Seguridade Social e alguns de seus Princípios

Por Vanderlize Nicolini Girardi | 09/09/2011 | Direito

A SEGURIDADE SOCIAL E ALGUNS DOS SEUS PRINCÍPIOS

Vanderlize Nicolini Girardi, acadêmica do curso de Direito, centro Universitário ? UNIVATES.


Sumário: 1. Introdução. 2. Princípio da filiação obrigatória. 3. Princípio do caráter contributivo. 4. Princípio do equilíbrio financeiro e atuarial. 5. Princípio da universalidade da cobertura e do atendimento. 6. Princípio da solidariedade social. 7. Princípio da proteção. 8. Princípio da garantia do benefício mínimo. 9. Princípio da garantia do benefício mínimo. 10. Considerações finais. 11. Referências bibliográficas.


1. Introdução
A seguridade social, como o próprio nome indica trata-se de um seguro à sociedade que, segundo Tavares (2005, p.1), visa garantir os direitos à saúde, à previdência e à assistência social, por meio de ações dos poderes públicos e da sociedade.
Dessa forma tem-se que a seguridade social, como o próprio nome diz, trata-se de um amparo ao segurado, frente às adversidades da vida, que surgiu quando o homem percebeu que estava desamparado frente aos riscos sociais.
Com isso surgiu uma forma de organização onde o cidadão contribuía financeiramente, e em contrapartida estaria amparado caso alguma situação que ameaçasse sua vida viesse a ocorrer.
Para Correia e Correia (2008, p.15-16) a seguridade pode ser vista sob duas perspectivas, a política e a jurídica. Na primeira a seguridade "[...] tem em primeiro plano e como finalidade a proteção da necessidade social, ou seja, estende-se a toda a sociedade e tem como principal prestador o estado, em missão fundamental."; e a segunda diz respeito "[...] ao meio ou instrumento com que se pretende almejar a finalidade de proteção às necessidades sociais, por meio de uma organização normativa instrumental e das relações jurídicas decorrentes.".
E com o passar dos anos essa organização foi se aperfeiçoando, havendo uma unificação do sistema previdenciário apenas com a Constituição Federal de 1988 e a regulamentação das Leis 8.212/91 e 8.213/91, com o objetivo de assegurar os cidadãos frente às imprevisões sociais, ou melhor, como diz Duarte (2008, p.23) "Sua instituição deve-se ao fato de o homem ter percebido sua impotência frente aos encargos produzidos pelos riscos sociais, ainda que protegido pelo núcleo familiar.".
Assim, a previdência social visa à proteção das pessoas, de modo que, tendo finalidade tão importante e sendo regulada por Lei, também é regida por princípios que ajudam na aplicação das normas e que, por isso, ganham destaque em nosso ordenamento jurídico.
Nas palavras de Wladimir Novaes Martinez (2001, p.29) "Os princípios representam a consciência jurídica do direito". Dessa forma percebe-se a importância dos princípios no mundo jurídico, já que estes representam a aplicação das normas jurídicas no dia-a-dia, sempre zelando pelos direitos humanos, pela igualdade e pela liberdade.
Já Castro e Lazzari (2008, p.95) referem-se aos princípios como sendo "´´[...] uma idéia, mais generalizada, que inspira outras idéias, a fim de tratar especificamente de cada instituto.".
No entanto, não restam dúvidas a respeito da necessidade da aplicação dos princípios às normas previdenciárias e tal importância é assim descrita por Martinez:
Os princípios jazem fora do âmbito das normas e do campo de atuação destas. Conforme seu nível, situam-se lado a lado com a pirâmide das fontes formais, justapostos em algumas hipóteses, interpenetrados noutras, convivem paralelamente com as normas jurídicas, observando-as ou substituindo-as, conforme o caso.(2001, p.33).
E, Castro e Lazzari (2008, p.95) vão além dizendo que "As regras ordinárias, portanto, devem estar embebidas destes princípios, sob pena de se tornarem letra morta, ou serem banidas do ordenamento.", ou seja, não teria como aplicar as normas sem valer-se dos princípios, tamanha sua importância e implicação para a obtenção dos resultados.
Com isso, parte-se para uma digressão de alguns dos princípios que regem a aplicação das normas previdenciárias, a fim de melhor entendê-los.
2. Princípio da filiação obrigatória
O princípio da filiação obrigatória está descrito no art. 201 da CF/88 e apresenta o caráter da obrigatoriedade de filiação que visa à proteção ao cidadão, já que este, estando filiado, irá contribuir financeiramente durante um determinado período de tempo, para posteriormente, e em determinadas situações, se beneficiar, com uma contraprestação pelo período em que contribuiu.
Por isso, a obrigatoriedade da filiação é um princípio básico do seguro social, onde há um vínculo jurídico unindo os protegidos ao seguro social. Castro e Lazzari (2008, p. 50) explicam que "[...] o regime legal previdenciário, em regra, estabelece o caráter compulsório à filiação, a fim de que se evite o efeito danoso da imprevidência do trabalhador.", e que por isso "[...] é situação que independe de manifestação de vontade do indivíduo, quando este exerça qualquer atividade laborativa remunerada.".
Martinez (2001, p.122) completa dizendo que "A automaticidade abrange o trabalho definido na lei previdenciária. Não alcança o trabalho não tutelado"., ou seja, para aquele que nunca contribuir para a previdência, nunca terá a contraprestação em momento de risco.
Isso serve para garantir a efetiva contribuição e para garantir a proteção ao cidadão, pois se não houvesse o caráter obrigatório o próprio ser humano talvez não se preocuparia com sua situação futura, já que como lembra Martinez (2001, p.121) "Privar-se hoje, em benefício do amanhã, contraria o espírito dissipador e fugaz do homem moderno, vivendo num mundo de incertezas de toda ordem.".
3. Princípio do caráter contributivo
O princípio do caráter contributivo também está previsto na Constituição Federal de 1988 em seus artigos 40, caput e 201, caput, onde descreve que a previdência social será organizada sob a forma de regime de caráter contributivo, e está diretamente ligado ao da filiação obrigatória.
Castro e Lazzari (2008, p.102) explicam a afirmação acima ao dizer que "Sendo o sistema previdenciário pautado pela universalidade de atendimento, nenhuma pessoa que exerça trabalho remunerado pode ficar isenta de contribuir com parcela de seus ganhos[...]", ou seja, se o indivíduo trabalhar, automaticamente terá que filiar-se, e consequentemente contribuir.
Desse modo, os mesmos autores explicam que "Diante desta compulsoriedade, o indivíduo que tenha exercido atividade que o enquadrava como segurado obrigatório é sempre devedor das contribuições que deveria ter feito [...]". Isso faz-se necessário para que a previdência consiga manter seu fundo sustentável, que posteriormente reverterá em benefício de quem contribuiu.
Além disso, forma de cálculo do coeficiente da contribuição utilizado é com base na capacidade contributiva de cada um. Nas palavras de Martinez (2001, p. 135) "a capacidade dos contribuintes é dado elementar na relação de seguro social; não pode ser desprezada pelo legislador.", ou seja, a contribuição não será igual para todos os contribuintes.
Isso mostra-se necessário em respeito ao princípio da igualdade, e como forma de proteção social, pois segundo o mesmo Autor, a contribuição deve ser apenas a necessária para atender os encargos, prestações e despesas de administração, sempre mantendo reservas técnicas.
4. Princípio do equilíbrio financeiro e atuarial
O princípio do equilíbrio financeiro e atuarial, previsto no art. 40, caput, e 201, caput, da CF/88 refere-se ao equilíbrio na relação econômica de entradas e saídas, ou seja, as contribuições que estão sendo vertidas para a previdência e o benefícios que estão sendo pagos por ela.
Nas palavras de Martinez (2001, p. 93): "[...] a estrutura do regime, seja o geral ou o complementar, tem de ser estimada a partir da clientela protegida, sua capacidade contributiva e a cobertura desejável ou possível num momento histórico [...]". Isto significa dizer que sem esse equilíbrio não haverá como a previdência manter-se.
Castro e Lazzari (2008, p.104) explicam que "[...] o poder público deverá, na execução da política previdenciária, atentar sempre para a relação entre custeio e pagamento de benefícios, a fim de manter o sistema em condições superavitárias [...]", ou seja, é como uma equação matemática onde serão avaliadas as obrigações assumidas, sejam presentes ou futuras e com isso se organizar para atendê-las, por isso a importância de manter-se esse equilíbrio.
5. Princípio da universalidade da cobertura e do atendimento
A universalidade da cobertura e do atendimento significa que a Seguridade deve contemplar todas as contingências sociais que geram necessidade de proteção social das pessoas, tais como: maternidade; velhice; doença; acidente; invalidez; reclusão e morte.
Segundo Castro e Lazzari (2008, p. 98), "por universalidade da cobertura entende-se que a proteção social deve alcançar todos os eventos cuja reparação seja premente, a fim de manter a subsistência de quem dela necessite." Dessa forma, pode-se entender que a Previdência deve socorrer a todos que dela necessitarem.
No entanto, cabe aqui salientar que só terão direito aos benefícios previdenciários aqueles que contribuírem para a previdência. De acordo com os autores, "tem que ser obedecido o princípio contributivo", ou seja, se o cidadão nunca contribuiu para o sistema da seguridade social, não pode esperar dela uma contrapartida.
Para se enquadrar no grupo de pessoas amparados pela Previdência Social tem de ser segurado ou dependente. Conforme Duarte (2008, p.37), o primeiro é a "pessoa física que exerce atividade vinculada ao regime geral ou recolhe contribuições" e o segundo "está vinculado (protegido) com o regime geral da previdência de forma reflexa, em razão de seu vínculo com o segurado.".
6. Princípio da solidariedade social
O princípio da solidariedade social é considerado entre os doutrinadores como sendo o fundamental da seguridade social:
[...] uma vez ausente, impossível falar-se em seguridade social. Tal afirmação prende-se ao fato de a seguridade social abranger toda uma coletividade, tendo por contribuintes aqueles que, com capacidade contributiva, contribuem em favor daqueles desprovidos de renda (DUARTE, 2008, p. 62-63).
Isso significa dizer que sempre haverá um ciclo de solidariedade entre as pessoas, pois enquanto jovem e capaz, trabalha para beneficiar aqueles que já o foram um dia, mas que já não o são mais. Posteriormente, serão eles os beneficiados por outros que trabalharão e contribuirão para os manterem.
No mesmo sentido, se posicionam Castro e Lazzari (2008, p. 96) ao dizer:
[...] a noção de bem estar coletivo repousa na possibilidade de proteção de todos os membros da coletividade, somente a partir da ação coletiva de repartir os frutos do trabalho, com a cotização de cada um em prol do todo, permite a subsistência de um sistema previdenciário.
Dessa forma, é possível concluir que se não fosse a solidariedade, não haveria o sistema previdenciário, pois a pessoa contribui sem ter uma contraprestação imediata e sem saber se no futuro irá fazer uso dela.
7. Princípio da proteção
O princípio da proteção nasceu do binômio capacidade/necessidade, cujo objetivo é garantir a proteção do trabalhador, frente a qualquer adversidade que vier a sofrer, ou como dizem Castro e Lazzari (2008, p. 97) "[...] as normas dos sistemas de proteção social devem ser fundadas na idéia de proteção ao menos favorecido.", onde o menos favorecido é o cidadão frente ao estado.
Ou seja, proteção é dada pelo estado, porém conta com a contribuição dos próprios necessitados, ou como diz Martinez (2001, p. 102) "O estado tem obrigação de acudir os indivíduos necessitados e vale-se de todos os meios disponíveis, mesmo o constrangimento do próprio protegido".
E o mesmo Autor destaca que "[...] presunção do desconto e do recolhimento da contribuição do empregado é a aplicação prática deste princípio, pois o legislador cuida de proteger os interesses do empregado.". disso conclui-se que é o trabalhador/protegido que sustenta a previdência para que esta venha a lhe proteger posteriormente, e essa corrente tem o condão de evitar a desestruturação da sociedade, bem como de garantir ao cidadão a aplicabilidade de seus direitos fundamentais.
8. Princípio da garantia do benefício mínimo
O princípio da garantia do benefício mínimo, também previsto na CF/88 em seu art. 201, § 2º, preza pelo pagamento de uma renda mensal não inferior ao salário mínimo nacional em se tratando de aposentadorias, auxílio-reclusão, auxílio-doença, pensão por morte e salário-maternidade.
Para Castro e Lazzari (2008, p. 105) essa garantia de benefício mínimo é pressuposto para uma existência digna, conforme determina o art. 1º, III da Constituição Federal, e esse entendimento decorre da lógica de que, se um trabalhador necessita de um salário mínimo para manter-se dignamente, o beneficiário da Previdência também o necessita na mesma proporção.
Para Martinez (2001, p. 162) "Se esse valor é a menor importância suficiente para oferecer a subsistência humana, tanto vale para as remunerações como para os benefícios da previdência social.", ou seja, se em regra um trabalhador necessita de, no mínimo, um salário mínimo para manter-se, o beneficiário da previdência também o necessita.
9. Princípio da preservação do valor real dos benefícios
O princípio da preservação real dos benefícios vem regulado pelo art. 201, § 4º da CF/88, e visa assegurar o reajustamento dos mesmos para preservar-lhes o valor real, assim como os arts. 7º, VI e 37, X do mesmo diploma legal, ao vedar a irredutibilidade salarial, de vencimentos e subsídios.
Castro e Lazzari (2008, p.106) explicam que esse princípio é de fundamental importância para garantir o poder de compra do beneficiário da Previdência, tanto que está regulado na Lei 8.213/91 em seu art. 41-A, onde prevê o reajuste anual, na mesma data do reajuste do salário mínimo, pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor ? INPC, apurado pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística ? IBGE.
Ou seja, é necessário que este princípio seja aplicado para que não seja causado prejuízo econômico aos beneficiários da previdência social.

10. Considerações finais
Com a análise acima, é possível entender que não é possível aplicar a norma sem aplicar os princípios, sob pena de causar prejuízo ao hipossuficiente, ou seja, ao cidadão, visto que a previdência visa a proteção da pessoa.
Nesta senda, cabe ao judiciário observá-los e aplicá-los caso a caso de forma a garantir um processo justo e de acordo com os ensinamentos da nossa Constituição Federal.

11. Referências bibliográficas
CASTRO, Carlos Alberto Pereira de; LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário. Florianópolis: Copnceito Editorial, 2008.

CORREIA, Erica Paulo Barcha; CORREIA, Marcus Orione Gonçalves. Curso de Direito da Seguridade Social. São Paulo: Saraiva, 2008.

DUARTE, Marina Vasques. Direito Previdenciário. Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2008.

MARTINEZ, Wladimir Novaes. Princípios de Direito Previdenciário. São Paulo: LTr, 2001.

TAVARES, Marcelo Leonardo. Direito Previdenciário. Rio de Janeiro: Lúmen Juris, 2005.