A BÍBLIA NÃO MENCIONA DE FORMA EXPLICÍTA SOBRE O NASCIMENTO VIRGINAL DE JESUS

Por Italu Bruno Colares de Oliveira, PhD | 09/04/2011 | Bíblia

É importante que se entenda que nenhuma religião tem como ponto de partida ou nascimento desassociada das influencias religiosas fornecidas por outras culturas. Assim como o judaísmo recebeu influencia do paganismo o cristianismo também recebeu influencias do judaísmo, mitraismo, zoroastrismo e maniqueísmo. Toda essa história da virgindade de Maria não é confirmada em parte alguma das Escrituras Sagradas de forma explicita. A grande questão é que como eu afirmo em meu livro: A Ação Missiológica de Deus Através da História da Humanidade: "nem sempre o Cristo das Escrituras é o mesmo das estruturas eclesiásticas". Muito do que se é pregado nas igrejas são credos independentes das Escrituras. Mas para se falar de um assunto como esse é necessário que se entenda alguns pormenores. O que mais acontece é que a Bíblia se é interpretada de acordo com o credo e não o contrario. Dessa forma, primeiro se crê no nascimento virginal de Cristo e depois se interpreta a Escritura de acordo com isso. Não se interpreta a Escritura a luz dela mesma. É importante lembrar que tudo o que temos sobre nascimento virginal é proveniente do paganismo. Isso deve ser colocado em pauta porque quando se fala do nascimento virginal de Jesus na Bíblia, somente se fala isso porque quando se lê a Escritura se lê crendo no nascimento virginal independente de suas declarações acerca disso. Somente nos evangelhos é que enxergamos alguma alusão acerca do nascimento virginal de Jesus e em parte alguma das escrituras mais tal acontecimento é mencionado. É muito estranho que um acontecimento desta grandeza não seja mencionado em toda a Bíblia Sagrada. Para que cheguemos em algum lugar com esse discurso será necessário expor o que a Bíblia, a Tradição e o paganismo esta expondo acerca deste assunto para que venhamos a entender o motivo do cristianismo compactuar desta doutrina.

O Nascimento virginal de Jesus na Bíblia

No Antigo Testamento
O texto utilizado para se falar acerca deste assunto é o de Isaias. Este texto na tradução portuguesa diz que uma virgem conceberá e dará luz a um menino. O interessante é que termo hebraico para virgem é bétula e o termo deste texto é Alma. Alma significa mulher jovem e não virgem. Então o termo foi mau traduzido ou prefiro dizer manipulado para sustentar a virgindade de Maria. Entenda-se que este texto para os judeus é interpretado de forma totalmente adversa do que é para o cristianismo. Para os judeus isso é uma referencia a um acontecimento que não se refere ao nascimento de Jesus.
Na Bíblia Hebraica da Editora Sefer traduzida para o português a palavra hebraica alma se traduz como dozenla no texto de Isaias 7.14.
No mundo Hebreu é inaceitável o celibato. Nesse mundo cultural, a virgindade é vista como maldição para toda mulher. A esterilidade provocava o desprezo da comunidade e era sinal de que Deus não estava com aquela mulher (cf. Jz 11,37-40). É impensável a algum judeu de verdade, seja mulher ou homem, que viva nesse mundo cultural assumir um voto celibatário. Os que assim, como Jeremias, o fizeram, foi como sinal profético de denúncia e desolação para o povo (cf. Jr 16,1-4).

No Novo Testamento
No Novo Testamento não existe nenhuma afirmação do tipo: "Maria deu a luz a Jesus sem ter tido relação sexual com homem algum". La diz que o anjo Gabriel visitou Maria dizendo que ela era agraciada, que o poder do altíssimo a envolveria e que o Espirito Santo geraria uma criança. Quando se fala que o poder do altíssimo a envolveria e o Espirito Santo, segundo o conhecimento cabalístico é a Shekinah. Na literatura talmúdica shekinah é a parte feminina de Deus, é a esposa de Deus. Segundo os cabalista, a shekinah somente pode-se fazer presente em uma casa em que exista a união sexual de um homem com uma mulher. Se pegarmos a afirmação do anjo Gabriel e juntarmos com esse conhecimento deduzimos que aconteceu uma relação sexual de Maria com seu parceiro. Isso também condiz com o conhecimento rabínico que uma criança somente poderá ser gerada através de uma relação sexual. No antigo testamento diz: crescei e multiplicai-vos. Para o judaísmo não gerar filhos é um pecado, pois isso é uma ordem. Por isso uma mulher que não gera filhos é considerada amaldiçoada. Então é irracional para a religião hebréia o fato de Jesus ter sido concebido sem intervenção sexual. Ora esse é um dos principais fatores do judeu não aceitar o cristianismo. Foi dada uma importância demasiada para o nascimento virginal de Cristo enquanto Paulo gastava seu tempo em outras alegações como a ressurreição que um dos fatores chaves da teologia cristã.
É importante que se entenda que em toda a Bíblia não existe nenhuma afirmação direta sobre o nascimento virginal de Jesus. Mesmo nos evangelhos o anjo Gabriel não afirma que Maria sendo virgem e sem relação sexual com homem algum conceberá Jesus. O texto é claro.
O interessante é que se alegada a virgindade de Maria e o nascimento de Jesus, poderia também ser afirmado que Isabel também concebeu João Batista sem a intervenção sexual, pois o recado para Isabel foi muito semelhante acerca do nascimento de João Batista como foi para Maria. Vemos outros casos semelhantes nas Escrituras como o caso de Abraão e Sará, pois a mesma era estéril e aparentemente Abraão impotente segundo a alegação de Sarah: "meu senhor já é velho".
Acerca disso existem algumas teorias que vale apena recordar. O termo Anjo (angelos do grego) significa mensageiro. É aquele que leva uma mensagem. Este termo em tempos antigos era aplicado também para sacerdotes. Uma das teorias diz que Gabriel era um sacerdote daqueles dias, um homem como eu e você. Mas ele foi o responsável por manter relações sexuais com Maria e assim Jesus foi concebido. Outros levantam a hipótese de que tenha sido um soldado romano. Mas o objetivo deste artigo não é desvendar quem manteve relações sexuais com Maria e sim mostrar que a Bíblia não afirma explicitamente o nascimento virginal de Jesus.
Primeiro, isso para o judaísmo é inaceitável.
Segundo, a Bíblia não afirma claramente acerca do nascimento virginal.
Terceiro, isso é aceito somente no paganismo.
Para um acontecimento fantástico como um nascimento virginal em toda a Bíblia deveria haver indícios ou lembrança de tal acontecimento. Lembrando que nossa teologia é paulina (pois temos mais o parecer teológico paulino em todo o Novo Testamento) não existe menção ao nascimento virginal de Cristo por parte de Paulo em nenhuma de suas epistolas nem mesmo em romanos que resume toda a teologia sistemática cristã. A principal proclamação de Paulo se refere ao um combate contra as heresias da época, a administração da boa doutrina e declaração sobre a ressurreição de Jesus Cristo.
A conceição virginal de Jesus não é um fato tranqüilamente aceito pelos biblistas. "Os textos do NT que falam diretamente de Maria são escassos e controvertidos do ponto de vista exegético". O texto de Paulo que se refere ao nascimento de Jesus ("nascido de mulher" - Gl 4,4) não contêm uma referência explicita ao tema da virgindade. Marcos refere-se a Jesus como "o filho de Maria" (Mc 6,3). O Evangelho segundo João traz em 1,13 uma expressão complicada: "eles, que não foram gerados nem do sangue, nem de uma vontade da carne, nem de uma vontade do homem, mas de Deus". A leitura no singular nos leva a pensar em Jesus, nascido segundo Deus. Contudo a Bíblia de Jerusalém nos mostra em nota que "a leitura no plural é atestada pela maioria dos manuscritos gregos". Então se levarmos isso consideração teríamos muitos filhos de virgens espalhados.
Dos 4 evangelhos, somente 2 anunciam o nascimento do bebê de Maria, Mateus 1 : 18-25 e Lucas 1: 26-38.
Depois, Maria se casou de fato com José e tiveram outros filhos como narra as Escríturas, Maria não morreu virgem e não ascendeu aos céus como advoga a teologia romana. Ela terminou sua vida servindo a igreja de Cristo.

O Nascimento Virginal de Cristo no Credo Apostólico
Na história, o credo apostólico, primeira confissão cristã oficial no período pós-revelação (Bíblia), afirma o nascimento virginal: "...nascido da virgem Maria...". Naquele tempo queriam relativizar a divindade de Cristo, por isso, a ênfase nos atributos da deidade do Senhor Jesus.
No credo apostólico (quem em minha opinião não merece tanta credibilidade) se tem a confirmação do nascimento virginal de Cristo. O credo apostólico não foi feito pelos apóstolos. Depois do Novo testamento o que mais chega próximo ao apóstolos é o didaque. O credo apostólico ele demorou cerca de 400 anos para ser formulado. Isso quer dizer que o credo apostólico foi criado de acordo com a determinação dos concílios e não dos apostolos.

O Nascimento Virginal de Cristo em contraste com o Paganismo
É comum dentro do paganismo a idéia doutrinária de uma virgem gerar um filho sem qualquer intervenção sexual por parte do homem. Sabemos que o judaísmo herdou muitas doutrinas, estórias e acontecimentos de outras religiões e culturas. Com o cristianismo não foi diferente. A idéia de uma virgem gerar uma criança foi acrescentada a doutrina cristã.
É comum dentre as muitas mitologias pagãs sustentarem o nascimento virginal de uma criança divina.
Para o estoicismo, a virgindade era o meio para o homem alcançar um controle perfeito das próprias emoções e desejos da alma sobre o corpo. Assim, livre das paixões carnais, elevar-se até a divindade. Esse modo de viver a virgindade "pode articular um grande ideal bem como ocultar uma soberba que rebaixa as raízes corporais do homem".
Há ainda a virgindade entendida a partir do culto. As vestais da tradição greco-romana "deviam servir à sua deusa Vesta pelo menos 30 anos após a sua consagração, em perfeita virgindade". Essa virgens tinham, ademais, um status dos mais prestigiosos: "Elas prestavam ao Estado o serviço considerado como o mais elevado: manter sempre aceso o fogo sagrado, símbolo vivo da grande família pátria, renovando-o em todo 1º. de março, início do novo ano".

O Descrédito com relação á Doutrina do Nascimento Virginal
Essa doutrina não foi atacada na história da igreja, até chegar o liberalismo teólogico e a crítica-bíblica, oriundos do iluminismo. Daí, com a relativização dos milagres, essa doutrina foi ferozmente atacada, principalmente com a chegada do liberalismo e do método histórico-crítico nos EUA. Um grande defensor e articulador dessa doutrina foi J. Greshan Machen (autor de "Cristianismo e liberalismo").
Karl Barth defendeu e escreveu sobre essa doutrina, quando Emil Brunner abriu mão dela, no período da neo-ortodoxia. Provavelmente Rudolf Bultmann deve ter esvaziado ela com sua idéia de desmitologização.

A Cristologia e a doutrina do Nascimento Virginal de Jesus
Os teólogos sistemáticos dão excessiva importância a doutrina do nascimento virginal por temerem que isso pode em algum momento comprometer uma cristologia saudável. De forma alguma!!! Certo aluno me perguntou: por que acreditar na ressurreição e não na virgindade de Mária (interrogação) Eu disse: você pode acreditar no que quiser, a questão é que estou afirmando apenas que na Bíblia essa doutrina não é mencionada explicitamente.
Boa parte de doutrina do nascimento virginal é encontrada dentro da Mariologia (doutrina teológica católica romana) que foi extremamente influenciada pelo paganismo. Entenda-se que o nascimento virginal de Jesus é uma das argumentações do catolicismo romano para afirmar que a mesma nunca pecou. Isso sim é um problema para a cristologia. Olhando por esse prisma, sustentar o nascimento virginal de Jesus nega a fonte de origem principal do cristianismo (judaísmo) e compromete a soteriologia cristológica.
Existem teólogos que afirmam: Jesus nasceu de uma virgem para não herdar a natureza do pecado. Mas esses mesmos teólogos dizem que o Espiríto Santo interrompeu a passagem do pecado de Maria para Jesus. Essa explicação a meu ver não favorece as expectativas do cientista religioso, pois pode-se afirmar também que o Espirito Santo interrompeu a passagem do pecado para Jesus se o mesmo nasceu de uma relação sexual.
A meu ver a doutrina do nascimento virginal corrobora para uma deturpação do pensamento cristológico judaico-cristão. Na Bíblia não se têm menção explicita de tal acontecimento, pois essa doutrina foi fabricada dentro dos concílios da igreja e cada vez mais incrementada, pois ela leva várias discussões conciliares para se completar.
Acerca da relevância da crença desta doutrina, nos alerta L. Boff de que "devemos abandonar definitivamente a concepção de muitos santos Padres que achavam ser o nascimento virginal de Jesus uma condição necessária para não ser contaminado pelo pecado original"30. Com o avanço da crítica literária e histórica o fator biológico do pecado original não mais se sustenta hoje.
Essa doutrina prejudica de forma sutil a antropologia teológica no que diz respeito a sexualidade, porque não há nenhuma visão negativa para com o sexo na religião hebréia. Antes, a procriação era sinal de benção para o judaísmo, ao contrário da virgindade, vista como esterilidade maldita.
Não há nenhuma necessidade a priori para Jesus não ter nascido de pai biológico. Essa posição é defendida, por exemplo, por Joseph Ratzinger, segundo o qual "a condição de Jesus como Filho de Deus (...) não (se baseia), de acordo com a fé da Igreja, no fato de Jesus não ter conhecido pai biológico; a doutrina da divindade de Jesus não seria atingida, se Jesus tivesse nascido de um matrimônio humano normal. Pois a condição de Filho de Deus, da qual fala a fé, não é um fato biológico, e, sim, ontológico". Assim sendo, o nascimento virginal em termos fisiológico-biológicos (no sentido da ausência do esperma masculino) não é nenhuma necessidade indispensável para a confissão de fé em Jesus como verdadeiro Filho de Deus.
Pelo que vimos, o desenvolvimento teológico da mariologia patrística percorre uma trajetória incialmente determinada mais por motivos cristológico-histórico-salvíficos, até um interesse expresso na pessoa e no destino da própria Maria. Isso faz com que a mesma seja divinizada por milhares de fiéis em todo o mundo.
Vejo que a dotrina supracitada é mais de cunho da mariologia do que da cristologia.

Considerações Finais:
Vemos que a doutrina do nascimento virginal não é mencionada de forma explicita em toda a Bíblia. Tanto Paulo como nenhum dos outros Apóstolos se preocuparam em fazer menção a tal "acontecimento". Nem Jesus se quer colocou Maria em uma posição de privilégio diante de tal crença. É irrefutável que no paganismo isso seja bastante comum em contraste que para o judaísmo é uma grande loucura. Tudo o que temos sobre o nascimento virginal são conhecimentos orais e nada embasados nas Escrituras Bíblicas.
Mesmo esta doutrina possuindo grande descrédito pelos teólogos modernos, existem aquelas pessoas que acreditam. A não crença nesta doutrina não altera a cristologia, pelo contrario, a enaltece. Mostra que Deus em sua soberania pode fazer qualquer coisa, inclusive usar um casal de pecadores para conceber o salvador do mundo.
Deixo claro que o objetivo deste artigo não é quebrar a fé no nascimento virginal de Jesus, mas apenas dizer que: os apóstolos não mencionaram tal acontecimento, a Bíblia não afirma de forma explicita tal acontecimento, que essa doutrina é um empecilho forte para a não conversão dos judeus, isso não altera a questão soteriológica e cristológica. Pode-se acreditar no que quiser, mas a pergunta chave é: o que as Escrituras dizem (interrogação).