PROBLEMAS DA HISTÓRIA REGIONAL: INSTITUIÇÕES E                      PODER.                   

Professor Me. Ciro José Toaldo

 

 

Atualmente muitos geógrafos têm abandonado a antiga e difundida utilização determinista do conceito como sinônimo de “região natural”, isto é, de um conjunto relativamente homogêneo de elementos naturais: clima, relevo, vegetação entre outros, cuja influência sobrepõe à ação humana e até mesmo a determina. Esses geógrafos já  tem demonstrado que a seleção dos índices para compor a região, com conceitos que são incapazes de aprender a historicidade e as contradições socais que impregnam um determinado espaço, responde a alguns interesses específicos de instituições com plenos poderes, como é o caso do Estado .

A geografia crítica apresenta um novo conceito de região, capaz de aprender as diferenças e contradições geradas pelas ações dos homens, ao longo da História, em um determinado espaço, procurando analisar o papel das instituições e seus poderes dentro deste espaço. Neste sentido “a organização sempre se constituiu em uma categoria social, fruto do trabalho e da forma dos homens se relacionarem entre si com a natureza. Partindo desse quadro teórico definem  “região como a categoria espacial que expressa uma especificidade,  uma singularidade, dentro de uma totalidade: assim, a região configura um espaço particular dentro de uma determinada organização social mais ampla, com a qual se  articula.” (Silva, 1990, p.8)

No mundo moderno a região tem sempre um substrato político, que coincide, ou não, com as fronteiras legalmente estabelecidas ou em disputa políticas. Aí dentro, cabendo nas fronteiras ou extrapolando-as, organizam-se os grupos políticos, cujos interesses, relacionado a seus respectivos poderes, podem ter o local como referencial dominante. A política regionalista se torna um dos modos possíveis de relacionamento  entre o todo, um exemplo, o estado nacional e as partes, os estados-membros de uma federação.

As elites regionais definidas como grupos de indivíduos que se destacam das classes e grupos de interesses como porta-vozes políticos e, ocupantes das posições de decisão política, tendo em suas mãos o pleno poder,  atuam, então, como referencias de interesses de âmbito variado.

José Batista Neto ao fazer uma análise do processo de intervenção do Estado na região semi-árida nordestina, com a criação da Inspeção de Secas entre 1909 e 1934, constata que se desenvolveu um discurso ideológico da inspeção sobre a questão  da seca.

O fato de a formação social capitalista reproduzir as condições desiguais que vigoram no mundo capitalista e estar montada sob uma divisão do trabalho que separa proprietários de não-proprietários, trabalhadores intelectuais de trabalhadores manuais, gera um quadro de dominação dos primeiros sobre os segundos, que exige a criação de instrumentos que garantam politicamente o uso do poder e como conseqüência, a dominação. Dois desses instrumentos são o Estado e a ideologia, cada um com uma função própria . Uma imbricada à outra. O Estado, instituição que aparece como um conjunto de aparelhos, inspecionando a seca, visando  submeter a sociedade às regras políticas da classe dominante. Ele, na sua materialidade, é território do conflito que as contradições sociais que o permeiam produzem. A ideologia, por seu lado, tem por função substituir a realidade da dominação de classe e do conflito social que o Estado e a sociedade encerram pela idéia de interesse geral que o próprio Estado encerra. Estado e ideologia, concorrem para a reprodução da hegemonia-estado de dominação de uma sociedade por uma classe que  generaliza seu poder e sua idéia.( Op. Cit., p.136-143 )

O Estado, com seus aparelhos que  inspecionam a seca, privilegiou na região semi-árida nordestina, os caracteres físicos sobre os elementos humanos, econômicos e sociais.

E este discurso da inspetoria, do conceito “certo” de seca como fenômeno climático, torna-se “verdadeiro” na consciência social da região e da nação, ou seja, percebe-se que a ideologia foi aceita.

Ora, se a seca existe num espaço já organizado socialmente ela é antes de tudo um fenômeno humano, logo social. Por isso está, igualmente carregada de todas as injunções do modo como o social está organizado historicamente.

A finalidade de dar ênfase na seca enquanto um fenômeno meramente físico, demonstrando o que as instituições com seus poderes podem fazer é precisamente para “mascarrar as relações de dominação e de exploração econômica do homem no espaço semi-árido, enfim, pelo discurso, produzir e reproduzir a hegemonia da classe dominante regional a nível intra-regional”( Paulo Henrique Martins. A seca: um capítulo da história do Nordeste. P.2).

Há, pelo menos, duas conclusões a serem extraídas dessa discussão. Uma que a seca e semi-árido vistos de forma diversa pelas  classes sociais que se encontram na região e fora dela. Outra, que, embora haja níveis de seca e do semi-árido, há uma única seca e uma única região, a das contradições sociais.

Assim posto, o estudo de caso feito por  José Batista Neto, no livro “República em Migalhas – História Regional e Local” (p.121-143), é uma das formas de perceber e buscar entender  os “problemas da história regional, no que diz respeito as instituições e o poder”.