Relações Públicas Governamentais

Roberto Ramalho é relações públicas, jornalista, e foi vice-presidente da Associação Brasileira de Relações Públicas, seccional de Alagoas, entre 2002 e 2003

O tema que aqui será abordado sobre Relações Públicas Governamentais é um dos mais importantes para a compreensão da relação entre o Estado e seus cidadãos.

Em relação aos estudos de Aristóteles, que, de acordo com o cientista político italiano Norberto Bobbio (2000), foi um dos primeiros e mais famosos estudiosos da relação Estado-cidadãos, o Estado era o foco, inclusive já existia por natureza, sendo anterior aos homens e não instituído por eles.

Contudo, com a evolução dos estudos na área, percebeu-se que a sociedade política era isso sim, constituída, sendo "um produto voluntário dos indivíduos, que com um acordo recíproco decidem viver em sociedade e instituir um governo" (BOBBIO, 2000: 64).

Aqui, portanto, passa-se a levar em conta a idéia de que a política é o meio que os homens utilizam para se associar e, assim, promover e manter entre si a vida social.

Segundo Norberto Bobbio (2000), Johannes Althusius, foi um dos maiores defensores desse pensamento. Assim sendo, as declarações dos direitos do homem nos Estados Unidos e na França marcaram a adoção desse novo ponto de vista, que além de reconhecer que os indivíduos constituíam o Estado, apontava para outro aspecto importante: o indivíduo não é pelo Estado, mas o Estado é pelo indivíduo.

Assim, essa relação passa a ser permanente e o papel do Estado é não só respeitar os direitos do homem, mas, também, fazê-los valer e protegê-los.

Ensina-nos o grande mestre do Direito Constitucional e Administrativo o seguinte:

"Uma das características do mundo moderno é aquela consciência que tem cada cidadão que cada cidadão contribui para a obra coletiva, eliminadas que foram, com o advento do regime democrático, as barreiras entre os homens que governam e aqueles que são governados. É que a democracia conseguiu atrair para o Governo, atrair para a coisa pública, todos os indivíduos, trazendo para o Governo, em sua acepção mais larga, os próprios homens que são governados, se não com uma participação direta, pelo menos com esse direito elementar de poder escolher os governantes". (Teoria do Estado, Themístocles Brandão Cavalcanti, Rio de Janeiro, 1958, p. 5.)

O destacado relações públicas e professor Cândido Theobaldo afirma:
"Se existe um regime político que necessite de Relações Públicas é precisamente o democrático. Participação do povo no governo é o princípio fundamental da democracia. Participação ampla e efetiva, para que todos possam, realmente, influir nas decisões oficiais. Ninguém deve ser excluído da responsabilidade de contribuir para a formulação e solução dos problemas ligados aos negócios públicos. Para seu êxito, a administração governamental depende da atitude e opinião populares" (ANDRADE, 1979: 21).

De acordo, portanto, com Theobaldo de Andrade, Relações Públicas Governamentais seria o esforço deliberado, planificado, coeso e contínuo da alta administração pública, para estabelecer e manter uma mútua compreensão entre governantes e governados (adaptação da definição oficial de Relações Públicas da Associação Brasileira de Relações Públicas). Ou ainda, Relações Públicas Governamentais é o método de ação que, através do diálogo planificado e permanente entre governantes e governados, procura identificar o interesse social

O Estado é com absoluta certeza algo permanente, certo, cuja existência e permanência não é questionada. Em razão disso, cada indivíduo agora reconhece que há representantes eleitos que gerenciam o Estado. Esta é uma relação de fácil compreensão para todos os cidadãos que dependem da máquina estatal para sua vida, que utilizam serviços de saúde, educação e de outras áreas essenciais subsidiadas pelo Estado.

Dessa maneira, entende-se que o governo eleito para atender as necessidades dos cidadãos, será analisado, cobrado e, por que não dizer julgado, de acordo com os mesmos valores com os quais se elegeu representante. Assim observa-se que o não cumprimento dessa premissa, sendo salvaguardadas as devidas proporções, traria conseqüências sérias para toda a sociedade: "[...] uma sociedade torna-se tanto mais ingovernável quanto mais aumentam as demandas da sociedade civil e não aumenta correspondentemente a capacidade das instituições de a elas responder" (BOBBIO, 2000: 36).

De acordo com Novelli (2006), a comunicação pública deve ir além da divulgação de informações e assessoria de imprensa junto com os diversos públicos. A comunicação tem papel fundamental como instrumento facilitador do relacionamento entre cidadão e Estado.

No nosso modo de ver a comunicação não apenas facilita o relacionamento entre o cidadão e o Estado através da máquina estatal, por meio de seus serviços, etc, mas, também, por meio do relacionamento entre cidadãos e governo.

Assim sendo, ter acesso aos serviços básicos é essencial para o bem-estar do cidadão. Analisando por um simples benefício somente ter acesso ou ainda ter acesso a serviços de qualidade pode ser uma decisão política, isto é, uma ação do governo eleito pelo povo. Além de usufruir do serviço público, seja ele qual for o cidadão percebe, ou pelo menos deveria perceber que esse benefício foi disponibilizado devido à decisão de alguém, ou de algum grupo político que se ocupa de administrar o Estado naquele período. Perceber ou não as ações governamentais em prol de si mesmo e de sua comunidade é base para o exercício de seu papel de cidadão.

"Acredita-se que os governos que asseguram a participação dos cidadãos na formulação, implantação e implementação de políticas públicas, graças à sustentabilidade política e legitimidade que logram obter para seus programas de ação, tornam-se muito mais eficientes do que poderia ser qualquer equipe de tecnocratas altamente especializados e insulados frente à população, na medida em que contam com o apoio desta enfraquecendo as resistências da oposição, evitando o desgaste político de intervenções autoritárias" (BENTO, 2003: 219 APUD NOVELLI, 2006: 81).
Outro grande teórico do pensamento comunicacional e estudioso do tema Relações Públicas Governamentais afirma o seguinte sobre o assunto:

"Dois argumentos principais podem ser adiantados em favor das Relações Públicas Governamentais. O primeiro poderia ser chamado de argumento da informação. Um governo democrático precisa informar o povo. Isto não envolve, necessariamente, qualquer elemento de persuasão. O segundo chamaríamos de argumento administrativo. Certas medidas administrativas não terão sucesso, a menos que o público ou setores do público estejam adequadamente informados acerca dos seus direitos e deveres ? a política exterior em alguns de seus aspectos é bom exemplo ? pois é da compreensão que surge a aquiescência" (Public Relations and American Democracy, J. A. R. Pimlott, New Jersey, 1951, p. 76.)

O acesso à informação sobre a administração pública é, obviamente, fundamental para o exercício governamental. Comunicar-se com os cidadãos já abre possibilidades de participação, pois, ao tomarem conhecimento sobre políticas públicas, podem formar opinião. Concordar ou discordar pode ser o começo para se mobilizar e conseguir participar do governo que oferece tais oportunidades.

A importância do acesso à informação também é destacado por Torquato (2004):

"A comunicação deve ser entendida como um dever da administração pública e um direito dos usuários e consumidores dos serviços. Sonegar tal dever e negar esse direito é um grave erro das entidades públicas. Os comunicadores precisam internalizar esse conceito, na crença de que a base da cidadania se assenta também no direito à informação" (2004: 122).

A atividade de relações públicas, de acordo com Simões (2001), é fundamentada na micropolítica e trata justamente da gestão da relação político-comunicacional entre uma organização e os públicos que influenciam sua missão.

Assim sendo, podemos afirmar, então, que a relação entre governo e cidadãos pode ser trabalhada pelas relações públicas, já que o primeiro tem a missão primordial de atender o segundo. Nesta relação, os cidadãos são a razão de existir do Estado e os responsáveis por eleger o governo que, sem os cidadãos, também não teria nenhuma utilidade.

Entre os estudos acadêmicos específicos sobre as relações públicas governamentais, destaca-se Cândido Teobaldo de Andrade. O autor assim as define: "Relações Públicas Governamentais é o esforço deliberado, planificado, coeso e contínuo da alta administração pública, para estabelecer e manter uma mútua compreensão entre governantes e governados. (Adaptação da definição oficial de Relações Públicas da ABRP). Ou ainda, Relações Públicas Governamentais é o método de ação que, através do diálogo planificado e permanente entre governantes e governados, procura identificar o interesse social" (ANDRADE, 1979: 23).

Como o papel do profissional de relações públicas é gerenciar o relacionamento da organização com os seus públicos, nenhum outro profissional está tão habilitado a trabalhar para que governo e cidadãos se relacionem produtivamente, pois é essa uma das principais finalidades do Estado.

Segundo Harwood L. Childs, no Curso de RRPP. ministrado na Fundação Getúlio Vargas: "todos os governos devem atentar para estes pontos capitais, que integram um programa eficiente de Relações Públicas:

a) procurar a cooperação de todos os cidadãos para os processos e regulamentos governamentais;

b) bem informar os cidadãos sobre o que realizava em seu beneficio e pedir sua participação nessas atividades para que eles possam lograr maiores benefícios;

c) evitar a crescente complexidade do sistema de governo, exigindo leis e reformas ditadas pelas necessidades da técnica;

d) aceitar as Relações Públicas para o Governo como ponto essencial ao desenvolvimento de uma sólida política, evitando-se a interferência: dos interesses partidários nas funções governamentais específicas;

e) demonstrar ao povo que ele tem direito a participação no progresso do governo, em seus níveis mais elevados".

Segundo Ana Lucia Novelli em artigo publicado no site do Conselho Federal de Relações Públicas ? Conferp ? www.conferp.com.br, com o título "Relações Públicas Governamentais: ação para a cidadania" despojada de sua concepção mercadológica, as relações públicas quando praticada nas esferas de governo - executivo, legislativo, ou judiciário - em seus vários níveis - federal, estadual, ou municipal - caracteriza-se pela disponibilização de meios, recursos e canais que possibilitem a comunicação entre sociedade e governo. O posicionamento estratégico da área tem como vetor a obtenção de quatro objetivos principais:

? Promover a adequada compreensão pública a respeito das funções das esferas governamentais;

? Fornecer informações contínuas sobre as atividades da administração pública;

? Estabelecer canais de comunicação que ofereçam ao cidadão a possibilidade de influir na política e ação do governo;

? Estabelecer canais de comunicação pelos quais o cidadão possa ser alcançado pelos representantes da administração pública.

De acordo com a Profa. Dra. Margarida M. Krohling Kunsch da Universidade de São Paulo, Escola de Comunicações e Artes, em artigo publicado na internet com o título "Relações Públicas na Administração Governamental Princípios, fundamentos, aspectos históricos e estratégias comunicacionais", os princípios e fundamentos das Relações Públicas Governamentais são os seguintes, a saber:

_ O sistema político democrático e a necessidade de Relações Públicas, pois a participação do povo, do cidadão é o principio fundamental da democracia.

_ Administração pública não pode funcionar sem a compreensão de suas atividades e processos. A separação entre governantes e governados é conseqüência principalmente da falta de informação.

_ Cabe ao governo manter abertas as fontes de informação e os canais de comunicação

_ Prestação de contas à sociedade...

O direito do cidadão à informação e o dever de informar dos governantes estão sustentados pela Declaração Universal dos Direitos do Homem da Organização das Nações Unidas (ONU). O direito à informação é o primeiro direito de uma sociedade democrática.

_ Cabe ao Estado democrático proteger e facilitar a formação da opinião pública contra influências perniciosas e de grupos de pressão com interesses ilegítimos ? DEFENDER O INTERESSE PÚBLICO.

_ Sinceridade/transparências nas informações, o governo deve dizer tudo o que fez, inclusive seus erros e as medidas que foram tomadas para corrigi-los.

O setor de Comunicação Social do governo deve permear o relacionamento com os cidadãos e a sociedade com os seguintes valores:

? Verdade;

? Respostas diretas aos particulares, entidades e mídias;

? Rapidez;

? Clareza;

? Cordialidade;

? Credibilidade;

? Ouvir.

Concluindo, as relações públicas governamentais devem ser vistas e analisadas do ponto de vista da extrema seriedade, sinceridade e transparência, uma vez que é ao povo que o Estado deve dar satisfações de suas ações com o objetivo de buscar o bem comum.

Referências Bibliográficas:

ANDRADE, Cândido Teobaldo. Fundamentos de Relações Públicas Governamentais. In: Revista Comunicação e Sociedade. Instituto Metodista de Ensino Superior. Editora Cortez e Morato. Dezembro de 1979, vol. 1, nº 2. p. 18-26.

BOBBIO, Norberto. Estado, governo e sociedade. Para uma teoria geral da política. 8ª ed. Trad. Marco Aurélio Nogueira. São Paulo: Paz e Terra, 2000.

NOVELLI, Ana Lúcia Coelho Romero. O papel institucional da Comunicação Pública para o sucesso da governança. In: Organicom: Revista Brasileira de Comunicação Organizacional e Relações Públicas. 1º semestre de 2006, ano 3, nº 4. p. 75-89.

PIMLOTT, J. A. R. (Public Relations and American Democracy, New Jersey, 1951, p. 76.