O sistema político de Silvestre Ferreira, de facto, parece jogar numa certa diluição entre os vários poderes que o constituem: Eleitoral, Legislativo, Judicial, Executivo e Conservador. Todavia, tais poderes estão bem caracterizados, definidas as suas competências e estabelecido o seu funcionamento, o que vem beneficiar o regime monárquico-constitucional e democrático no que respeita à observância do exercício dos Direitos, Liberdades e Garantias, ao contrário de um poder absoluto, centralizado e ditador.

Na descrição que faz de cada um daqueles cinco poderes, no Manual do Cidadão em um Governo Representativo ou Princípios de Direito Público Constitucional, Administrativo e das Gentes, Pinheiro Ferreira, começa as respetivas conferências, com uma afirmação profunda, a propósito do Poder Eleitoral. Ele refere: «Ao grande júri eleitoral, único tribunal da opinião pública, pertence distribuir os empregos aos candidatos, segundo suas capacidades, e recompensar os cidadãos, segundo os seus merecimentos.» (FERREIRA, 1834a:112).

Adotando o mesmo critério e relativamente ao Poder Legislativo, a definição que Silvestre Pinheiro Ferreira dá deste poder é, numa orientação democrática, uma crítica velada ao absolutismo, à ditadura, qualquer que ela seja. Também, uma condenação de todos os privilégios contrários ao que é estabelecido nas leis comuns.

O legislador terá o dever de proporcionar as condições legais para o bem geral do Estado no sentido de criar direitos e deveres, iguais para todos os cidadãos: «O mandato do legislador não é um poder absoluto. Toda a lei de privilégio contrária à lei comum seria um atentado. Toda a lei comum contrária às condições do pacto social seria prevaricação.» (Ibid:142).

No que concerne ao Poder Judicial, antes como hoje, tão sensível quanto fundamental para a boa aplicação das leis e a correspondente realização da Justiça, Pinheiro Ferreira tem uma visão interessante e, extraordinariamente, coincidente com as preocupações que, ainda hoje, fazem meditar profundamente os cidadãos.

Num contexto democrático de plena liberdade, verifica-se que o sistema judicial, principalmente em Portugal, ainda não consegue a realização plena, objetiva e pertinente da Justiça, julgada adequada aos acontecimentos e aos intervenientes, sejam estes arguidos/réus ou vítimas.

Há carência de recursos humanos, meios técnicos e infra-estruturas compatíveis com a dignidade desta função, cujos titulares dos respetivos cargos, das magistraturas judiciais, devem merecer a mais elevada consideração, respeito e obediência dos cidadãos, porque, de entre outros: «O objectivo da justiça seria o de eliminar toda forma de opressão em todos os cantos da terra. A razão sendo única e igual em todo o ser humano tornaria esse ideal não só realizável, mas um dever dos ‘amigos da humanidade’ e da justiça.» (SILVA, 2004:53).

Se, por um lado, a separação dos Poderes é fundamental para o bom funcionamento das Instituições; não menos essencial é que para cada poder sejam estabelecidas as respetivas competências, em Lei própria, que deve fixar os limites da jurisdição do poder que ela regula.

Para que a lei se aplique, dispõe o Poder Judicial de tribunais, forças policiais e estabelecimentos prisionais e/ou de correção, porque de facto, o objeto deste importante Poder consiste em decidir as causas criminais, ou cíveis, ocorridas na sociedade, por isso é essencial que a população confie no sistema, tal com então já defendia Pinheiro Ferreira: «O Poder Judicial não pode ser exercido senão por juízes revestidos de confiança das partes e da nação.» (FERREIRA, 1834a:183).

Na perspetiva deste autor, um outro Poder caracteriza o sistema político numa Monarquia Constitucional Representativa, que ele designa por Poder Executivo. Silvestre Ferreira, na composição deste Poder Executivo, considera dois aspetos muito importantes e complementares: por um lado, o monarca; e por outro, uma burocracia ordenada de forma hierárquica, no entanto a direção do governo pertencerá a uma única pessoa, certamente, o monarca, atuando os restantes elementos, com os seus meios, capacidades e especialidades, na dependência daquele. Neste Poder Governamental, a cooperação é articulada pelo monarca, do qual partem as respetivas instruções, existindo um único pensamento, precisamente, como já referido, o do monarca.

O governo funcionará como um sistema orgânico, cujo comando depende da inteligência humana do monarca. É notório e patente que Pinheiro Ferreira, como burocrata, nas diversas funções e cargos que desempenhou, idealizou, para este Poder Executivo, uma certa harmonia entre as diversas Repartições, recorrendo a uma burocracia que, por si própria, faz mover esta máquina administrativa, carecendo apenas de alguém que a controle.

Nesta linha, Pinheiro Ferreira, dá importância ao pensamento de quem dirige: o monarca e as leis que servem o sistema, regras e normas que justificam a burocracia implementada nas Repartições: «A execução das leis, e o Pensamento do Governo, que a ele preside, são os dois elementos essenciais ao Poder Executivo.» (Ibid:247).

Finalmente, no sistema político delineado por Pinheiro Ferreira, surge um quinto e último instrumento: o Poder Conservador que não é, exatamente, uma cópia do Poder Moderador de Benjamin Constant, muito embora tenha recebido alguma influência deste, porque este Poder não era originário da realeza. O que se pretendia, segundo Silvestre Pinheiro era: «Fazer guardar os direitos que competem a cada cidadão, e manter a independência e a harmonia de todos os outros poderes políticos a fim de que os agentes de um não usurpem as atribuições de outro.» (Ibid:322).

A técnica jurídica utilizada por Pinheiro Ferreira consistia em retirar aos demais poderes parte das atribuições conservadoras, constituindo-se o Poder Conservador com elementos daqueles anteriores poderes, reservando-se o exercício do Poder Conservador, na parte que respeita aos direitos civis, a todos os cidadãos, através da figura da petição ou, em último recurso, pela resistência legal.

Nos demais aspetos, o ideal seria criar uma autoridade independente dos restantes poderes, e que não tivesse acesso nem exercesse nenhum dos referidos quatro poderes anteriores. Na apresentação e descrição do Poder Conservador, Pinheiro Ferreira afirma que: «Sem um Poder Conservador não pode haver independência, harmonia nem equilíbrio entre outros poderes políticos do estado.» (Ibid:322).

 

Bibliografia

FERREIRA, Silvestre Pinheiro, (1834a). Manual do Cidadão em um Governo Representativo. Vol I, Tomo I, Introdução António Paim, (1998a) Brasília: Senado Federal.

SILVA, Sidney Reinaldo (2004). “Instrução e Civilização em Condorcet”, in Revista de Educação, Campinas SP: PUC-Campinas, Nº 17, p. 47-55, Novembro 2004

 

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