Qual a Importância do Microscópio Para o Estudo do Corpo Humano? Por Que Malpighi Foi Considerado o Fundador da Anatomia Microscópica? O Que Era a Anatomia Comparada?

A anatomia moderna progrediu bastante quando Vesálio insistiu em estudar o corpo humano através da dissecação de cadáveres. No entanto, poucas décadas depois novas comparações revelaram um corpo humano surpreendente. Wiliam Harvey (Médico e Professor da Universidade de Pádua) encontrou pistas para a circulação sanguínea nas suas experiências com frangos, sapos e serpentes. 

Mas, o círculo da circulação – que ele estudava – ainda não estava completo e só o seria graças às observações de “animais inferiores”, através de uma nova anatomia comparativa. O alcance dessas comparações seria muito mais vasto do que tudo quanto Galeno ousara. 

O herói dessa história – Marcelo Malpighi – era um cientista cujo trabalho não tinha qualquer unidade dogmática. Foi um dos primeiros que não definiu a sua missão nem pela doutrina do seu mestre, nem pelo assunto que estudou e já não era “aristotélico” nem “galenista”. O seu padrinho mecânico era qualquer instrumento que lhes prolongava os sentidos e alargava a visão. Malpighi viria a ser um “microcopista” e a sua ciência foi “microscopia”, palavra registrada pela 1ª vez em inglês em 1664. Sua carreira foi cimentada não pelo que ele tentava confirmar ou provar, mas pelo veículo que o transportou nas suas viagens de observação. 

Geralmente chamado o fundador da anatomia microscopia, Malpighi foi um dos primeiros exploradores do estilo novo que desviaram a atenção do cosmo para o desenvolvimento do universo para o fato. Os escritos dele poderiam chamar-se de “Viagens com o Microscópio”, pois a sua obra foi o diário de um viajante a um mundo invisível ao olho nu. 

Infelizmente não sabemos muito sobre o instrumento através do qual Malpighi observou, mas sabemos que ele utilizava um microscópio com uma lente simples e, algumas vezes, outro com duas lentes. Em 1684, um incêndio lhe consumiu a casa e todos os seus microscópios e, tentando reparar as perdas, a Royal Society de Londres mandou-lhe lentes especialmente desbastadas e vários nobres com inclinações científicas acrescentaram os seus próprios microscópios à oferta. 

Marcelo Malpighi nasceu em Bolonha em 1628 de uma família rica, formando-se doutor em medicina pela universidade da cidade onde lecionou Lógica e depois medicina Teórica na Universidade de Pisa. Lá, ele conheceu um professor de matemática (Gionanni Alfonso Borelli) que exerceu grande influência na sua carreira. 

Não fosse Malpighi, e o talentoso Borelli talvez tivesse continuado a ser apenas um respeitável discípulo de Galileu e Kepler. Por outro lado, não fosse Borelli, talvez Malpighi tivesse continuado a ser apenas mais um explicador de “Medicina Teórica”. Após uma brilhante carreira na Academia da Experiência em Florença, Borelli tornou-se um membro da comunidade de ciência europeia. 

Borelli se tornou um fundador da “Iatrofísica” (a palavra grega “iatro” significa médico); ou seja, a aplicação da Física à Medicina. Ele serviu-se dos princípios físicos que antes aplicara aos movimentos dos fluidos e voltou-os para o interior do corpo humano. 

Em seu livro (“Do Movimento dos Animais”), Borelli demonstrava que os movimentos do corpo humano eram como os de todos os outros corpos físicos. Quando o braço de um homem levantava um peso, o trabalho era realizado em conformidade com os princípios conhecidos de Arquimedes: _ o osso era a alavanca, movia-se como o seu segmento mais curto pela força de propulsão do músculo. Os movimentos dos membros ao levantar, andar, correr e saltar também obedecia às leis da Física. Borelli demonstrou como as mesmas leis governavam as asas dos pássaros, as barbatanas dos peixes e as pernas dos insetos. 

Entretanto, Malpighi mirava seu microscópio nos órgãos internos a fim de descobrir a sutileza da sua estrutura. Quando estudante em Bolonha sentiu-se impressionado com o trabalho de Harvey, que dizia assinalar “o crescente novo conhecimento de astronomia”. Acreditava que quando Harvey explicara a função do coração e do sangue, dera uma coerência nova a toda fisiologia humana, e que a sua técnica experimental, a firmeza da sua lógica e a sua exclusão de outras explorações possíveis eram convincentes. 

Malpighi dizia que Harvey demonstrou claramente que o sangue circula através do corpo muitas vezes num dia. No entanto faltava à sua teoria um elo crucial, pois se passava tanto sangue velozmente pelo coração e o corpo produzia sangue tão lentamente, o próprio sangue deveria encontrar-se em um processo de renovação. O mesmo sangue tinha de estar em constante movimento das artérias para as veias, a fim de manter o fluxo da vida correndo sempre. 

Era bastante fácil a um anatomista localizar as artérias ou as veias. Mas, qual a relação entre elas? Até esse mistério, que preocupara o próprio Harvey, ser solucionado, haveria motivo para duvidar de Harvey. Malpighi situou o mistério nos pulmões e depois haveria de solucioná-lo através de novas técnicas de anatomia comparativa. Em 1661 anunciou suas descobertas ao seu velho amigo Giovanni Borelli. Na anatomia ortodoxa de Galeno supunha-se que os pulmões eram vísceras carnudas, resultado de um temperamento quente ou úmido e de uma natureza sanguínea. Malpighi interrogava-se sobre se era essa realmente a sua estrutura: _ “Como a natureza tem o hábito de colocar no imperfeito os rudimentos do perfeito, chegamos à luz gradualmente”. 

Malpighi descobriu os capilares e ao mesmo tempo revelou a estrutura e o funcionamento dos pulmões, abrindo caminho para a compreensão do processo respiratório. Através do engenho, da cuidadosa técnica e uma ânsia de procurar analogias para acumular provas, Malpighi elaborou uma nova anatomia comparada. O que para Galeno foi uma fonte de erro, tornou-se para ele um meio de conhecimento. Essa nova anatomia comparada usava o “Microscópio da Natureza”.

Malpighi demonstrou o quanto eram infindáveis essas vistas microscopias. Ele observou na língua os órgãos do paladar (ou papilas gustativas) e começou a descrever a sua função. Revelou a estrutura das glândulas e foi o pioneiro da anatomia do cérebro, observando a distribuição da matéria cinzenta e as estruturas do cérebro e do cerebelo. Descobriu a camada pigmentaria da pele. 

Com o microscópio, ele comparou as células e o sistema vesicular das plantas com o sistema traqueal dos insetos e criou assim a Fitotomia, a anatomia das plantas. Mas, apesar do seu preconceito contra a teoria, Malpighi foi estimulado para algumas hipóteses sobre todos os processos da vida. O que ele viu na textura da madeira, na traqueia dos insetos, nos pulmões das rãs e dos homens indicou-lhe que quanto mais “perfeito” é um organismo, tanto menores são seus órgãos respiratórios. 

A força de Malpighi foi posta à prova pela inveja dos seus colegas médicos e outros ataques também vieram até dos seus próprios alunos. Em 1698 foi pronunciada contra ele uma acusação formal em Roma. Quatro teses elaboradas e defendidas por um dos seus próprios alunos condenavam seu trabalho e declaravam-no inútil: _ “Deus Todo Poderoso preparou no corpo um domicílio maravilhoso para a nobre alma humana {....} é nossa forme opinião que a anatomia da pequena conformação interna das vísceras, não tem utilidade para nenhum médico”. 

A grande tristeza da vida de Malpighi não foi a crítica injusta e mesquinha dos ignorantes, embora alguns deles tivessem sido seus alunos. Ele dedicara seu trabalho ao velho amigo Borelli. Mas neste mundo competitivo e na batalha pela prioridade, até as camaradagens intelectuais mais longas sofriam tensões que as levavam ao ponto de ruptura. Zangado, Malpighi terminou a sua longa e fértil correspondência com Borelli em 1668, pela razão de que um conhecido daquele publicara um panfleto discordando da nova explicação de Malpighi da função das papilas da pele. 

Quando Malpighi morreu, seus colegas foram mais caridosos no seu veredito e, em 1697, a Royal Society publicou uma carta necrológica do professor de Anatomia em Roma: _ “O incomparável Malpighi, que naturalmente se aplicou apenas a estudos sérios e mesmo assim contra sua vontade, para desfrutar algum receio; dedicara todo o seu tempo a fim de descobrir novos mundos por anatomias, e a refutar pela sua virtude e grande saber, as calúnias dos invejosos”. 

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