A AFETIVIDADE NO AMBIENTE ESCOLAR PÚBLICO
Por Mauricio Porto de Campos Passaglia | 07/09/2016 | Educação
RESUMO
O presente artigo aborda como tema principal a afetividade amenizando a indisciplina e a violência no ensino fundamental público e tem como objetivo expor, através de pesquisa bibliográfica como metodologia, que a escola pública como um todo (desde a direção até a portaria, passando pelos principais, que são seus educadores), deve ter laços afetivos para com seus alunos, pois estes interferem de forma significativa na sua formação pessoal, em sua postura e consequentemente no seu processo de aprendizagem. Também objetiva-se a reflexão sobre as possíveis causas da indisciplina e da violência em sala de aula e também nas dependências da escola pública e, até mesmo fora dela, onde os alunos ficam expostos a todo tipo de “liberdade”. O reconhecimento da importância do papel da escola e de seus educadores como construtores do conhecimento e mediadores dos desenvolvimentos cognitivo, sociais e afetivos, é também fator de reflexão. O artigo também explana a atual situação das escolas públicas no Brasil, de seus alunos e de seus docentes, como principais atores da educação pública nacional.
Na metodologia, optou-se por um estudo bibliográfico buscando-se o aprofundamento necessário para compreensão de tal tema, discutindo e apontando os estudos dos principais autores da área como Andersen (2011), Bossa (1992), Carlberg (1998), Chamat (1997), Charlot (2005), Dantas (1992), Esteve (1995), Falleiros (2005), Freire (1996, 1999), Gómez (1998), Lapierre & Lapierre (2002), Nóvoa (2009), Sacristán (1995), Tacca (2006), Vasconcellos (1994), Visca (1991) e Weiss (1994, 2004).
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INTRODUÇÃO
A afetividade e suas implicações com o ensino tem sido um tema crescentemente abordado no ambiente acadêmico, nas últimas duas décadas. Porém, muito mais como preocupação teórica do que como objeto de produção de práticas, principalmente nas escolas públicas onde a incidência de indisciplina e violência são maiores.
O presente artigo pretende refletir sobre a dimensão afetiva nas comunicações e práticas pedagógicas no ambiente escolar público, pois para serem de fato afetivas dependem da forma como são desenvolvidas, uma vez que produzem impactos, positivos ou negativos, na relação que se estabelece entre os alunos e os diversos setores da instituição.
A referência que Tacca (2006, p. 199) faz a Vygotsky explica a necessidade do comprometimento de todas as partes envolvidas em um processo de ensino:
Vygotsky propôs que “para entender o discurso do outro, nunca é necessário entender apenas umas palavras; precisamos entender o seu pensamento. Mas é incompleta a compreensão do pensamento do interlocutor sem a compreensão do motivo que o levou a emiti-lo. “De igual maneira, na análise psicológica de qualquer enunciado só chegamos ao fim quando descobrimos esse plano interior último e mais encoberto do pensamento verbal: a sua motivação”. A comunicação acontece, então, quando são realizadas trocas e se cada interlocutor se dispõe a compreender o outro, além daquilo que este consegue verbalizar, o que implica considerar a sua subjetividade na confluência de sentidos subjetivos que emergem na situação relacional. (TACCA, 2006. p. 199).
Se a comunicação entre as pessoas e a prática pedagógica dentro do ambiente escolar público passar a ser na linha da afetividade, colaboração e gentileza, os impactos serão certamente positivos amenizando a indisciplina e a violência nesse ambiente e consequentemente melhorando o processo de aprendizagem.
É sabido através da mídia que a indisciplina e a violência nas escolas públicas, principalmente no ensino fundamental são grandes e acontecem por diversos motivos sendo um deles, a falta de afetividade, colaboração e gentileza nas comunicações e práticas pedagógicas.
A pesquisa está assim organizada: na primeira seção apresenta-se uma rápida explanação do ambiente educacional público, dos seus docentes e dos seus alunos. Na segunda seção procura-se demonstrar que um dos caminhos a serem trilhados para amenizar a indisciplina e a violência é a afetividade. Na terceira seção será abordado o papel do docente frente à esse desafio. Por último, encontram-se as considerações finais apontando aspectos relevantes para a compreensão do tema proposto.
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(REFERENCIAL TEÓRICO) A AFEVTIVIDADE NO AMBIENTE ESCOLAR PÚBLICO
2.1. A INSTITUIÇÃO PÚBLICA, SEUS DOCENTES E SEUS ALUNOS
2.1.1. A INSTITUIÇÃO
A atual situação do sistema educacional brasileiro tem sido objeto de um esforço de compreensão por uma série de estudiosos, provocando discussões nas mais variadas entidades da sociedade civil, além de ser notícia constante em todos os meios de comunicação.
Se, há alguns anos, era senso comum que tínhamos uma educação pública de péssima qualidade, escolas sucateadas, professores despreparados e mal pagos, enfim, todo um sistema educacional falido, hoje a avaliação da má qualidade do ensino público se mantém, apesar dos recursos garantidos a partir da constituição de 88 e das leis editadas nos anos 90.
Fragmentos retirados do texto “Exclusão e sucateamento: o legado do projeto educacional da ditadura militar brasileira à atualidade.” (REVISTA ESPAÇO ACADÊMICO EDIÇÃO Nº 66 – NOVEMBRO DE 2006.).
Hoje, temos dois tipos de escola no Brasil: a pública e a privada. A escola privada, enquanto comércio de conhecimento se solidifica graças a camada da sociedade mais abastada enquanto a pública se desintegra graças ao descaso e falta de vontade pública mas, sobrevive como um fenômeno inexplicável.
António Nóvoa (2009, p. 64) pontua com clareza esses dois tipos de escola:
Um dos grandes perigos dos tempos atuais é uma escola a “duas velocidades”: por um lado, uma escola concebida essencialmente como um centro de acolhimento social, para os pobres, com uma forte retórica da cidadania e da participação. Por outro lado, uma escola claramente centrada na aprendizagem e nas tecnologias, destinada a formar os filhos dos ricos. (NÓVOA 2009, p. 64.).
Os jovens são cada vez mais escolarizados em instituições diferentes, dependendo do status econômico de seus pais. Constata-se, assim, o estabelecimento de redes educacionais cada vez mais diferenciadas e hierarquizadas. Nessas redes, a escola pública deve acolher as populações mais frágeis. Charlot fala sobre a escolarização de base: [...] “perseguida por muito tempo, segue-se um fracasso em massa dos alunos, com iletrismo, abandonos repetências, etc.” (CHARLOT 2005, p. 144.).
A despeito de a escola ser estruturada com o objetivo de promover a melhoria das condições de vida dos sujeitos inseridos na sociedade moderna, Carlberg explica que “ela pode, muitas vezes, também produzir dificuldades de aprendizagem em seus alunos devido aos obstáculos encontrados para a implantação e execução de um plano curricular.” (CARLBERG 1998, p. 02.).
Portanto, em sua trajetória histórica no Brasil, a escola pública pode, ao invés de propiciar o processo de aprendizagem ao aluno, encaminhá-lo ao fracasso, por determinados fatores, como:
[...]professores em escolas desestruturadas, sem apoio material e pedagógico, desqualificados pela sociedade, pelas famílias, pelos alunos e não podem ocupar bem o lugar de quem ensina tornando o conhecimento desejável pelo aluno. (WEISS, 2004, p. 16).
Ainda sobre as escolas brasileiras, Bossa (2002, p. 21), diz:
No Brasil, a escola torna-se cada vez mais o palco de fracassos e de formação precária, impedindo os jovens de se apossarem da herança cultural, dos conhecimentos acumulados pela humanidade e, consequentemente, de compreenderem melhor o mundo que os rodeia. A escola, que deveria formar jovens capazes de analisar criticamente a realidade, a fim de perceber como agir no sentido de transformá-la e, ao mesmo tempo, preservar as conquistas sociais, contribui para perpetuar injustiças sociais que sempre fizeram parte da história do povo brasileiro. (BOSSA 2002, p. 21.).
Ao se avaliar uma instituição, há a necessidade de se fazer perguntas “disparadoras”, importantes para análises mais adequadas e desprovidas de pré-julgamentos. Weiss (1994, p. 94) traz questões importantes sobre a avaliação da aprendizagem no contexto escolar, com o viés psicopedagógico:
[...] será o problema da não aprendizagem apenas do aluno? Não estará o professor [educador] estagnado em relação à busca de novos conhecimentos? Não estará a escola sendo apenas repetitiva, impondo diariamente uma dose de “conhecimentos prontos”, que são “engolidos” pelo aluno e não “digeridos”? (WEISS 1994 p. 94).
São questões relevantes, mas poderíamos acrescentar uma outra não menos importante: seria a falta de afetividade da escola para com o aluno também a contribuir com o seu fracasso? A Instituição deve investir na capacitação de seu material humano, na postura e na habilidade da fala afetiva e acolhedora.
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