Os nomes e apelidos do Fusca

Por Laércio Becker | 19/04/2012 | Sociedade

            Por: Laércio Becker, de Curitiba-PR

SUMÁRIO

1. No princípio...

2. No Brasil

2.1. Fusca e variações

2.2. Outros apelidos

3. No mundo

4. No fim...

5. Referências bibliográficas

 

1. No princípio...

... era o verbo. Mais ou menos. No princípio era um desenho. Depois, um protótipo. Para cada um, um nome. Até aí, tudo bem. O problema é definir qual desenho e, conseqüentemente, qual protótipo. Pois há muita polêmica quanto ao projeto que realmente deu origem ao Fusca. Como nem os especialistas se entendem sobre isso, não é aqui que vamos descobrir o Santo Graal do Fusca. Para simplificar um pouco, vamos nos abster de nomes de projetos e protótipos, como o Tipo 12, o V1, o Tatra V-570 etc. Vamos falar apenas sobre modelos produzidos em série.

Volkswagen era o nome pelo qual foi conhecido um automóvel desenhado por Josef Ganz e fabricado pela Standard Fahrzeugfabrik, de Ludwigsburg, de 1933 a 1935. Também tinha um formato de besouro, porque consistia basicamente o projeto do Maikäfer (melolonta, besouro da família dos Melolontídeos; literalmente, “besouro de maio”; sobre os Coleópteros, ver item 3, abaixo), que ele fez para a montadora Adler, só que com uma capota. Por isso, há quem diga que essa foi a verdadeira origem do Fusca.

Em seus devaneios demagógicos, Hitler queria um carro (Wagen) para o povo (Volks). Várias montadoras apresentaram projetos. Inclusive a Opel, subsidiária da General Motors, que mostrou ao Führer um projeto de “carro do povo” (Volkswagen) – por isso, o nome também é atribuído à Opel.

Mas Hitler se recusava a escolher um projeto e um nome de uma empresa de capital americano. Preferiu o projeto de Ferdinand Porsche e, em referência à organização nazista Kraft durh Freude (Força pela Alegria), responsável pela construção da fábrica que o construiria, impôs o nome KdF-Wagen. Para horror do próprio Porsche, que o achou comercialmente péssimo.

Aquarelista frustrado, Hitler chegou a fazer alguns esboços. Queria que o carro se parecesse com um besouro, porque as formas inspiradas na natureza, a seu ver, seriam perfeitas. (Segundo Ricardo Caruso, era uma tendência entre os nazistas a preferência por formas aerodinâmicas, uma propaganda de eficiência e atualidade.) O sonho se concretizou: ficou mesmo parecido com um besouro. Tanto que, em vários cantos do mundo, ele é assim chamado (ver item 3, abaixo). Mas a origem das formas arredondadas é bem anterior. Na década de 1920, o famoso arquiteto suíço Le Corbusier chegou a fazer desenhos do que ele considerava que deveria ser o carro do futuro. Com as curvas de um besouro. Abstraído o capricho do ditador, essa forma aerodinâmica da carroceria proporciona um bom coeficiente de penetração e robustez de conjunto.

Devido ao começo da 2ª Guerra Mundial, com a invasão da Polônia, a fábrica que deveria produzir o KdF-Wagen foi requisitada para o esforço de guerra. Produziu então, com base no chassi do KdF-Wagen: o utilitário Kübelwagen (carro-cuba, devido ao seu formato de banheira) e o anfíbio Schimmwagen (carro que nada). Com um chassi de tração integral mas carroceria do KdF-Wagen, o Kommandeurwagen (carro do comandante, destinado ao alto escalão).

Ao fim da Guerra, a KdF-Stadt (cidade KdF) mudou de nome para Wolfsburg (nome do castelo local), a fábrica foi reconstruída e passou a fabricar o KdF-Wagen, agora rebatizado para Volkswagen Standard. Ambas as mudanças de nome são atribuídas ao major inglês Ivan Hirst, das tropas de ocupação, responsável pela fábrica.

2. No Brasil

2.1. Fusca e variações

Durante muitos anos, desde sua chegada ao Brasil, o nome original do carro era Volkswagen Sedan. Na época, fazia sentido, pois o conceito de sedan era mais amplo que hoje: compreendida qualquer carro de carroceria fechada e não conversível. Depois, o conceito mudou. Atualmente, é considerado sedan o carro de três volumes e quatro portas, p.ex., o VW 1600, conhecido como “Zé do Caixão” ou “Fusca 4 portas”.

Mas o povo lusófono tinha dificuldade de pronunciar corretamente o nome “Volkswagen”. Lembrando que, em alemão:

  • o “v” tem som de “f”,
  • o “l” tem som de “l” (mesmo quando precede outra consoante, assim como no sotaque gaúcho tradicional, não som de “u”, como falam os demais brasileiros),
  • o “w” tem som de “v” (e não de “u”, como em inglês) e
  • o “g” sempre tem som de “g” (nunca de “j”, como acontece em muitas palavras do português; p.ex., em alemão, “Geologie” pronuncia-se “gueologui”).

Ou seja, a pronúncia correta é “folksvaguen”. No entanto, a primeira adaptação fonológica ao português, praticamente imediata (exceto no Rio Grande do Sul, suponho), foi a subsituição do “l” pelo “u”: “fouksvaguen”. O passo seguinte foi a apócope, abreviando para “fouks”. Em seguida, nova adaptação fonológica, que gerou corruptelas: no Rio Grande do Sul, “Fuca”; no Paraná e em Santa Catarina, “Fuque” e “Fuquinha”; no resto do país, “Fusca”, “Fusquinha”. E até “Fusqueta” – p.ex.: “Dentro de uma fusqueta, estavam quatro...” (Alf Degani, Última Hora, 23.06.1969, apud Euclides da Silva).

Segundo Fabio Steinbruch, Fábio Kataoka e Portuga Tavares, o apelido “Fusca” foi uma criação carioca. É possível. Como já dissemos em nosso artigo “A gramática dos nomes de clubes brasileiros de futebol”, fluminenses e paulistas já deram apelidos carinhosos a clubes de seus estados com sufixo nominal “-usca”: Campusca e Cantusca no Rio, Norusca em São Paulo. Ou seja, é bem provável que o apelido “Fusca” tenha sido criado num desses dois estados e depois acabou se espalhando para o resto do país.

Essa origem carioca ou paulista também pode explicar dois mistérios:

  • o grande mistério da inversão da posição do “s”, de depois do som “k” para antes dele – em outras palavras, por que o modelo não se chama “Fucsa”, já que teve origem em “Folcs”; e
  • o mistério menor da substituição do som “o” pelo “u” (que já havia sido introduzido na palavra pela pronúncia brasileira, quando substituiu o som “l” por “u”) – vale dizer, por que o modelo não se chama “Fosca”, já que teve origem em “Volks”.

 Como vimos no já citado artigo sobre os clubes de futebol, há um bom grau de incerteza na definição do sentido que o sufixo nominal “-usca” (e sua variação “-uca”, como em “meiúca” e “Fuca”) atribui às palavras. Vejamos:

  • Às vezes, ele é considerado um diminutivo, p.ex., em galrusca (tipo de cabra pequena) e pardusca (um pouco parda). Esse sentido pode ser aplicado ao Fusca, um veículo relativamente pequeno. Nesse caso, ao falarmos “Fusquinha” e “Fusqueta”, estamos usando dois sufixos nominais diminutivos em seqüência, um duplo diminutivo, como em: marionete (Marion já é diminutivo de Marie), “marolinha” (marola já é uma onda pequena), “caminhonetinha” (caminhonete já é um caminhão pequeno) e “carrinhozinho”.
  • Outras vezes, nas palavras de Luiz Cesar Saraiva Feijó, ele é “repleto de afetividade”, p.ex., quando uma personagem de Joaquim Manuel de Macedo diz que sua avó “é a velha mais patusca [i.e., divertida] do Rio de Janeiro”. Também é aplicável ao Fusca, um carro que costuma despertar esse tipo de sentimento e afetividade.
  • Outras ainda, prosseguindo na lição do Prof. Feijó, ele traduz uma certa “malícia e uma pitada de deboche”, quando assume, na opinião de Luiz Roncari, um “tom rebaixante”. P.ex., quando Nelson Rodrigues descreve uma grã-fina caricata como “realmente gorda e realmente patusca como as viúvas machadianas”. Outro exemplo, ainda mais eloqüente, é a gíria “delerusca”, para delegado – como na música “Na subida do morro”, de Moreira da Silva (gravada em 1952 num 78’ da gravadora Continental, junto com “Cavaleiro de Deus”): “Enquanto eu vou me desguiando/ vocês vão ao distrito/ ao delerusca se desculpando/ foi um malandro apaixonado/ que acabou se suicidando”. Outros dois exemplos são do dramaturgo Plínio Marcos (apud Euclides da Silva): “o doutor delerusca resolveu acabar com o pesqueiro” (Última Hora, 07.06.1972); “o delerusca explicou...” (Diário da Noite, 23.02.1970). Esse sentido depreciativo do sufixo “-usca” também é aplicável ao Fusca, pelos que desprezam o carro.

Ou seja, é possível que a inversão dos sons “s” e “k” tenha decorrido da utilização desse sufixo nominal “-usca”, com esse triplo sentido, tão perfeitamente aplicável a esse automóvel, na justa medida em que desperta esses três sentimentos contraditórios evocados pelo sufixo, que vão do desprezo à admiração. O detalhe é que essa mesma ambigüidade aflige também o (duplo) diminutivo “Fusquinha”, que pode ser usado como demonstração de carinho ou de desdém pelo carro, a depender do contexto.

Por e-mail, Alexander Gromow apresenta outra hipótese bastante plausível para explicar o “mistério da letra s”: o puritanismo. É que, como “Fuca” e “Fuque” teriam conotação sexual, foi inserido o “s”. Vejamos: de fato, “fuque” lembra outras gírias, a saber:

  • Fuque-fuque: ato sexual (J.B. Gurgel), especialmente no Centro-Oeste, no sul de Goiás e Rio de Janeiro (cf. Mário Souto Maior). P.ex.: “Quero ver é na hora do fuque-fuque” (Adovaldo Sampaio).
  • Vuque-vuque: ato sexual. P.ex., na música “Vuque vuque nheco nheco”, de Almeida e Neguinho da Beija-Flor, gravada no LP Meu mundo novo, de 1983, pela gravadora Top Tape.
  • Vuco-te-vuco: cópula; mas também trabalheira agitada, na Paraíba (cf. Marcus Odilon) – neste caso, lembra “muvuca”, que significa bagunça.
  • Vuco-vuco: substantivo masculino para “automóvel”, no Paraná (cf. Filipak e Melillo Filho); ou advérbio correspondente a “depressa”, na Bahia (cf. Alexandre Passos) – neste caso, lembra a famosa onomatopéia “vapt-vupt”, consagrada por Chico Anísio.

Como se vê acima, as três primeiras gírias são de evidente conteúdo sexual; a terceira e a quarta trazem a idéia de agitação e velocidade; e a quarta também significa automóvel. As de conteúdo sexual poderiam, realmente, ter influenciado a colocação do som “s”. Mas e a gíria paranaense “vuco-vuco” que significa automóvel? Teria sido influência do “Fuque”? Ou, a partir da idéia de velocidade, teria dado origem ao nome “Fuque”? Tudo é possível.

Há outras versões para a origem do nome “Fusca”. Uma delas é a de Bob Sharp. Em artigo publicado na revista Fusca & Cia (agradecimentos ao amigo Rudinei), ele diz que a palavra foi criada por um grupo de adolescentes (ele inclusive) internos do Colégio Nova Friburgo, na cidade fluminense de mesmo nome, no início dos anos 50, quando o carro ainda era novidade no Brasil. Diz que chegaram a essa palavra naturalmente, como se chama João Carlos de “Joca”. E que depois o nome foi se espalhando. Longe de mim duvidar que o grupo, por si, também tenha chegado ao nome Fusca. Contudo, com o devido respeito, acho pouco provável que se espalhe pelo Brasil todo uma invenção: (i) de adolescentes, (ii) num colégio interno, (iii) em Nova Friburgo. O próprio autor afirma que os pais visitavam os internos umas duas vezes por ano. Ou seja, era um microcosmo triplamente fechado, isolado demais para ganhar todo um país. Ainda mais considerando a precariedade dos meios de comunicação da época (sem celular e internet; telefones eram raros e caros) e a pouca atenção que os adultos davam aos adolescentes na época (tanto que eram trancafiados em internatos). Repito: com isso, não estou duvidando de que eles também tenham inventado a palavra, espontaneamente, de improviso. Mas pode ser que ela também tenha surgido noutras localidades, ou num grande centro, a partir do qual ganhou o mundo.

Kataoka e Tavares defendem que a evolução de “Volkswagen” para “Fusca” foi um pouco diferente. Primeiro teria ocorrido a corruptela, com a perda do “l”, soando “foxvaguen” – como em “fox-trot”, tipo de dança que existia desde a década de 1910. Depois é que teria ocorrido a redução (por apócope) para “fox”, a partir da qual teriam surgido “Fusca”, “Fuca”, “Fuque”, “Fuquinha”, “Fusquinha” e “Fusqueta”. É claro que é uma linha perfeitamente defensável mas, particularmente, prefiro acreditar que foi a evolução acima indicada (primeiro a substituição do “l” pelo “u”, depois a apócope e, por fim, a corruptela) porque, se a primeira tendência da linguagem coloquial é reduzir a palavra, a primeira tarefa a cumprir, aqui, seria cortar dois terços das sílabas. Só depois é que se parte para um trabalho de “ourivesaria” vernacular, lapidando a sílaba restante, até se dar ao luxo de acrescentar novos fonemas (paragoge), para conferir à palavra maior expressividade, com uma sonoridade mais agradável ou mais forte, chamativa.

Outra possibilidade, lembrada por Ricardo Caruso, é que “Fusca” seja uma onomatopéia a partir do característico zumbido do motor, o famoso assobio do escapamento duplo. Sim, é possível. Mas creio que é mais provável que essa plasticidade fônica apenas reafirmou e reforçou o uso de um apelido cuja origem foi acima descrita.

Seja qual for a origem desse apelido, fato é que, a partir do final dos anos 60, ganhou bastante popularidade. Mas somente em 1983 a montadora finalmente adotou oficialmente o nome “Fusca”.

Importa lembrar que “fusca” é palavra que, independentemente do carro, já existia no idioma português, em três classes de palavras: adjetivo, verbo e substantivo.

a)      Na condição de adjetivo, “fusca” é o feminino de fusco, do latim fuscus, que significa: escuro, pardo, trigueiro – p.ex., em Diogo Bernardes: “antes que a noite fusca a vista estreite” (Égloga I). Daí que, segundo Firmino Costa, gado fusco é o de pelagem escura – p.ex., em Guimarães Rosa, que fala de bois “pretos, fuscos, retintos”. Em sentido figurado: melancólico, triste, sombrio, sinistro, velado (uma voz fusca é cavernosa, roufenha). Outro sentido do adjetivo fusco é o de “fosco”, que significa: escuro, sem brilho, embaciado (p.ex., em Coelho Neto: “entre o fusco lampejo dos bronzes e o brilho esbatido dos móveis, sombras que se moviam em círculos”) – em sentido figurado: covarde, fraco; alterado, mudado, perturbado. Há ainda o adjetivo “fuscalvo”, que significa claro-escuro (fusco + alvo). Há também o adjetivo “fuscoito”, já em desuso, que significa: um tanto fusco; em sentido figurado: áspero, desabrido, agreste (alguém pensou noutra coisa?).

b)     Na condição de verbo, “fusca” é a conjugação do verbo fuscar, no presente do indicativo, terceira pessoa do singular: ele fusca. Do latim fuscare, “fuscar” significa: escurecer, anoitecer. Lembra “enfuscar”, que é tornar fusco, escurecer. Também usado como sinônimo de “foscar”, que significa tornar fosco – ver significados deste adjetivo na letra “a”, acima – (p.ex., é possível dizer que, em 1974, a VW fuscou o painel do Fusca 1500); e “ofuscar”, que significa turvar a vista (p.ex., alguém poderia dizer que o farol Tremendão ofusca mais que o olho-de-boi), deslumbrar; impedir de ver, obscurecer, ocultar, esconder, encobrir; em sentido figurado: desprestigiar, desvirtuar, empanar (p.ex., em Joaquim Manuel de Macedo: “ninguém conclua daqui que por ofuscada perco o amor que tinha ao astro que me ofuscou”) – como verbo pronominal, ofuscar-se: deslumbrar-se; apagar-se, perder o brilho, o valor, o prestígio (p.ex., eu diria que, na segunda série de 1970, com perda do brilho dos cromados, o Fusca 1300 ofuscou-se).

c)      Na condição de substantivo comum feminino, “fusca” é uma espécie de pato selvagem de plumagem negra ou parda, i.e., de peito, asas e lombo escuros. Na condição de gíria, fusca significa a justiça (cf. Grande Enciclopédia e Caldas Aulete). M. Viotti aponta outra gíria, só que “de gatunos”, pela qual fusca significa “garrucha”. Segundo Mário Prata, em Portugal, fusca também é arma de fogo: pistola ou revólver. Já em Cabo Verde, fusca é bebedeira, embriaguez. O substantivo feminino “fusquidão” significa qualidade do que é fusco, escuridão – p.ex., em Aquilino Ribeiro: “de rota batida engolfou-se na fusquidão da terra” (O servo de Deus) e “de envolta com a fusquidão do céu” (S. Banaboião). Há ainda a locução masculina “lusco-fusco” (não confundir com “lesco-lesco”), que signfica: crepúsculo, logo depois do ocaso. No Rio Grande do Sul, diz-se “fusco-fusco” (p.ex., no conto Contrabandista, de Simões Lopes Neto: “Era já fusco-fusco. Pegaram a acender as luzes”); em Cabo Verde, “fuscafusca”; e Francisco Azevedo menciona a variação “fusque-fusque”.

d)     Na condição de substantivo próprio, Fusco é sobrenome (p.ex., do escritor brasileiro Rosário Fusco) e apelido (p.ex., nas Memórias da Rua do Ouvidor: “João-Fusco, a quem tinham alcunhado Fusco pela cor muito trigueira”), enquanto Fusca é prenome. P.ex., da Santa Fusca, também chamada de Santa Jusca ou Fosca (assim como a protagonista da ópera Fosca, de Carlos Gomes), virgem mártir católica celebrada em 13 de fevereiro. No séc. III, durante a perseguição do Imperador Décio aos cristãos, Fusca era uma jovem de Ravena, de 21 anos, que queria converter-se ao cristianismo. Juntamente com sua tia e ama-seca Maura (depois também canonizada), foi batizada pelo sacerdote Hermoloro. Seu pai, quando soube, tentou obrigá-la a renunciar à nova crença. Após fracassar, denunciou ambas à autoridade local, que mandou prendê-las. Lá chegando, os guardas não cumpriram a ordem porque viram um anjo ao lado da jovem. Mas elas compareceram voluntariamente ao tribunal, reafirmaram a fé em Cristo e, por isso, foram cruelmente torturadas e executadas. Suas relíquias encontram-se guardadas na Igreja de Santo Estêvão, em Bolonha. (A propósito, o Fusca já tem padroeira?)

Se o escritor Rosário Fusco fosse devoto de Santa Fusca e tivesse uma filha, poderia batizá-la de Fusca Fusco. Se ela tivesse um Fusca escuro, poderia chamá-lo de Fusca fusco. Se ela quisesse tirar o brilho da plumagem de uma fusca (o pato), ela poderia tentar fuscá-lo. Preferencialmente no crepúsculo, que ela, se fosse gaúcha, chamaria de fusco-fusco. E faria isso em seu carro, é claro. Em resumo: num Fusca fusco, Fusca Fusco fusca a fusca no fusco-fusco. Um título enigmático para este microconto poderia ser “A justiça velada” ou, em fusquês, “A fusca fusca”.

Brincadeiras à parte, o que se nota claramente é que a palavra “fusca”, no latim e no português, tem um significado muito ligado ao escuro, à perda de brilho e sentidos figurados decorrentes (tristeza, melancolia etc.) que não têm nada a ver com o espírito alegre do Fusca, confirmado pelos inúmeros nomes e apelidos adotados nos outros países (cf. veremos no item 3, abaixo). Exceção para o substantivo feminino “fosca”, que significa disfarce, jeito, aparência ilusiva; momice, trejeito, brinquedo – mais usado no diminutivo, “fosquinha”, que é a ação de aparecer e desaparecer repentinamente; sombra; gesto, festa, careta; dissimulação, engano; gracinha, pique, troça; indireta miúda, provocação à inveja. Outra exceção para o já citado verbo “ofuscar”, quando ele pressupõe a existência de um brilho maior (p.ex., em Joaquim Manuel de Macedo: “é fato que nenhuma de nós gosta de ser ofuscada com o esplendor de outra. Já basta de brilhar, D. Clementina”).

Sendo assim, o nome Fusca, dado no Brasil ao Volkswagen Sedan, certamente não tem nada a ver com o campo semântico da palavra “fusco” e suas variações. Vale dizer, não tem origem etimológica nas raízes latinas do idioma português, mas eminentemente fonética, a partir da pronúncia alterada da palavra alemã “Volks”.

Outro argumento que poderia ser lançado é que, como substantivo comum e próprio (nome da Santa), “fusca” é sempre do gênero feminino, enquanto, na condição de nome do carro, Fusca é do gênero masculino. Aliás, como a maioria, mas é claro que há honrosas exceções, p.ex., Brasília, Kombi e Variant; Caiçara, F-1000, Rural, S-10, Vemaget, Romi Isetta etc. Alguém pode argumentar que o gênero do nome do carro costuma contrariar o do substantivo comum, talvez como uma tentativa justamente de diferenciar dele – p.ex., a Blazer, o Fúria, o Esplanada, a Saveiro, a Veraneio. No entanto, nem sempre há essa divergência – p.ex., o Diplomata, o Dodge, o Itamaraty, a Jangada, o Puma. Ou seja, a questão do gênero das palavras “fusca” e “Fusca” não ajuda a decidir a origem do nome do carro.

2.2. Outros apelidos

Além de “Fusca”, “Fuca”, “Fuque”, “Fuquinha”, “Fusquinha” e “Fusqueta”, alguns modelos específicos do Volkswagen Sedan tiveram apelidos próprios, só deles. São os seguintes:

 

a)      Cornowagen – Fusca com teto-solar opcional, disponibilizado em 1965. Dizia-se que era o veículo predileto do marido traído, que poderia aí acomodar seu par de chifres. Há quem diga que o apelido maldoso partiu da concorrência. Numa sociedade em que as pessoas se preocupam demais com o que os outros pensam, foi fatal.

b)     Pé-de-boi – modelo bastante simplificado, “espartano”, de 1965 a 1966; o apelido foi propagado pela própria montadora, com o intuito de dizer que o carro simples era adequado à vida rural.

c)      Modelinho – modelo com maior área envidraçada no vigia traseiro, lançado em 1966; segundo O grande livro do Fusca, provável corruptela de model-year, “ano-modelo” – o ano de fabricação de um veículo, que não necessariamente corresponde ao ano civil (na boa síntese de Fabio Steinbruch).

d)     Tigrão – primeiro modelo 1300, em 1967; jogada de marketing da montadora, provavelmente inspirada numa propaganda da Esso; a idéia era distinguir do modelo 1200.

e)      Fuscão – 1500, de 1970 a 1975; apelido que servia para distinguir do modelo 1300.

f)       Super-Fuscão – 1600-S, de 1974 a 1975; apelido que servia para distinguir dos modelos 1300 e 1500. Em 1976, com o lançamento do modelo 1600, foram aposentados esses superlativos “Fuscão” e “Super-Fuscão”.

g)      Bizorrão – modelo 1600-S, de 1974 a 1975; corruptela de besourão, provavelmente reforçada por onomatopéia (é o que dá a entender a propaganda da época, em que se lia o seguinte: “Bizz-Bizz-Bizzzuuuummm! Chegou o Bizorrão!”).

h)      Fafá – a partir de 1979, devido o formato das lanternas traseiras lembrar os generosos seios da famosa cantora paraense Maria de Fátima Palha de Figueiredo, a Fafá de Belém. Outros países, que não tinham o privilégio de conhecê-la, chamavam de “pata-de-elefante”, pelo formato da pegada do paquiderme. Falando em patas, as lanternas anteriores à Fafá eram conhecidas, no Brasil, como “pata-de-cavalo”, também pelo formato.

i)        Itamar – de 1993 a 1996, porque foi seu lançamento foi fomentado por Itamar Franco, Presidente da República (que não comprou um).

j)       Joaninha – apelido das rádio-patrulhas, em São Paulo, provavelmente pela combinação das cores da bandeira paulista com o formato da viatura. Como veremos a seguir, na França e na Itália, o Fusca também é conhecido como “joaninha”. Isso até poderia levantar a hipótese de o apelido das viaturas paulistas ter surgido por influência da comunidade italiana. Mas é pouco provável, já que, nesse caso, o apelido teria sido Maggiolino (como veremos no item 3, a seguir), ou alguma corruptela disso.

 

3. No mundo

Traremos, a seguir, uma listagem de nomes e apelidos do Fusca em vários países. A lista foi composta a partir de várias fontes, às vezes contraditórias quanto à grafia e ao significado de alguns desses nomes. Infelizmente, nem sempre foi possível descobrir qual o significado. Os que estão com interrogação são duvidosos e carecem de confirmação. É claro que a lista não é perfeita, estando sujeita a futuros acréscimos e correções.

  • África do Sul – Kewer (em africâner: besouro) ou Volla (pronuncia-se “Folla”, corruptela de “Volks”, que se pronuncia “Folks”)
  • Alemanha – Käfer (besouro)
  • Argentina – Escarabajo (escaravelho)
  • Áustria – Käfer (besouro) ou Kugel Porsche (Porshe-bola – ver item 1, acima)
  • Bélgica – Coccinelle (dos valões: joaninha) ou Keverke (dos flamengos: besouro)
  • Bolívia – Peta (tartaruga)
  • Bósnia Herzegovina – Folcika (corruptela de “Volks”)
  • Brasil – Fusca (corruptela de “Volks”, cf. explicação no item 2.1, acima)
  • Bulgária – Kostenurka (tartaruga) ou Brambar (idem)
  • Cabo Verde – Baratinha (nesse país, “fusca” significa bebedeira, embriaguez)
  • Canadá – Beetle (do inglês: besouro), Weevil (do inglês: gorgulho), Bug (do inglês: inseto), Coccinelle (do francês, no Quebec: joaninha) ou Choupette (idem: apelido feminino carinhoso, utilizado para animais de estimação, mas também para o Herbie, na dublagem francesa)
  • Chile – Escarabajo (escaravelho), Moncho (corruptela de Vocho: besouro) ou Poncho (idem)
  • China – Jiaké Chong (besouro)
  • Colômbia – Escarabajo (escaravelho), Pulga (pulga), Cucarron (besouro) ou Pichirilo (gíria usada para se referir a um carro velho de forma carinhosa – agradecimentos ao amigo Rudinei)
  • Costa Rica – Vocho (besouro)
  • Croácia – Buba (besouro)
  • Cuba – Huevito (ovinho) ou Be-doblebe (vê-dáblio)
  • Dinamarca – Boble (bolha), Bobbel (idem), Bobbelfolkevogn (Volkswagen-bolha) ou Hitlerslæden (trenó de Hitler – ver item 1, acima)
  • Egito – Khon-fesa (besouro)
  • El Salvador – Escarabajo (escaravelho)
  • Equador – Escarabajo (escaravelho) ou Pichirilo (gíria – ver Colômbia)
  • Eslováquia – Chrobák (besouro)
  • Eslovênia – Hrošč (besouro)
  • Espanha – Escarabajo (em castelhano: escaravelho) ou Escarabat (em catalão: escaravelho)
  • Estados Unidos – Bug (inseto) ou Beetle (besouro)
  • Estônia – Põrnikas (inseto)
  • Filipinas – Kotseng Kuba (em tagalo: carro corcunda), Pagong (em tagalo: tartaruga), Ba-o (em cebuano: tartaruga) ou Boks (corruptela de “Volks”)
  • Finlândia – Kuplavolkkari (Volkswagen-bolha) ou Kupla (bolha)
  • França – Coccinelle (joaninha)
  • Grécia – Skaraveos (escaravelho) ou Scathari (besouro)
  • Guatemala – Cucaracha (barata), Cucarachita (diminutivo) ou Cuca (abreviatura)
  • Haiti – Coccinelle (joaninha)
  • Holanda – Kever (besouro)
  • Honduras – Cucarachita (baratinha)
  • Hungria – Bogár (besouro)
  • Índia – Beetle (besouro)
  • Indonésia – Kodok (sapo)
  • Inglaterra – Beetle (besouro)
  • Irã – Folex (sapo)
  • Iraque – Agroga (pequena tartaruga)
  • Islândia – Kodok (sapo) ou Bjalla (besouro)
  • Israel – Hipushit (besouro) ou Bimba (bamba?)
  • Itália – Maggiolino (joaninha) ou Maggiolone (idem)
  • Japão – Kabuto-mushi (besouro – agradecimentos ao amigo Walter)
  • Letônia – Vabole (besouro)
  • Líbia – Fakrouna (tartaruga)
  • Lituânia – Vabalas (besouro)
  • Macedônia – Buba (besouro)
  • Malásia – Kura (tartaruga)
  • México – Pulguita (pulguinha), Vocho (besouro) ou Vochito (besourinho)
  • Namíbia – Scoro-Scoro
  • Nepal – Bhyagute Car (carro-sapo)
  • Nigéria – Catch Fire (pega-fogo – provavelmente devido a incêndios no motor, em casos de falta de manutenção das mangueiras de combustível)
  • Noruega – Bobla (besouro) ou Boble (bolha)
  • Panamá – Tortuga (tartaruga)
  • Paquistão – Foxi (corruptela de “Volks”)
  • Paraguai – Escarabajo (escaravelho) ou Fusca (corruptela de “Volks”)
  • Peru – Escarabajo (escaravelho) ou Bocho (corruptela de Vocho: besouro)
  • Polônia – Garbus (corcunda)
  • Porto Rico – Volky (corruptela de “Volks”)
  • Portugal – Carocha (escaravelho)
  • Quênia – Kifuu (em suaíle: casca de ovo)
  • República Dominicana – Cepillo (escova)
  • República Tcheca – Brouk (besouro)
  • Romênia – Broască (pequeno sapo), Broscu (sapo) ou Buburuza (joaninha)
  • Rússia – Zhuk (besouro)
  • Sérvia – Buba (besouro)
  • Sri Lanka – Ibba
  • Suaíle (alguns países africanos)Mgongo wa Chura (costas de sapo) ou Mwendo wa Kobe (a velocidade da tartaruga)
  • Suécia – Bagge (aférese de Skalbagge, besouro), Bubbla (bolha) ou Folka (corruptela de “Volks”)
  • Suíça – Scarabée (em francês: escaravelho) ou Käfer (em alemão: besouro)
  • Tailândia – Rth tèā (tartaruga-carro) ou Fo‘lkh tèā (tartaruga-Volks)
  • Taiwan – Jingui che (besouro)
  • Tanzânia – Kobe (em suaíle: tartaruga)
  • Turquia – Vosvos (besouro), Kaplumbağa (tartaruga) ou Tosbağa (idem)
  • Uruguai – Escarabajo (escaravelho)
  • Venezuela – Escarabajo (escaravelho)
  • Vietnã – Côn bọ (besouro)
  • Zimbabwe – Bhamba datya (em suaíle: sapo) in Shona

 

Maravilha... com esse vocabulário, o leitor já está apto a dar a volta ao mundo.

Podemos fazer um ranking dos singificados dos nomes e apelidos do Fusca (juntando sob o mesmo nome os diminutivos, abreviaturas e pequenas variações, como “tartaruga” e “tartaruga-carro”, “ovinho” e “casca de ovo”), conforme o número de países e línguas em que esses significados são utilizados:

1)     Besouro – 36 países/línguas

2)     Escaravelho – 14

3)     Tartaruga – 12

4)     Corruptela de “Volks” – 8

5)     Sapo – 7

6)     Joaninha – 6

7)     Bolha – 4

8)     Inseto – 3

9)     Barata – 3

10) Pulga – 2

11) Corcunda – 2

12) Ovo – 2

13) “Pichirilo” – 2

14) Gorgulho – 1

15) Bola – 1

16) Escova – 1

17) Trenó – 1

18) Pega-fogo – 1

19) Vê-dáblio – 1

20) “Choupette” – 1

 

Com isso, é possível ter uma noção bastante interessante sobre a imagem que o Fusca passa para os mais diferentes povos.

Chama a atenção o grande número de identificações do carro com o besouro (33% das 108 acima relacionadas) – nem estamos contando aqui o Bizorrão (ver item 2.2, acima), porque se referia apenas a um modelo do carro. Essa identificação começou no país de origem (Käfer) e se espalhou não pelo idioma alemão, mas pela própria imagem do inseto – com ou sem o apoio da montadora.

O detalhe é que “besouro” é o nome vulgar dos insetos da ordem dos Coleópteros, que representa mais de 23% dos animais e mais de 35% dos insetos. Essa ordem compreende, entre outros, os escaravelhos (família dos Escarabídeos), as joaninhas (família dos Coccinelídeos) e os gorgulhos (família dos Curculionídeos) – além da família dos Melolontídeos (como o Maikäfer), que já mencionamos no item 1, acima. Em outras palavras, escaravelhos, joaninhas e gorgulhos são tipos de besouros. Assim, a rigor, a identificação do Fusca com o besouro deve corresponder à soma de besouros, escaravelhos, joaninhas e gorgulhos, que resulta em 57 identificações (53% do total) – não estamos contando aqui a Joaninha paulista (ver item 2.2, acima), porque se refere apenas às viaturas policiais.

É claro que a identificação do Fusca com os coleópteros se baseia no formato. Mas essa identificação é ainda mais perfeita se levarmos em conta que os besouros são os animais melhor adaptados na escala zoológica, tanto que estão distribuídos pelo planeta inteiro, estando ausentes apenas das regiões polares e do fundo do mar. Ora, é justamente o caso do Fusca, veículo muito bem adaptado na escala automobilística, também distribuído pelo mundo inteiro, salvo as mesmas exceções dos coleópteros: os pólos e o fundo do mar. Também se costuma dizer dos besouros que só voam por milagre, porque sua aerodinâmica não ajuda. Que milagre explica o sucesso mundial do Fusca?

Se subirmos um nível na classificação de Lineu, o resultado é ainda mais abrangente. Porque a ordem dos Coleópteros pertence à classe dos Insetos, que também compreende, entre outras, as ordens dos Ortópteros (na qual são classificadas as baratas, família dos Blatídeos) e dos Sifonápteros (na qual são classificadas as pulgas). Ou seja, se buscarmos a identificação do Fusca com os insetos, devemos lembrar não só os muitos países e idiomas em que o Fusca é conhecido como “inseto”, mas também aqueles em que é chamado de besouro, escaravelho, joaninha, barata e de pulga, o que resulta em 65 identificações (60% do total).

Assim como ocorre em relação aos besouros, a identificação com todos os demais insetos se dá em virtude do formato. Também foi o formato que motivou os apelidos ligados a tartaruga (à exceção da “velocidade de tartaruga”, em suaíle), sapo, bolha, corcunda, ovo e bola. Somadas essas identificações (exceto a já citada), chegamos a 91, no total de 108 (84%). Como bem observou o amigo Rudinei, talvez a origem disso esteja na costumeira ausência de uma plaquinha de identificação do nome do carro, que é tão comum em outros modelos. Sem saber o nome, as pessoas tenderiam a identificá-lo pelo formato que lhes é mais familiar. O que é relativamente fácil para um carro de formas simples, porém muito próprias dele, o que criou uma identidade visual fácil e marcante. É uma interessante hipótese a ser estudada.

Somado às formas arredondadas, Ricardo Caruso aponta outro motivo para identificação com o besouro (e, acrescentamos, outros insetos): o zumbido característico do motor refrigerado a ar, que, numa licença poética, pode-se dizer assemelhado ao zunido do vôo de um inseto. Forma e som, combinados, reforçariam o apelido.

Fora todas essas identificações pelo formato (e som) do carro, merecem destaque os 8 nomes que resultam de corruptelas de “Volks” (7%), entre as quais, o nosso já consagrado “Fusca”.

4. No fim...

... das contas, nota-se que, seja qual for o modo de composição do nome local, o carro passou a ser conhecido por uma palavra em seu idioma nacional, o que de certa forma tornou-o mais próximo da população local, menos estrangeiro – ironicamente, pois o carro foi concebido na vigência de um regime xenófobo. Outra ironia: um carro que participou da 2ª Guerra Mundial é conhecido por apelidos amigáveis, de apelo a imagens simples, comuns desde a infância (insetos, bolhas, tartarugas, sapos, ovos) – daí talvez seu sucesso no mundo pop, de Herbie (de Se meu Fusca falasse), Wheelie (de Carangos e Motocas) e, em menor medida, o Battillac de Batfino. Às vezes com um tom até humorístico, como o nosso “Fafá”, ou com auto-ironia, como “velocidade de tartaruga” (em suaíle). Mesmo apelidos mais críticos, como “trenó de Hitler” (na Dinamarca), “pega-fogo” (na Nigéria), têm humor. Certamente cáustico, como “Cornowagen”, mas ainda assim humor. Ao contrário da palavra “fusco” que, como vimos no item 2.1, acima, pertence a um campo semântico mais sombrio, melancólico, sem brilho (que condiz mais é com a época sombria em que foi gestado, cf. explicamos no item 1, acima). Ao contrário também do apelido “Tigrão”, que a montadora tentou emplacar mas não “pegou”, talvez por faltar ao carro linhas agressivas que justificassem uma mínima identidade com o felino.

A bem dizer, um humor sutil é justamente a constante de todos esses nomes e apelidos do Fusca. Que, como bem nota Jon Stroud, o associam a sentimentos de diversão, lazer e liberdade.

 

5. Referências bibliográficas

ARIÈS, Philippe. História social da criança e da família. 2ª ed. Rio de Janeiro: Zahar, 1981. p. 277-8.

AZEVEDO, Francisco Ferreira dos Santos. Dicionário analógico da língua portuguesa. Brasília: Coordenada, s/d. p. 187.

BEAU, Albin Eduard. Langenscheidts Taschenwörterbuch der Portugiesischen und Deutschen Sprache. Berlin: Langenscheidt, 1964. t. 2, p. 221, 236, 244, 268.

BUZZI, Zundir José. Entomologia didática. Curitiba, UFPR, 1985. p. 185 e ss.

CALDAS AULETE. Dicionário contemporâneo da língua portuguesa. 5ª ed. Rio de Janeiro: Delta, 1985. v. 3, p. 882-3, 904-5.

CALMON, Andrea. O grande livro do Fusca em fascículos. Rio de Janeiro: IBC, 2011. nº 1, p. 4 e ss., nº 3, p. 32-45; nº 4, p. 12-9; nº 7, p. 11-9.

CARUSO, Ricardo. Livro do Fusca. São Paulo: Nova Leitura, s/d. p. 6, 16 e ss., 26 e ss., 42, 46.

COELHO NETTO, Henrique Maximiniano. Vida mundana. 2ª ed. Porto: Chardron, 1924. p. 93.

COSTA, Firmino. Vocabulário analógico. São Paulo: Melhoramentos, s/d. p. 25-6.

CUNHA, Antônio Geraldo da. Dicionário etimológico Nova Fronteira da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1982. p. 372.

DER GROSSE Brockhaus. 16ª ed. Wiesbaden: F.A. Brockhaus, 1957. v. 12, p. 246.

ENCICLOPÉDIA do automóvel. São Paulo: Abril Cultural, s/d. v. 8, p. 1.760, 1.899-903.

ENCICLOPEDIA Universal Ilustrada Europeo-Americana. Madrid: Espasa-Calpe, s/d. t. 25, p. 262; t. 33, p. 1.194.

FARIA, Ernesto. Dicionário escolar latino-português. 3ª ed. Rio de Janeiro: MEC, 1962. p. 419.

FARIA, Oswaldo Lamartine de; AZEVEDO, Guilherme de. Vocabulário do criatório norte-riograndense. Rio de Janeiro: Ministério da Agricultura, 1966. p. 53.

FEIJÓ, Luiz Cesar Saraiva. Futebol falado. Rio de Janeiro: ed. do autor, 2010. p. 111, 165.

FERREIRA, António Gomes. Dicionário de latim-português. Porto: Porto Ed., 1983. p. 510.

FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Aurélio século XXI: o dicionário da língua portuguesa. 3ª ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999. p. 956.

FILIPAK, Francisco. Dicionário sociolingüístico paranaense. Curitiba: Imprensa Oficial, 2002. p. 183, 185, 365.

FIRMINO, Nicolau. Dicionário latino-português. 5ª ed. São Paulo: Melhoramentos, 1959. p. 243.

GRANDE Enciclopédia Portuguesa e Brasileira. Lisboa: Editorial Enciclopédia, s/d. v. 11, p. 681, 690, 1.009-10, 1.012.

GROMOW, Alexander. Volkswagen Sedan = Fusca. Mas... Por quê? A Bananinha, nº 9, 1992, p. 5-6.

GUIMARÃES ROSA, João. Ficção completa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1994. v. 1, p. 200.

GURGEL, J.B. Serra e. Dicionário de gíria. 3ª ed. Brasília: ed. do autor, 1995. p. 205, 227.

HOUAISS, Antônio; VILLAR, Mauro de Salles. Dicionário Houaiss da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001. p. 1.408.

KATAOKA, Fábio. Fusca uma paixão. São Paulo: Escala, 2008. p. 15 e ss.

KATAOKA, Fábio; TAVARES, Portuga. Almanaque do Fusca. São Paulo: Ediouro, 2006. p. 12 e ss., 22, 37, 112, 174.

LEAHY, Anthony. Dicionário de curitibanês. 2ª ed. Curitiba: Instituto Memória, 2010. p. 11, 30.

LEHMANN, Padre João Batista. Na luz perpétua. 5ª ed. Juiz de Fora: Lar Católico, 1959. v. 1, p. 143.

LOPES NETO, João Simões. Obra completa. Porto Alegre: Sulina, 2003. p. 381.

MACEDO, Joaquim Manuel de. A Moreninha. Rio de Janeiro: Pallas, 1975. p. 23, 50.

MACEDO, Joaquim Manuel de. Memórias da Rua do Ouvidor. Brasília: Senado Federal, 2005. p. 41.

MARANHÃO, Zilkar Cavalcante. Entomologia geral. São Paulo: Nobel, 1976. p. 379 e ss.

MARTINS, Nilce Sant’Anna. O léxico de Guimarães Rosa. 2ª ed. São Paulo: Edusp, 2001. p. 238.

MELILLO FILHO, Renato. Gíria policial: pequeno glossário. Porto União: Uniporto, 1983. não paginado.

MORAIS, Orlando Mendes de; PENA, Leonam de Azeredo. Dicionário de sinônimos e antônimos. 9ª ed. Rio de Janeiro: EC, s/d. p. 218.

NASCENTES, Antenor. Dicionário etimológico resumido. Rio de Janeiro: INL, 1966. p. 344.

NUNES, Zeno Cardoso; NUNES, Rui Cardoso. Dicionário de regionalismos do Rio Grande do Sul. Porto Alegre: Martins, 1982. p. 197.

ODILON, Marcus. Camumbembe e seus parentes. Belém: Falangola, 1997. p. 120, 228.

OSBORNE, Charles. Dicionário de ópera. Rio de Janeiro: Guanabara, 1987. p. 152.

PAGOTTO, Fábio C.; TAVARES, Portuga. Kombi. São Paulo: Alaúde, 2011. p. 49.

PASSOS, Alexandre. A gíria baiana. Rio de Janeiro: Liv. São José, 1973. p. 100.

PRATA, Mário. Dicionário de português: schifaizfavoire. 14ª ed. São Paulo: Globo, 1995. p. 67.

PRIORE, Mary del (org.). História das crianças no Brasil. 6ª ed. São Paulo: Contexto, 2009. p. 7 e ss.

RIBEIRO, Aquilino. S. Banaboião: anacoreta e mártir. s/l: Bertrand, 1984.

RODRIGUES, Nelson. A cabra vadia. São Paulo: Companhia das Letras, 1995. p. 273.

ROHRBACHER, Padre. Vidas dos santos. São Paulo: Américas, 1959. v. 3, p. 239.

RONCARI, Luiz. Literatura brasileira: dos primeiros cronistas aos últimos românticos. 2ª ed. São Paulo: Edusp, 1995. p. 224.

SAMPAIO, Adovaldo Fernandes. Lídia, Lígia e Lívia. In: Antologia do conto erótico. Rio de Janeiro: Eroticon, 1977. p. 118.

SANDLER, Paulo Cesar. DKW: a grande história da pequena maravilha. 2ª ed. São Paulo: Alaúde, 2006. p. 39-41, 46 e ss.

SANDLER, Paulo Cesar. Fusca. São Paulo: Alaúde, 2011. p. 6 e ss., 13 e ss., 32 e ss.,  74, 78, 82.

SCHILPEROORD, Paul. A verdadeira história do Fusca: como Hitler se apropriou da invenção de um gênio judeu. 2ª ed. São Paulo: Alaúde, 2011. p. 216 e ss. et passim.

SHARP, Bob. Fusca: coisa de garotos. Fusca & Cia, São Paulo, a. 4, nº 38, p. 58-9.

SILVA, Euclides Carneiro da. Dicionário da gíria brasileira. Rio de Janeiro: Bloch, 1973. p. 70, 106.

SILVEIRA BUENO, Francisco da. Grande dicionário etimológico-prosódico da língua portuguesa. São Paulo: Saraiva, 1965. v. 3, p. 1.495.

SOUTO MAIOR, Mário. Dicionário do palavrão e termos afins. 3ª ed. Recife: Guararapes, 1980. p. 161.

SPITZER, Carlos. Dicionário analógico da língua portuguesa. 5ª ed. Porto Alegre: Globo, 1956. p. 146, 148.

STEINBRUCH, Fabio. Automóveis no Brasil: marcas que o tempo não apaga. São Paulo: Alaúde, 2008. p. 136-9, 405.

STEINBRUCH, Fabio. Memórias sobre rodas: o automóvel no Brasil dos anos 1960. São Paulo: Alaúde, 2007. p. 33, 43.

STROUD, Jon. O pequeno grande livro do Fusca. São Paulo: Escrituras, 2011. p. 6, 13 e ss., 124-5.

TACLA, Ariel. Dicionário dos marginais. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1981. p. 55, 61.

TOCHTROP, Leonardo. Dicionário alemão-português. Porto Alegre: Globo, 1968. p. 282, 301, 313, 346.

VIEIRA, José Luiz. A história do automóvel. São Paulo: Alaúde, 2010. v. 3, p. 205-7.

VIOTTI, M. Novo dicionário da gíria brasileira. São Paulo: Bentivegna, 1956. p. 207-8.

VOCABULÁRIO Sul-Rio-Grandense. Porto Alegre: Globo, 1964. p. 210.

WANKE, Eno Theodoro. Vocabulário paranista. 2ª ed. Ponta Grossa: UEPG, 2001. p. 49.