A DESCRIMINALIZAÇÃO DO ABORTO DE ANECEFÁLOS E O PRINCÍPIO...
Por rafaela coelho rodrigues lima | 17/08/2016 | DireitoA DESCRIMINALIZAÇÃO DO ABORTO DE ANECEFÁLOS E O PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA
Juliana Araújo Abreu
RESUMO
A polêmica questão sobre o aborto de feto anencéfalo apesar de já decidida favorecidamente pelo Supremo Tribunal Federal, ou seja, de forma que é possível a retirada de tais fetos, sendo uma questão opinativa pela mãe ainda requer bastantes olhares e estudos, no que concerne a dignidade da mulher assim como a vida do feto. O primeiro questionamento ora aqui feito é sobre os direitos advindos da sexualidade e reprodução feminina, como um direito universalmente garantido na contemporaneidade pelo fato das diversas manifestações históricas feitas antes pelas mulheres que buscavam desde sempre garantir seus direitos. É importante ressaltar também que a palavra aborto no caso de feto anencéfalo é uma denominação errônea, sendo correto dizer que há a interrupção terapêutica do parto. Concomitantemente a esse fator, o presente trabalho irá dissertar sobre o processo de descriminalização do “aborto” de anencéfalo, relacionando com as decisões que o Tribunal Superior tomou a respeito de tal caso, além de levar em consideração o princípio norteador de tal discussão que e o princípio da dignidade da pessoa humana, sendo este o fator preponderante para o em estar da mãe, além de sua saúde, entre outros princípios fundamentais que acabam se alocando dentro do princípio da dignidade humana, no presente caso.
INTRODUÇÃO
Partindo da concepção defendida por Greco, tem-se o início da vida a partir da concepção ou fecundação, ou seja, desde o momento em que o óvulo feminino é fecundado pelo espermatozóide masculino. Para fins de proteção por intermédio da lei penal, a vida só terá relevância após a nidação, que diz respeito à implantação do óvulo já fecundado no útero materno, o que ocorre 14 dias após a fecundação. Assim, enquanto não houver nidação não haverá possibilidade de proteção a ser realizada por meio da lei penal. Uma vez implantado o ovo no útero materno, qualquer comportamento dirigido finalisticamente no sentido de interromper a gravidez, pelo menos à primeira vista, será considerado aborto (consumado ou tentado). (Greco, 2007, p. 240)
O tema abordado pelo presente trabalho mostra sua relevância ao tratar de um assunto no qual o Código Penal e a Constituição Federal defendem ser um dos bens mais importantes a ser preservado: a tutela sobre a vida. A permissão da prática do aborto em casos específicos se mostra atual por trazer discussões dentro do Princípio da Dignidade da Pessoa humana, no que tange religião, ética, justiça, e implica diretamente nos Direitos Sexuais e Reprodutivos da mulher.
O segundo item do trabalho aborda a espécie de aborto em casos necessário, como demonstra o artigo 128, I não se pune: “Se não há outro meio de salvar a vida da gestante”. O Supremo Tribunal Federal se pronunciou sobre o assunto, permitindo que mulheres gestantes de feto anencéfalo interrompam gravidez com assistência médica. A prática em questão não será considerada crime de aborto tipificado quando as mulheres “anteciparem o parto” de feto portador dessa anomalia.
Ainda relacionado ao tema cabe ressaltar a importância do atendimento voltado à mulher com a implementação do programa Aborto legal, O Ministério da Saúde em sua norma técnica - Atenção Humanizada ao Abortamento, afirma que o tema do aborto suscita dentre muitos, alguns questionamento morais, e poucos são os profissionais de saúde que se dispõem a atuar nessa prática. O Governo Brasileiro trata o aborto como um problema grave no que diz respeito à saúde pública e isto resulta do fato de ser o Brasil, um país ainda em desenvolvimento. (BRASIL, 2005, p. 11)
O Ministério da Saúde preza pela discussão do tema, enseja um maior apoio às mulheres pretendendo evitar possíveis complicações advindas de um aborto inseguro. Não menos importante que esses aspectos, faz-se necessário superar a discriminação e a desumanização do atendimento às mulheres em situação de abortamento, ainda uma realidade de muitos serviços públicos no País, o serviço de Aborto Legal veio para solucionar esses dilemas e dar maior amparo nos casos em que o aborto é permitido por lei. (BRASIL, 2010, p.10)
A atenção humanizada às mulheres em abortamento merece abordagem ética e reflexão sobre os aspectos jurídicos, tendo como princípios norteadores a igualdade, a liberdade e a dignidade da pessoa humana, não se admitindo qualquer discriminação ou restrição do acesso a assistência à saúde. Esses princípios incorporam o direito à assistência ao abortamento no marco ético e jurídico dos direitos sexuais e reprodutivos afirmados nos planos internacional e nacional de direitos humanos. (BRASIL, 2005, p.10)
Por fim, a questão central do trabalho é analisar o pronunciamento expedido pelo Supremo Tribunal Federal quanto à descriminalização do aborto nos casos de anencefalia. O feto anencéfalo é aquele que possui uma má formação no cérebro, caracterizada pela ausência total ou parcial deste, o que potencialmente inviabiliza sua vida fora do útero materno. Visa-se retratar a anencefalia sob a ótica dos Direitos Fundamentais, que significa analisar a crise enfrentada pelo Sistema Judiciário brasileiro no que se refere às mães, com relação à efetividade do direito de decisão de continuidade (ou não) da gestação.
1 DIREITOS SEXUAIS E REPRODUTIVOS
“As primeiras reivindicações explícitas de prerrogativas relativas às mulheres no campo da sexualidade podem ser datadas, no Ocidente, a partir do século XVIII”. (LIMA, p. 17). Não obstante, Lima (2013) vai afirmar também que na maior parte desses países essa questão estava somente relacionada ao sentido da saúde da mulher. Além do mais, Corrêa e Ávila (2003) afirmaram que essa noção de direitos sexuais e reprodutivos da mulher foram se atrelar aos direitos humanos apenas a partir da contemporaneidade.
Os movimentos feministas começaram a surgir através da revolução francesa, com os ideais de liberdade, fraternidade e igualdade, em que as mulheres começaram então a ascender na burguesia e a verem seus direitos serem efetivados de forma mais válida e constante.
Segundo Lima (2013) com a chegada do fim da Segunda Guerra Mundial, a Declaração Universal dos Direitos Humanos foi aprovada pela Assembleia Geral das Nações Unidas, e nela constava os princípios norteadores de tal declaração: indivisibilidade e universalidade. O artigo 2º de tal declaração assevera que:
Toda pessoa tem capacidade para gozar os direitos e as liberdades estabelecidos nesta Declaração, sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento, ou qualquer outra condição.
Segundo Lima (2013, p. 20) ainda:
A Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (CEDAW) também configura um documento internacional que versa de forma ainda mais enfática sobre os direitos humanos das mulheres. Ela foi adotada pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 1979 e aponta a tradição e a cultura como forças de influência sobre a configuração das relações familiares e de gênero.
A palavra sexo antigamente era vista de forma errada, sendo esta uma palavra obscena e que era vedada pela sociedade, principalmente no que dizia respeito às mulheres. Mas graças aos esforços de tais mulheres que já se encontravam cansadas desse tabu, começaram a aparecer os primeiros movimentos feministas a respeito dos direitos sexuais femininos. Dessa forma em 1993 foi criada a Declaração e o Plano de Ação de Viena, tratando sobre o tema de forma explícita, no sentido de recorrer ao Poder Público para sua intervenção sobre determinados assuntos no que concerne a sexualidade. (LIMA, 2013).
No âmbito da história do Direito, parece mais fácil tratar da liberdade sexual de forma negativa do que em um sentido positivo e emancipatório. Chega-se a um consenso sobre o direito que a mulher tem de não ser objeto de abuso sexual, exploração, estupro, mutilação genital ou tráfico, mas não sobre seu direito de usufruir livremente de seu próprio corpo. Nesse sentido, o que foi deixado na obscuridade da esfera privada não foi o sexo de uma forma genérica, mas o sexo enquanto prazer. (LIMA, p. 23).
Historicamente, no que tange ao campo jurídico, os direitos sexuais e reprodutivos têm recebido tratamento um tanto esparso no âmbito nacional, sendo inseridos no contexto mais amplo da saúde pública. (LIMA, p. 27).
O crime de aborto, por exemplo, segundo ainda a mesma autora (2013) que está divido pelos artigos 124, 125, 126, 127 e 128 é considerada como sendo uma prática ilegal, mas além de estar tipificado como crime, é também umas das maiores causas do problema da saúde pública.
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