1984, Uma Obra-prima de Orwell.

Por | 08/11/2016 | Literatura

George Orwell, em sua obra 1984, fez um trabalho sensacional – incrível. Na criação de sua obra, ele se preocupou em dar uma vivacidade, detalhada, de uma vida sob um Estado Totalitário. Com personagens do seu romance, Winston Smith e Julia, na luta contra o Grande Irmão, o partido, nos demonstram como a grande mídia das massas, os governos, a educação, pela revolução, podem mudar, e manipular, uma sociedade, como uma estratégia Gramsciana da criação da hegemonia de pensamento. Além do poder de vigiar e punir os indivíduos, jogar uns contra os outros e mudar toda uma história.

Na romance contado por Orwell, inicia-se com a história do personagem Winston, em alusão aos regimes totalitários, em que vive numa sociedade liderada por um partido, que chegou ao poder através de uma revolução do proletariado. Os líderes da revolução estão no poder, e comandando a sociedade como bem entendem - não por bem do povo, ou seja, dos proletários, quem eles prometeram proteger, mas de si mesmos.

Quando se fala de regimes totalitários, é comum pensar no horror dos acontecimentos do século XX, como o Nazismo de Hitler, por exemplo, ou o Fascismo de Mussolini, mas esquecido, de forma proposital, pelos intelectuais da atualidade, os arautos do saber, do regime da Stálin, o comunismo – que foi mais cruel que Hitler. Como dito por ARON (1955) os intelectuais ignoram por uma questão ideológica, a saber:

[...] Na Rússia e na China e não na Inglaterra ou na Alemanha, partidos pouco numerosos na origem, e recrutando em grande parte os intelectuais, influíram no destino dos povos e, uma vez donos do Estado, impuseram uma verdade oficial. Na Ásia ou na África, os diplomados tomam hoje a direção dos movimentos revolucionários ou dos Estados recém-promovidos à Independência.

Assim, à medida que avançamos na leitura da obra, observamos a grandeza do autor na descrição dos acontecimentos ao personagem. Desde o detalhamento de uma poeira no chão, até um aroma de um café tradicional. O autor nos leva ao cenário em que tudo acontece em movimento e estático, em tensões contra o partido, contra a polícia das ideias – que buscava identificar o pensamento-crime, este também utilizado no nazismo e comunismo.

Na trama, encontramos a mesma ideia do Panóptico de Jeremy Bentham, trazido também em Vigiar e Punir, de FOUCAULT (1975): “[...] o poder deveria ser visível e inverificável. Inverificável: detento nunca deve saber se está sendo observado; mas deve ter certeza de que sempre pode sê-lo”. A Teletela, que fazia esse papel na trama, vigiava sem parar, demonstrando a vigilância como poder do Grande Irmão, que, constantemente dito na obra, estava sempre de olho em você. Atualmente, percebemos com tanta frequência o poder do Estado sobre a vida do indivíduo, que comparado com outras épocas, não tinha acesso aos dados pessoais e coisas tão intimas, controla desde o nascimento até sua vida nas redes sociais.

A Polícia das ideias, como dito anteriormente, buscava o pensamento-crime, é perfeitamente o que observamos em nossa atualidade: o politicamente correto. As pessoas deixam de dizer o que pensam – mesmo sendo verdadeiros - para que os demais não se sintam ofendidos. Omitindo, assim, a verdade, para não perder aprovação social, e vivendo numa mentira coletiva, mesmo consciente disso. No mais, a polícia das ideias utilizava os amigos próximos, os filhos e vizinhos para denunciar aqueles que tivessem pensamentos contrários aos dogmas do Socialismo Inglês.

Na obra, o personagem começa a perceber como o partido manipulou a sociedade por muito tempo, mesmo ele sendo um membro do partido. Observara que a sociedade havia perdido o sentimento, não havia mais amor ao próximo, haja vista que o Estado absorveu a sociedade, e somente a ideologia do partido importava. Como na descrição de uma cena do cinema, uma mãe e um bebê em alto mar, segurando sua prole em seus braços, e sustentada numa proa. O helicóptero do partido bombardeou a mulher com sua criança, enquanto a plateia sorria e admirava a dilaceração do corpo. Assim, a ideologia usurpava a consciência dos indivíduos, tudo pela causa, não importando o meio. Semelhante ao que acontece no filme: O doador de memorias (2014).

As pessoas daquele país já não possuíam ideia de tempo e lugar que estavam. Não sabiam se a Oceania estava em guerra com Lestásia ou Eurásia – importava somente o que convinha ao partido. Era fácil para o partido controlar essas informações, haja vista que possuía o controle sobre a mídia, a educação, e infiltrados na sociedade para espalhar essas notícias, bem como alterações das edições dos jornais, nos livros antigos, para que não fosse conflitante com os interesses do partido no tempo atual, entre outros.

Outro fator que chama bastante atenção nessa obra-prima: A sociedade igualitária. O povo comum era chamado de proletários, mas aqueles que lideravam a sociedade eram chamados de dirigentes do partido, que não era permitido nenhum tipo de oposição. Enquanto eles controlavam a igualdade do povo, usufruíam dos privilégios do alto escalão do partido.

O partido detinha o poder sobre os jornais, sobre as informações que circulavam, e alterando quando erravam suas previsões. Principalmente por terem controle sobre a fala, dicionários, como as pessoas se comunicam, como no caso da Novafala, e duplipensamento, que retiram das pessoas a liberdade de terem pensamentos e expressões contrárias. Pois mediante a mudança no significado das palavras que era possível mudança do pensamento. Como no dilema do partido, liberdade significa escravidão; paz, guerra. Como o personagem Goldstein, ex-líder da revolução, que pregoava paz, liberdade de expressão, livre-comércio, era visto como um inimigo a ser abatido. Retiravam palavras que poderiam dar fim ao partido, ou alteravam o significado dela, passando por uma tradução ideológica. Assim como anunciado recentemente, a reedição das obras de Machado de Assis, pela escritora Patrícia Secco, com objetivo de “facilitar” a leitura, torna-la mais “palatável”, ou seja, irão reduzir Assis ao nível da mentalidade média, e não elevar a mentalidade da sociedade para compreender o autor, e reeditando imbuída de ideologia.       

Por vezes, é nessa cilada que caem alguns defensores das liberdades individuais, pois esquecem que os preenchimentos de significado dessas palavras podem ser facilmente alterados, como bem convier aos arautos da catástrofe. Não está relacionada somente a uma questão de mercado, ou seja, de livre-mercado, mas o fator cultural muito maior por trás desse processo, na qual esses agentes são especialistas, pois não querem dominar somente o corpo, mas a mente. Enquanto alguns acham que estão defendendo a liberdade, essa palavra pode ter sido alterada para fins outros. Assim como na trama vivida por Winston, era impossível alertar ao povo, pois mesmo vivendo numa ditadura, acreditavam que era uma democracia – e muitos nem sabiam o que poderia ser. Era exatamente o que Gramsci queria; criar uma hegemonia de pensamento, uma revolução cultural.

A mentalidade totalitária está presente em todo lugar, querendo absorve as mentes dos indivíduos. Na trama, talvez, possa ficar esperando a vitória do personagem, mas na vida real, não sabemos onde se encontra o inimigo. Winston e Julia lutam contra o Estado totalitário, contra o Grande Irmão, a teletela, a polícia das ideias, e contra os inimigos-amigos. Uma obra fantástica, que nos levar a compreender o mundo e a política, além de viver a poética e o mundo fascinante da literatura e de seus detalhes. Um grande escritor, um profeta, que nos leva muito além das letras.

REFERÊNCIAS

ARON, Raymond. 1955. O ópio dos intelectuais. Trad.de Yvone Jean. Brasília . Editora Universidade de Brasília, (p. 209) 1980.

FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: nascimento da prisão. Trad. De Raquel Ramalhete. 42. Ed. Petrópolis, RJ: Vozes, (p.195, 2014) 

Obra de Machado de Assis é reescrita para facilitar leitura. Disponível em < http://exame.abril.com.br/estilo-de-vida/obra-de-machado-de-assis-e-reescrita-para-facilitar-leitura/> Acesso em 08/11/16.

DOADOR DE MEMORIAS (2014) Disponível em< http://www.adorocinema.com/filmes/filme-195540/> Acesso em 08/11/16