A Educação nas Culturas Tradicionais - O Islã
Por Roberto Dana | 14/08/2009 | SociedadeA educação nas culturas tradicionais
" A cultura Árabe Muçulmana" .
Sendo considerada uma das maiores religião monoteísta do mundo moderno o Islã e a que mais cresce no mundo (com cerca de 1,3 bilhões de pessoas no mundo), tendo como principal região a África e a Ásia.
Hoje em dia não é difícil ligarmos a televisão ou abrirmos os jornais e nos depararmos com noticias do mundo árabe, principalmente fatos sobre o Islamismo. Essa presença marcante na mídia faz com que a cultura muçulmana seja hoje em dia uma das mais estudadas pelo mundo ocidental. Seus costumes, suas crenças, seu dia a dia nos revelam um mundo antagônico ao nosso e que está sempre despertando nosso interesse.
Uma frase de Jorge Palma (Texto Antropologia) define bem isso:
"Pode parecer estranho esse interesse pela diferença, pois de maneira geral, espera-se das disciplinas científicas justamente a superação da diversidade".
Foram esses motivos e a questão de ser filho de Judeus é que me levaram a um estudo profundosobre essa cultura tradicional, neste que estudo veremos que alguns tabus e mitos caem por terra ao nos aprofundarmos no estudo dessa cultura tão antiga e que tem contribuído com o desenvolvimento da humanidade, inclusive para mim que como descendente de Judeus tinha uma visão etnocêntrica em relação a esse povo.
Pela tradição Muçulmana, Maomé ( 570dC – 632dC), teria tido uma revelação do Anjo Gabriel, para que pregasse em nome de Allah por todo mundo. Tendo resistido a idéia no inicio, ele decidiu pregar a "revelação" que está registrada no Livro Sagrado chamado "Alcorão". Um dos principais pontos do Alcorão é piedade para com os outros, tanto que o significado da palavra Islã é " submissão a Deus".
É um dos deveres sagrados islâmico é ir a Meca (A cidade santa Muçulmana que fica na Arábia Saudita e é localizada nas planícies de Mina) pelo menos uma vez na vida e dar 7 voltas ao redor da Caaba (uma sala na qual acredita-se esteja a Pedra Sagrada).
No século IX, ocorreu a Sharia, que é uma lei paralela ao Alcorão. Nesta época foram instituídas algumas proibições, como:
As mulheres não podiam andar sem o chador ou um lenço na cabeça (ijhab), e não se deve nunca negar ou blasfemar da sua fé (podendo ser passível da pena de morte). Com a morte do Profeta Maomé ocorreu um "cisma religioso", criando duas visões sobre o islamismo ( Xiita e Sunita). As leis são aplicadas conforme os clérigos de cada país, podendo ser mais ou menos rígida. Tais doutrinas levaram a criação de vertentes antagônicas dentro do mundo muçulmano, fazendo com que a interpretação das leis provocasse situações totalmente adversas à pregada no Alcorão. Daí veremos a grande dificuldade de os jovens muçulmanos entenderem com exatidão a sua religião.
O Sheik (que significa ancião ou velho) é quem ministra os conhecimentos religiosos ao jovem muçulmano. Mas para isto ele deve freqüentar alguma Faculdade de Teologia Islâmica, e como existem poucas (a maioria fica na Síria, Iêmeme na Arábia Saudita) começa a dificuldade do futuro Sheik. A formação de Sheik visa ir mais fundo dentro do conhecimento sobre algumas questões religiosas, sociais e legais. Com duração de 4 anos, o curso tem disciplinas de direito Islâmico, História Muçulmana e questões civis atuais (com possibilidade de especialização como mestrado e doutorado).
Nada impede uma mulher de ser Sheik, contudo ela não poderá conduzir as orações dentro das mesquitas. O Sheik é responsável pelas atividades da mesquita como: Casamento e a orientação dos fiéis. A influência do Sheik na vida social e tão grande que qualquer questão, como: briga familiar, financeira ou matrimonial é sempre levada ao Sheik, afim de que ele solucione esses problemas (por isso um Sheik deve ser casado e ter uma vida equilibrada e bem estabelecida). Mesmo sendo vitalício, uma interpretação errônea do Alcorão pode dar fim a vida educacional de um Sheik, ele também pode pedir um afastamento afim de resolver algumas pendências em sua vida particular.
Como o Alcorão é considerado a palavra de Allah dada a Maomé, o sacerdote serve como modelo de conduta a ser seguido por seus pares.
Segundo a lei Islâmica não existe ninguém na terra que possa conduzir os anseios dos outros até Allah sendo assim o cargo de Sheik e estritamente educacional e por este motivo deve ter uma diretriz bem especificada a ser passada aos jovens principalmente, evitando assim um crescimento de ramificações fundamentalistas radicais. O Hammas e a doutrina Talibã são exemplos claros de etnocentrismo radical. Colocarmos questões estritamente políticas e pessoais, para nos guiarmos, como diz o teólogo Fernando Altemeyer Junior ( PUC de São Paulo) em entrevista a Revista das Religiões (Abril) em Setembro de 2004: "Nem mesmo Maomé serve de intermediário; ele é mensageiro da lei divina".
Como é grande o analfabetismo dentro dos países Islâmicos e a própria religião em si proíbe certos questionamentos, existe uma grande parte de setores político-religiosos que usam principalmente os jovens para fazer crescer uma discriminação contra o ocidente. Essa manipulação já ocorreu em outras épocas da humanidade no próprio Islã e em outras culturas (Romana, Grega, Européia, etc) onde todos os povos conquistados pelos muçulmano eram "convencidos" a aceitar o islamismo como sua religião para não sofrerem as mazelas que o mundo lhes fazia (a escravidão principalmente). Antes do seu nascimento as crianças muçulmanas já tem adquirido alguns direitos, como:
Al Ta'am - Alimentação: os pais têm o dever de alimentar seus filhos. Durante a gravidez a mãe deve observar cuidadosamente os alimentos e substâncias que ingere e que possam prejudicar o bebê. Este é um direito do feto. Após o nascimento é obrigatório para a mãe muçulmana amamentar seu bebê até os 2 anos de idade. Além da alimentação em si, laços de afeição entre a mãe e o bebê são fortalecidos.
A criança não deve ser privada destes benefícios e apenas nos casos em que a mãe não consegue amamentar o bebê deve-se recorrer a alimentos industrializados. Neste caso deve-se cuidar para que apenas ingredientes permitidos no Islam estejam contidos nestes alimentos. Segundo um "hadith" do Profeta Muhammad
Al Himayah - Proteção: é obrigação dos pais proteger seus filhos do perigo e de conceitos e idéias negativas que possam afetar seu caráter ou personalidade, veiculados através de televisão, influência na escola, nas ruas ou outro meio qualquer.
Al Tilbaba - Medicação: os pais devem se assegurar de que é dada à criança a medicação correta para protegê-los de doenças e cuidar corretamente de seus filhos quando eles estiverem doentes.
Al Malbas - Vestimenta: a criança tem direito a receber roupas adequadas à sua idade e ao seu sexo e que também sejam adequadas à estação do ano.
Al Nasab - Linhagem: a criança tem direito de saber quem são seus pais e de ser reconhecida por eles. Como consequência deste direito decorrem uma série de injunções islâmicas que são com freqüência mal-interpretadas por não-muçulmanos.
Para garantir esse direitos o Islã permite a poligamia. A partir dos 7 anos (idade de Tamiz) as crianças começam a aprender a fazer suas orações, a não cometer nada de Haram = ilícito e outros ensinamentos básicos da sua religião e cultura. O nome dado as crianças ocorre até o 7º dia de vida e segue alguns preceitos religiosos, esse nome não pode ser idolatra e nem fazer menção a personagens (jogadores de futebol, artistas,etc), no caso de a família morar em um país que não se fale o Árabe deve-se escolher um nome de fácil pronuncia para aquela região. Orienta-se os jovens a não casarem-se por Riqueza, Origem, Beleza e Religião, e sim somente pela religião. Tendo sua visão do mundo através dos olhos "e dos Óculos" dos clérigos (Sheik) mais velhos e com idéias preconcebidas da sociedade ocidental, muitas vezes fazendo surgir a intolerância, preconceito e radicalismo . Nos ensinamentos dados a estes jovens a diversos séculos eles tem tido uma oportunidade "impar" de alcançar prestigio social e riqueza para sua família (ou até dezenas de esposas),que é a JIHAD = Guerra santa.
Como a principal "mão de obra" terrorista vem dos jovens que não tem muito o que esperar nesta vida na Terra. Essa mesma juventude abdica de tudo para se entregar a atos terroristas afim de alcançar no "paraíso" algo que nunca alcançariam neste mundo.
A revolução Iraniana de 1979, foi o ponto de partida do renascimento fundamentalista atual Islâmico. Dele surgiram doutrinais educacionais que vigoram até a presente data entre os jovens muçulmanos.
Os fundamentalista do Talibã pregam uma guerra incessante contra o "Grande Satã", aonde os jovens não aprendem a ler e sim pegar em armas para combater esse "inimigo". Os recentes atentados ao EUA, atentados na Europa, a ditadura de Saddam Hussein no Iraque, a "Intifada Palestina" entre outros casos, fez surgir uma certa aversão e preconceito contra o Islã em todo mundo (principalmente nos EUA e parte da Europa) não separando o que é verdadeiramente o Islã e o que diz ser, fazendo com que surjam movimentos nacionalista visando atacar principalmente os jovens árabes que vivem nestes países.
O jovem que enxerga o islamismo pela ótica Xiita ( que é minoria entre os muçulmanos) tem uma visão radical quanto a questões domesticas com os Sunitas. Essa corrente Xiita foi por muito tempo o pensamento de maior expressão dentro do Islã (mesmo sendo minoria). As grandes diferenças entre os Xiitas e Sunitas, são:
Os "hadith" (as palavras e atos de Maomé e dos primeiros muçulmanos, usadas como suplemento ao Alcorão, para compreensão do Islã) são diferentes para Sunitas e Xiitas. Os Sunitas dão grande importância à peregrinação a Meca, enquanto os Xiitas dão também muita importância a outras peregrinações.
Os xiitas usam geralmente o termo Imã apenas quando se referem a Ali e aos seus descendentes, ao contrário dos sunitas. Os xiitas acreditam nos imãs que, como descendentes de Maomé e Ali, são vistos como seres com algo de divino. Os sunitas, por seu lado, acreditam em tradições baseadas em escolas teológicas e jurídicas que envolviam analogias do Alcorão e dos "hadith".
Os dois ramos partilham apenas três doutrinas: a individualidade de Deus, a crença nas revelações de Maomé e a crença na ressurreição do profeta no Dia do Julgamento.
Sem muito para seguir os jovens Islâmicos atualmente tem contestado muito a sua cultura e religiosidade (principalmente as mulheres) e de certa forma querem ter uma visão diferente da imposta pelos Sheik. Contudo as barreiras colocadas pela intolerância ainda gera frutos. Os jovens que vivem em países mulçumanos tem uma criação diferenciada do jovem criado na Europa, América Latina ou EUA. Nesses países os jovens tem tido um acesso maior aos meios de comunicações gerando um intercambio cultural e religioso e ideológico entre eles. Por sua vez na maioria dos países Árabes estes jovens não tem esse tipo de acesso e na maioria das vezes o único contato com outro jovem e no seio familiar (primos, irmãos, tios, etc) restringindo muito o seu meio social. O namoro quase não existe entre os jovens, pois na grande maioria das vezes os casamentos são arranjados por suas famílias e o encontro só acontece na cerimônia de núpcias. A diversão restringe-se a festas familiares ou festas religiosas. Mesmo numa cultura relativamente fechada como a Muçulmana, já podemos ver em alguns países Árabes a construção de boates, parques temáticos, cinemas, etc, como ponto de partida aceitação do meio de vida ocidental, contudo tais fontes de lazer geralmente são usadas por turistas, visto que a desigualdade social e latente neste países.
A influencia familiar na educação cultural dos jovens e de vital importância, mesmo que na sua grande maioria estes sejam filhos de gerações analfabetas. Essa falta de escolaridade entre os muçulmanos parece estar com seus dias contados, pois em diversos países Árabes tem surgido projetos de inclusão sócio-educacional destes jovens afim de que tenham uma interpretação correta do Alcorão e não sejam influenciados conforme anseios políticos momentâneos.
Alguns tabus e mitos lançados pelos meios de comunicações mundiais trazem a tona questões que muitas vezes não pertencem a cultura muçulmana. Como o recente caso de alguns países da África que praticam a circuncisão clitoriana nas jovens. Tal pratica tem sido relacionada a religiãoIslâmica, contudo esses costumes antecedem (segundos estudos) a conversão destas tribos Africanas ao Islã.
A Mulher muçulmana pode ter até uma liberdade cultural, dependendo do país em que vivam. Atualmente o voto feminino tem provocado mudanças comportamentais e políticas, como o caso do Irã, em que o voto dos jovens e das mulheres tiraram do poder os Aiatolás. Na Jordânia as mulheres conquistaram quase todos seus direitos pleiteados igualando-se em muitos pontos aos homens.
Vemos em alguns países árabes hoje mães usando o tradicional carsaf (vestimenta que cobre quase todo corpo feminino) e suas filhas usando calça jeans, vestindo camisetas, e ouvindo rock. Tais mudança na educação e na cultura não tem sido bem aceitas pela sociedade muçulmana, (principalmente entre os doutores da lei), gerando conflitos. Os anciões alegam que com a entrada da televisão, cinema e internet, o "Mal" está se alojando entre o seio familiar muçulmano e futuramente teremos uma sociedade falida socialmente, com uso de substâncias entorpecentes, assaltos freqüentes, aumento da prostituição, violência familiar,etc.
Tais conceitos fazem surgirem uma nova visão sobre esse aspecto colocado pelos clérigos muçulmanos e aberto um debate sério em toda sociedade Islâmica pelo mundo, questionando até onde pode ir a interferência dos Sheik na vida dos jovens muçulmano.
Segundo Abdelbagi Osman, Presidente da Sociedade Beneficiente Muçulmana do Rio de Janeiro (em entrevista dada a Revista das religiões citada anteriormente), "O cargo de Sheik é fundamentalmente educativo, por isso é preciso ter responsabilidade naquilo que se faz"
Por todos esses motivos o estudo feito acima sobre essa cultura demonstra que questões ETNOCENTRICAS E RELATIVISTAS, muitas vezes fazem surgir a intolerância em ambos os lados, tanto do que é observado como do que olha.Podemos concluir que uma sociedade por mais fechada culturalmente que possa parecer aos nossos olhos tem seus princípios básicos de sobrevivência cultural. É que em algum momento da história ela começa a absorver outros modos de vidas até então impossíveis de serem aceitos por ela. Esses objetos de estudos não podem perder sua identidade cultural, por isso não devemos interferir em seus hábitos, costumes e crenças. Também não seria o ideal entrarmos de cabeça nessa cultura que é nosso objeto de estudo e deixarmos nos impreguinar com a visão interior desse povo, abstendo-se da nossa própria cultura e cair na armadilha do relativismo radical. O exemplo dado por Palma em relação ao par de óculos coloridos é vital e serve para proteger ambos os elementos,não deixando infeccionar a visão do estudioso como de seu objeto de estudo.Com o advento da globalização essa infecção acontecerá mais rápido que uma sociedade tradicional possa querer ou pensar. E só no futuro poderemos concluir se essa capa protetora ocular trouxe algo de bom e produtivo para vivermos num mundo sem tanta intolerância étnica, religiosa e cultural. Dessa forma só o futuro poderá responder se erramos ou acertamos.
Bibliografia:
Sites
dossiers.publico.pt
educaterra.terra.com.br
www.dhnet.org.br/direitos/sos/c_a/direito_criancaislan.html
FRAGA, Olívia - Revistadas Religiões "Como se forma um Sheik ?" - Editora Abril – Edição de Setembro de 2004 .
PALMA, jorge Luiz - Antropologia –– Santa Cruz do Sul -Editora DP&A - 2004