A APLICAÇÃO DA MUTAÇÃO CONSTITUCIONAL
Por FRANCISCA VIVIA TEIXEIRA COSTA | 02/07/2013 | DireitoAutora: FRANCISCA VÍVIA TEIXEIRA COSTA
A APLICAÇÃO DA MUTAÇÃO CONSTITUCIONAL
INTRODUÇÃO
O fenômeno mutação, objeto do presente trabalho mostra-se como uma tendência informal do poder reformador, no qual muitas são as indagações como a formação de uma situação de insegurança jurídica, onde o judiciário poderia utilizar-se de tal mecanismo para exercer freqüentemente uma função típica do legislativo, pode surgir o questionamento no sentido de saber se o judiciário ao mudar o sentido de aplicabilidade da norma não estaria ferindo o principio fundamental da separação e harmonização dos três poderes.
Todos os questionamentos levantados no parágrafo anterior são plausíveis, todavia neste humilde trabalho não se buscou o exaurimento do tema, até porque seria uma pretensão quase impossível, visto ser um tema ainda muito novo no Ordenamento Jurídico Brasileiro, que merece destaque, mas ainda é palco de conhecimento em si mesmo.
Assim objetivou-se tratar de um tema de grande relevância para o Direito Brasileiro, mas de maneira a abordar seus principais aspectos, influências, limites, expoentes doutrinários e aplicabilidade jurisprudencial. A fim de proporcionar o conhecimento desse fenômeno, sua amplitude e finalidade diante da sociedade atual, segundo a perspectiva do dinamismo social e da função do STF de guardar a constituição de modo a promover sua eficácia, evitando que esta se torne objeto de uma sociedade antiga, mediante mecanismos que reavivam a Carta magna e proporcionem sua contemporaneidade.
No que tange a aplicação da mutação constitucional pelo STF é possível destacar o caso do depositário infiel, que aboliu a prisão por dividas; a abrangência do termo casa, que se estendeu também para o local de trabalho no que pese escritórios e consultórios; o alcance do termo racismo, que não mais restringe a discriminação étnica, mas também religiosa e cultural em sua amplitude e a teoria da relativização da coisa julgada que admite relativizar um direito fundamental em razão da maior necessidade de aplicação de outro averiguado no caso concreto.
A abstrativização do controle difuso se constitui como um dos principais exemplos de mutação constitucional, que se refere à alteração da hermenêutica do art. 52, X da CF, que antes era interpretado de modo a conceder ao senado a prerrogativa de decidir a cerca da suspensão da lei declarada inconstitucional pelo STF em sede de controle difuso, agora em pese a interpretação deve ser realizada segundo o STF, de modo a verificar que ao Senado cabe apenas a mera publicação da decisão nos casos determinados pela Corte, decididos inicialmente com eficácia inter partes, mas devendo ao final tomar proporções erga omnes.
1. A APLICAÇÃO DA MUTAÇÃO CONSTITUCIONAL PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
O fenômeno da mutação constitucional foi primeiramente discutido na Europa, mas precisamente na Alemanha, no Brasil a internacionalização do mesmo é relativamente nova, visto que foi a partir do século XXI, em meados de 2005 que o guardião da constituição da republica federativa do Brasil, STF, proferiu as primeiras decisões pautadas na aplicação do presente instituto como forma de promover a eficácia constitucional, alterando apenas o sentido da norma e conservando seu texto.
Como já visto neste trabalho, o Supremo Tribunal Federal vem aplicando a hermenêutica axiológica, mediante a utilização do fenômeno mutação constitucional, através de sua jurisprudência e ainda atribuindo efeito erga omnes ora ex- tunc com modulação temporal, ora ex- nunc a fim de dirimir as incongruências existentes sob o prisma das diversas interpretações.
Tão logo se ressalte a singularidade do instituto em tela, vez que se apresenta com meio informal por não haver ainda sua previsão legal e não se confunde com reforma constitucional, visto que não altera a letra do texto constitucional, realizando apenas uma inclinação no sentido de orientar a interpretação que mais se adéqua a realidade social e seus anseios.
Assim temos como exemplos a serem tratados neste trabalho o depositário infiel, no tocante aos direitos fundamentais assim como também a abrangência do termo casa, relativo à proteção constitucional com asilo inviolável e determinação do alcance do termo racismo como crime imprescritível e inafiançável.
Segue abaixo as hipóteses de aplicabilidade do fenômeno mutação constitucional no ordenamento brasileiro, segundo Wellington Márcio Kublisckas (2009, p. 251/261);
1.1. Depositário Infiel
A carta magna de 1988 trouxe no rol dos direitos fundamentais, no art. 5º, inciso LXVII, a seguinte redação:
Art. 5º, LXVII: Não haverá prisão civil por dívida, salvo a do responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e a do depositário infiel.
Assim de acordo com esse dispositivo é previsto duas modalidades de prisão civil, podendo sê-las em razão de escusa de obrigação alimentícia ou em razão de inadimplemento voluntario do depositário infiel, a polemica norteou por muito tempo este ultimo caso, pois o mesmo artigo da constituição federal em seu parágrafo 2°, determina que:
Art. 5º, §2: Os direitos e garantias expressos nessa Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.
Comentando neste sentido, Flávia Piovesan (2007,p.30) afirma que:
A Constituição de 1988 inovou ao ponto de incluir constitucionalmente os direitos elencados em tratados internacionais os quais o Brasil seja signatário.
Neste dispositivo é possível observar o principio da inexauribilidade, que admite a coexistência harmônica e pacifica entra os positivos constitucionais e os tratados internacionais dos quais o Brasil seja signatário Reforçando essa vertigem encontra-se também a Emenda constitucional 45, promulgada em 2004 que determinou entre outros o seguinte dispositivo e
Art. 5º,§3: Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada casa do Congresso Nacional em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais.
O problema ocorre quando há o conflito entre a norma originaria e o dispositivo do tratado, quando este se fundamenta nos anseios da sociedade.
Conforme Convenção Americana de Direitos Humanos, onde o Brasil ratificou em setembro de 1992 o Pacto de São José da Costa Rica, internalizando através do Decreto 678/1992, que em seu artigo 7º divergia do elencado pela constituição de 1988, conforme dispositivo:
"Art. 1º: É aprovado o texto da Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto São José) celebrado em São José da Costa Rica, em 22 de novembro de 1969, por ocasião da Conferência especializada Interamericana sobre Direitos Humanos. "
“Art. 7 º: "Ninguém deve ser detido por dívidas. Este princípio não limita os mandados de autoridade judiciária competente expedidos em virtude de inadimplemento de obrigação alimentar."
Aos ideais sociais a nível internacional foram incorporadas a prevalência e relevância dos direitos humanos, como tão logo se vê na exposição de motivos do Pacto de São José da Costa Rica:
Os Estados Americanos signatários da presente Convenção, reafirmando seu propósito de consolidar neste Continente, dentro do quadro das instituições democráticas, um regime de liberdade pessoal e de justiça social, fundado no respeito dos direitos humanos essenciais;Reconhecendo que os direitos essenciais da pessoa humana não derivam do fato de ser ela nacional de determinado Estado, mas sim do fato de ter como fundamento os atributos da pessoa humana, razão por que justificam uma proteção internacional, de natureza convencional, coadjuvante ou complementar da que oferece o direito interno dos Estados americanos;Considerando que esses princípios foram consagrados na Carta da Organização dos Estados Americanos, na Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem e na Declaração Universal dos Direitos do Homem, e que foram reafirmados e desenvolvidos em outros instrumentos internacionais, tanto de âmbito mundial como regional;Reiterando que, de acordo com a Declaração Universal dos Direitos Humanos, só pode ser realizado o ideal do ser humano livre, isento do temor e da miséria, se forem criadas condições que permitam a cada pessoa gozar dos seus direitos econômicos, sociais e culturais, bem como dos seus direitos civis e políticos; e Considerando que a Terceira Conferência Interamericana Extraordinária (Buenos Aires, 1967) aprovou a incorporação à própria Carta da Organização de normas mais amplas sobre os direitos econômicos, sociais e educacionais e resolveu que uma Convenção Interamericana sobre Direitos Humanos determinasse a estrutura, competência e processo dos órgãos encarregados dessa matéria.
Diante dos anseios sociais e da internacionalização dos direitos humanos foi possível observar a partir da decisão judicial do RE 466343/SP, em 2008, que o Supremo tribunal Federal optou pelo indúbio pro réu e desta forma priorizando o Pacto de San José da Costa Rica defendendo a impossibilidade de prisão do depositário infiel como forma de relevar os seus direitos fundamentais, como mostra as exposições dos motivos do referido Pacto, bem como as decisões a seguir expostas retidas do site do Supremo Tribunal Federal:
EMENTA: PRISÃO CIVIL. Depósito. Depositário infiel. Alienação fiduciária. Decretação da medida coercitiva. Inadmissibilidade absoluta. Insubsistência da previsão constitucional e das normas subalternas. Interpretação do art. 5º, inc. LXVII e §§ 1º, 2º e 3º, da CF, à luz do art. 7º, § 7, da Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica). Recurso improvido. Julgamento conjunto do RE nº 349.703 e dos HCs nº 87.585 e nº 92.566. É ilícita a prisão civil de depositário infiel, qualquer que seja a modalidade do depósito.(RE 466343, Relator(a): Min. CEZAR PELUSO, Tribunal Pleno, julgado em 03/12/2008, DJe-104 DIVULG 04-06-2009 PUBLIC 05-06-2009 EMENT VOL-02363-06 PP-01106 RTJ VOL-00210-02 PP-00745 RDECTRAB v. 17, n. 186, 2010, p. 29-165)
A seguir foi exposto outra decisão judicial retiradas do site do plenário, a qual reforça o posicionamento favorável do judiciário brasileiro em aplicar a mutação constitucional, neste exemplo no caso do depositário infiel, onde mesmo estando disciplinado na Carta Magna o dispositivo que admite a prisão civil por este motivo foi afastado em ração da proteção a um bem maior, mais abrangente que seja a liberdade e a dignidade da pessoa humana, fazendo de forma clara prevalecer os valores e princípios previstos na própria constituição que visem a promoção e proteção dos direitos humanos.
Tal medida se faz necessária, a sociedade que presenciou e influenciou a elaboração da carta magna já não é mais a mesma no que tange algumas particularidades com a em tela, até mesmo pelo dinamismo que caracteriza os organismos sociais, sendo pertinente e necessária a adequação da interpretação constitucional a sociedade hodierna.
A cerca da mutação constitucional no que tange o depositário infiel explica Pellegrini (2008,p.64), que:
A afirmação da mutação constitucional não implica o reconhecimento, por parte da Corte, de erro ou equívoco interpretativo do texto constitucional em julgados pretéritos. Ela reconhece e reafirma, ao contrário, a necessidade da contínua e paulatina adaptação dos sentidos possíveis da letra da Constituição aos câmbios observados numa sociedade [...].
1.2. A Abrangência do Termo Casa Diante da Proteção Constitucional Fundamental do Direito a Inviolavibilidade.
Antes da decisão judicial RE nº 251.445/GO, a abrangência do termo “casa”, protegido com asilo inviolável pelo artigo art. 5º, inciso XI da CRFB de 1988 se limitava a domicilio, residência, todavia por tal decisão o presente termo se estende ao local de trabalho considerado espaço privado, por tanto merecedor de tal proteção, constituindo um claro exemplo de aplicação da mutação constitucional pelo Supremo Tribunal Federal , que modificando a tradicional hermenêutica do presente artigo por uma interpretação mais ampla e consonante com a necessidade e realidade social atual , conforme disciplinado no próprio corpo da decisão , retirada do site jus Brasil em dezembro de 2012:
GARANTIA CONSTITUCIONAL DA INVIOLABILIDADE DOMICILIAR (CF, ART. 5º,XI). CONSULTÓRIO PROFISSIONAL DE CIRURGIÃO-DENTISTA. ESPAÇO PRIVADO SUJEITO À PROTEÇÃO CONSTITUCIONAL (CP, ART. 150, § 4º, III).NECESSIDADE DE MANDADO JUDICIAL PARA EFEITO DE INGRESSO DOS AGENTES PÚBLICOS. JURISPRUDÊNCIA. DOUTRINA.- Para os fins da proteção constitucional a que se refere o art. 5º, XI, da Carta Política, o conceito normativo de "casa" revela-se abrangente e, por estender-se a qualquer compartimento privado onde alguém exerce profissão ou atividade (CP, art. 150, § 4º, III),compreende os consultórios profissionais dos cirurgiões-dentistas.- Nenhum agente público pode ingressar no recinto de consultório odontológico, reservado ao exercício da atividade profissional de cirurgião-dentista, sem consentimento deste, exceto nas situações taxativamente previstas na Constituição (art. 5º, XI).A imprescindibilidade da exibição de mandado judicial revelar-se-á providência inafastável, sempre que houver necessidade, durante o período diurno, de proceder-se, no interior do consultório odontológico,a qualquer tipo de perícia ou à apreensão de quaisquer objetos que possam interessar ao Poder Público,sob pena de absoluta ineficácia jurídica da diligência probatória que vier a ser executada em tal local. Trata-se de recurso extraordinário interposto pelo Ministério Público do Estado de Goiás contra decisão do Tribunal de Justiça local, consubstanciada em acórdão assim ementado (fls. 586/587)
1.3. A Determinação do Alcance do Termo Racismo.
Como já sabido o crime de racismo constitui tipo imprescritível e inafiançável de acordo como artigo 5 º, inciso XLII, da Constituição Federal de 1988, chegando ao STF a discussão a cerca da publicação de livros anti-sêmicos contra a comunidade judaica, no qual se pretende defender a liberdade de expressão, a prescrição punitiva e a atipicidade do delito em questão por não se adequar ao conceito de racismo.
Diante dessa problemática o STF em sede de HC nº 82.424/RS, decidiu pela abrangência do termo racismo para além de discriminação etnológica, mas que englobe também conceitos etimológicos, sociológicos biológicos e antropológicos.
Decisão
- Após o voto do Senhor Ministro Moreira Alves, Relator, concedendo a ordem para pronunciar a prescrição da pretensão punitiva, pediu vista o Senhor Ministro Maurício Corrêa. Falou pelo paciente o Dr. Werner Cantalício João Becker. Presidência do Senhor Ministro Março Aurélio. Plenário, 12.12.2002. Decisão: Após o voto do Senhor Ministro Moreira Alves, Relator, concedendo a ordem, e dos votos dos Senhores Ministros Maurício Corrêa e Celso de Mello, este último em antecipação, indeferindo-a, pediu vista o Senhor Ministro Gilmar Mendes. Presidência do Senhor Ministro Março Aurélio. Plenário, 09.04.2003. Decisão: O Tribunal, preliminarmente, por inexistência de previsão regimental, indeferiu o pedido de nova sustentação oral do ilustre advogado do paciente, tendo em vista não se encontrar mais nesta Corte, pela aposentadoria, o Senhor Ministro Relator. Ausentes, justificadamente, nesta preliminar, os Senhores Ministros Sepúlveda Pertence e Carlos Velloso. Em seguida, após o voto do Senhor Ministro Gilmar Mendes, que indeferia o habeas- corpus, anteciparam os votos os Senhores Ministros Carlos Velloso, Nelson Jobim, Ellen Gracie e Cezar Peluso, também denegando a ordem, pediu vista o Senhor Ministro Carlos Britto. Não participou da votação o Senhor Ministro Joaquim Barbosa por suceder ao Senhor Ministro Moreira Alves que proferira voto. Presidência do Senhor Ministro Maurício Corrêa. Plenário, 26.06.2003. Decisão: O Tribunal, por maioria, resolvendo a questão de ordem, não viu condições de deferimento do habeas-corpus de ofício, vencido o Senhor Ministro Carlos Britto, que entendeu deferi-lo por carência da ação penal por atipicidade de conduta. Votou o Presidente, o Senhor Ministro Maurício Corrêa. Prosseguindo-se no julgamento, após o voto do Senhor Ministro Carlos Brito, que concedia, ex-officio, a ordem de habeas-corpus para absolver o paciente por falta de tipicidade de conduta, pediu vista dos autos o Senhor Ministro Março Aurélio. Não votou o Senhor Ministro Joaquim Barbosa por suceder ao Senhor Ministro Moreira Alves que proferira voto. Ausente, justificadamente, neste julgamento, o Senhor Ministro Nelson Jobim. Plenário, 27.08.2003. Decisão: O Tribunal, por maioria, indeferiu o habeas-corpus, vencidos os Senhores Ministros Moreira Alves, Relator, e Março Aurélio, que concediam a ordem para reconhecer a prescrição da pretensão punitiva do delito, e o Senhor Ministro Carlos Britto, que a concedia, ex-officio, para absolver o paciente por falta de tipicidade de conduta. Redigirá o acórdão o Presidente, o Senhor Ministro Maurício Corrêa. Não votou o Senhor Ministro Joaquim Barbosa por suceder ao Senhor Ministro Moreira Alves que proferira voto anteriormente. Plenário, 17.09.2003.
1.4. A Teoria da Relativização da coisa Julgada
Atualmente muito se discute a cerca da possibilidade de mutabilidade da coisa julgada material quando da incidência de grave ofensa a preceitos constitucionais mediante a ponderação dos princípios da adequação e razoabilidade diante do caso concreto a fim de aproximar a atividade jurisdicional à efetiva justiça.
Nos últimos anos a teoria da relativização da coisa julgada vem ganhando adeptos, a qual se refere não à ofensa da coisa julgada ou do princípio da segurança jurídica, mas sim a um instrumento que viabilize a aplicabilidade deste de modo a adequá-lo aos demais valores e princípios constitucionais.
O presente assunto se mostra como um breve estudo a cerca da atual discussão que norteia a teoria da relativização da coisa julgada em face de uma ofensa constitucional a exemplo do reconhecimento da relevância de sua aplicação no âmbito das decisões determinantes de paternidade ocorridas antes da existência da técnica de averiguação desta condição pelo exame de DNA, o qual constitui prova cabal capaz de vincular o magistrado na analise de seu reconhecimento.
No Ordenamento Jurídico Brasileiro a coisa julgada constitui direito fundamental protegido pelo artigo 5º da Constituição da República Federativa Brasileira de 1988, que se refere ao princípio da segurança jurídica.
A coisa julgada se classifica em duas espécies, podendo se coisa julgada forma, a qual não gera os efeitos da imutabilidade da sentença e por isso cabe rediscussão de sua matéria, ressalvado os requisitos legais.
Já a coisa julgada material se caracteriza pela imutabilidade, salvo em ação rescisória, a qual é cabível em situações taxadas em lei.
Ressalte-se que alguns dos doutrinadores ainda defendem a existência e classificação da coisa julgada soberana, que seria aquela formada após a decisão da ação rescisória.
Procura-se mostrar que a coisa julgada material goza de proteção máxima constitucional e constitui elemento essencial para a segurança jurídica, todavia em casos excepcionais como o exemplo aludido, faz-se necessária sua relativização em face da proteção de outros direitos e princípios constitucionais como a dignidade da pessoa humana e o acesso à justiça, que não se resume ao acesso ao judiciário ou ao direito de ação, pois possui uma dimensão muito mais ampla que objetiva a máxima proximidade da real justiça.
Tais direitos quando contraposto ao princípio da segurança jurídica, devem ter sua incidência avaliada de acordo com o caso concreto segundo a observância e aplicação dos princípios da ponderação do interesses envolvidos, da adequação constitucional, da razoabilidade e da proporcionalidade, a fim de aproximar-se da verdadeira justiça.
A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, se consagra pelo garantismo, que visa assegurar a máxima segurança jurídica, tão logo averigua-se no rol do direitos e garantias fundamentais a proteção a coisa julgada, que segundo uma interpretação literal, ao se falar em trânsito em julgado de sentença oriunda de juízo de delibação, com julgamento de mérito, far-se-á coisa julgada material, que se caracteriza pela imutabilidade ad eterna.
Todavia a sociedade hodierna anseia na busca pela da proximidade da justiça real e desta forma é inadmissível que uma decisão injusta que ofenda a direitos constitucionais perdure pela natureza imutável, pois a intenção do legislador constituinte originário foi proporcionar segurança jurídica, mas esta não pode ser argüida para tolher o direito de desconstituir mal injusto.
Desta forma é notória a necessidade de uma nova hermenêutica constitucional, não apenas sob o aspecto gramatical ou literal, mas sim sob um prisma axiológico que englobe a Carta Magna como o conjunto sistematizado com o fim para chegar o mais próximo da realização de justiça por meio do judiciário.
Neste sentido surge a teoria da relativização da coisa julgada, a qual admite que o princípio da segurança jurídica no tocante a imutabilidade dos efeitos da sentença com resolução de mérito, coisa julgada material, seja preponderado e relativizado em face da busca pela proximidade da materialização da justiça, no que tange sanar a ofensa constitucional decorrente de comprovado mal injusto, que ofenda a Constituição.
Este posicionamento ainda constitui matéria intra-uterina no processo civil brasileiro, que teve inicio principalmente nos casos de ações de investigação de paternidade, situações em que a decisão do judiciário era determinada com base em outras provas que não o exame de DNA, por este ainda não existir, com o seu advento foi possível provar cabalmente a real paternidade e desta forma fez surgir à necessidade de alteração da coisa julgada nos casos anteriores, de modo a promover a proximidade da efetiva justiça.
O tema apresentado possui notória relevância no nosso ordenamento jurídico, tornando-se imprescindível sua discussão, pois se trata de um assunto controvertido na atualidade que carrega diversos problemas de ordem pública e constitucional que afetam diretamente a relação processual, logo se faz necessário compreender os presentes institutos e entender a extensão e delimitação de sua aplicabilidade com base na doutrina, jurisprudência e princípios gerais do direito.
O estudo em questão se posiciona segundo a perspectiva da razoabilidade e proporcionalidade de acordo com a possibilidade de relativizar uma garantia constitucional em favor de outra que diante do caso concreto possibilita uma maior proximidade da efetivação de justiça.
Assim pode ser caracterizada a teoria da relativização da coisa julgada material, mesmo após o decurso do prazo para propositura da ação rescisória, nos casos de grave ofensa a constituição e mal injusto que atinja a parte prejudicada.
Em suma faz-se necessário a presente conceituação, definição e classificação o instituto da coisa julgada como proteção constitucional, bem como estabelecimento das exceções no tocante a sua imutabilidade, mencionando exemplos concretos, jurisprudência que norteiam tal entendimento, demonstrando sua adequação, pertinência e relevância diante do ordenamento jurídico brasileiro face ao dinamismo social na busca pelo saneamento de injustiças e efetivação do direito.
O Brasil vige sob a forma de Estado Democrático de Direito, na Carta Magna de 1988 é exposta a importância atribuída a coisa julgada pelo legislador constituinte originário.
Trazendo como direito fundamental em seu artigo 5°, XXXVI o princípio da segurança jurídica ao proteger o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada.
No que tange o instituto da coisa julgada há uma clássica divisão entre formal e material, a primeira é inerente a decisão jurisdicional terminativa,.
Ressalte-se que no caso de juízo de prelibação com sentença processual sem resolução de mérito os efeitos são apenas endoprocessuais. Logo a matéria poderá ser rediscutida, ressalvados os casos de litispendência.
A rediscussão da matéria é hipótese inexistente quando se fala em coisa julgada material, visto que esta se apresenta apenas nas decisões definitivas com resolução de mérito, oriundas do juízo de delibação, não importando se a sentença foi procedente ou improcedente, se constitutiva, condenatória ou declaratória, produzirá tanto efeitos endo como exoprocessuais.
Dessa forma, consiste num fenômeno de imutabilidade da sentença em face da preclusão dos prazos recursais, caracterizando o verdadeiro encerramento do processo por representar um núcleo imodificável ou imutável segundo doutrina ainda dominante, salvo nulidade em caso de ação rescisória.
A ação rescisória cabível no processo civil brasileiro se apresenta como uma possibilidade de nova analise da sentença já transitada em julgado materialmente, no caso de vício existente que a torne anulável.
Por tirar os efeitos de outra decisão em vigor possui natureza declaratória desconstitutiva, possuindo um prazo decadência para sua propositura de dois anos contados do trânsito em julgado da sentença.
Tal ação é cabível ao fundamento taxativo das seguintes hipoteses: prevaricação, concussão ou corrupção do juiz; juiz impedido ou absolutamente incompetente; dolo da parte vencedora em detrimento da parte vencida, ou de colusão entre as partes, a fim de fraudar a lei;ofender a coisa julgada; violar literal disposição de lei; se fundar em prova, cuja falsidade tenha sido apurada em processo criminal ou seja provada na própria ação rescisória; depois da sentença, o autor obtiver documento novo, cuja existência ignorava, ou de que não pôde fazer uso, capaz, por si só, de Ihe assegurar pronunciamento favorável; houver fundamento para invalidar confissão, desistência ou transação, em que se baseou a sentença; fundada em erro de fato, resultante de atos ou de documentos da causa.
Faz- se importante frisar q a ação rescisória é instrumento hábil mesmo se interposto antes do esgotamento dos recursos de acordo com o teor da Súmula 514, do STF:
Admite-se ação rescisória contra sentença transitada em julgado, ainda que contra ela não se tenham esgotado todos os recursos.
Ressalte-se que a citada imutabilidade atribuída à coisa julgada material de acordo com o caso concreto pode tornar-se um instrumento de injustiça, vez que a matéria da lide não mais poderá ser revista ou reformulada.
Desta forma mostra-se plausível a reflexão a cerca da possibilidade da modificação da coisa julgada mesmo após o prazo de interposição da ação rescisória nas situações em que a decisão contrarie preceitos constitucionais, de modo a realizar a observância dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade sob o prisma de ponderação dos interesses envolvidos a fim de garantir a justiça.
A teoria da relativização da coisa julgada se apresenta como um recente instituto que visa à possibilidade de alteração da garantia constitucional da coisa julgada prevista no rol do artigo 5° da Constituição, relativização realizada em face de uma grave ofensa a própria norma originária.
De modo didático é possível observar no caso concreto, onde são invocadas as fontes do direito para resolver a lide, tem-se uma decisão transitada em julgado, que depois dos dois anos, prazo para a interposição da ação rescisória, surge um novo meio de prova que viabiliza o contraditório de maneira mais eficaz pela possibilidade de produção de provas mais concretas que as anteriores.
Logo nota-se a necessidade de alteração da coisa julgada, pois mesmo sendo um direito fundamental a sua manutenção ofende outros direitos fundamentais como o contraditório e a ampla defesa.
Assim a teoria da relativização da coisa julgada consiste na previsão de um procedimento atípico do judiciário na revisão da coisa julgada material, mesmo ultrapassado o prazo para propositura da ação rescisória quando a sentença se fundar em lei inconstitucional ou determinação que gere grave ofensa a valores e princípios constitucionais.
O presente instituto surgiu concretamente como forma de proteger o Erário no tocante as exorbitantes indenizações em desapropriações e nas ações de investigação de paternidade.
Nas ações de reconhecimento de paternidade transitadas em julgado foi possível a prova por meio do exame de DNA gerando conseqüências para os processos de investigação de paternidade antigos, fato que gerou repercussão inclusive no STJ.
- 2. A ABSTRATIVIZAÇÃO DOS EFEITOS DO CONTROLE DIFUSO
O Poder constituinte Originário tem como principal característica a criação de uma nova ordem jurídica, ou seja, a elaboração de uma nova constituição, logo apresenta- se como ilimitado por iniciar um novo período constitucional.
O Poder Constituinte derivado, como o próprio termo já define, deriva da carta magna refere-se às posteriores alterações do texto constitucional, que podem ocorrer mediante dois instrumentos, qual sejam o reformador e o decorrente, este permite as assembléias legislativas estaduais criarem as respectivas constituições estaduais, já o poder constituinte derivado reformador altera o texto constitucional.
Esta reforma, alteração pode ocorrer mediante aprovação de emenda constitucional sendo esta de competência do congresso nacional nos termos do artigo 60 da Constituição da Republica Federativa do Brasil de 1988, ou mediante mutação constitucional que como já explanado ao longo deste trabalho trata-se de alteração informal do texto constitucional,onde não se altera o texto,mas sim sua interpretação a fim de proporcionar uma aplicação sistemática, axiológica do texto constitucional de modo a alcançar a percepção integradora do texto evitando a aplicação meramente literal e isolada.
O Controle de Constitucionalidade Brasileiro Judicial vigente se subdivide em dois critérios, quais sejam o subjetivo ou orgânico e o objetivo ou formal, o primeiro se afirma em duas espécies de acordo com a legitimidade do órgão julgador, sendo eles o controle difuso e o controle concentrado, o primeiro a competência se expande por todos os órgãos do judiciário.
Logo a inconstitucionalidade pode ser argüida em qualquer órgão do poder judiciário e ainda pode excepcionalmente chegar ao judiciário em sede de recurso, já o controle concentrado em âmbito federal determina legitimação especial, pois a legitimidade ativa se restringe ao rol taxativo do artigo 103 da constituição federal de 1988.
Art. 103. Podem propor a ação direta de inconstitucionalidade e a ação declaratória de constitucionalidade: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)
I - o Presidente da República;
II - a Mesa do Senado Federal;
III - a Mesa da Câmara dos Deputados;
IV - a Mesa de Assembléia Legislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito Federal; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)
V - o Governador de Estado ou do Distrito Federal; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)
VI - o Procurador-Geral da República;
VII - o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil;
VIII - partido político com representação no Congresso Nacional;
IX - confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional.
Lembrando que dentre estes legitimados ativos, ainda há um divisão entre universais e especiais ou temáticos, os legitimados ativos universais não possuem restrições que condicione a sua pertinência, enquanto os legitimados ativos especiais são os dispostos nos incisos IV, V e IX do dispositivo em comento, os quais necessitam demonstrar pertinência temática como condição de afirmação de sua legitimidade.
O critério objetivo ou formal diz respeito a natureza da inconstitucionalidade, que se subdivide em concreto e abstrato, este se caracteriza pela discussão da norma em abstrato, ou seja, a causa de pedir e o pedido principal residem na analise da constitucionalidade da lei, assim possuem natureza jurídica de ação.
Já o critério objetivo concreto se refere a analise da lei é feita de modo incidental, ou seja, a inconstitucionalidade é arguida já durante a tramitação de uma açãoque por pedido principal algo diverso da analise da inconstitucionalidade da lei, baseado no caso concreto, assim a alegação e inconstitucionalidade ocorrem em um processo já em tramite como incidente processual, logo esta se apresenta como sua natureza jurídica.
No sistema judicial brasileiro os critérios apresentados são aplicados de maneira combinada, pois em regra o controle concreto é exercido por via difusa e o controle abstrato por via concentrada.
Outra divergência entre estas duas espécies ocorrer no tocante aos efeitos e eficácia produzidos, pois em regra no controle abstrato por via concentrada opera-se em regra o efeito ex nunc e eficácia erga omnes, já no controle concreto por via difusa opera-se em regra o efeito ex tunc e eficácia inter partes.
Assim se uma ação está sendo discutida em primeiro grau trata-se de controle concreto e a inconstitucionalidade é alegada durante a tramitação de um processo já existente.
Portanto em tal ação será exercida por controle concreto via difusa, pois a analise da inconstitucionalidade será feita por um órgão de primeira instancia e desta forma terá em regra efeito ex tunc e eficácia inter partes, com natureza meramente incidental.
Quando esta ação chega ao Supremo tribunal Federal por meio de recurso e este é provido e conhecido pela corte a decisão que antes gozava apenas de eficácia inter partes pode se receber eficácia erga omnes, nos termos do artigo 52, inciso X da Constituição Federal de 1988.
Nos casos de repercussão geral como nos casos Recurso Extraordinário e grande de demanda de ações semelhantes, no que concerne a causa de pedir, o STF após decidir pela inconstitucionalidade da lei em sede de controle concreto por via difusa comunica ao presidente do Senado Federal tal inconstitucionalidade.
Então o presidente do Senado Federal ao receber esse ofício e mediante resolução suspendendo a eficácia da lei e atribuindo a decisão efeito ex nunc e eficácia erga omnes.
Art. 52. Compete privativamente ao Senado Federal:
I - processar e julgar o Presidente e o Vice-Presidente da República nos crimes de responsabilidade e os Ministros de Estado nos crimes da mesma natureza conexos com aqueles;
I - processar e julgar o Presidente e o Vice-Presidente da República nos crimes de responsabilidade, bem como os Ministros de Estado e os Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica nos crimes da mesma natureza conexos com aqueles;
II - processar e julgar os Ministros do Supremo Tribunal Federal, o Procurador-Geral da República e o Advogado-Geral da União nos crimes de responsabilidade;
II processar e julgar os Ministros do Supremo Tribunal Federal, os membros do Conselho Nacional de Justiça e do Conselho Nacional do Ministério Público, o Procurador-Geral da República e o Advogado-Geral da União nos crimes de responsabilidade;
III - aprovar previamente, por voto secreto, após argüição pública, a escolha de:
a) Magistrados, nos casos estabelecidos nesta Constituição;
b) Ministros do Tribunal de Contas da União indicados pelo Presidente da República;
c) Governador de Território;
d) Presidente e diretores do banco central;
e) Procurador-Geral da República;
f) titulares de outros cargos que a lei determinar;
IV - aprovar previamente, por voto secreto, após argüição em sessão secreta, a escolha dos chefes de missão diplomática de caráter permanente;
V - autorizar operações externas de natureza financeira, de interesse da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios;
VI - fixar, por proposta do Presidente da República, limites globais para o montante da dívida consolidada da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios;
VII - dispor sobre limites globais e condições para as operações de crédito externo e interno da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, de suas autarquias e demais entidades controladas pelo Poder Público federal;
VIII - dispor sobre limites e condições para a concessão de garantia da União em operações de crédito externo e interno;
IX - estabelecer limites globais e condições para o montante da dívida mobiliária dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios;
X - suspender a execução, no todo ou em parte, de lei declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal;
XI - aprovar, por maioria absoluta e por voto secreto, a exoneração, de ofício, do Procurador-Geral da República antes do término de seu mandato;
XII - elaborar seu regimento interno;
XIII - dispor sobre sua organização, funcionamento, polícia, criação, transformação ou extinção dos cargos, empregos e funções de seus serviços e fixação da respectiva remuneração, observados os parâmetros estabelecidos na lei de diretrizes orçamentárias;
XIII - dispor sobre sua organização, funcionamento, polícia, criação, transformação ou extinção dos cargos, empregos e funções de seus serviços, e a iniciativa de lei para fixação da respectiva remuneração, observados os parâmetros estabelecidos na lei de diretrizes orçamentárias;
XIV - eleger membros do Conselho da República, nos termos do art. 89, VII.
XV - avaliar periodicamente a funcionalidade do Sistema Tributário Nacional, em sua estrutura e seus componentes, e o desempenho das administrações tributárias da União, dos Estados e do Distrito Federal e dos Municípios.
Parágrafo único. Nos casos previstos nos incisos I e II, funcionará como Presidente o do Supremo Tribunal Federal, limitando-se a condenação, que somente será proferida por dois terços dos votos do Senado Federal, à perda do cargo, com inabilitação, por oito anos, para o exercício de função pública, sem prejuízo das demais sanções judiciais cabíveis.
A Teoria da abstrativização dos efeitos do controle difuso é pautada em precedentes do STF, se caracteriza como uma tendência doutrinaria e jurisprudencial que visa aproximar o controle difuso do controle concentrado no tocante aos efeitos e eficácia.
O STF pode aplicar os efeitos da modulação temporal no controle concentrado, por meio deste o STF pode declarar uma lei inconstitucional hoje, mas determinar que a mesma continue em vigor até uma certa data em virtude dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade segundo a analise da relevância social e da segurança jurídica.
Por analogia o STF vem adotando os efeitos da modulação temporal também no controle difuso. Conforme Recurso Extraordinário 197917-SP, STF.
EMENTA
RECURSO EXTRAORDINÁRIO. MUNICÍPIOS. CÂMARA DE VEREADORES. COMPOSIÇÃO. AUTONOMIA MUNICIPAL. LIMITES CONSTITUCIONAIS. NÚMERO DE VEREADORES PROPORCIONAL À POPULAÇÃO. CF, ARTIGO 29, IV. APLICAÇÃO DE CRITÉRIO ARITMÉTICO RÍGIDO. INVOCAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA ISONOMIA E DA RAZOABILIDADE. INCOMPATIBILIDADE ENTRE A POPULAÇÃO E O NÚMERO DE VEREADORES. INCONSTITUCIONALIDADE, INCIDENTER TANTUM, DA NORMA MUNICIPAL. EFEITOS PARA O FUTURO. SITUAÇÃO EXCEPCIONA.
Alguns ministros do STF como Gilmar Mendes Eros Grau afirma que o art.52 da Constituição Federal de 1988, em seu inciso X teria sofrido uma mutação constitucional, isto é uma releitura que modificou não o texto constitucional, mas sim o sentido que se extrai deste texto.
Nessa releitura a nova interpretação dada pelo fenômeno informal de reforma da constituição, o papel do Senado Federal não mais era de conferir os efeitos erga omnes da decisão do STF, pois a própria Corte já seria capaz de conferir eficácia contra todos, logo à atribuição do senado a de meramente dar publicidade a decisão do STF.
Ressalte-se que a teoria em tela se constitui como expoente de legitimação da Teoria da Transcendência dos Motivos Determinantes da Sentença, aqui aplicada no controle difuso, pois segundo o atual Código de Processo Civil das três partes que constituem a sentença apenas a parte dispositiva tem o condão de fazer coisa julgada.
Todavia segundo o anteprojeto do Novo Código de Processo Civil não só a parte dispositiva, mas também as fundamentações terão vinculação de coisa julgada material, pois neste considera ser importante atribuir força decisória as razões que motivaram o magistrado a adotar determinado posicionamento posto na parte dispositiva da sentença.
CONCLUSÃO
Diante de tudo neste trabalho exposto e comentado é possível observar e conhecer o instituto mutação constitucional, que embora uma teoria ainda recente, já coleciona adeptos, doutrinadores de renome que pleiteiam sua defesa no que tange a sua necessidade como medida urgente que altera não o texto constitucional, mas sim sua interpretação, realizando uma hermenêutica sistemática e axiológica.
Indo além do tradicional e ultrapassado método gramatical ou literal, mas sem dele se desprender, pois no ordenamento jurídico brasileiro com base na própria carta magna de 1988 prevalece a observância e eficácia dos valores e princípios constitucionais, aos quais são atribuídos força normativa, afim de garantir principalmente a efetivação do principio da dignidade da pessoa humana.
Desta forma há caso em que é preciso o afastamento mesmo de um dispositivo constitucional para efetivar um valor maior garantido por este mesmo diploma legal.
Por isso ressalta-se a responsabilidade na aplicação do instituto em tela de acordo com critérios de razoabilidade e proporcionalidade, em que a finalidade reside no bem estar social e na adequação e harmonia entre a Constituição da República Federativa do Brasil e os ditames sociais atuais, que em face de seu caráter de organismo social dinâmico apresenta situações fáticas que ensejam na necessidade de regulação pelo mundo jurídico que no aparente conflito de direitos constitucionais.
Relativiza- se um direito constitucional em detrimento do outro aplicando a mutação constitucional, como maneira de alcança um bem maior que se aproxime dos valores e anseios sociais, que em seu aspecto generalístico e humanístico visa conservar a eficácia da Carta Magna.
Logo cumpre a sociedade e principalmente a doutrina e jurisprudência nacional o papel de estudar e avaliar os mecanismos viáveis para impedir que a Carta magna torne-se inócuo, impedir que mortos legislem para vivos, pois o texto maior de um país deve precípua e primordialmente refletir, disciplinar e proteger os anseios e necessidades de sua sociedade.
Foi exposto situações fáticas e jurídicas,nas quais foram aplicadas a mutação constitucional, como a abrangência do termo casa e o alcance do termo racismo, a inaplicabilidade da prisão civil no caso do depositário infiel, os quais se mostram como exemplos claros mudança de interpretação do judiciário.
Pois tais casos que refletem a nova postura do STF em concretizar direitos através da ampliação ou/e alteração dos antigos posicionamentos, que eram meramente declaratórios de omissões.
Ainda no mencionado capítulo houve a exposição e comento da Teoria da Relativização da Coisa Julgada, a qual apesar de ainda muito recente no Direito Brasileiro merece destaque, vez que já houvera sido aplicada pelo STF.
Essa teoria admite que mesmo a coisa soberanamente julgada, a coisa julgada material que perdura após os dois anos de interposição da ação rescisória, seja objeto de questionamento nos casos que visem assegurar um bem jurídico constitucional relevante como os direitos fundamentais.
Tese que já foi adotada pelo STF nos casos de reconhecimento de paternidade anteriores ao descobrimento e aplicação do exame de DNA.
No quarto e ultimo capítulo foi abordado um dos mais evidentes exemplos de mutação constitucional, qual seja a Teoria da Abstrativização dos Efeitos do Controle Difuso, a qual se funda em precedentes do STF.
A mesma defende que o art. 52, inciso X da CF de 1988, teria sofrido uma mutação constitucional, pois de acordo com a Corte há a necessidade de uma releitura, pois na verdade caberia ao Senado Federal o papel não mais de conferir os efeitos erga omnes as decisões do STF, de grande repercussão e em sede de controle difuso.
Pois o próprio STF já teria a atribuição de conferir eficácia erg omnes, desta forma caberia ao Sendo Federal meramente o papel de dar publicidade a decisão proferida pelo STF, em sede de controle de constitucionalidade difuso.
Por fim foi ressaltado que a teoria da abstrativização dos efeitos do controle difuso se apresenta como legitimadora da Teoria da Transcendência dos Motivos Determinantes, a qual constitui tese inspiradora do novo Código de Processo Civil.
Buscam os motivos que determinaram a decisão, seus fundamentos e não apenas o discurso finalista, que trata a solução para o problema se o respectivo argumento. Assim visa-se que a parte da fundamentação da sentença também gere coisa julgada e não apenas a parte dispositiva.
Diante de tudo neste trabalho explanado, nota-se que a mutação constitucional apresenta-se como mecanismo informal de reforma constitucional, informal porque não altera o texto em sua literalidade.
Tendo em vista que apenas de modifica a interpretação objetivando uma aplicação constitucional contemporânea no sentido de acompanhar o dinamismo social e eficaz no sentido de proporcional a concretização de direitos.
Observa-se que o tema do presente estudo se mostra como instrumento necessário hodiernamente, principalmente diante da inércia do legislativo e das transformações sociais.
Entretanto faz-se imprescindível que seja obedecida a letra da norma, ou seja, a gramaticalidade do texto constitucional a fim de proporcionar a revitalização da Constituição, conservando o princípio da segurança jurídica.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Constituição da República Federativa do (1988) . Brasil São Paulo: Saraiva, 2006.
Decreto 678/1992, Pacto de São José da Costa Rica, disponível em http://www.senado.gov.br/.
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KUBLISCKAS, Wellington Márcio. Emendas e Mutações Constitucionais. São Paulo: Atlas, 2009.
PELLEGRINI, Luiz Fernando Gama. Execução Fiscal. Depositário Infiel. Prisão por Dívida. Não Cabimento. Prevalência dos Pactos e Convenções Internacionais sobre as Legislações Infraconstitucionais. 2008.
PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional. Revista Ampliada e Atualizada. 8ª ed. Editora Saraiva. 2007.
SILVA, José Afonso da. Poder Constituinte e Poder Popular (estudos sobre a Constituição). São Paulo: Malheiros, 2000.
http://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/774152/recurso-extraordinario-re-197917-sp-stf, re-466343-sp-stf ,re-251445-stf/ habeas corpus-hc- 82424-rs-stf / reclamacao-rcl-4335-ac-stf.
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm.
http://www.stf.jus.br/súmula 514-stf.