A Conferência Nacional de Educação 2010: um olhar crítico-social no novo documento e suas diretrizes para o ensino no Brasil.

Por Orleans Oliveira de Sousa | 29/03/2011 | Política


A Conferência Nacional de Educação 2010: um olhar crítico-social no novo documento e suas diretrizes para o ensino no Brasil.

Discutir a educação, em particular no Brasil, é algo meticuloso e complexo, considerando que as leituras feitas por intelectuais, acadêmicos, políticos partidários, sociedade civil e demais atores sociais são de diversas formas, como por exemplo o de que esta vem ganhando significativa universalização no atendimento bem como melhor qualidade.
O novo documento do CONAE (Conferência Nacional de Educação) traz discussões relevantes para que sejam pensadas as novas políticas educacionais no Brasil a partir de 2011, haja vista tal documento balizar e fundamentar o novo Plano Nacional de Educação para a década de 2011/2020.
As políticas que sustentam teoricamente o funcionamento do ensino brasileiro são dadas conforme planos realizados pelos poderes de cada esfera, municipal,estadual ou federal levando em conta os dados encontrados em Institutos de Pesquisa a exemplo do INEP ( Instituto de estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira).Dessa forma, o norteamento dessas políticas se dá dentro de visões como a de equidade, categoria bastante defendida nas propostas, principalmente a partir de 1990, estando em culminância nos últimos anos dessa década. O novo documento da CONAE foi desenvolvido a partir do tema: Construindo o Sistema Nacional Articulado de Educação: O Plano Nacional de Educação , Diretrizes e Estratégias de Ação.Este, vem ao encontro das insatisfações da população em geral destacando-se que as conferências foram realizadas de forma articulada com a sociedade e que tal conferência está em um âmbito maior: O Sistema Nacional de Educação.
As propostas do documento da CONAE, realizada em Brasília no período de 28 de março a 1º de abril de 2010, nos convida a um olhar sociológico no que diz respeito à explicação das necessidades educacionais brasileiras, faremos tal olhar nos recortes dos eixos estruturados conforme as prioridades desencadeadas pela conferência e estabelecendo uma mediação dialética com os temas: melhoria, qualidade, equidade e igualdade.
Eixos:
I ? Papel do Estado na garantia do direito à educação de qualidade
II ? Qualidade da educação, Gestão Democrática e Avaliação
III ? Democratização do Acesso, Permanência e Sucesso Escolar
IV - Formação, Valorização do Trabalhadores em Educação
V ? Financiamento da Educação e Controle Social
VI ? Justiça Social, Educação e Trabalho: Inclusão, Diversidade e Igualdade
Em breves comentários tentaremos fazer uma análise simples por eixo, tentando estabelecer diálogo com situações postas no que se refere ao atual contexto educacional.

Eixo I: Papel do Estado na Garantia do Direito à Educação de Qualidade

O oferecimento de educação de qualidade, incluindo o cumprimento da mesma perante a lei e perante os planos implementados pelo Estado é familiar a todos(as) os(as) participantes do processo político brasileiro, haja vista a conquista na participação da sociedade como pressuposto em contribuições relevantes na elaboração de melhores propostas, ou melhor, a transcrição da fala das várias segmentações sociais ao encontro das necessidades educacionais observadas durante o reconhecimento de cada cidadão como sujeito ativo e social.
A Conferência Nacional de Educação no seu documento final enfatiza a obrigatoriedade do Estado perante a lei no que se refere à oferta do ensino, destacando também a importância de uma política efetiva e qualitativa como resgate e como dívida ao povo brasileiro por termos tido marcas históricas fortemente impregnadas de práticas elitizadas, discriminatórias, burocráticas etc. Cunha (2001) em Estado, Democracia e Educação no Brasil reforça tal afirmativa na seguinte passagem:

A educação escolar brasileira é herdeira direta do sistema discriminatório da sociedade escravagista sob dominação imperial. Mesmo tendo deixado de existir, o escravagismo deixou marcas persistentes na escola atual, apesar do avanço do capitalismo no Brasil e de alguns períodos de maior abertura do sistema político.(Cunha,2001.pág.31)

É preciso falar agora em uma educação articulada dentro de um sistema nacional de educação. A voz dos 3.889 conferencistas transformou-se em 677 emendas a serem a serem referência na elaboração do novo PNE 2011 /2020 dentro de um Sistema Nacional de Educação que segundo os participantes a ausência de um SNE configura a forma fragmentada e desarticulada do projeto educacional vigente no país.
Romper práticas políticas com o funcionamento da educação brasileira tal como é dada, ou seja, relações capitalistas de estado, características gerencialistas, estado burguês, e outras é de fato, desafio aos que propõem tal ruptura, considerando-se que para isso, é necessário uma política que saia dos documentos formais e ganhe consistência na implementação.
Fica claro, em tese, os caminhos mais favoráveis a uma educação com qualidade contínua e articulada. Por exemplo, ao entendermos que não se desenvolve uma educação sem financiamento coloca-se tal alternativa em termos como CAQ Custo Aluno/a-Qualidade,. de fato, os valores estabelecidos em lei, na lógica do discurso, vai ao encontro da relação valor aluno/ano e a paridade educação/qualidade, porém o discurso do aumento do valor é, indubitável, o que não é assegurado, principalmente no ensino público é a concretização do valor/qualidade. Atualmente, com o FUNDEB, a média nacional do valor aluno/ano é de R$ 1.415.97 2010 colocando-se em discussão investimento x qualidade, não obscurecendo o crescimento de tal valor em relação aos anos anteriores.
Diante desta realidade, é necessário um olhar especial ao novo PNE Plano Nacional de Educação a ser implantado a partir de 2011, tendo em vista a necessidade de políticas sustentáveis de educação.

Eixo II - Qualidade da Educação, Gestão Democrática e Avaliação

Dada a realidade educacional brasileira, situada em espaços contraditórios no que se refere ao financiamento x resultados, destacamos o enfoque dado pelo documento da CONAE, qualidade social e democratização da gestão. Com as novas políticas do MEC Ministério da Educação e Cultura, sobretudo o PDE, Plano de Desenvolvimento da Educação, as Instituições escolares são norteadas por propostas de descentralização, autonomia, autogestão etc, inculcando à comunidade escolar, práticas democráticas e participativas da gestão.
A escola é espaço de democracia, a partir da gestão, considerando-se dessa forma que é possível elevar o sucesso da escola por meio de uma prática articulada de gestão, não deixando de nos atentar ao fato de que uma unidade de ensino não se solidifica sem que haja o envolvimento de outros setores da sociedade. É necessário desenvolver políticas contínuas e que tenham início, meio e fim durante sua implementação.
Diante dessa questão, coloca-se a necessidade de cobrança pelos diversos atores sociais da efetividade das propostas que lemos nos diversos documentos oficiais do Governo Federal, bem como por direito à continuação dos projetos e planos educacionais para que a melhoria da educação não sofra interferências com as transições governamentais. Ao propor um Sistema Nacional Articulado de Educação, concebe-se que temos que levar em conta a parte e o todo, desde a avaliação externa aos intramuros da escola, como por exemplo, planos do sistema, da instituição educativa, do professor e do estudante assim explicado no documento da conferência.
No âmbito da avaliação do Sistema Nacional de Educação no Brasil, a discussão se pauta na problemática dos modelos e finalidades da atual forma de avaliação. Propõe-se uma política nacional de avaliação articulada ao subsistema, vendo-se agora a necessidade de uma avaliação que contemple não só o ranqueamento das instituições educativas mas também que vise o desenvolvimento dos sistemas de ensino e do processo ensino-aprendizagem. De fato, o significado avaliar para melhorar fica um tanto desejável considerando que o distanciamento entre públicas e privadas e privadas e públicas existe por falta de políticas que articulem o sistema de ensino.
A meta qualidade educacional a ser implementada na visão da CONAE, está constituída dentro de propostas que atendam a educação de forma articulada e também considerando as especificidades de cada realidade. Implementar políticas articuladas de educação afim de diminuir as desigualdades em termo de qualidade é desafiador haja vista os dados do IDEB (Índice Desenvolvimento da Educação Básica) mostrarem dados que favoreçam à reflexões a respeito de qualidade dentro de um sistema. O documento do PDE (Plano de Desenvolvimento da Educação), destaca as diferenças gritantes entre os índices de desenvolvimento da educação básica IDEB. A diferença entre redes varia de 1 a 6,8 e entre escolas 0,7 a 8,5 ratificando a complexidade de uma política orgânica e sistematizada no que diminua essas disparidades..
O PDE ao tentar desenvolver uma política orgânica e sistematizada no que se refere à distribuição de recursos financeiros, pedagógicos, tecnológicos e outros o faz considerando seis pilares fundamentais: visão sistêmica da educação, territorialidade, desenvolvimento, regime de colaboração, , responsabilização e mobilização social. Nessa perspectiva o desenvolvimento de um plano de educação deverá estar diretamente vinculado a outras nuances do processo como por exemplo, interlocução dialética entre governos e subsistemas de educação. No eixo em discussão, qualidade da educação, gestão democrática e avaliação, mais do que articulação, é necessário doses de criticidade por parte de todos os membros da sociedade, criando-se relação de diálogo entre modelos políticos e práticas escolares.

Eixo III - Democratização do acesso, Permanência e Sucesso Escolar

Luiz Antônio Cunha em Educação, Estado e Democracia no Brasil, no capítulo Democracia Restrita, Escola Excludente destaca o termo democracia na visão de Bobbio

Uma definição mínima de democracia reconhece como tal o regime onde existia um "conjunto de regras de procedimento para a formação de decisões coletivas, em que está prevista e facilitada a participação mais ampla possível dos interessados.(Marx,apud Bobbio 2001.pág.20)

Em se falando de democratização do acesso, permanência e Sucesso escolar as propostas do documento do CONAE foram discutidas com base nos dados sobre a realidade educacional brasileira tanto no ensino básico como no superior. A partir dos anos de 1990, a educação brasileira é discutida e analisada dentro do contexto do neoliberalismo. A exemplo disso destacamos a seguinte passagem:

A educação é a pedra angular do crescimento econômico e do desenvolvimento social e um dos principais meios para melhorar o bem-estar dos indivíduos. Ela aumenta a capacidade produtivas das sociedades e suas instituições políticas, econômicas e científicas e contribui para reduzir a pobreza, acrescentando o valor e a eficiência ao trabalho dos pobres e mitigando as conseqüências da pobreza nas questões vinculadas à população, saúde e nutrição ( Banco Mundial, 1992, p.02)

A partir dessas premissas, as políticas públicas ganham legitimação, estabelecendo-se metas e prazos no cumprimento do que se considera urgente. O que destacamos são os dados vistos em relação à melhoria do ensino no Brasil. Segundo o documento da CONAE, ainda há 14 milhões de pessoas analfabetas no Brasil e segundo relatório da ONU publicado em janeiro de 2010 a má qualidade da educação no Brasil contribuiu para que o país não atingisse um bom Índice de Desenvolvimento Humano.
Não se desconsidera a ampliação da oferta de vagas, principalmente no ensino básico público no Brasil, ressalta-se a importância de políticas públicas educacionais menos frágeis e mais consistentes favorecendo possibilidades de aproximação entre o discurso da igualdade, sucesso escolar, e democratização do acesso ao da melhoria o qual é visto em recortes estatísticos e históricos.
A organização do Sistema educacional Brasileiro carece de efetivas práticas políticas com olhares para as particularidades dentro do conjunto bem como para as categorias como igualdade e equidade no que diz respeito à uma educação de boa qualidade para todos, haja vista a não garantia de padrões mínimos de boa qualidade. No que se refere ao ensino superior apenas 12,1% dos jovens entre 18 e 24 anos tem acesso a este nível de ensino sendo 25,9% destes nas Universidades públicas e 74,1% nas Universidades privadas nos chamando atenção estes percentuais ao entendermos que ainda existe bastante deficiências a serem superadas.
A análise das diretrizes do eixo III do documento da CONAE, nos permite questionar sobre o que será considerado preponderante nas novas legislações educacionais, a partir de 2011, com o novo PNE tendo em vista estarmos conscientes da precarização no funcionamento da educação brasileira em todas a suas etapas e modalidades de ensino.

Eixo IV - Formação e Valorização dos Profissionais da Educação

Neste eixo está sendo abordado uma das questões mais sérias nas discussões a respeito do ensino no Brasil. As atuais políticas de formação e valorização dos profissionais da educação não possuem organicidade em relação ao que é implementado , impossibilitando uma sistematicidade e uma lógica de funcionamento do sistema educacional que permita inculcar nos profissionais da educação uma consciência de política favorável à melhoria do ensino.
A partir dos novos pensamentos formalizados no documento da CONAE-2010 e considerando a não existência de uma formação/valorização concretizada no ensino brasileiro é importante nos atentarmos às novas legislações, a partir de 2011, resgatando as políticas implementadas anteriormente e nos situando das mudanças que se dizem postas na melhoria da qualidade do ensino.
O que se pensa a respeito de propostas para a melhoria como exemplo, dedicação exclusiva, redução em 50 por cento da carga horária para atividades extra sala, contratação em regime estatutário,formação de professores em cursos presenciais, garantia de bolsas de estudos em cursos de licenciatura, redução de 50% da carga horária de trabalho para estudantes de pós graduação lato sensu, afastamento com remuneração de 100% aos estudantes de pós graduação stricto sensu, piso salarial nacional, entre outras propostas nos permite indagar sobre questões como:
1 ? Suficiência destas propostas ao que se espera de ensino de boa qualidade;
2 ? Efetivação destas em 100 por cento nas escolas públicas;
3 ? Fragilidade no âmbito da fiscalização por parte do poder judiciário;
4 ? Garantia de articulação no funcionamento por parte do poder executivo.
As discussões do eixo formação e valorização dos profissionais da educação colocam em evidência, a falta de condições mínimas propiciadoras ao bom funcionamento do ensino no Brasil, destacando-se também a necessidade de rupturas com atuais políticas e da quebra dos continuísmos dos discursos.

Eixo V - Financiamento da Educação e Controle Social

As políticas de investimento em educação no Brasil nos faz trazer neste texto, reflexões sobre como acontece o desenvolvimento de tais políticas para manutenção e desenvolvimento do ensino destacando-se a importância de um sistema de financiamento que garanta o funcionamento articulado e que abranja todas as etapas de ensino.
A reforma tributária é colocada no documento da CONAE ? 2010, como necessidade urgente e que esteja pautada pela justiça social e o equilíbrio regional e que esteja principalmente, preocupada em garantir recursos financeiros suficientes e permanentes para a efetivação dos direitos sociais e distribuição de renda . A educação nessa perspectiva, não deverá ser prejudicada, no que se refere a investimentos por nenhuma instabilidade no âmbito da política econômica. Aqui, destacamos o ensino básico, ao se falar em investimentos, por conta das mudanças de fundo a partir de 1996 com a criação do FUNDEF e FUNDEB em 2006. Simon Schwartzman no artigo científico Educação Básica no Brasil: a agenda da modernidade coloca :

{...} A educação básica é responsabilidade coletiva e deve receber, em qualquer sociedade, uma parte substancial dos recursos públicos. Público não quer dizer, porém, hierarquizado, uniforme, monolítico e burocrático. A função do estado em todos os níveis é a de proporcionar recursos, fixar metas, acompanhar resultados e corrigir a as desigualdades e iniqüidades ... A perestroika educacional de que o Brasil necessita consiste em devolver às escolas a autoridade, a responsabilidade, os benefícios e os eventuais custos do seu desempenho. (Schwartzman, artigo científico, Scielo Brasil. Vol. 05 n°13.SP)

A partir dessas inferências , coloca-se como fator exponencial o aumento da cesta de investimentos para que a proposta CAQ Custo aluno/a- qualidade aconteça. No eixo em discussão está evidente a necessidade de investimento em educação no Brasil em relação ao PIB. A proposta dos conferencistas é que este alcance 7% até 2011 e 10% até 2014 que segundo o documento em análise, tal aumento garantirá a efetivação do SNE Sistema Nacional de Educação e o redirecionamento dos processos de organização e gestão no sentido de lograr a qualidade social em todos o níveis e modalidades de educação básica.

Eixo VI - Justiça Social, Educação e Trabalho: Inclusão, Diversidade e Igualdade

Neste eixo, categorias como inclusão, diversidade e igualdade nos faz retomar alguns aspectos ao se analisar as variadas condições no processo de desenvolvimento, considerando a importância de se analisar como o espaço da cotidianidade escolar e também temáticas como justiça social, educação e trabalho estão sendo desenvolvidas haja vista as fragmentações no plano da elaboração e execução das políticas para educação, em particular, no ensino básico.
Nas linhas que seguem, colocaremos em evidência a relação entre justiça social, educação e trabalho e o que temos como prática no âmbito do atual sistema educacional, no que diz respeito à inclusão, igualdade e diversidade. Dessa forma, é importante destacar que:
I ? As políticas de financiamento que contemplam inclusão, diversidade e igualdade não aumentem a exclusão e que estas sejam elaboradas e aplicadas com menor grau de discriminação uma vez que à medida que se divide em pedaços cria-se possibilidades de fragmentações nas relações sociais.
II ? O Estado assuma sem neutralidade a responsabilidade de ofertar com melhor qualidade as diversas modalidades de ensino, abrangendo as políticas de benefício não só em regiões centrais, mas também nas regiões mais distantes e de difícil acesso.
III ? O processo de desenvolvimento de políticas sociais no sentido de garantir inclusão, igualdade e diversidade inicie a partir do despertar da consciência de todos os sujeitos sociais. Estes, devem entender que não se constrói um país com justiça social sem esforços conjuntos e sem a participação nas discussões das propostas para a melhoria da educação.
Aprofundar a respeito deste eixo, exige um olhar para as atuais práticas políticas por parte dos entes federados e também para a forma como está sendo desenvolvido no âmbito do contexto escolar as diretrizes para o ensino formal na perspectiva da inclusão, igualdade e diversidade. Levando em conta as situações postas quando se fala da diminuição das desigualdades, políticas de desenvolvimento educacional e outros, inferimos que precisa-se construir um sistema de educação que esteja além do projeto dado tendo em vista que não se pode dizer que possuímos uma conjuntura que de fato esteja garantindo os critérios mínimos de qualidade educacional.

A relação das diretrizes da CONAE e suas implicações na cultura escolar

Discutir a respeito das implementações das políticas educacionais, especificamente no Brasil, implica situá-las no âmbito da cultura e da prática escolar dentro de um panorama histórico dessas categorias. O processo de elaboração dos planos e projetos educacionais e sua execução se recarregam de várias outras questões que estão dadas em outras instâncias das relações sociais presentes em todos os atos praticados pelos seres humanos.
Ao desenvolver o diálogo entre as políticas do documento do CONAE para o ensino no Brasil e o contexto da prática e da cultura escolar é necessário problematizar a ligação entre educação e sociedade evidenciando os fatores que possibilitam tal ligação, como por exemplo, o entendimento do papel que a educação desempenha na visão tanto da população em geral como na visão dos legisladores e executores das diretrizes do ensino.
O acesso à educação formal e a conseqüente obtenção de certificações está culturalmente associado à ideia de maiores possibilidades de ingresso no mercado de trabalho, isso é uma das inculcações postas na s cultura s escolar brasileira , porém, destaca-se que não é só isso, está presente também em lei, a garantia como dever do estado de uma formação para o exercício da cidadania. A partir dessa dualidade, educação como possibilidade de ascensão social x garantia em lei de uma educação promissora do exercício da cidadania discorreremos alguns pontos em relação ao processo de desenvolvimento e funcionamento considerando dois aspectos: Contradições postas entre o contexto escolar e a formação dos sujeitos e, o papel do estado e a oferta do ensino na realidade brasileira.
No primeiro aspecto, é interessante retomar a discussão a respeito do surgimento da escola, destacando-se que a mesma surgiu como necessidade de atendimento à classe burguesa, no sentido de se encontrar meios de controle, regulação e crescimento da produção, ou seja, mão de obra especializada em detrimento da forma de sociedade anteriormente determinada, a sociedade feudal.
No âmbito do contexto escolar e a formação dos sujeitos, situaremos a nossa abordagem nas últimas décadas, sobretudo, a partir de 1980 dadas as características do fenômeno da globalização no Brasil bem como o processo de democratização política.
Emergidos em um sistema social e econômico em que paradigmas culturais, sociais, morais, entre outros, não se constituíam como únicos e lineares, colocamos como dado de reflexão a importância de se investigar a reciprocidade nos acontecimentos entre escola e formação humana considerando que o que se discute a respeito dessa temática não ganha coerência na prática tão pouco na teoria, tanto no âmbito das práticas escolares quanto da legislação. Enguita em A Face Oculta da Escola: Educação e Trabalho no Capitalismo coloca:

Substituir as condutas, as atitudes e os valores adequados para a sociedade agrária por outros adequados para a sociedade industrial foi precisamente, como esperamos ter demonstrado a estas alturas o objetivo principal da escola. A questão agora é em que posição se situa uma força de trabalho formada para o emprego assalariado diante das formas autônomas de produção ainda existentes, mesmo que se tenham visto modificados por seu contato com o modo de produção capitalista. (Enguita,1989, pág.221)

Dentro dessa dualidade, Sistema Educacional voltado para a formação humana e formação para o trabalho, ressaltamos a importância de necessidades de políticas públicas que sejam eminentemente próximas das condições da garantia de formação de sujeitos e que estes sujeitos não estejam meramente condicionados ao propósito do que é posto em lei, mas também, que consigam perceber , diferenciar, analisar o que e como estão ocorrendo o fatos sociais para a partir daí pensar em superação humana.
Iniciaremos a discussão do segundo eixo , o papel do estado e a oferta do ensino na realidade brasileira, com a seguinte passagem do artigo científico Reforma do Estado e Políticas Educacionais: Entre a crise do Estado-Nação e a Emergência da Regulação Supranacional no qual Almerindo Afonso reafirma a ideia de cidadania:

No seu sentido mais restrito, a cidadania pressupõe o reconhecimento de uma relação jurídica de pertença a uma determinada comunidade política, e como conseqüência, o acesso a alguns direitos elementares diretamente decorrentes da posse legal de uma nacionalidade tutelada por um determinado estado. Neste sentido se recuarmos, um pouco no tempo, verificamos que este reconhecimento político foi , e ainda continua a ser muitas vezes um ato arbitrário e extremamente seletivo.

Colocar em debates o papel do estado na oferta do ensino que garanta o exercício da cidadania nos leva a questionar o que este fez ou está fazendo para que isso aconteça, nos permitindo interver no mérito da questão pelo fato de se perceber ou de se comungar de uma situação que desfavorece a formação do ser para a cidadania.
A complexidade da temática é aviltante, haja vista a existência de vários percalços no processo de implementação de políticas e de políticas desfavorecedoras, que vão de encontro à tão desejada igualdade e justiça social. Vale lembrar que vivemos em um país em que devemos estar no alinhamento com as exigências da produção dada pelo capitalismo. Segundo Marx, apud, David Harvey em Espaços de Esperança

O único valor que o trabalhador pode ter não é determinado em termos do trabalho feito nem do efeito social útil desse trabalho, mas por meio de uma relação especificamente social de produção ... que marca o trabalhador como recurso direto de valorização do capital.("Marx, apud, David Harvey, pág.146) .

A escola nesse sentido, se permeia por conceitos de categorias como eficácia e eficiência em detrimento da ideia de formação para a vida nos seus amplos aspectos, dessa forma, é oportuno destacar , a participação social, a leitura dos vários pontos de vista, e, sobretudo, a continuidade da pesquisa educacional como opção para o favorecimento de rupturas com os atuais modelos de desenvolvimento da educação.

Considerações finais

Situar a atual sistematização da educação brasileira no plano social e econômico, implica problematizar a conjuntura dada. A educação brasileira no âmbito histórico, é garantida por lei desde 1827 com a primeira lei geral de educação pública, havendo até hoje, várias outras como por exemplo LDB´s, PNE´s, e a Constituição Federal.
Apesar disso, considera-se que as rupturas no que se refere à aplicação de planos e projetos não são tão evidentes. O documento da CONAE ? 2010, traz dentro da visão da pós modernidade, propostas a curto e longo prazos às quais talvez diminuam as disparidades do Sistema de Educação Brasileiro, porém, não se pode dizer, que temos garantia de desenvolvimento do que está escrito, haja vista tal documento servir apenas de referência para outras propostas elaboradas pelos poderes legislativo e executivo.
Esperamos que com esta análise, possamos ter esclarecido alguns pontos preponderantes do processo de educação no Brasil, mostrando que é necessário e importante análises crítico-reflexivas de documentos, textos científicos, discursos e outros para não nos estreitarmos apenas no nosso olhar mas principalmente olhar as contradições nos vários espaços ao nosso redor.


Bibliografia

CUNHA, Luiz A. Educação, Estado e Democracia no Brasil.4.ed.São Paulo:Cortez, 2001.495p.
ZAGO, Ireni; SOUZA, Isaura; DEITOS, R. et AL. Educação, Políticas Sociais e Estado no Brasil.EDUNIOESTE; Curitiba, 2008.308p.
SCWARTZMAN, Simon. Educação Básica no Brasil: a agenda da modernidade. Scielo Brasil. São Paulo. Disponível em www.google.com.br, acesso em 29/04/2010.
AFONSO, Almerindo. Reforma, Estado e Políticas Educacionais: entre a crise do estado ? Nação e a emergência da regulação supra nacional. Educação e Sociedade, pág. 4.
ENGUITA, Mariano F. A face Oculta da Escola:Educação e Trabalho no Capitalismo.Trad. Tomás Tadeu da Silva. Porto Alegre: Artes Médicas.1989.
Harvey, David. Espaços de Esperança.trad. Adail Ubirajara Sobral e Maria Stela Gonçalves. Edições Loyola.3ª Ed. São Paulo. 2004