A DEBILIDADE DO SISTEMA DE SERGURANÇA PÚBLICA...

Por Wallace Hernane Pereira dos Santos | 06/03/2017 | Política

         ¹ SANTOS, Wallace Hernane Pereira dos

 

Observamos que na atualidade é crescente a atuação de organizações criminosas. Acompanhando as notícias diárias veiculadas a mídia, observa-se mesmo que superficialmente que as atuações de criminosos especializados são evidentemente maiores ao perpassar dos anos. É perceptível a condição de preparo de indivíduos formente armados, equipados e treinados, dispostos a realizar ações ousadas fora das regiões centrais. Em um Estado com 853 municípios, vislumbramos a atuação inescrupulosa e orquestrada por marginais técnicos em suas realizações que destroem a sensação de segurança e levam terror aos cidadãos ordeiros nos rincões mineiros.

           

Como função do Estado, os órgãos de segurança pública atuam com intenção de prevenir que o crime aconteça, e reprimir tais organizações criminosas. Nas capitais e cidades com concentração demográfica maior, às instituições dispões de mais recursos humanos, equipamentos, viaturas, entre outros aportes para realizar prevenção e repressão quanto a esse tipo de módus operandi.   Acompanhando essa sistêmica, o crime organizado migra para as cidades periféricas que são desprovidas de mesmo aparato supracitado.

 

Segundo André Carneiro² (2016), a modalidade criminosa denominada como novo cangaço ou cangaço moderno se populariza nas prisões desde a segunda metade do século XX, onde há um arcabouço criminal disponível com presos políticos, comuns e organizações criminosas estando todas inseridas em um mesmo cenário. Ainda conforme André Carneiro (2016), o cangaceirismo moderno detém como suas características a atuação violenta, rápida, com elevado número de indivíduos, de forma sistêmica e planejada, assim como uso da caatinga (biona natural da região nordeste e norte de Minas Gerais), antes e pós-ação torna inevitável à comparação com os cangaceiros da primeira metade do século XX. Diferindo da região nordeste quanto ao bioma e convergindo quanto à oportunidade, Minas Gerais por ser uma região com áreas de matas extensas e despovoadas, propícia aos criminosos a condições de homizio em diversos pontos pós-ação delituosa.

 

O crime em constante evolução, condições propícias para partilha destes conhecimentos pelos criminosos como atuações de sucesso e a sensação de impunidade permite o aumento desta modalidade criminosa que tomou forma no Ceará, Bahia, Mato Grosso,

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¹ Graduando do Curso de Bacharelado em Direito – Faculdade de Minas Gerais (FAMIG).

² CARNEIRO, André. Cangaceirismo moderno. Major da Policia Militar de Pernambuco. Licenciatura Plena em História pela Universidade Federal de Pernambuco (2005), Pós-Graduado em História Militar na universidade do Sul de Santa Catarina (2011), Pós-Graduado (MBA) em Gestão Governamental na Faculdade Internacional de Curitiba (2011), Pós-Graduado em Planejamento Estratégico na Faculdade Maurício de Nassau (2014), Pós-Graduado em Ciências Jurídica na Universidade Cidade de São Paulo (2015), Mestrado em História e Cultura Histórica na Universidade Federal de Paraíba (2013), Bacharel em Direito pela Universidade Cidade de São Paulo (2016). Autor do livro Capitães do Fim do Mundo (2016).

 

Pernambuco e hoje na atualidade atinge Minas Gerais.

 

No ano de 2016 e em Janeiro de 2017, a fim de verificar eventos similares a atuação com a modalidade de “novo cangaço” ou “cangaço moderno”, foram realizadas pesquisas no sistema REDS³ (Registro de Eventos de Defesa Social) e fontes abertas (fontes e meios eletrônicos), sendo encontrados 18 (dezoito) registros mais significativos entre os demais pelos modus operandi. Durante a atuação destes indivíduos, verificamos que se utilizaram de recursos como armamento de calibre restrito, veículos roubados, número elevado de elementos, explosão de caixas eletrônicos, sequestro de reféns, disparos em residências ou destacamentos/pelotões da PM ou escudo humano.

 

Realizando paralelo sobre eventos registrados no período supracitado com demais estudos reiterados sobre o tema, percebe-se que com aparatos policiais menores (militares e civis) nas cidades de interior, a migração de crimes para essas localidades torna-se oportunua.

Consoante a isso, Luiz Flávio4 (2013) discorre sobre a migração do crime da seguinte forma:

 

Porque o crime organizado é uma atividade lucrativa, que atua especialmente na área do mercado ilícito (de drogas, de armas, de carros roubados etc.). Se dificuldades aparecem num determinado lugar, migra-se o crime para outros lugares, onde não existam tantos obstáculos, seja em razão da deficiência policial, seja porque poucas medidas preventivas foram adotadas, seja, enfim, pela pouca mobilização comunitária para desenvolver programas situacionais de impedimento do delito.

 

Luiz Flávio ainda descreve e contextualizada sobre o motivo das atuações de organizações em cidades do interior:

 

Quanto mais à cidade esteja fragilizada em termos de medidas preventivas da criminalidade (poucos policiais, poucas viaturas, raras medidas comunitárias de prevenção etc.), mais cobiçada ela se torna, porque o lucro do crime organizado não pode cessar nem diminuir. Constatado o fenômeno da presença de muitos criminosos “de fora” agindo numa determinada cidade, impõe-se contextualizar o fato para admitir que poucos crimes de maior relevância hoje acontecem sem controle e o gerenciamento do crime organizado. Os grandes crimes já não são empreendimentos individuais ou de grupos locais. A criminalidade organizada atua em rede e de suas garras poucos crimes escapam.

 

Consoante ao supracitado são fatores facilitadores para organizações criminosas, a

existência de agências bancárias desprovidas de sistema de segurança mais elaborado, elevada quantidade de rotas de fuga (pavimentadas ou não) e falta de medidas repressivas,  

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³ MINAS GERAIS, (ESTADO). Registro de Defesa Social (REDS). Pesquisa em sistema informatizado, referente a ocorrências classificadas como Roubo/Furto, que guardem características de Novo Cangaço ou Cangaço Moderno – Período: 2016.

4 GOMES, Luiz Flávio – Jurista e cientista criminal. Fundador da Rede de Ensino LFG. Codiretor do Instituto Avante Brasil e do atualidadesdodireito.com. br. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983), Juiz de Direito (1983 a 1998) e Advogado (1999 a 2001).

preventivas direitas e indiretas deixam a criminalidade em condições favoráveis de atuação contra as instituições financeiras e a sociedade a mercê da criminalidade.

 

Ainda neste paralelo, oportunamente Francisco José5 (2009), descorre sobre esta modalidade criminosa, denominando estas organizações especializadas como “banditismo moderno” e mesmo com denominação diferente é inegável o modus operandi aplicados por esses criminosos. Neste mesmo trabalho, Francisco José rememora o passado explicitando como era o cangaço6, citando oportunamente as volantes, sua forma precípua de combate:

 

As Volantes foram criadas para combater o banditismo que sempre existiu no interior.

 

E mais a frente, reitera que:

 

“As volantes nunca deixaram de existir, só caíram em desuso”.

 

Destarte, num primeiro momento, as volantes foram formadas inicialmente por forças policiais, voluntários, convidados e indivíduos criados no mesmo ambiente dos cangaceiros, que tinham por objetivo combater esses criminosos. Após realizar remonte histórico, a devida contextualização e descrever a evolução das modalidades criminosas, resta demonstrado por Francisco José como se dão os trabalhos e formas de combate a estes criminosos no passado e no presente. De igual maneira, demonstra a necessidade de uma força policial preparada e especializada para fazer frente à modalidade atual. Descorre então sobre tropa especializada com aplicações de técnicas das volantes, porém com otimização do recurso humano e técnico:

 

Em 06 de novembro de 2002, pela primeira vez a CIOSAC7 iria colocar em prática os princípios operacionais das volantes, seria um pequeno contingente que iria adentrar na caatinga sem dia certo para retorno.

 

E ainda descreve oportunamente como as ações da CIOSAC se tornaram primordiais para sucesso ao combate ao “banditismo moderno”:

 

Agindo nos 170 municípios do CPA (71), CPS (56) e CPZM (43), sendo

subordinada diretamente ao CPE seja no combate ao crime organizado, tráfico e plantio de entorpecentes, bem como nas mais adversas missões (conflitos entre

famílias, assaltos a bancos, carros-fortes, autocargas, ônibus, etc.), as atuações da

CIOSAC tornaram-se imprescindíveis, cumprindo eficientemente

todas as missões que lhe são confiadas, nunca abúlica em bem servir

e proteger a sociedade pernambucana.

 

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5 Barbosa, Francisco José, 1º Tenente da Policia Militar de Pernambuco. BEPI. – EVOLUÇÃO DO BANDITISMO MODERNO E FORMAS DE ATUAÇÃO EFICAZES DA POLICIA MILITAR NO SERTÃO PERNAMBUCANO. Trabalho de Conclusão de Curso apresentado no Curso de Pós-Graduação em Gestão da Segurança   Pública na Sociedade Democrática na Universidade Luterana do Brasil.

6 CangaçoGasparetto, Antonio Junior. Fenômeno nordestino integrado por nômades que usavam violência para cometer crimes na região.

7 CIOSAC – Companhia Independente de Operações em Área de Caatinga. Na atualidade elevada a BEPI – Batalhão Especializado em Policiamento no Interior.

Realizado o devido paralelo entre as ações criminosas ocorridas em outros Estados, a breve contextualização referente ao surgimento e o combate a esses criminosos, verificamos a necessidade de abordar possíveis sugestões de soluções de combate a essa modalidade criminosa crescente Minas Gerais, assim como destacar fatores dificultadores.

 

O interior de Minas Gerais é dotado de pequenos efetivos policiais que tem por intuito prevenir e reprimir crimes diversos. Em suma, em sua grande maioria de menor potencial ofensivo. Porém, essa modalidade criminosa aproveita desse numerário reduzido e a imprevisibilidade de suas atuações para orquestrar ações rápidas, violentas e eficazes.

 

O BOPE8 da Policia Militar do Estado de Minas Gerais tem papel preponderante no combate a essa modalidade criminosa. Por deter de efetivo especializado em Operações Especiais e Operações em Áreas Rurais, podem ser desencadeadas por essa unidade algumas providências de primordial relevância. Por ser detentor de conhecimento específico nessa área e ter policiais interagindo em outros estados em treinamentos de combate a essa modalidade buscando adaptar a realidade vivenciada e oportunamente a modelo da Polícia Militar do Mato Grosso, desenvolver POP’s (Procedimento Operacional Padrão) a serem disseminados nos rincões de Minas Gerais para parametrizar casos de acionamentos, cerco e bloqueio e providências posteriores, podem ser essenciais para solução destes eventos de defesa social. Destarte, mapeamento das regiões, estudos de caso das ações criminosas, desenvolvimento de planos de melhores maneiras de atuações e combate com efetivo disponível e equipamento. Ainda por ser missão secundária do BOPE, existe a possibilidade de desenvolver treinamentos de primeiro interventor em ocorrências de assalto a banco. Ressalta-se que é necessária a conscientização de que as ocorrências desta modalidade não devem ser atendidas apenas como pós-explosão (ação secundária) desenvolvida pelo EAB9, mas primordialmente como ação de emprego imediato de um primeiro   efetivo especializada (ação primária) desenvolvida pelo COMAF10 para busca e captura de criminosos.

 

Na atualidade o BOPE se encontra com efetivo reduzido, inviabilizando o trabalho itinerante (relembrando as volantes), guarnições rodando em regiões específicas de Minas Gerais sem prazo determinado devidamente orientados por órgãos de inteligência de segurança pública. Não podemos descartar, porém atuações desta unidade quando da ocorrência destes fatos com a maior brevidade possível. Como outra proposta não se pode descartar possibilidade de descentralização de frações especializadas (Pelotões de Operações Especiais) em um segundo momento, uma vez que é crescente a necessidade de aumento do efetivo da unidade e emprego constante nos interiores.

 

Uma proposta ainda é o trabalho integrado entre Ministério Público e as agências de

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8 BOPE – Batalhão de Operações Policiais Especiais. Situado na região metropolitana de Belo Horizonte é unidade com atuação em todo Estado de Minas Gerais.

9 EAB – Esquadrão Anti Bombas. Equipe do BOPE responsável por intervenções em eventos envolvendo suspeita de artefatos explosivos, com competência técnica para realizar intervenções para solucionar a crise.

10 COMAF – Comando de Operações em Mananciais e Áreas de Floresta. Equipe do BOPE responsável por intervenções em áreas rurais, com objetivo de busca e captura de indivíduos homiziados em área de matas e florestas.

segurança para identificação preventiva das organizações criminosas atuantes nessa modalidade, suas denominações, objetivos com a ação, suas localizações dentro e fora do Estado. Desta forma, intervenções estratégicas ocorreriam anteriormente às ações criminosas, evitando assim a quebra da sensação de segurança, os atentados contra agentes de segurança pública, a destruição de patrimônio público/privado, subtração de bens para realização das ações (como veículos furtados), assim como inibir a aquisição de armamento e equipamento de uso restrito, impedindo por fim a subtração dos valores financeiros.

 

Após sinistro, não evitado por recursos anteriormente supracitados, não havendo sucesso na captura imediata (mesmo no flagrante continuado) dos infratores, existe a necessidade de uma investigação minuciosa e direcionada a busca de provas e informações que levem a prisão dos autores destas ações criminosas. Para isso, o efetivo empregado em tal ação deve deter de especializações e conhecimento prévio desta modalidade criminosa e buscar formas diversificadas para identificar autores e suas origens.

 

A maior dificuldade encontrada nestas situações supranarradas são a falta de efetivo disponível nos interiores e unidades especializadas nesta modalidade criminosa, recursos financeiros insuficientes disponibilizados pelo Estado que poderiam ser revertidos para compra de armamentos, viaturas, equipamentos de proteção individual e coletivo, indisponibilidade de pagamento de diárias para cursos de especialização e seminários fora do Estado e que versem sobre o tema. É necessário que policiais de unidades especializadas como BOPE ou especialistas nesta modalidade, viagem para ministrar aula/treinamento qualificando soldados alunos em formação nos rincões mineiros, ou até mesmo realizar treinamentos para os já formados lotados nestas unidades.

 

Resta demonstrado que o Estado detém em seu aparelho preventivo e repressivo efetivos especializados, recursos de pessoal profissional e técnico para fazer frente a esa modalidade assim como a disposição para treinar e aprimorar policiais que ingressarem na carreira policial. Porém existe a necessidade de investimento em contingente e armamentos para enfrentamentos desta modalidade no interior e dispêndio financeiro para esse enfrentamento.

 

O tema por tal relevância, não se esgota com apresentação deste artigo, que tem por finalidade despertar interesse de demais profissionais de segurança pública para amplitude do assunto e debate deste crescente problema.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Fontes de Pesquisa:

 

 

Reds: https://web.sids.mg.gov.br/reds/

Acessado em 23/01/17

 

http://www.infoescola.com/historia/o-cangaco/
Acessado em 23/01/17

 

http://professorlfg.jusbrasil.com.br/artigos/121929367/crime-organizado-migracao-e-busca-de-lucro-facil

Acessado em 08/01/2017

 

https://www.armador.com.br/wordpress/cangaceirismo-moderno/

Acessado em 08/01/2017

 

CARVALHO, Alfredo Wanderley. O CANGAÇO MODERNO E AS FORÇAS POLICIAIS NO SERTÃO DE PERNAMBUCO.Monografia apresentada como exigência para obtenção do título de graduação em Licenciatura em História, através da Autarquia de Ensino Superior de Arcoverde –AESA, Centro de Ensino Superior de Arcoverde –CESA; Arcoverde: 2010. p.12;13.

 

MAGALHÃES,JorgeLuiz de, A FRAGILIDADE DO APARELHO POLICIAL COMO FATOR MOTIVADOR ÁS AÇÕES DE QUADRILHAS DE ROUBO A BANCO NA ÁREA DE CIRCUNSCRIÇÃO DO COMANDO REGIONAL. Monografia apresentada por Ten Cel da PMMT, Oficial Aluno do Curso Superior de Polícia, Bacharel em Ciência Jurídica, Especialista em Gestão de Segurança Pública -Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) e pós graduando em Gestão Organizacional de Segurança Pública -Universidade Estadual de Mato Grosso (UNEMAT).