A felicidade não é deste mundo
Por SILNEY DE SOUZA | 03/09/2010 | ReligiãoEra um dia muito bonito. O sol brilhava forte reforcando os tons esverdeados daquele campo sem fim. Ali, próximo à beira da estrada o homem preparava a terra para um novo plantio. Parou alguns segundos para descansar e pensar um pouco na vida. Aliás, como estava dura aquela vida. Acordava ainda quando o sol nem havia nascido. Pegava cedo na enchada, sol escaldante, trabalho duro e cansativo, até o final do dia. Família grande, filhos pequenos que dependiam da sua renda para o sustento. Queria ter uma vida melhor, não tão difícil, mas, mesmo assim agradeceu ao Pai pela saúde e pelo amor em família. Apoiado no cabo da enchada, durante aqueles poucos segundos de reflexão, viu passar pela auto estrada um homem muito bem vestido dirigindo seu carro importado em alta velocidade e então pensou: "esse ai que é feliz!"
Este, por sua vez, nem viu aquele trabalhador rural na beira da estrada. Eram tantas as preocupações que passavam pela sua cabeça...
Compromissos, horários, reuniões, problemas da empresa para resolver, contas a saldar, uma infinidade de coisas para solucionar. Eram problemas em casa, separação da esposa, filhos envolvidos com drogas etc etc etc. As coisas estavam realmente difíceis. Levantou os olhos para o céu como que procurando algo que não soubesse bem e avistou ao longo um avião cortando rapidamente as distâncias e pensou com seus botões: "esse ai que é feliz!"
Mergulhado em suas reflexões, no entanto, estava o piloto daquele avião. Que vida mais desregrada, sem local fixo, cada dia em um local, uma cidade diferente, um país distante. Eram escalas de vôo a cumprir que não o permitiam fixar morada, família, amigos em nenhum local. Verdade que como resultado do seu trabalho ao longo dos últimos dez anos, conhecera o mundo, mas eram infindáveis as noites dormidas em hotéis, longe do convívio da família e dos amigos. Da cabine do avião apreciou a paisagem abaixo, lindos campos, belos tons de verde, misturando-se com os raios solares daquele belo dia, quando avistou bem longe, quase do tamanho de uma formiguinha, um trabalhador rural descansando o braço sobre o cabo de sua enchada e então pensou: "esse ai que é feliz!"
Como nos ensina o Evangelho Segundo o Espiritismo, a felicidade não é deste mundo:
"Não sou feliz! A felicidade não foi feita para mim! Exclama geralmente o homem, em toda as posições sociais. Isto prova, meus caros filhos, melhor que todos os raciocínios possíveis, a verdade desta máxima do Eclesiastes: "A felicidade não é deste mundo". Com efeito, nem a fortuna, nem o poder, nem mesmo a juventude em flor, são condições essenciais da felicidade. Digo mais: nem mesmo a reunião dessas três condições, tão cobiçadas, pois que ouvimos constantemente, no seio das classes privilegiadas, pessoas de todas as idades lamentarem amargamente a sua condição de existência. Diante disso, é inconcebível que as classes trabalhadoras invejem com tanta cobiça a posição dos favorecidos da fortuna. Neste mundo, seja quem for, cada qual tem a sua parte de trabalho e de miséria, seu quinhão de sofrimento e desengano. Pelo que é fácil chegar-se à conclusão de que a Terra é um lugar de provas e de expiações. Assim, pois, os que pregam que a Terra é a única morada do homem, e que somente nela, e numa única existência, lhe é permitido alcançar o mais elevado grau de felicidade que a sua natureza comporta, iludem-se e enganam aqueles que os ouvem. Basta lembrar que está demonstrado, por uma experiência multissecular, que este globo só excepcionalmente reúne as condições necessárias à felicidade completa do indivíduo. Num sentido geral, pode afirmar-se que a felicidade é uma utopia, a cuja perseguição se lançam as gerações, sucessivamente, sem jamais a alcançarem. Porque, se o homem sábio é uma raridade neste mundo, o homem realmente feliz não se encontra com maior facilidade. Aquilo em que consiste a felicidade terrena é de tal maneira efêmera para quem não se guiar pela sabedoria, que por um ano, um mês, uma semana de completa satisfação, todo o resto da existência se passa numa seqüência de amarguras e decepções. E notai, meus caros filhos que estou falando dos felizes da Terra, desses que são invejados pelas massas populares. Conseqüentemente, se a morada terrena se destina a provas e expiações, é forçoso admitir que existem, além, moradas mais favorecidas, em que o Espírito do homem, ainda prisioneiro de um corpo material, desfruta em sua plenitude as alegrias inerentes à vida humana. Foi por isso que Deus semeou, no vosso turbilhão, esses belos planetas superiores para os quais os vossos esforços e as vossas tendências vos farão um dia gravitar, quando estiverdes suficientemente purificados e aperfeiçoados. Não obstante, não se deduza das minhas palavras que a Terra esteja sempre destinada a servir de penitenciária. Não, por certo! Porque, do progresso realizado podeis facilmente deduzir o que será o progresso futuro, e das melhoras sociais já conquistadas, as novas e mais fecundas melhoras que virão. Essa é a tarefa imensa que deve ser realizada pela nova doutrina que os Espíritos vos revelaram. Assim, pois, meus queridos filhos, que uma santa emulação vos anime, e que cada um dentre vós se despoje energicamente do homem velho. Entregai vos inteiramente à vulgarização desse Espiritismo, que já deu início à vossa própria regeneração. É um dever fazer vossos irmãos participarem dos raios dessa luz sagrada. À obra, portanto, meus caros filhos! Que nesta reunião solene, todos os vossos corações se voltem para esse alvo grandioso, de preparar para as futuras gerações um mundo em que felicidade não seja mais uma palavra vã. FRANÇOIS-NICOLAS-MADELAINECardeal Morlot, Paris, 1863
Reflitamos!