A CONCEPÇÃO DE LÍNGUA E ARTE DISCUTIDAS A LUZ DA TEORIA DE EDWARD SAPIR
Por Cinthia Andrade | 25/10/2009 | EducaçãoCinthia de Oliveira Andrade
Comumente dizemos que a língua é um mecanismo de comunicação, um sistema de signos específicos de uma comunidade. No entanto, de acordo com SAPIR, "As línguas são para nós mais do que sistemas de transferência de pensamento. São uma túnica invisível que veste o nosso espírito e dá forma predeterminada a toda a sua expressão simbólica." (p.217), uma mesma língua é utilizada por todas as pessoas que constituem um país, porém cada membro dessa população em seu convívio com os grupos sociais faz uso das mais diversas variações lingüísticas, o que o distingue dos demais e o aproxima de seu grupo, em cada subgrupo (família, grupos profissionais e amigos) o individuo a utiliza atribuindo diferentes tipos de gíria.
E como nos diz o autor "Quando a expressão tem uma significação fora do comum, chamamo-la literatura."(p.217), nessa arte denominada literatura a arte é colocada na expressão, na palavra, na língua, fala-se não apenas espontaneamente ou impulsivamente para se comunicar, utiliza-se da retórica e eloqüência bem como dos mais variados artifícios da linguagem para sua fala embelezar.
É uma ação prazerosa e bela, pois "a arte é uma expressão tão pessoal que não nos apraz senti-la jungida a uma forma predeterminada, seja qual fôr. As possibilidades da expressão individual são infinitas, e a linguagem, em particular, é o mais fluido dos meios" (p.217). Em nome da arte fala-se com liberdade, diz-se até mesmo o que comumente não se falaria. A arte liberta a língua, mesmo que ilusoriamente por meio da linguagem.
A literatura é uma manifestação específica da linguagem que carrega com sigo traços de regionalismo e experiências do individuo, ela um registro de arte, formal, que circula e interage em nosso meio. E como cada língua possui formas distintas, também são diferentes as possibilidades formais de cada literatura. Por esse motivo algumas obras, em especial as literárias, não podem ser traduzidas, pois se perde a originalidade, a poesia, a arte.
Desse modo o autor nos apresenta dois níveis de arte "uma arte generalizada, não lingüística, que se pode transferir sem perda para um meio lingüístico estrangeiro, e uma arte especificamente lingüística que não é transferível"(p.218) eessa afirmação é exemplificada por meio de uma comparação entre as obras shakespearianas e as de Swimburne, onde a primeira poderia ser traduzida sem maiores percas da identidade do artista e a segunda, por sua vez, seria intraduzível.
Segundo SAPIR "Uma verdade científica é impessoal"(p.219), portanto tem a liberdade de ser manifestada em qualquer outra língua sem que seja afetada a intenção do artista ou a interpretação do interlocutor. Assim poderíamos afirmar que as obra de Shakespeare são científicas, pois o sentimento que está na obra original pode ser exprimido em qualquer outra língua, já as de Swinburne poderíamos classificar como obras de arte intraduzíveis, por que a sonoridade e a poesia presentes nela dependem, também, dos efeitos lingüísticos que só sua língua é capaz de manifestar.
No entanto sabemos alguns artistas sentem dificuldade ao terem que se expressar de acordo com as normas padrões de uma língua e por esse motivo muitas vezes suas expressões artísticas nos impressionam mais pela simplicidade com que o faz do que pelo seguimento às regras.
Como nos diz o teórico "toda língua já é em si mesma, aliás, uma arte coletiva de expressão" (p.220), pois nela estão ocultas suas características, fatores estéticos, que não divide com as demais línguas. Não é apenas a fonética da língua que determina ou direciona a literatura, são as suas peculiaridades morfológicas que indicam essa direção, por este motivo, pelas distinções existentes entre as línguas e pelo grande valor que cada uma tem é que EDUARD SAPIR nos diz que "hoje, compreendemos melhor que o que é eficiente e belo numa língua, em outra pode ser vício" (p.223).
Por esse motivo muitas vezes ao precisarmos traduzir uma obra literária perdemos sua essência, pois ao compor sua obra o autor fez uso de vários elementos lingüísticos e culturais que o influenciam, elementos estes na maioria das vezes impossíveis de serem resgatados; "a língua já é por si uma arte coletiva de expressão, de milhares de intuições individuais" (p.226), é ela quem define a individualidade do artista, quem caracteriza o artista, diferenciamos Vinícius de morais do Gregório de matos através do uso que fazem da língua, pois é na observação da mesma que encontramos resquícios característicos da arte que os distingue.
Como vimos a linguagem é capaz de ser moldada de acordo com o estilo, com a intenção do artista que a utiliza, sendo assim no momento de produção literária ele tem o poder de transformá-la e fazer com que sua sonoridade e sua intenção se ajustem a emoção que quer expressar, e é por esse motivo que algumas vezes ao traduzir um texto para uma língua distinta acabamos perdendo o que de mais rico a em sua produção artística, a sua essência.
REFERÊNCIAS:
SAPIR, Eduardo. A Linguagem introdução ao estudo da fala – Língua e Literatura. JR, J. Mattoso Câmara (tradução). 2ª edição. RJ: Livraria Acadêmica, 1954.