sorriso de satisfação.

– Ah! Nem acredito que esse palerma vai me ajudar a desvendar meu precioso enigma. Pensou o Senhor Urubu.

Muito cordialmente, o detestável urubu se aproximou do açum-preto e, ao pedir-lhe desculpas, aproveitou para saber mais sobre o enredo daquele misterioso sumiço da sua viola.

O simpático pássaro, sem perceber a real intenção do cabeça-pelada, contou-lhe tim-tim por tim-tim o que lhe tinha acontecido na sacada do paraíso.

O Senhor Urubu, com um sorriso nos lábios, correu até o lugar indicado pelo açum-preto.

Para seu contentamento, lá estava a viola caída ao chão, mas sem nenhum arranhão.

O Senhor Urubu aproximou-se da sua viola e, cuidadosamente, como bom investigador que era, averiguou se havia indícios suficientes para a confirmação da sua suspeita – o sapinho tinha realmente chegado àquela festa na sua viola!?

Nosso cantador da lagoa estava tão entusiasmado, que não percebia o tanto de inveja das aves, principalmente do Senhor Urubu.

Como ele tinha bebido sangria além da conta (arf, arf, arf...), resolveu se refrescar na sacada. Foi quando pôde escutar do maldoso urubu comentários a seu respeito.

– Ah! Então foi dessa maneira que esse sapinho enxerido chegou até aqui, enganando a mim e a todos. Ele vai me pagar muito caro, por ter-me feito de bobo! – Exclamou o Senhor Urubu muito irritado.

Sem perceber a presença do sábio sapinho, pôs-se a tramar uma verdadeira intriga.

O sapinho saiu de mansinho, sem ser visto. Finda a festança, a maioria das aves voltou para a floresta.

A princípio, o sapinho sonhador ficou aterrorizado, sem saber como retornar para casa.

Mestre Urubu, ao deparar com o desespero do infeliz sapinho, resolveu lhe oferecer ajuda.

– Vamos, amigo! Entre na minha viola, que lhe darei carona até solo firme.

O sapinho, que não era nada bobo, aceitou a oferta, porém se preveniu.

No meio da viagem de volta à floresta, o Senhor Urubu não teve a menor dúvida, e jogou o coitado do sapinho viola abaixo.

No entanto, para sua surpresa, nosso querido sapinho, ao cair em queda livre, gritou a sorrir:

– Quem não tem asas, usa paraquedas!

O batráquio paraquedista voou até terra firme.

Deus e o mundo, exceto as aves, ficaram felizes com a aterrissagem segura do nosso querido sapinho.

A ousadia daquele animalzinho nos leva a uma grande lição: É preciso sonhar sempre, para poder superar o impossível.

FIM

 

Ridete Marçal de Barros