A (DES)PROPORCIONALIDADE ENTRE O INSTITUTO DE DELAÇÃO PREMIADA E AS BENESSES ADQUIRIDAS

Por Anna Caroline Barros Costa | 06/06/2017 | Direito

Anna Caroline Barros Costa

Magsom Quinco Lima Meneses

1 Introdução; 2 Uma visão geral acerca do instituto da delação premiada; 2.1 As várias faces da delação premiada no ordenamento jurídico brasileiro; 3 A (des) proporcionalidade entre os benefícios concedidos ao delator e os riscos decorrentes da delação; 3.1 As novas garantias atribuídas à figura do delator em face da Lei de Proteção à Testemunha e da Lei das Organizações Criminosas; 4 Conclusão; Referências.

RESUMO

 A delação premiada é um assunto que está constantemente noticiado na atualidade, os casos de corrupção envolvendo o governo amplamente divulgado pelas mídias exemplificam isso, por esse viés midiático dar-se pra ter uma noção do que se trata, porém quando passamos a estudá-la de fato nota-se que há algumas incoerências que merecem ser pontuadas e analisadas, a delação nada mais é do que a possibilidade dada ao participante ou coautor do crime de ter sua pena reduzida, ou até mesmo substituída por outra. Em razão da prática deste ato tem-se a possibilidade de se obter alguns benefícios, porém o que pode ser observado é que por vezes o instituto de delação premiada não compensa para os criminosos já que o que se recebe em troca da mesma, é considerado pífio em relação a uma possível punição que se pode sofrer pelos demais participes do crime, desta forma o presente artigo se propõe a analisar a delação premiada expondo uma visão geral da delação premiada, a sua origem, a natureza jurídica, as fontes normativas, os requisitos, a legitimidade e as consequências jurídicas, bem como suas diversas previsões legislativas, buscando a solução do impasse da (des) proporcionalidade das benesses adquiridas em decorrência da prática da delação premiada com o risco que se assume em relação aos demais participes do crime.

PALAVRAS-CHAVES: Delação Premiada; Benefícios; Impasse.

1 INTRODUÇÃO

A delação premiada é um instituto carregado de complexidades, e que atualmente com todos os casos de corrupção narrados pela mídia parece está em voga, não que ela posso ocorrer somente com esses crimes, no decorrer do trabalho veremos que não, apesar do tema está atual, o instituto em si não o é, ele data desde a pré-história em que havia denúncia dos atos praticados pelos outros, em troca estes eram recompensados de alguma forma, porém a nível brasileiro temos o seu surgimento na década de 90 com a Lei de Crimes Hediondo, precisamente no artigo 8º, parágrafo único, desde então é regulamentada por várias outras leis, não tendo este instituto uma regulamentação especifica, o que acaba por dificultar a sua aplicação.

Em todas as previsões legislativas que versam sobre delação premiada é notável que à figura do delator são assegurados alguns benefícios, porém estes só serão concedidos na hipótese de eficácia da colaboração da sua delação, portanto exemplificando, somente se desmantelar a quadrilha ou bando, encontrar objeto fruto de crime ou ainda se encontrar vitima de sequestro. È importante salientar que o uso da delação premiada é de extrema  importância para o Estado, haja vista que com a sua utilização é possível resolver a problemática instaurada. È através da figura do delator na delação que se consegue desmantelar uma quadrilha ou mesmo desvendar todo o crime, tal instituto pode até salientar a impotência do Estado de resolver os conflitos sozinho, mas digamos que trata-se de um mal necessário, por isso e possível ver o incentivo da delação.

O que salta aos olhos também é que os benefícios concedidos pelo legislador ao delator não se mostram muito atraentes, e são considerados irrisórios se levado em consideração o que o Estado pode obter com a delação, as informações precisas, que talvez seriam impossíveis de serem conseguidas com uma simples investigação criminal. A figura do delator é a pessoa que conhece todos os atos praticados, que vivenciou e até mesmo fez parte de muitos deles, importante salientar que só pode participar da delação quem efetivamente participou do crime, portanto a delação quase sempre é encarada como traição  pelos criminosos e é vista como uma “pena de morte”, sendo assim não há estimulo nenhum ao delator em praticar tal ato, já que é previsível que o mesmo continuará a cumprir a pena, por vezes, no mesmo estabelecimento que seus comparsas de crime.

Contudo, posteriormente houve uma grande inovação no sentido dos benefícios que se poderiam adquirir que culminou com a lei de proteção às testemunhas (Lei nº 9.807/99) assegurando ao criminoso, além da diminuição da pena, a possibilidade de concessão do perdão judicial e a consequente extinção de punibilidade, além de proteção especifica ao delator, tais como dependências separadas dos demais presos e segurança a sua integridade física, restando saber se pode ser considerado proporcional as benesses adquiridas com o risco que se corre com a delação.

É perceptível que o assunto merece ser estudado, tendo em vista que há pontos relevantes que devem ser conceituados e analisados para que haja a compreensão do mesmo, tais como o conceito de delação nas mais variadas perspectivas, a natureza jurídica, as fontes normativas, os requisitos, a legitimidade e as consequências jurídicas, dentre outros assuntos que serão aprofundados ao longo da construção do presente artigo científico.

2 UMA VISÃO GERAL ACERCA DO INSTITUTO DA DELAÇÃO PREMIADA

A modalidade de deleção premiada é a possibilidade concedida ao participante ou coautor do crime de ter sua pena reduzida, desde que denuncie os seus comparsas, possibilitando o desmantelamento da quadrilha ou indicando o local que encontra os produtos fruto de crime, em contrapartida tal denunciante recebe alguma benesse. Em outros termos, temos a conceituação de Renato Brasileiro que faz-se bastante pertinente. Vejamos.

È a possibilidade concedida ao participante e/ou coautor de ato criminoso de não ser processado, de ter a sua pena reduzida, substituída por uma restritiva de direitos, ou até mesmo extinta mediante a denúncia de seus comparsas às autoridades competentes, permitindo, a depender da conduta delituosa, o desmantelamento do bando ou quadrilha, a descoberta de toda a trama delituosa, a localização do produto do crime, ou, ainda, a facilitação da libertação do sequestrado. ( LIMA, 2012, p.1084)

 

 Porém o que pode ser observado atualmente é que por vezes o instituto de delação premiada não compensa para os criminosos já que o que se recebe em troca da mesma, é considerado pífio em relação a uma possível punição que se pode sofrer pelos demais participes do crime, importante observação deve ser levada em consideração só que se falar em delação premiada, se a figura do delator também assume a autoria do crime, parece se tratar de uma obviedade, mas não é caso contrário teríamos um simples testemunho.

A delação premiada foi inserida no ordenamento jurídico pátrio por intermédio da Lei 8072/90, em seu artigo 8º, parágrafo único, tal lei versa sobre os crimes hediondos, desde então é regulamentada por várias outras leis, não tendo este instituto uma regulamentação especifica, o que acaba por dificultar a sua aplicação. Todos os dispositivos existentes asseguram à figura do delator benefícios, porém estes não se mostram muito atraentes, visto que com a delação só se poderá obter a diminuição da pena de 1/3 a 2/3, isso ficando condicionada ainda a eficácia de sua colaboração.

 O uso da delação premiada é de suma importância para o Estado, haja vista que com a sua utilização é possível resolver a problemática instaurada. È através da figura do delator na delação que se consegue desmantelar uma quadrilha ou mesmo desvendar todo o crime, com tal conduta temos o reconhecimento do Estado de uma situação de incapacidade de solucionar o problema por iniciativa própria, fazendo necessário a delação.

Se tratando do principio processual penal do nemo tenetur se detege, importante discussões surgem acerca do mesmo, mas todas convergem em um ponto estratégico, a prática da delação premiada não viola tal principio, haja vista os benefícios legais oferecidos servem como estimulo para colaboração, que pode ocorrer com a confissão do crime, o importante é que não haja nenhuma coação o obrigando, portanto não há violação ao direito de não produzir provas contra si mesmo. (LIMA, 2012).

No que tange a natureza jurídica do instituto de delação premiada temos uma demasiada complexidade, devendo a mesma ser analisada sobre dois vieses, ou âmbitos, tanto no Direito Penal, quanto no Direito Processual Penal. Sob o ponto de vista do renomado processualista penal Renato Brasileiro, a delação premiada é muito complexa, isso explica esse dupla natureza jurídica, em direito penal ela pode ser causa extintiva da punibilidade, causa de diminuição de pena ou ainda causa de fixação do regime inicial aberto ou de substituição de penas, privativa de liberdade por restritiva de direito. Quando se dirige a natureza jurídica sob o ponto de vista processual penal temos que a delação é configurada como meio de prova, o que não nos parece ser erroneamente colocada, já que as confissões do delator serão tomadas como base para desmantelar a quadrilha ou bando, o que não deixa de ser um meio de prova. (LIMA, 2012)

Quanto ao momento de apresentação podem-se tecer importantes considerações, as diversas disposições legislativas que possui a delação premiada são omissas no que  atine ao seu momento de apresentação, nem mesmo regulamentam a forma de feitura da mesma, partindo do parâmetro que a delação é um meio de prova ela poderia ser apresentada tão somente até a prolação da sentença, apesar de ser considerada como meio prova não se pode afastar que a mesma possa ser apresentada a qualquer momento, mesmo após o trânsito em julgado, sendo a delação nessa fase capaz de surtir efeitos, sob de pena de ser inadmitida, ou mesmo não obtendo o delator os benefícios que dela possam decorrer, já que as benesses adquiridas estão condicionadas a eficácia da delação como anteriormente foi citado.

 

2.1 As várias faces da delação premiada no ordenamento jurídico brasileiro

 

A delação premiada apesar de ser um instituto considerado como “velho” ainda se tem muita dificuldade no seu tratamento por existir várias disposições legais, o que acaba por gerar confusão na sua aplicação, sendo ideal a criação de uma lei especifica para regular a mesma.

A delação pode ser vista e aplicada em diversas leis brasileiras, sendo elas no Código Penal, Leis n° 8.072/90 – Crimes Hediondos e equiparados, 9.034/95 – Organizações Criminosas, 7.492/86 – Crimes contra o Sistema Financeiro Nacional, 8.137/90 – Crimes contra a ordem tributária, econômica e contra as relações de consumo, 9.613/98 – Lavagem de dinheiro, 9.807/99 – Proteção a Testemunhas, 8.884/94 – Infrações contra a Ordem econômica e 11.343/06 – Drogas e Afins. A depender da prática do crime, temos qual lei a mesma se encaixará, girando a polêmica toda em virtude dos beneficios que podem ser adquiridos que mudam de lei para lei, sendo que em um ponto convergem, os beneficios adquiridos são desproporcionais em relação ao risco que se corre, ficando condicionado ainda há alguns requisitos, sobre isso Renato enfatiza.

Em todas as hípoteses acima citadas de delação premiada, para que o agente faça jus aos benefícios penais estipulados em cada um dos dispositivos legais, é indispensável aferir a relevância e a eficácia objetiva das declarações prestadas pelo colaborador. Não basta, pois, a mera confissão acerca da prática delituosa. Essa confissão deve vir acompanhada  do fornecimento de informações que sejam objetivamente eficazes, capazes de contribuir para a indentificação dos comparsas e da trama delituosa. Por força da delação, portanto, deve ter sido possivel a obtenção de algum resultado prático positivo, resultado este que nao seria alcançado sem as declarações do colaborador.(LIMA, 2012, p. 1090-1091)

 

Nota-se em todos esses dispositivos que o beneficio concedido pelo legislador ao delator é muitas vezes considerado irrisórios sendo somente diminuição de 1 a 2/3 dependendo da eficácia da colaboração, se levado em consideração às informações que podem ser obtidas através dele, informações estas que se tornam impossíveis de se conseguir com uma investigação criminal, porque geralmente o delator é a pessoa que conhece todos os atos praticados que culminou com o crime em si, sendo assim levando em consideração que a traição é encarada pelos criminosos como uma “pena de morte”, não há estímulo nenhum ao delator em praticar tal ato, já que é previsível que o mesmo continuará a cumprir a pena, por vezes, no mesmo estabelecimento que seus comparsas de crimes, porém já vem sendo relativizado o entendimento e leis surgiram para dar uma garantia maior a figura do delator. (LIMA, 2012). Nessa perspectiva a lei que trouxe uma maior inovação foi a Lei de Proteção às testemunhas que trouxe à figura do delator mais garantias e segurança com esta, bem como a aplicação do instituto que passou a ser a todos os tipos de crimes.

 

3 A (DES) PROPORCIONALIDADE ENTRE OS BENEFÍCIOS CONCEDIDOS AO DELATOR E OS RISCOS DECORRENTES DA DELAÇÃO

 

Uma vez estabelecidas as noções iniciais acerca do instituto da delação premiada, faz-se necessário a explanação acerca da dimensão das consequências desta. É inquestionável a necessidade da existência de tal mecanismo de combate à criminalidade, tendo em vista o notável aumento das organizações criminosas. É certo que as informações obtidas com o delator são essenciais para uma maior efetividade no combate ao crime organizado, todavia, é questionável se os benefícios concedidos ao co – réu são o suficiente em face das consequências ocasionadas pela “traição” em relação aos demais membros da quadrilha, uma vez que a “lei do silencio” é regra nesse meio, e a sua violação pode ser rigorosamente punida pelos criminosos, dessa forma o delator fica praticamente sentenciado a “pena de morte”. (ROBALDO, 2008, p. [?]).

A lei do silêncio, ou ormetá, tem origem na máfia italiana, ainda hoje é a matriz da proteção às organizações criminosas, com base nela, os integrantes do grupo impõe medo tanto dentro da associação delinquencial quanto fora dela, formando uma espécie de “solidariedade pelo medo”. O seu rigor era tanto que as próprias autoridades, até aproximadamente o fim do século XX, desacreditavam que alguém poderia em sã consciência, delatar os seus parceiros, de modo que aquele que o fizesse, não seria levado em conta. (MAIEROVITCH, 20-?, p. [?]).

Destarte, a delação premiada ainda é extremamente questionável, principalmente pelo fato de que para que os benefícios sejam concedidos, alguns requisitos devem ser cumpridos, como por exemplo o fato de que as informações sejam relevantes e eficientes, a ponto de comprovar a existência da organização criminosa e viabilizar a prisão de um ou mais integrantes desta, porém se esses objetivos não forem alcançados, além de não ter conseguido obter nenhuma benesse, o delator ainda terá que encarar o fato de que agora a sua segurança resta comprometida, mesmo com as garantias decorrentes da Lei nº 9.807/99, estas podem se mostrar insuficientes, ficando o delator exposto a ação dos criminosos que almejam puni-lo por seu ato. (BRAIANI, 2010, p. 58 – 60). Fernando Braz Ximenes corrobora com tal afirmação:

Questiona-se, também, a eficácia do instituto sob análise, quando se atenta para a inabilidade do Poder Público para proteger todos aqueles que colaboram para o desvendamento de fatos criminosos. De fato, o Estado brasileiro é extremamente ineficiente no tocante a assegurar segurança às testemunhas no processo penal, o que acaba gerando impunidade, devido à famigerada lei do silêncio. Se assim é na proteção das testemunhas, imagine-se a diligência estatal no que toca à proteção dos réus colaboradores, que, muitas vezes, acabam cumprindo reprimenda em estabelecimentos penais lotados de componentes de organizações criminosas. Assim, poucos se atreveriam a vestir a faixa de “X-9” ou “cagueta” do bando, o que acaba diminuindo a aplicação do instituto. (XIMENES, 2012, p.[?]).

 

Ainda se tratando dos fatores que inviabilizam a legitimidade da delação premiada, pode-se apontar o fato de que o instituto em si propiciaria um comportamento antiético e imoral, posto que incentiva a traição entre pessoas que outrora eram parceiros, independentemente do caráter ilícito do ato. Tal afirmação de dá com base no fato de que o ordenamento jurídico deve se valer de soluções que sejam dotadas de um caráter honesto e leal, tanto no que diz respeito ao processo em sentido amplo, quanto no que tange aos indivíduos ou partes envolvidas, mesmo que para isso tenham que ser sacrificados alguns interesses.

Existe também uma quebra no principio da isonomia, uma vez que a delação premiada estabelece um tratamento diferenciado para indivíduos que cometeram o mesmo delito, sendo assim, se essas pessoas tiveram condutas igualmente reprováveis seria descabido atribuir penas diversas pela simples existência de uma ajuda na investigação do ocorrido, ademais a investigação do ocorrido é uma obrigação das autoridades estatais, que não deveriam se valer de qualquer ajuda desleal para promover a eficácia do seu trabalho. (XIMENES, 2012, p.[?]).

 

3.1 As novas garantias atribuídas à figura do delator em face da Lei de Proteção à Testemunha e da Lei das Organizações Criminosas

 

Inicialmente, o instituto da delação premiada foi criado sem se preocupar com qualquer garantia à segurança ou proteção do có – réu posto que não havia qualquer restrição a propagação da imagem do delator, de modo que a este não era assegurado o anonimato. Destarte, na iminência de sofrer retaliações esses indivíduos optavam muitas vezes por se manterem calados e inertes, visto que nenhum beneficio poderia compensar a sua exposição e as consequências provenientes disto. Com tal advento surgiu a “lei do silencio”, que passou a ser um dos princípios básicos das organizações criminosas, cujo descumprimento acarretava em graves penas, para o delator e sua família, ficando este refém dos criminosos. Entretanto a Lei nº 9.807/99, ou simplesmente, Lei de Proteção à Vítima e à Testemunha, surgiu pra proporcionar mais garantias no que diz respeito à segurança do delator, trazendo uma maior eficácia ao instituto da delação premiada. (ROBALDO, 2008, p[?]).

Dentre as inovações trazidas pela lei 9.807/99, está a possibilidade de conceder à figura do delator o beneficio das medidas especiais de segurança e proteção à sua integridade física. Tal fato esta disposto no artigo 15º da legislação supracitada, e mesmo que esta não detalhe quais tipos de medidas protetivas serão adotadas, supõe-se que sejam as mesmas elencadas no artigo 7º, dentre as quais podem-se destacar os direitos á segurança na residência, incluindo o controle de telecomunicações, à escolta e segurança nos deslocamentos da residência, inclusive para fins de trabalho ou para a prestação de depoimentos, à transferência de residência ou acomodação provisória em local compatível com a proteção, à preservação da identidade, imagem e dados pessoais, dentre outros.

Todavia há uma certa inexatidão, uma vez que o artigo 15º diz que o delator, estando ele preso ou não, terá direito ás medidas protetivas, em face de ameaça ou coação eventual ou efetiva, porém, se for analisada a Lei como um todo, observar-se-á que o artigo 2º da mesma em seu parágrafo 2º, afirma categoricamente que excluem-se do rol de protegidos, os indivíduos que uma vez condenados, estejam cumprindo pena, bem como aqueles que tenham sido indiciados ou acusados sob prisão cautelar. Destarte, se o artigo 2º for considerado em prejuízo do artigo 15º, o delator ainda estará exposto, podendo facilmente sofrer retaliações dentro do local onde o mesmo esteja cumprindo pena, pois considera-se nesse caso que os órgãos de segurança publica podem garantir essa proteção, quando é de conhecimento geral que tal afirmação não é verdadeira, tendo em vista a situação precária do sistema carcerário brasileiro. (GREGHI, 2009, p. [?]).

Há ainda que se falar em um outro beneficio que surgiu com a Lei n. 9.807/99, cujo artigo 13º, faz menção ao perdão judicial nos casos em que, o acusado, sendo réu primário, e tendo colaborado efetiva e voluntariamente com a investigação, venha a prestar um depoimento que resulte na identificação dos demais co - autores ou partícipes, na localização da vítima, na recuperação total ou parcial do produto do crime, sendo observado sempre a personalidade do beneficiado e a natureza, circunstâncias, gravidade e repercussão social do fato criminoso.

Porém o perdão judicial deve ser analisado de uma forma mais ampla, que venha a abarcar a Lei das Organizações Criminosas, ou Lei 12.850 de 2013. Tendo por base o seu artigo 4º § 11º, observa-se que a sentença irá apreciar os termos do acordo homologado entre o Ministério Público e a defesa, bem como a sua eficácia, a duvida é se na hipótese de um prévio acordo prevendo e garantindo o perdão judicial ao réu, a sentença proferida pelo juiz estaria vinculada a este, ou se tal acordo não passaria de uma mera expectativa de direito. Andrey Borges de Mendonça se posiciona da seguinte maneira:

A nova Lei indica que o magistrado não pode simplesmente desconsiderar o acordo. Assevera, expressamente, que o juiz apreciará o termo e a sua eficácia. Assim, o que nos parece é que o magistrado deve analisar se o colaborador realmente cumpriu o acordo homologado e, assim, atingiu o resultado a que estaria proposto. A análise da sentença deve ser feita à luz da eficácia da colaboração para a persecução penal. Se o colaborador cumprir totalmente o acordo realizado, prestando colaboração efetiva, o magistrado, em princípio, deve aplicar o benefício que lhe foi proposto, sendo sensível ao acordo realizado e aos interesses em jogo.  Isto até mesmo em atenção ao princípio da lealdade que o Estado deve àquele que colaborou na persecução penal [...]. O STF já decidiu nesse sentido. No mesmo sentido, decidiu o STJ, afirmando que, se houve efetiva contribuição do réu-colaborador, deve ser assegurada a aplicação do benefício. (MENDONÇA, 2013, p. 30 – 31).

 

 

 Ocorre que tal posicionamento não é unanime, pois no Brasil, ainda se vigora a tese de que o juiz não poderia se vincular aos termos do acordo, se essa corrente fosse aplicada, é certo que dificilmente haveriam casos de delação premiada, uma vez que não haveriam garantias ao delator de que este seria posto em liberdade, ficando o mesmo a mercê da decisão final do juiz, sendo que se o magistrado decidisse por não contemplar o acordo previamente realizado com o Ministério Público, o delator seria ou continuaria efetivamente preso, e com base na já citada Lei do Silencio, ele teria pouquíssimas chances de sobreviver no sistema carcerário, o mesmo se aplica à possibilidade de diminuição de pena. Como o disposto na Lei 9.807/99 não deixa claro se a proteção será estendida aos familiares do delator, o que é mais um ponto negativo posto que certamente os membros das organizações criminosas tentarão atingir aqueles com o objetivo de obter vingança. (LOURENÇO, 20-?. P.[?]).

Dessa forma é evidente que a benesses adquiridas pelo delator são quase que ínfimas tendo em vista às informações prestadas por este, sem as quais a investigação criminal seria ineficiente. Destarte é evidente que a criação do instituto da delação premiada, se deu justamente por causa das deficiências existentes na atuação do Estado, que se mostra incapaz de conseguir as informações necessárias para a conclusão da investigação, através da apuração formal.

 

4 CONCLUSÃO

Com a exposição da problemática central do presente paper pode-se concluir que o instituto da delação premiada ainda é carregado de controvérsias. Por obvio seu surgimento se deu em meio à um crescimento exorbitante no número de crimes praticados por organizações criminosas, sendo que a sua finalidade precípua, de auxiliar o trabalho de investigação, não o exime de ser apontado como um mecanismo de cunho moralmente duvidoso, pois, apesar de tudo, tanto a investigação quanto o processo tem que ser conduzido pautado na ética, e incentivar a traição, dentro de um grupo, independentemente dos seus atos criminosos, acaba por gerar criticas.

Ademais, a criação da delação premiada, foi justamente uma tentativa de otimizar e facilitar o processo de investigação, tal fato mostra uma deficiência no que diz respeito ao trabalho das autoridades competentes, que necessitam da ajuda dos próprios criminosos para executar uma tarefa que é sua por obrigação. De certo a própria criação do instituto da delação premiada é carregada de divergências, mas há que se falar que assim como a sua existência, o seu modelo de execução é envolto em polemicas.

Por mais que os benefícios, tais como a diminuição da pena ou até mesmo o perdão judicial, possam parecer bons atrativos, estes não são uma garantia, posto que para recebe –los, é necessário que o delator cumpra uma série de requisitos, de modo que se por exemplo as informações prestadas não auxiliarem na prisão de um ou mais membros da quadrilha, a delação pode ter sido em vão, de modo que aquele que a fez fica exposto a todo e qualquer tipo de retaliação pelos seus parceiros, dentro e fora do presídio.

Mesmo com o advento da Lei nº 9.807/99, ou Lei de Proteção à Vítima e à Testemunha, a delação ainda é um risco para aquele que coopera com as investigações entregando os demais membros da organização criminosa, pois a “lei do silencio” que vigora dentro desses grupos, é extremamente rigorosa, criando uma lealdade e fidelidade pelo medo, dessa forma é extremamente imprudente colocar a vida de um individuo em risco em detrimento de um instituto cheio de lacunas como é o caso da delação premiada.

 

REFERENCIAS

 

BITTAR, Walter Barbosa. Delação premiada. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011.

BRAIANI, Marina Paula Zampieri. O instituto da delação premiada frente ao crime organizado [trabalho de conclusão de curso].Presidente Prudente- São Paulo: Faculdades integradas “Antônio Eufrásio de Toledo”, Curso de Direito;2010.

GREGHI, Fabiana. A Delação Premiada no Combate ao Crime Organizado. Disponível em: http://lfg.jusbrasil.com.br/noticias/1512243/a-delacao-premiada-no-combate-ao-crime-organizado-fabiana-greghi. Acesso em: 07 de maio de 2015.

LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de processo penal. Salvador: JusPodivm, 2014.

LOURENÇO, Messias José. Crime organizado e lei de proteção de testemunhas. Disponível em: https://www2.mppa.mp.br/sistemas/gcsubsites/upload/60/CRIME%20 ORGANIZADO%20 E%20LEI%20DE%20PROTE%C3%83%E2%80%A1%C3 %83%C6%92O%20DE%20TESTEMUNHAS(1).pdf. Acesso em: 08 de maio de 2015.

MAIEROVITCH, Wálter Fanganiello. Blindagem do crime organizado: delação premiada. Disponível em: http://ibgf.org.br/index.php?data%5Bid_secao%5D=3&data%5Bid_materia %5D=598. Acesso em 07 de maio de 2015.

MENDONÇA, Andrey Borges. A Colaboração premiada e a nova Lei do Crime Organizado (Lei 12.850/2013). Disponível em: http://www.prrj.mpf.mp.br/sala-de-imprensa/publicacoes/custos-legis/a-colaboracao-premiada-e-a-nova-lei-do-crime-organizado-lei-12.850-2013/view. Acesso em 08 de maio de 2015.

NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo e execução penal. São Paulo: 2014.

ROBALDO, José Carlos de Oliveira. A delação premiada e a lei de proteção a vítimas e testemunhas. Disponível em: http://ww3.lfg.com.br/public_html/article.php?story=2008031 9183823135&mode=print. Acesso em: 20 de março de 2015.

XIMENES, Fernando Braz. Delação Premiada: Prós e Contras. Disponível em: http://www.boletimjuridico.com.br/doutrina/texto.asp?id=2521. Acesso em 08 de maio de 2015.

Artigo completo: