A contação de histórias como influência na formação do leitor

Por marluce bueno | 27/04/2017 | Educação

INTRODUÇÃO 

A leitura tem sido objeto de pesquisa para bibliotecários, pedagogos, lingüistas, literatos, sociólogos e psicólogos, dentre outros profissionais, e para entender a amplitude do tema, é necessário nortear-se sob o foco de variadas referências científicas.

Atribui-se à biblioteca, à escola e à família, a responsabilidade pela introdução e fomentação do gosto pela leitura, o que contribui para o desenvolvimento do indivíduo como agente formador de opinião.

A motivação para realizar um estudo sobre a contação de histórias e, mais especificamente, sobre a sua influência na formação do leitor, teve início com o seguinte problema de pesquisa: saber se a contação de histórias interfere na formação do leitor.

Como a criança se torna leitor competente e formador de opinião, com gosto por ouvir histórias? Quem está ocupando o papel de contador de histórias que incentiva o gosto pela leitura-leitor? O pai? A mãe? O bibliotecário? O professor? Outras pessoas fora do âmbito escolar e familiar?

Almejando responder a essas indagações realizou-se uma pesquisa de caráter qualitativo, fundamentada nos pressupostos teóricos, com o propósito de alcançar o seguinte objetivo: identificar a influência da contação de histórias na formação do leitor competente para ler e compreender as condições humanas e científicas. Este objetivo, por sua vez, desdobrou-se em: a) distinguir as formas de aplicação da contação de histórias;  b) conhecer o perfil do leitor/ouvinte de histórias; c) investigar a influência da Biblioteca na para a formação do leitor.

O problema desta pesquisa, de acordo com o recorte feito por meio da escolha dos objetivos propostos, tem significativa relevância para a área  da biblioteconomia considerando a importância em conhecer o perfil acadêmico em três grandes áreas do conhecimento: Humanas, Biológicas e Exatas , além da invasão tecnológica  acontece cada vez mais rápida , junto novas ferramentas e principalmente a internet  que também aumenta cada vez mais o volume de informações a serem lidas, assimiladas, e compreendidas. O que cada vez mais se torna necessário o hábito da leitura, e principalmente, a compreensão do que se lê.

A grande maioria do referencial teórico apresentado situa-se no campo da formação do leitor através de dinâmicas de incentivo à leitura, que aborda situações de valorização do ato de ler para que haja compreensão

Segundo Lajolo (2004) nenhuma pessoa nasce sabendo ler, é preciso aprender e a medida em recebe-se informação aumenta o grau de compreensão. O hábito e gosto pela leitura é construído aos poucos, fortalecendo o raciocínio lógico e proporcionando uma leitura de mundo. É importante ler, porém mais importante é saber contextualizar o que se leu.

Para alcançar os resultados pretendidos, foi elaborado um questionário[1] com variáveis relacionados, a prática da leitura, prática da audição de histórias e a freqüência em bibliotecas em processo de formação intelectual.

O estudo demonstrou-se apropriado porque exemplifica de melhor forma a relação de cada indivíduo com relação a sua formação como leitor  suas práticas e seu hábito de leitura que foi adquirido em sua formação intelectual e a teoria aqui explicitada

A intenção é apresentar a análise do desenho cultural por amostragem do individuo como leitor através de suas práticas de leitura que foram implantadas através de atividades de incentivo, seja da família, da biblioteca ou da escola.

1 REVISÃO DE LITERATURA 

1.1 A importância social da contação de histórias 

Nos primórdios da humanidade, antes do aparecimento da escrita, a transmissão de conhecimentos era feita através do recurso da oralidade. Estes conhecimentos eram passados de geração em geração, contando especialmente com a memória. Desta forma, a cultura de um povo era passada e armazenada na mente daqueles que eram os responsáveis por transmitir o conhecimento.

A transição da oralidade para a escrita fez parte de uma evolução natural. O homem passou para a fase dos registros, retratos da fala, e alterou substancialmente suas mensagens que chegaram ao convívio das crianças através da literatura adaptada e moldada em toda a sua linguagem, em sua estética, acrescida de magia, mas com a sua essência conservada, apesar do longo  caminho percorrido.

Ainda hoje, existem culturas que transmitem suas histórias através da oralidade e cujos registros ainda estão nas mentes dos chefes das tribos. O costume de narrar mitos e histórias em reuniões ao redor da fogueira ou no interior das cabanas ao anoitecer, é muito peculiar das sociedades tribais do mundo todo e essas ações são cruciais para manter viva a tradição e os vínculos sociais.Esclarece Benjamin (2000), que a comunicação é uma forma de transmitir cultura, cultivar através dos tempos o que o homem faz ou produz. Essa metodologia de comunicação que garante a continuidade da cultura dos povos, de geração a geração, costumes, experiências, normas, dá-se, sobretudo, através das manifestações da literatura oral ou contação de histórias. 

Nações e povos são em grande parte as estórias que nutrem a si mesmos. Se eles contam a si mesmos estórias que sejam mentiras, sofrerão as conseqüências futuras. Se contarem estórias que enfrentam suas próprias verdades, libertarão a sua Historia para florescimentos futuros. (BEN OKRI. Apud LUBA, Alba[1]

As histórias sempre estiveram muito próximas das pessoas,  em todos os momentos da evolução humana. A arte de contar histórias, proveniente da tradição oral, representa mais que um desenvolvimento intelectual, pois relaciona-se profundamente com o encontro interior e com questões íntimas compassadamente  com o mundo exterior através de histórias ouvidas.

Tahan (1961), destaca que tanto no presente como no passado existe uma poesia de voz. Esta inspiração traz diversas funções igualitárias e rítmicas pela expressão. Por vários aspectos existe a tradição da oralidade na vida cotidiana, no ensino, no testemunho judiciário, na consulta médica. A transmissão oral, quando impressa em forma de poesia, dá primazia ao ritmo sobre o significado, da ação sobre a representação, percebendo sempre a influência da contação de histórias na vida cotidiana de cada um. A oralidade, esta diretamente ligada as expressões humanas de comunicação que interligam a transmissão de conhecimentos

Sobre a narrativa, como uma forma artesanal de comunicação, discorre Benjamim (2000): “os camponeses e os marujos foram uns dos pioneiros mestres da arte de narrar, foram os artífices que a aperfeiçoaram”. A narrativa  relaciona-se com a contação de histórias que sempre esteve ligada à oralidade dos povos,  independente da classe social e de sua cultura, a contação de histórias, favorece a aproximação das pessoas e promove além do bom relacionamento a transmissão de tudo que se aprende e deixa um tom de romantismo e integração do ser humano..

Há séculos, as histórias permanecem na imaginação do adulto e da criança. São contos de fadas, fábulas, lendas e mitos, narrativas de tradição oral que, derrubando fronteiras e limites, continuam vivas na memória das pessoas que um dia as conheceram, por se tratar de um “fenômeno antropológico”, de acordo com Coelho (1994), que ultrapassa limites e significados literários, tornando-se parte da própria história do homem, e que permanece ligado à sua oralidade, transmitindo informação.

1.2 A contação de histórias no desenvolvimento da criança

Histórias são importantes para o desenvolvimento das crianças e na formação do leitor, pois possibilitam a oportunidade de projetar seus próprios pensamentos e sentimentos com o de personagens que podem, de certa forma, estar passando pelos mesmos problemas daquele que ouve e ou lê a história. Além disso, permitem que o indivíduo explore suas dúvidas e questionamentos para chegar a um entendimento e à construção de um raciocínio lógico.

Para Abramovich (1991), ouvir histórias é também suscitar o imaginário, é ter a curiosidade respondida em relação a tantas perguntas, é encontrar idéias para solucionar questões. A criança em processo de aprendizagem, que busca neste mundo de imaginações o seu verdadeiro mundo, poderá obter rumos que despertem a consciência crítica.

As histórias podem influenciar o gosto pela leitura, estimular o desenvolvimento psicológico e moral, enriquecer o vocabulário, ampliar o mundo de idéias e aumentar o conhecimento.

Quando Coelho (1994), reforça que, constatada a importância da história  como fonte de prazer para a criança e a contribuição que oferece ao seu desenvolvimento, percebe-se que a narrativa contribui e desperta o senso crítico.

Coelho (2000), discorre que um dos pontos altos de contar histórias é o lúdico, a recreação, porém, a importância da contação de histórias vai além de tais atividades. Por meio delas, é possível enriquecer as experiências infantis, desenvolver as diversas formas de linguagem, ampliar o vocabulário, formar o caráter e desenvolver a confiança na força do bem, proporcionando àquele que ouve viver o imaginário e atingir o conhecimento e a compreensão do mundo.

A história também tem o poder de estimular o desenvolvimento de funções cognitivas importantes para o pensamento, tais como a da comparação entre figuras e a história contada, o pensamento hipotético, divergente ou convergente, o raciocínio lógico, as relações espaciais e temporais, pois toda e qualquer história é composta de princípio meio e fim. Os enredos das histórias também são, geralmente, organizados de forma a utilizar um conteúdo moral com a possibilidade de interferência das ações das personagens que colaboram e difundem a construção da ética e da cidadania na formação do indivíduo

É possível afirmar que existem dois tipos de histórias: aquelas que alimentam a alma e permitem a transmissão de valores e de imagens arquetípicas fundamentais para a construção da subjetividade, e aquelas que servem para despertar o raciocínio e o interesse para  agir de diversas formas e até mesmo para estar no mundo.

Seguindo os pensamentos de Propp (1984)

“os contos fantasiosos são muito atuais, satisfazem pois, mapeiam os impulsos e temores conscientes e inconscientes copiam experiências reais” Abordam os problemas universais, vão de encontro com idéias preconcebidas e saem em defesa das causas aparentemente perdidas. Relatam medos, amores, a felicidade de ser criança, carências, autodescobertas, perdas e ganhos, vida e morte. Revolvem os mais profundos pensamentos e trazem à consciência pensadora inovações dos pensamentos levando a novos caminhos. 

A característica da fantasia está ligada às ações reais da formação humana, pois pode-se obter realizações através da vivência de processos literários por meio da contação de histórias

Coelho(1987), defende a teoria de que os contos de fadas são os mais indicados para ajudar as crianças a encontrar um significado na vida, recebendo grande influência na sua formação, pois, ao estimular a imaginação, desenvolvem o intelecto favorecendo a clareza de suas emoções. 

O "contar histórias" é uma questão cultural que foi praticamente se perdendo com o passar do tempo, apesar de que ainda contamos muitos casos, histórias, fatos que aconteceram. Mas ainda é importante abrir espaço para os contos de fada e fábulas para crianças, porque tudo isso traz lições de vida. Contos de fada não acontecem somente no mundo da fantasia, ocorrem também na vida real. Isso ajuda a estruturar e a elaborar a personalidade da criança, fortalecendo sua parte emocional e psíquica e, até mesmo, contribuindo para a leitura do sonho, do prazer. O ato de contar de histórias é o momento em que a família se reúne para trocar experiências que aprenderam, e passar outras; é mesmo o momento do diálogo. Em cada conto também há trocas afetivas, porque quando se conta uma história, sentimentos e emoções são expostos, isso ajuda a cativar o sujeito que ouve, tornando-se um hábito. Se o "contar histórias" puder vir desde a tenra idade, será melhor. Por exemplo: à noite, quando a criança vai dormir, às vezes, ela tem medo de escuro, ouve barulhos e se sente desamparada. A hora da história será o momento de acalmar, de levá-la para o mundo da fantasia, fazendo-a sonhar, até mesmo tranqüilizar para a horinha do sono. (ABRAMOVICH, 1991) 

Portanto, a contação de histórias, de acordo com os autores citados, além de favorecer o desenvolvimento do indivíduo nas áreas psicológica, intelectual e cultural, ajuda a transformar as condições de um povo e traz novos valores inoculados na formação do leitor.

1.3 O contador de histórias

O contador de histórias nasceu a partir do momento em que o homem sentiu a necessidade de buscar explicações para os fatos que aconteciam. Porém, na Antigüidade, os homens não sabiam escrever, então conservavam as suas vivências na tradição oral. Enquanto as histórias contadas não haviam sido registradas através dos signos gráficos, ganhavam a cada versão, detalhes e variações, dependendo do conhecimento, vocabulário, crenças, estilos, e até do público ouvinte de cada narrador.

Os camponeses contavam suas histórias sentados em volta de uma fogueira e seus personagens centrais eram reis, rainhas e tesouros. Vivenciavam esses personagens e suas façanhas, descobrindo os tesouros mais escondidos e aventurando-se pelos mais  belos e ricos “palácios encantados”.

Para Coelho(1981), contar histórias é uma arte que requer uma tendência inata, uma predisposição latente em toda pessoa que se propõe a desenvolver um trabalho pedagógico ou artístico com crianças. É um conjunto de técnicas atribuídas ao ensino da didática que eclodem desse talento para serem desenvolvidas e estimuladas.

Importante destacar que o contador precisa estar consciente de que é a história apresentada que deve ser ponto central. Ele apenas ocupa o papel de transmissor, relata o acontecido que deve ser apresentado de forma natural, deixando as palavras fluírem.

Um exemplo claro de contador de história foi Jesus Cristo (PRICE, 1995). Ele fez uma clara opção pela prática da contação de histórias, ou seja, utilizou a fala. Pode-se tomar por exemplo o Sermão da Montanha, onde Jesus inicia o ensino centrado no discurso, na contação de histórias para transmitir seus ensinamentos  cujos preceitos perpetuam até nossos dias, de acordo com as doutrinas do cristianismo.

Outro contador de histórias foi o filólogo francês Charles Perrault, que no século XVII coletou histórias da Idade Média, adaptou e imortalizou contos tais  como: O gato de botas, Cinderela, Chapeuzinho vermelho, entre outros.

No século XIX, a concepção dos contos de fadas alterou-se com o aparecimento dos Irmãos Grimm, Jacob e William Grimm, filólogos e folcloristas, historiadores  e pesquisadores, que recolheram diretamente da memória do povo a matéria-prima de seus contos, redescobrindo o mundo maravilhoso da fantasia que sempre habitou a imaginação humana. Contos que estão embutidos na literatura infantil e que são conhecidos por uma maioria de indivíduos.

Existe um grande acervo de contos maravilhosos que estão reunidos na coletânea “As mil e uma noites”, de origem árabe, cuja forma original surgiu no século XV e foi divulgada na Europa a partir do século XVIII.

Jean la Fontaine, denominado o mestre dos fabulistas modernos, introduziu a forma de fábula que conhecemos hoje. Esta é de origem rural e seu surgimento remonta a épocas muito antigas. Mostra a realidade vista por um ângulo diferente ao traduzir a necessidade natural do homem em relação à expressão de seus pensamentos.

Contos de fadas e fábulas são estilos que fazem parte da cultura literária infantil. 

1.4 A formação do leitor 

Lajolo (2001), pondera que ninguém nasce sabendo ler: aprende-se a ler à medida em que se vive. Se ler livros geralmente se aprende nos bancos da escola, outras leituras se aprendem por aí, na chamada escola da vida. Segundo a autora, a leitura é construída aos poucos, fortalece o raciocínio lógico e proporciona uma leitura de mundo. É importante ler, porém mais importante é saber contextualizar o que se leu, ou seja, a leitura deve ser um 

[...] processo que envolva uma compreensão crítica do ato de ler que não esgota na decodificação pura da palavra escrita, mas que se antecipa e se alonga na inteligência do mundo. A leitura do mundo precede a leitura da palavra, daí que a posterior leitura desta não possa prescindir da  continuidade da leitura daquele. Linguagem e realidade se prendem  dinamicamente. A compreensão do texto a ser alcançada por sua leitura crítica implica a percepção das relações entre o texto e o contexto. (FREIRE, 1992)

Portanto, a formação de cada leitor é particular, de indivíduo para indivíduo, porém as ações para que se tornem ouvintes/leitores estão entrelaçadas para todos, recuperando cada um de forma peculiar de acordo com a sua sensibilidade e devendo-se respeitar o tempo e o momento de cada indivíduo.

Para Lajolo (2004), a escrita, os livros e a leitura estão presentes em várias expressões que enchem nossa boca e nossos ouvidos. Parafraseando a escritora, quem é que nunca ouviu a frase "o homem que lê vale mais"? Expressões como esta valorizam a intelectualidade e permeiam a cultura de um povo enriquecendo-as adicionadas a tantas outras expressões, que têm sentido positivo na formação do indivíduo. 

A escrita, a leitura e o livro atestam e passam recibo do valor de uma pessoa, da transparência e inteligibilidade de um processo, da força da escrita como determinadora ou, pelo menos, de influenciadora de normas e de comportamentos. No entanto, ouvimos a todo momento dizer que o brasileiro lê pouco. E por que um povo que em tese não gosta de ler atribuiria tanto valor à leitura a ponto de fazer dela e dos livros metáfora de valores construtivos? Talvez a história não seja bem assim e a questão não esteja na quantidade de romances, ficções e aventuras consumidos anualmente. (LAJOLO, 2004) 

Quando Lajolo (2004) nos leva a perceber a leitura como uma metáfora de valores construtivos, algumas questões se apresentam: Se existem expressões que certificam o valor das pessoas com base no que lêem também poderia ser atribuído valor ao que se ouve? Seria possível formar seres através do conhecimento oral? Aprimorar a escrita? Dar novos rumos, impregnar o conhecimento desde a infância, através da audição? Como conhecer quem é leitor e quem não é?

Na Idade Média segundo Lucas (2000), a leitura era conhecida como possibilidade de acesso de um sujeito a um tesouro, era uma via para o alcance da sabedoria, prescrita e recomendada como exercício, onde os textos sagrados eram disponibilizados apenas para aqueles que eram considerados cultos e marcados para serem leitores .

Durante milênios, a leitura foi uma forma de discriminação social. Desde os primórdios da introdução da escrita, saber ler e escrever esteve ligado aos escribas reais, as esferas do poder e da religião. A  leitura sempre esteve ligada à capacidade de se medir o tempo, a comunicação, e memória.

Barthes (1994) apresenta a leitura na atualidade, como uma prática de lazer, um prazer , ao qual todos podem ter acesso, onde o ápice esta no próprio ato de ler, independendo do conteúdo de textos, onde a leitura torna-se uma via privilegiada de acesso ao imaginário.

Para este trabalho, é importante verificar até que ponto a biblioteca tem influência na formação do leitor e se atividades de dinamização como a hora do conto podem levar o indivíduo a obter o desejo de buscar novos assuntos, texto de seu interesse e prática de leitura.

As respostas sobre esses leitores nominais ou ocultos poderiam nos fazer conhecer o perfil de uma nação, cruzar dados que nos revelem quem lê e o que lê, proporcionando-nos conhecer os indivíduos e a sua cultura 

1.5 Para que ouvir histórias 

De acordo com Amarilha (2004), o ato de ouvir histórias é o primeiro passo para tornar-se um leitor, para descobrir que através do livro é possível encontrar idéias, satisfazer a curiosidade, encontrar soluções para um problema, descobrir a realidade cercada por conflitos, impasses, identificar-se com um personagem, superar as dificuldades, descobrir lugares novos. Assim, a contação de histórias interfere diretamente na vida e na formação do leitor que recebe informações e que, aos poucos, armazena e produz a decodificação deste dados, tornando-se capaz de solucionar seus próprios problemas.

Segundo Malba Tahan (1961), as histórias denotam o poder de observação,  treinam a memória, exercitam a inteligência e a lógica, aguçam o poder imaginário e as emoções, aprimoram as relações sociais das criança. Ouvir histórias ordena o pensamento, enriquece o vocabulário, dá ordem lógica aos fatos desenvolvendo a capacidade de compreensão do leitor em processo de formação que, com a leitura dos signos gráficos, passa a ter compreensão daquilo que lê com capacidade de contextualizar o assunto transmitido.

A transmissão oral, que por muitos séculos foi a forma de preservar  valores de inúmeras culturas, já denotava uma iniciação do leitor, como foi o caso do povo hebreu, que transmitiu sua cultura utilizando a oralidade e preservando a cultura de uma época e de uma nação.

Para Abramovich (1991), aprende-se a ler e a gostar de ler, aprende-se a ter satisfação com a leitura, aprende-se a acompanhar o que é dito moda na literatura, aprende-se a ter critérios e opiniões de leitura, aprende-se a julgar valores estéticos. Tudo isso se aprende lendo. Ou seja, a informação está vinculada à leitura, quanto mais se lê, mais informação será retida, e Abramovich afirma que: “é importante para a formação de qualquer criança ouvir muitas histórias, escutá-las é o início da aprendizagem para ser um leitor, e ser leitor é ter um caminho absolutamente infinito de descoberta e de compreensão do mundo”

A iniciação com as maravilhas de uma história acontece, em geral, adentrando pelos ouvidos da criancinha. È a voz da mãe, do avó, do tio visitante, da primeira professora que chama sussurrante para a gostosura  de embalar na lindura dum conto de fadas, num episodio da Bíblia ou na magia duma lenda, dum poema brincante, na aventura de outra criança parecida com ela[...]. Se a história for acalentante contada o encanto envolve abraçante e o gostinho de quero mais e mais... permanece marcante e marcado. (ABRAMOVICH, 1991)

Ao sentir coisas como estas, observa-se que, é possível serem introduzidos na formação da crianças, de acordo com a faixa etária e em processo de formação, assuntos que agucem o interesse que irão promover o aprendizado.

O gosto pela leitura, como prazer ou até mesmo como opinião, não é nato da natureza humana, inflexível e acabado. A sua formação tem a ver com as necessidades, com o tempo e com o espaço em que se movimentam as pessoas e os grupos sociais cada vez mais envolvidos com o compromisso de formar cidadãos conscientes e formadores de opinião. 

Teberosky(1993), pesquisador contemporâneo da questão do leitor, argumenta que “o ser humano natural não é escritor ou leitor, mas falante e ouvinte” e “bons leitores surgem a partir de bons falantes, capazes de recitar”. Observa-se através da ótica do autor, que tal referência pode ser muito proveitosa no caso da iniciação do leitor seguindo este raciocínio, pois se o indivíduo ouve histórias logo gostará de ler  e será cada vez mais introduzido no contexto da universalidade da leitura .

Oralidade e escrita caminham juntos nos mais diversos lugares, salas de aula, bibliotecas etc. Desta forma, a contação de histórias e leitura completam-se para estimular o gosto literário e a iniciação do leitor.

Segundo Eco (1994), “ler é como uma aposta. Apostamos que seremos fiéis às sugestões de uma voz que não diz explicitamente o que está sugerindo”. É deixar a imaginação tomar conta do que sente, é dar asas à imaginação num mundo universal, é proporcionar a certeza de erros e acertos, é fomentar no indivíduo a percepção de compreender que a leitura induz a caminhos que podem ou não ter sido sugeridos pelo autor.

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