A Estatística Presente nas Histórias de Vida dos Alunos
Por Tarciana Pereira da Silva Almeida | 29/05/2009 | EducaçãoRESUMO: O presente trabalho irá mostrar como se deu a sistematização
dos trabalhos com tratamento da informação realizados em uma turma de
1º ano do 1º Ciclo e que estavam associados a um estudo sobre a
história de vida dos alunos. O projeto começou a ser desenvolvido com a
pesquisa de vários aspectos da vida dos alunos, com a finalidade de
fazê-los compreenderem-se como sujeitos históricos. As pesquisas foram
realizadas em seus registros de nascimento, em perguntas a familiares e
aos próprios alunos. Após a pesquisa começamos então a fase de
tratamento da informação: contávamos o número de freqüências de cada
item presente na pesquisa, e construíamos juntos tabelas, a princípio,
e depois passamos a elaborar gráficos. Algumas das pesquisas que foram
realizadas foram: maternidade onde nasceram, idade deles no mês do
estudo, número de irmãos, mês de aniversário,etc. Uma das atividades
foi localizar suas alturas, em centímetros, em intervalos de números.
Os alunos faziam as leituras das informações e depois iam realizando as
atividades propostas com esses gráficos e tabelas. Como eram
informações que se referiam a eles próprios eles se sentiram bastante
motivados. Ao final dos trabalhos realizados pudemos verificar a sua
familiaridade com esses tipos de texto, que carregam informações
numéricas e estão presentes em diversos portadores como jornais,
revistas e livros. Eles já conseguiam, apesar de não dominarem
completamente o código escrito proceder a leitura de gráficos e
tabelas. Concluímos então que é possível sim, trabalhar com o
tratamento da informação já nas séries iniciais do ensino fundamental.
PALAVRAS-CHAVE: informação, gráfico, tabela, leitura e produção.
INTRODUÇÃO: O trabalho aqui relatado foi desenvolvido após os estudos realizados no Pró-Letramento (Programa de Formação Continuada de Professores dos Anos/Séries Iniciais do Ensino Fundamental) na área de Matemática, tendo como eixo norteador o Tratamento da Informação, com ênfase na Estatística, que é um ramo da Matemática que visa organizar, resumir, apresentar e interpretar informações. O objetivo desse trabalho foi fazer com que os alunos venham a compreender os procedimentos de coleta, organização, comunicação e interpretação de dados, utilizando tabelas e gráficos com informações que para eles tivessem significação. Por isso, resolvemos reunir o tratamento da informação às histórias de vida desses alunos.
DESENVOLVIMENTO: A Matemática é uma ciência que está presente em nosso cotidiano e é muito importante para a construção da cidadania pois ela nos instrumentaliza com conhecimentos científicos para que possamos nos inserir na sociedade atual, que torna-se a cada dia mais complexa, exigindo novos padrões de produtividade que exige sempre mais conhecimentos.A Matemática está presente em nossas interações diárias: precisamos saber ler as horas para não nos atrasarmos, precisamos saber fazer contas para não receberou passar troco errado, para saber quantos meninos tem a mais que meninas na turma, para prever a distância de um salto que precisamos dar, etc. Assim sendo, nós, professores, devemos fazer com que os nossos alunos percam o "medo" dessa disciplina, que por muito tempo foi tratada como uma disciplina dissociada da vida cotidiana. A Matemática é, conforme Carraher (1995, p.12) "não é apenas uma ciência: é também uma forma de atividade humana", pois ela está presente em nosso cotidiano e é utilizada por nós para organizarmos os objetos e eventos no mundo e na realidade em que vivemos. Precisamos, então, resgatar sua importância, percebendo-a como dinâmica e inerente as nossas vivências diárias. Segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais de Matemática (1997) o professor desempenha importantes papéis: o de organizador da aprendizagem,pois precisa planejar atividades que levem a execução de seus objetivos, o de consultor, porque deve fornecer ao aluno informações que ele ainda não consegue obter sozinho, de mediador, fazendo pontes entre os conhecimentos de diferentes alunos, de incentivador da aprendizagem, estimulando os alunos sempre à investigação e de controlador, no sentido de determinar prazos para realização das atividades, garantindo assim a qualidade do processo de ensino-aprendizagem. Ele deve proporcionar aos alunos um ambiente de trabalho que os estimule a criar, comparar, discutir, rever, perguntar, ter uma postura investigativa frente às informações que lhe chegam por diferentes canais. Ainda de acordo com os PCN's (BRASIL,1997, p.20) "O significado da Matemática para o aluno resulta das conexões que eleestabelece entre ela e as demais disciplinas, entre ela e seu cotidiano [...]". Dessa forma, achamos importante relacionar informações relevantes para a construção da identidade das crianças aos conhecimentos matemáticos que pretendíamos trabalhar, construindo um projeto didático. Fizemos a opção de trabalho por projetos didáticos há cerca de 05 (cinco) anos atrás pois acreditamos que essa é uma maneira de tornar a aprendizagem significativa, pois os alunos têm que mobilizar diversos conhecimentos, articulando-os para que surja então, um novo conhecimento. Para que ocorra a aprendizagem os conhecimentosdevem ser descontextualizados para depois serem contextualizados novamente em situações diferentes da inicial. No trabalho com projetos " todo conhecimento é construído em estreita relação com o contexto em que é utilizado, sendo por isso impossível separar os aspectos cognitivos, emocionais e sociais presentes nesse processo".(LEITE, 1996, p. 27). O trabalho que desenvolvemos e que encontra-se aqui relatado, durou 03 (três) semanas, ao longo das quais reunimos informações sobre cada criança colhidas de diferentes fontes: de seu registro de nascimento, de pesquisas junto aos seus familiares e a eles próprios.Depois as socializamos na turma e os alunos fizeram os registros de suas pesquisas em um livrinho intitulado "Minha história". Depois de preenchido esse livrinho, que demorou uma semana e meia, começamos, de fato, o trabalho com Tratamento da Informação. Conforme citado anteriormente, nosso objetivo eram ajudar os alunos a compreenderem como se coleta, organiza e interpreta dados fazendo uso de tabelas e gráficos. Os recursos utilizados foram muito simples: quadro branco, piloto, cartolinas para confecção de cartazes, folhas para mimeografar atividades, lápis de cor, fita métrica, desenhos de frutas em quantidade suficiente para todos os alunos e fita adesiva. Relataremos agora como se sucederam as aulas de Tratamento da Informação, voltada para a Estatística Descritiva, que é a área da Estatística que usa números para descrever fatos através da simplificação de informações, utilizando-se de gráficos e tabelas. Iniciamos as atividades perguntando a eles em que maternidade eles haviam nascido. Registramos no quadro o nome das maternidades e fui anotando com palitinhos a freqüência com que essas maternidade se repetiam. Ao final pedimos com que contassem essa freqüência e que alguns deles viessem ao quadro registrar esses números. Estava, então, feita a primeira tabela. Procedemos a leitura, perguntando: "Em que maternidade nasceram mais alunos de nossa turma?", "Em que maternidade nasceram menos alunos dessa turma?". Extrapolamos a informação numérica, fazendo com que se localizassem espacialmente: "Por que nasceram mais alunos na Maternidade Professor Barros Lima?" Essa pergunta foi feita pois essa maternidade é a que está mais próxima da comunidade em que eles moram e alguns alunos conseguiram estabelecer essa relação entre maternidade e local de residência das mães. Percebemos então, que os alunos, apesar de estarem no 1º ano do ensino fundamental já traziam algumas noções sobre como se faz a leitura de uma tabela. Os PCN's nos alertam para o papel da escola que é ampliar o universo de conhecimentos que as crianças possuem, dando a elas condições de estabelecerem vínculos entre seus conhecimentos prévios o os novos conteúdos que ajudarão na construção de novos conhecimentos. Falamos então que esse era um texto que continha informações numéricas, mas que não era o único com essa características. Transformamos então a tabela em gráfico de colunas e pedimos que umas crianças viessem até o quadro e mostrasse no "desenho" qual coluna (barrinha) indicava a maternidade em que havia mais alunos da turma nascidos. Eles foram capazes de localizar essa informação. Fizemos então uma atividade no caderno onde eles teriam que dizer quantos alunos nasceram em duas das maternidades pesquisadas e pudemos notar que a turma como um todo preferiu se orientar pela tabela, com exceção de um aluno, que consultou o gráfico. Num outro dia, havíamos feito um cartaz com os dias e meses de aniversário dos alunos para que eles consultassem a informação, se necessário fosse. Traçamos duas retas que dariam início a mais um gráfico e distribuímos um quadradinho de papel para cada aluno, orientando-os que, de um a um, levantassem de suas cadeiras e colassem um quadrinho no mês de seu aniversário. Alguns tiveram dificuldades por não estarem ainda dominando o sistema de escrita alfabético, mas fomos dando dicas e todos colaram seus quadrinhos. Depois chegou a vez de analisarmos em que mês haviam mais aniversariantes, por que os meses de junho e setembro não apareceram no gráfico, etc. Mais um dia se passou e a atividade foi a seguinte: Registramos no quadro a altura de cada aluno, em centímetrose estabelecemos intervalos de alturas (de 110 a 114 cm, de 115 a 119 e de 120 a 124 cm). Depois pedimos que tentassem localizar suas alturas em um desses intervalos.A localização de números em intervalos também está prevista nos Parâmetros Curriculares Nacionais como uma das competências a ser adquirida pela criança. Explicamos que o uso de intervalos seria necessário, pois senão a linha do gráfico ficaria imensa e ele não seria bem compreendido.A princípio foi complicada essa localização, mas como foi realizada coletivamente, eles foram compreendendo gradativamente e terminamos esse processo. Havíamos registrado com palitinhos. Desenhamos, então, um gráfico e perguntamos aos alunos até que altura deveríamos colocar essas barrinhas. Apesar de nem todos terem compreendido, três alunos conseguiram verbalizar a resposta corretamente. Em mais um dia letivo, colocamos no quadro números de 0 a 7 e pedimos que cada aluno viesse até o quadro e marcasse um palitinho ao lado de seu número de irmãos. Alguns alunos, que haviam faltado às aulas anteriores, não estavam conseguindo fazer a marcação correta, mas os colegas os orientavam, dizendo-lhes onde e como deveriam marcar (havíamos estabelecido que os palitinhos seriam marcados formando quadrados com uma barrinha na diagonal, com um total de cinco palitinhos). Os alunos receberam então uma tabela com algumas informações e deveriam completar com os números que faltavam. Essa atividade foi proposta em trios e pode-se afirmar que foram poucos os erros encontrados.Foi esclarecido para eles que nessa tabela não haveria como informar quantos irmãos cada aluno possuía, mas dava uma idéia global do número de irmãos, permitindo saber que a maioria da turma possuía apenas dois irmãos e apenas duas crianças não os possuía. Foram então colados gráficos em seus cadernos para que eles pintassem um gráfico com essas informações obtidas. Começamos então a usar uma legenda e, como foi a primeira vez, que havíamos associado cores às colunas, alguns alunos se complicaram, mas apenas cinco alunos não realizaram a tarefa a contento. Em outro dia, dispusemos desenhos de quatro tipos de frutas diferentes na mesa e pedimos que, um a um, viessem ao quadro colar sua fruta preferida. Todos vieram muito entusiasmados e começaram a contabilizar: "Maçã está ganhando!", "Só falta uma melancia para empatar!". Ao final da colagem, os alunos contaram cada fruta e pedimos que alguns viessem ao quadro registrar essas quantidades. Depois cada aluno recebeu um gráfico que foi colado ao caderno para que colorissem.Como na legenda, ao lado dos quadrinhoshavia o desenho das frutas, assim como no gráfico, isso é, como foi suprimida grande parte da informação escrita, não houve dificuldades na execução da atividade. Alguns alunos optaram por colorir com apenas uma cor e outros fizeram uso de quatro cores. Foi interessante escutar a observação dos alunos "É para pintar de baixo para cima, não é tia?", "Olhe, ela fez errado. Não é assim, igual ao meu?". Em mais um dia de aula, resolvemos mostrar a eles um outro tipo de gráfico: o de setores. Havíamos feito a transposição do gráfico de colunas do dia anterior para o de setores. Ao lado dos quadrinhos da legenda estavam novamente os desenhos das frutas. Esse gráfico estava colorido e disposto num cartaz. Com o objetivo de verificar se eles já conseguiam realizar a leitura de legenda, começamos a perguntar que fruta correspondia ao setor apontado pela professora. Para nossa grata surpresa, novamente eles não demonstraram dificuldades nessa leitura. Durante todo o projeto os alunos foram orientados, ora individualmente pela professora, ora em grupos. A avaliação do trabalho se deu de forma contínua, pois a cada aula era observada a participação dos alunos, seu envolvimento nas atividades, a realização das atividades solicitadas e eram realizadas algumas intervenções quando se verificava que o assunto não estava sendo compreendido por alguns alunos, de forma a favorecer a sua compreensão sobre a leitura de gráficos e tabelas .
CONSIDERAÇÕES FINAIS: Conforme pudemos estudar no fascículo 6 do Curso do Pró-Letramento de Matemática, o eixo do Tratamento da Informação auxilia o professor a trabalhar de forma que "[...] privilegie a coleta, a seleção, a organização e a interpretação crítica de dados quantitativos da realidade, as inferências baseadas em informações qualitativas ou dados numéricos [...]" (BIRAL, 2007, p.08). Acreditamos que com o projeto empreendido tenhamos propiciado aos nossos alunosa oportunidade de realizar coleta de dados (apesar de cada um trazer dados referentes a si próprios houve a socialização dos resultados para a construção dos gráficos e tabelas), a organização (pois fomos contando as freqüências dos dados frutos da pesquisa e colocando-os em gráficos e tabelas) e também a análise e interpretação dos dados à luz da realidade deles, extrapolando os limites da própria Matemática e fazendo ligações com outras áreas de conhecimento. Foi gratificante perceber o quanto eles estavam envolvidos com as atividades propostas e como eles buscavam se ajudar no processo de compreensão. Retomamos então a idéia citada anteriormente: os conhecimentos prévios desses alunos foram aproveitados, superados com questionamentos orientados pela professora, pois eles tiveram que sintetizar o que já sabiam, o que aprenderam durante as aulas e deram um salto de qualidade, construindo um novo conhecimento. Dessa forma pudemos dizer que conseguimos atingir os objetivos propostos ao início do projeto, fazer com que os alunos compreendesse como acontece a coleta, a organização e a interpretação de gráficos e tabelas, instrumentos estatísticos preciosos para a análise de nossa realidade.
BIBLIOGRAFIA
- BIRAL, Andressa Cesana et all. Pró-letramento Matemática: Tratamento da Informação. Fascículo 6. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Básica, 2007.
- BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais: Matemática. Brasília: Ministério da Educação e Cultura, Secretaria de Educação Fundamental, 1997.
- CARRAHER, Terezinha et al. Na Vida Dez, na Escola Zero. São Paulo: Cortez, 1995.
- LEITE, Lucia Helena Alvarez. Pedagogia de Projetos:Intervenção no Presente. Presença Pedagógica.V.2,n.8, mar/abr 1996.