A Chuva
Por VÂNIA MOREIRA DINIZ | 20/04/2009 | Literatura
Acho que nunca estive preparada para esses dias invernais em pleno verão. E hoje ao levantar-me com a esperança no olhar e de bem com a vida apesar dos transtornos que ela costuma nos trazer, ouvi o barulho da chuva que ao embalo do vento quase batia nas janelas. Ao aproximar-me apreciei pelo vidro os grossos pingos que caíam transformando o céu, numa faixa branca e tão brumosa que me deu a sensação que a natureza toda se preparava para alguma transformação importante.
Via fascinada as árvores vigorosas, as folhas que se balançavam e as flores que pareciam se alegrar com a água que corria em fios trazendo-lhes fonte de vida e umedecendo-as. Ao lado disso, lá longe enxergava uma pessoa que em dia de folga, parecia se regozijar com a liberdade que usufruía.
Recordava-me de crianças brincando, esquecidas de tudo o mais, poças d’água respingando as pernas nuas e a alegria a traduzir-se no sorriso espontâneo e indominável.
E muitas vezes enquanto na praia esperávamos a volta do sol, interrompida por uma chuva de verão, a água do mar se tornava quase instantaneamente mais aquecida como para compensar essa arte e reação da natureza. Tudo isso passava na minha cabeça enquanto a chuva caía quase torrencialmente, trazendo uma nostalgia que me levava a reminiscências ternas e prazerosas.
Quando a paisagem se tornou mais limpa e pude divisar um céu menos carregado, percebi o quanto a chuva transformara cada um dos elementos que eu admirava e que eram fontes de energia e símbolo de beleza. E quanto mais olhava mais admirava, como sempre o planeta maravilhoso.
Repentinamente tudo me entristeceu porque me lembrei de várias ocasiões em que vira transtornada, o quanto o frio e a tristeza é capaz de desabrigar famílias e fazer criancinhas sentirem um frio que pode levá-las à morte.
Sei que a chuva foi feita para irrigar a terra e fazê-la esplendorosa e saudável, dando aos homens alimentação e fonte de vida e que a miséria, ao contrário foi construída pela displicência e incoerência, que pouco a pouco tomou conta do mundo de uma forma alarmante, transtornando padrões e desintegrando leis de bondade, tolerância e altruísmo.
Esse dia que amanheceu frio e pálido fez-me pensar em beleza, equilíbrio, força, fascínio, sonho e amor reconfortante aquecendo um dia sem sol. Também me recordou o apogeu da paixão, a ventura de momentos especiais cercados pelo silêncio de um dia chuvoso com o barulho candente e ritmado que marca seu úmido compasso.
Mas finalizou na tristeza de saber que milhões de pessoas, irmãos de caminhada, não desfrutam do enlevo de um dia de chuva e o que ele pode proporcionar de magnético e encantador. Reconheço que em todos os pormenores da vida os contrastes são avassaladores e nada é pleno ou transbordante. A chuva... Tantos pensamentos, sentimentos, dores, alegrias, impotências e a esperança sempre renovada de que as prendas da natureza possam alcançar todos os seus filhos... Como seria justo, compreensível e humano.
Vânia Moreira Diniz